A CONFISSÃO POR TELEFONE OU VÍDEO-CHAMADA É VÁLIDA?

Fonte: FSSPX México – Tradução: Dominus Est

Devido às atuais dificuldades causadas pelo coronavírus, muitos de vocês precisam ficar em casa e se encontram impossibilitados de acessar o sacramento da penitência nas igrejas. Portanto, muitos se perguntam se é possível confessar-se em casa usando o telefone ou os diferentes aplicativos que temos à nossa disposição, como WhatsApp, Skype, FaceTime etc., fazendo uma vídeo-chamada com o sacerdote e confessando-nos on-line.

Então, surge a pergunta: posso ou não confessar-me por telefone ou através dos diferentes aplicativos que o mundo moderno me disponibiliza? Esta não é uma pergunta nova, porque o telefone existe há muito tempo e a teologia moral já respondeu a essa pergunta.

A resposta é “Não”. Não posso usar o telefone nem os aplicativos de celular ou computador para confessar-me. Por que razão? O problema é que a confissão por telefone ou através dos diferentes aplicativos que estão ao nosso alcance é, muito provavelmente, inválida. É muito duvidosa, porque não cumpre os requisitos que Nosso Senhor colocou no sacramento da penitência ao instituí-lo. Vamos desenvolver o tema aproveitando o que diz o Padre Royo Marín em sua “Teologia Moral para Leigos”, na qual ele indica os diferentes pontos que tornam a confissão por telefone, muito provavelmente, inválida e, portanto, ilícita. E isso se aplica, é claro, a aplicativos modernos e chamadas de vídeo.

Podemos dizer que são três as principais razões que tornam a confissão por telefone muito duvidosa:

Em primeiro lugar, diz Pe. Royo Marín, falta a presença real do penitente. Na confissão deve haver um contato pessoal imediato entre o sacerdote e o penitente. Entre o sacerdote, que é o juiz na penitência. Vocês devem se lembrar que a confissão é um sacramento instituído como um juízo: o padre é um juiz que julga os pecados em nome de Deus, em nome de Jesus, e o penitente é o acusado que se auto-acusa. Deve haver uma relação cara a cara entre o juiz e o penitente, ou seja, o acusado. É evidente, diz o Pe. Royo Marín, que o telefone, por sua própria natureza, é usado para falar com uma pessoa ausente, não com uma pessoa presente. O mesmo deve ser dito, e com maior razão, do rádio e da televisão. Não importa que se possa falar com o penitente e até vê-lo na televisão porque, como diremos em breve, a palavra humana não é realmente transmitida pelo telefone ou rádio, e pela televisão não se vê o mesmo penitente, mas apenas sua imagem ou fotografia refletida na tela, exatamente como em um espelho. Falta, absolutamente, a presença real, mesmo moral, do penitente. Não há presença real, podemos dizer, entre o penitente e o confessor. É uma presença artificial. 

Agora, a segunda razão para a invalidade da confissão por telefone é que não há verdadeira e real transmissão das palavras de absolvição. Na conversa telefônica não se transmite a mesma voz humana como se esta estivesse realmente passando pela linha telefônica que conecta os dois dispositivos, mas ao vibrar a membrana do microfone ferida pela palavra do interlocutor, se estabelece uma corrente elétrica que faz vibrar a membrana do receptor da mesma forma, fazendo-lhe reproduzir a palavra ou o som transmitido. Não é, portanto, a própria palavra que percorre a rota telefônica ou radiofônica, mas apenas uma série de vibrações elétricas que reproduzem a palavra humana. Isso, é claro, pode ser aplicado ao mundo numérico das chamadas que usam aplicativos de celular, que não são mais correntes elétricas, como antes, mas números. O mundo numérico é uma tradução de nossos sons e nossas palavras em números e, assim, é transmitido ao nosso interlocutor. O que se aplica às ligações telefônicas, como o Pe. Royo Marín diz, ainda mais se aplica às conversas numéricas como são feitas hoje.

Não vale objetar, diz o Pe. Royo Marín, que o mesmo ocorre com a conversa humana entre duas pessoas presentes, já que a palavra de uma delas é transmitida à outra através de ondas ou vibrações sonoras distintas da própria palavra. Não há paridade entre os dois casos, porque na conversa entre as pessoas presentes tudo isso ocorre de maneira completamente natural e imediata, ou seja, sem intermediários, já previstas por Cristo ao instituir o sacramento dessa maneira, enquanto que a conversação por telefone ou rádio, produz o fenômeno de maneira puramente artificial e através de um intermediário, que está longe de coincidir com o meio natural e imediato. Na conversa telefônica ou com a vídeo-chamada moderna, usa-se um intermediário tecnológico, e aqui eu abro um parêntese para completar o que o Pe. Royo Marín diz, e aplicá-lo ainda mais ao mundo de hoje, ao mundo moderno. Podemos dizer que esse intermediário é o principal problema. Além do fato de não haver presença, existe um intermediário que pode corromper e distorcer a conversa ou o contato entre o penitente e o sacerdote.

Sabemos muito bem que, no mundo digital de hoje, é possível tranquilamente transformar as palavras e modificá-las. Assim como o Photoshop nos permite retocar uma imagem e fazer o que se quer com ela, o mesmo acontece com os sons que são transmitidos via telefone celular ou via WhatsApp, quando atingem a outra parte, podem ser totalmente modificados, sem poder garantir a autenticidade da conversa.

Aqui é adicionado um terceiro problema que o Pe. Royo Marín menciona: o grave perigo de quebrar o sigilo sacramental (segredo da confissão). Se a isso acrescentamos que a absolvição por telefone e, com maior razão, por rádio, coloca em grande perigo o sigilo sacramental, será fácil entender que, pelo menos no que diz respeito ao sacramento da penitência, não é possível estabelecer paridade entre a conversa natural e o artificial. Este é um problema sério. Se alguém se confessar por telefone, não se tem garantia do segredo da conversa, o segredo da advertência do Padre, e isso é gravíssimo, Porque Nosso Senhor instituiu a confissão, precisamente, incluindo esse sigilo, esse segredo sacramental.

Sabemos muito bem que o que é dito no WhatsApp, Skype, aplicativos ou telefone pode ser tranquilamente ouvido por qualquer pessoa, pelos serviços de inteligência, e isso vai contra a essência do sacramento.

Então, veja você, por estas três razões: pela falta da presença real entre o penitente e o sacerdote; por esta transmissão que necessita de um intermediário artificial; e, finalmente, devido a esse perigo que implica ao sigilo da confissão, o uso de meios tecnológicos, como aplicativos de telefone ou vídeo-chamada, é muito provavelmente inválido e, portanto, não pode ser usado.

É interessante porque, há alguns dias, em 15 de março, um bispo no Peru concedeu permissão a seus padres para confessarem por telefone ou vídeo-chamadas e, cinco dias depois, em 20 de março, ele teve que voltar atrás, porque o Vaticano emitiu um decreto recordando normas tradicionais para a confissão sacramental. Ele teve que retratar mostrando que a Igreja nunca aprovou a confissão por telefone.

Ao final de tudo isso, devemos ficar desanimados porque não podemos confessar indo às igrejas? Não. O ato de contrição perfeita, o ato de caridade perfeita, permite-nos receber o perdão de Jesus, mesmo antes da confissão. Portanto, não desanimemos, mas que usemos esse ato de perfeita contrição para receber o perdão de Jesus, se o necessitarmos.

Pe. Jean-Michel Gomis +

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