Pai da revolta contra a autoridade, o orgulho também cria, para com os iguais, a dureza de coração, e o desprezo para com os inferiores.
Se nada há mais nobre do que sacrificar-se a si próprio, com seus gostos e interesses, por dedicação para com o próximo, nada há mais vil do que tudo querer para si. Uma mãe cristã, atenta a formar em seus filhos uma grande bondade de coração, e em destruir neles o egoismo, falar-lhes-á muitas vezes daquele que, por amor dos homens, se aniquilou a ponto de tomar a forma de escravo, e até de morrer sobre uma cruz. Far-lhes-á contrair o costume de fazerem às outras crianças todos os serviços que lhes poderem fazer, e sobretudo de terem um terno amor para com seus irmãos e irmãs.
Que encantador espectáculo não oferece uma família, cujos membros são todos unidos por laços duma forte e constante caridade! … E, por outro lado, nada há mais triste, do que encontrar irmãos armados, quase desde a infância, uns contra os outros, inimigos até à morte, nunca se vendo, ou vendo-se com visível desgosto? Atualmente é isso um espectáculo vulgar. E não é verdade poder dizer-se especialmente hoje este provérbio tão conhecido: É raro que a concórdia reine entre os irmãos? E essa desordem, as mais das vezes, é fruto da negligência da mãe, que não teve cuidado de repetir muitas vezes a seu filhos, com o Apóstolo da caridade:—«Meus filhos, amai-vos uns aos outros, porque é esse o preceito do Senhor!»
Lemos na vida da Senhora Acarie que exortava seus filhos a serem amigos uns dos outros, e lhes contava muitas vezes as vantagens da concórdia e as conseqüências funestas da desinteligência:—«É preciso sempre ceder, lhes dizia, exceto quando a honra de Deus exige que se resista. Quem cede, ganha sempre a vitória contra o seu adversário.» Os seus filhos mais novos, diz Doval, vinham todas as noites contar-lhe os seus sentimentos, e se tinham tido disputas uns com os outros, como de ordinário lhes acontecia, pediam perdão uns aos outros, e abraçavam-se diante de sua mãe. — Todas as manhãs os filhos da senhora de Ghantal se abraçavam, e estes sinais exteriores de afeição servem muitas vezes, para entreterem a união dos corações, contanto que haja grande cuidado em evitar amizades particulares, e familiaridades muito ternas.
«Fazei compreender às crianças, diz Fénelon, que é um erro brutal acreditar que haja homens nascidos para lisonjear a preguiça e o orgulho dos outros; e sendo o serviço dos criados estabelecido contra a igualdade natural dos homens, deve-se suavizá-lo, tanto quanto possível.» A senhora Acarie exigia que seus filhos falassem aos criados com doçura e polidez, recomendando-lhes que lhes não obedecessem, quando assim o não fizessem. De forma que nunca diziam a um criado: «Faze isto, ou faze aquilo.» Eram obrigados a dizer: «Faça o favor de fazer isto.» Doutra forma o criado tinha ordem de não obedecer.
Os pobres e os doentes, esses membros pacientes de Jesus Cristo, merecem também nossos respeitos e nosso amor.
Como acusam negligência ou pouca fé de sua mãe essas crianças, que se encontram nas aldeias, ou mesmo nas ruas duma cidade, a correrem atrás dos desgraçados cobertos de andrajos, muitas vezes para os apedrejarem ou encherem de sarcasmos e insultos!
Longe de desviar seus filhos dos horríveis espetáculos da miséria, da dor e mesmo da agonia, a senhora de Chantal queria que eles a acompanhassem nas visitas que fazia aos pobres. Um levava o pão, outro os remédios, outro o dinheiro. Era a recompensa que lhes dava, quando eles tinham cumprido a sua obrigação ou dado provas de obediência. O maior castigo que lhes podia dar, era obrigá-los a ficar em casa, à hora em que ia visitar os seus pobres. Era assim, por esta meiga intimidade com os desgraçados, e contraída desde a infância que a senhora de Chantal desenvolvia na alma de seus filhos a unção do coração, e fazia jorrar essas fontes profundas de sensibilidade que parecem ter desaparecido dos nossos dias, porque as crianças são educadas na vaidade que seca, em vez de serem criadas na caridade que enternece» (Abade Bougaud).
«Quando eu era criança, escreve o historiador de Santa Catarina de Sena, minha mãe colocava-me sobre os joelhos, para derramar no meu coração as verdades cristãs. Insistia sobre a caridade, e dizia-me: «É preciso sempre ver na pessoa do pobre a pessoa adorável de Nosso Senhor Jesus Cristo.» E por isso com que respeito nós levávamos aos pobres um pedaço de pão ou uma pequena moeda de cobre! Era a grande recompensa da semana. Quem de entre nós melhor se tivesse comportado, e que melhor tivesse sabido as suas lições, tinha a honra de distribuir as pequenas esmolas, e acompanhar a sua mãe às cabanas da aldeia. Quando tínhamos muito desejo dum brinquedo, há muito tempo prometido, dizia-nos a mãe: — «E se nós déssemos esse dinheiro aos pobres?» E o sacrifício era feito de boa vontade.
«Íamos ordinariamente sentar-nos num banco de pedra, que estava em frente da casa, à beira da estrada, e na nossa infantil crença, olnavamos, se os rostos pálidos dos pobres se pareciam com o crucifixo de marfim que estava no quarto da mãe, e os nossos olhares perscrutadores, seguiam-nos através dos atalhos das nossas montanhas. Todos os dias visitávamos uma santa mulher, maior ainda pelo coração que pelo espírito, que abrira o seu castelo aos pobres; uma criada velha, chamada Serafina, era a encarregada dessa nobre hospitalidade. Nunca deixamos de lhe ir oferecer os nossos serviços para lhe fazermos preguntas acerca das aventuras dos seus hóspedes tão veneráveis, para nossos corações. Como poderia eu esquecer estas gratas recordações duma infância cristã?
Lamartine, o inolvidável poeta, escreveu de sua mãe: «Via-a muitas vezes sentada, de pé ou de joelhos junto da enxerga do pobre, ou nesses antros miseráveis, onde dormem os proletários, enxugar com suas próprias mãos o suor frio dos pobres moribundos, agasalhá-los com os seus próprios cobertores, recitar-lhes as orações dos últimos momentos, e esperar pacientemente horas inteiras que a sua alma deixasse a mansão do mundo, ao som da sua meiga voz.» Não há efetivamente obra mais caridosa, e zelo mais importante, como assistir cristãmente aos moribundos.
A Mãe segundo a vontade de Deus – Pe. J. Berthier, M.S