CRISTO JUIZ (PARTE 4): O PODER DE JULGAR VEM DO PAI E FOI TRANSMITIDO A SÃO PEDRO, AOS APÓSTOLOS E AOS SEUS SUCESSORES

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Prof. Paolo Pasqualucci (Courrier de Rome nº 387) – Tradução: Dominus Est

4. O poder de julgar vem do Pai e foi transmitido a São Pedro, aos Apóstolos e aos seus sucessores

O poder de julgar do Filho vem do Pai. Com efeito, assim como o Pai ressuscita os mortos e dá a vida, da mesma maneira o Filho dará a vida a quem Ele quer. O Pai não julga ninguém, tendo deixado todo juízo nas mãos do Filho, a fim de que todos honrem o Filho como honram o Pai. Aquele que não honra o Filho não honra o Pai. É o que explica Nosso Senhor em seu primeiro ensinamento aos fariseus.

«Em verdade, em verdade vos digo: O Filho não pode de si mesmo fazer coisa alguma, mas somente o que vir fazer ao Pai; porque tudo o que fizer o Pai, o faz igualmente o Filho. Porque o Pai ama o Filho, e mostra-lhe tudo o que faz; e lhe mostrará maiores obras do que estas, até ao ponto de vós ficardes admirados. Porque assim como o Pai ressuscita os mortos e lhes dá vida, assim também o Filho dá vida àqueles que quer. O Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho todo o poder de julgar, a fim de que todos honrem o Filho como honram o Pai. O que não honra o Filho, não honra o Pai, que o enviou. Em verdade, em verdade vos digo que quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna e não incorre na sentença da condenação, mas passou da morte para vida» (Jo. 5, 19-24).

O Filho não é autônomo em relação ao Pai. Ele não pode nada fazer «de si mesmo». O Filho pode fazer «somente o que vir fazer ao Pai»; o que o Pai, em seu amor pelo Filho, «mostra» (deíknumi em grego, demonstro, monstro em latim) ao Filho. Esse conhecimento pelo Filho é o fruto do amor do Pai pelo Filho e pertence à natureza intrínseca de seu vínculo, à coabitação (pericòresis ou circuminsessio) e à compenetração recíproca das Pessoas da Santíssima Trindade por sua processão imanente.

O conhecimento que o Filho tem das obras do Pai é um conhecimento direto, por «visão», porque o espírito do Filho habita sempre o espírito do Pai, e o Filho sempre conserva sua individualidade de pessoa (Santo Agostinho). O que o Filho vê o Pai fazer é portanto o que o Pai «mostra» ao Filho, pelo amor que isso traz a Ele. Portanto, as obras que faz o Filho são aquelas que o Pai Lhe «mostrou», e é por isso que elas são obras do Filho. Elas são, enquanto tais, obras do Pai. Os fariseus estavam escandalizados porque Jesus tinha curado um paralítico no dia do Shabat, no tanque de Betesda (Jo. 5, 9-18). E para respondê-los, Jesus começa a explicar que procedia do Pai, do qual vinha sua natureza divina, demonstrada pelas obras miraculosas que realizava. A obra que constituía a cura milagrosa de um homem paralisado há trinta anos (Ibid., 5) era uma obra que o Filho havia visto junto ao Pai. Mas o Pai lhe mostrará obras bem maiores que essas, «até ao ponto de vós ficardes admirados». E quais seriam essas obras? O Senhor expõe-nas, e isso constituía uma afirmação de sua natureza divina face aos fariseus.

O Pai ressuscita os mortos no Juízo Universal (Ez. 37). Ele «dará a vida a quem quiser», ou seja, dará a vida àqueles que considerar dignos de merecimento. Mas o Pai quer que «o Filho [dê] vida àqueles que quer». Eis uma obra «maior ainda», muito maior que aquela realizada pela cura miraculosa do paralítico. Essa obra «maior» realiza o fim essencial da Encarnação porque o Verbo, sem estar unido de alguma maneira por isso mesmo a todos os homens, encarnou-se em um homem para a nossa salvação e, portanto, a fim de «dar a vida» eterna, a saber, «para quem quiser»: não a todos aqueles que a querem, não segundo o julgamento dos homens (muitos pecadores gostariam de entrar no paraíso mantendo-se impenitentes), mas segundo o Juízo de Deus, manifesto pelo Filho.

Portanto, o Pai não julga ninguém, tendo então remetido todo juízo nas mãos do Filho. Todo juízo: não somente o juízo individual, mas também o final, universal, enquanto juízo visível para nós, julgados, naquele Dia, não enquanto Juízo independente da vontade do Pai, que habita sempre ab eterno na vontade do Filho (Santo Agostinho). O Pai fez isso também para que todos «honrem» o Filho da mesma maneira que o Pai para fazer assim compreender que o Filho não é menos que o Pai, visto que «todo juízo» remetido às suas mãos. Ademais, para fazer compreender que Ele é um com o Pai (Jo. 10, 30). E que, portanto, Ele deve ser «honrado» como o Pai que está nos céus. Honrado, precisamente, como convém ao Filho de Deus, consubstancial ao Pai.

Nosso Senhor, portanto, é juiz como o Pai. E Ele o é porque tal é a vontade do Pai. Assim, o Filho faz sempre o que «vir fazer ao Pai». Da mesma maneira que o Pai ressuscita os mortos e dá a vida (eterna) pelo juízo, da mesma maneira faz o Filho. Mas por que Nosso Senhor diz que aquele que obtém a vida eterna «não incorre na sentença da condenação, mas passou da morte para vida»? Devemos novamente considerar que os justos vão para o paraíso sem a necessidade de serem julgados? Não. Eles «passam da morte para a vida», eles ressuscitam espiritualmente para ir para a vida eterna, sem serem submetidos à sentença de condenação (Santo Agostinho), ou seja, evitando a condenação que incorrem aqueles que quiseram se condenar.

O poder de julgar foi anunciado aos Apóstolos para o dia do Juízo: neste dia, eles julgarão com Ele os homens (Lc 22, 30). Ele foi anunciado a Cefas quando Nosso Senhor o declara «pedra da Igreja», ou seja, chefe da Igreja, contra a qual o inferno jamais prevaleceria, conforme relata a célebre passagem de Mt. 16, 17-20, que constitui o fundamento do Primado de Pedro. «Eu te darei as chaves do reino dos céus: tudo o que ligares sobre a terra, será ligado também nos céus, e tudo o que desatares sobre a terra, será desatado também nos céus». Ele não diz «Eu te dou», porque não havia ainda enviado o Espírito Santo aos Apóstolos.

Enfim, esse poder foi efetivamente conferido por Cristo ressuscitado. «“Assim como o Pai me enviou, também vos envio a vós”. Tendo proferido estas palavras, soprou sobre eles e disse-lhes: “Recebei o Espírito Santo. Aqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhe-ão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos”» (Jo. 20, 21-23). O Apóstolos iriam julgar os homens neste mundo, no exercício de sua missão, para realizar a obra da salvação, não para condená-los. Mas o fato de esse poder incluir a faculdade de condenar é extraído do célebre episódio de Ananias e Safira contado nos Atos, onde São Pedro é o protagonista e pronunciou sobre eles a sentença de Deus, que os fez morrer imediatamente, impenitentes, por causa da maquinação que haviam montado às custas da comunidade cristã (Atos 5, 1-11).

O poder de perdoar ou reter os pecados, ou seja, de absolver ou de condenar, procede do Pai no Filho. Assim como o Filho foi enviado pelo Pai, o Filho envia os Apóstolos, com Pedro na sua cabeça, escolhido por Ele, e depois todos os bispos e sacerdotes, para continuar a missão de conversão do mundo, até o fim dos tempos. Ele os envia após lhes ter dado o Espírito Santo, e não antes. É pelo intermédio do Espírito que eles exercem o poder de julgar, que pertence a Nosso Senhor, enquanto um com o Pai, e que é portanto de origem sobrenatural. Segundo os critérios profanos, é um poder delegado, mas um poder efetivo; é um poder efetivo de influir sobre o destino das almas, estando dado que os pecados perdoados pelos sacerdotes «serão perdoados» pelo Filho, e os pecados retidos «serão retidos» pelo Filho. O exercício desse poder realiza a justiça divina, mas ela é temperada pela misericórdia divina, porque Deus quer que os homens se salvem obtendo misericórdia por seus pecados, graças ao sacrifício da Cruz, ou seja, graças aos méritos ganhos por Nosso Senhor.

À Igreja, portanto, é conferido por Cristo o poder de julgar, poder que pertence ao próprio Cristo, e esse poder é transmitido a todos os sacerdotes de Cristo na sucessão apostólica.

(Continua…)