Fonte: Sì Sì No No, ano XXXIX, n. 18 – Tradução: Dominus Est
Leia o capítulo anterior clicando aqui.
A constituição ‘Pastor Aeternus’ do Concílio Vaticano I estabelece as condições necessárias para a infalibilidade das definições pontifícias extraordinárias ou ordinárias. Ensina que o papa é infalível “quando fala ex cathedra, isto é, quando, no exercício do cargo de Pastor e Doutor de todos os cristãos, em virtude da sua suprema autoridade apostólica, define uma doutrina relativa à Fé e aos Costumes, que deve ser sustentada por toda a Igreja” (DB 1834).
Portanto, as condições necessárias para que haja um pronunciamento infalível do Magistério pontifício extraordinário ou ordinário são quatro: 1°) que o Papa fale como Doutor e Pastor universal; 2°) que use a plenitude da sua autoridade apostólica; 3°) que manifeste claramente o desejo de definir e obrigar a crer; 4°) que trate de fé ou da moral.
O ponto crucial é a terceira condição, ou seja, que haja a intenção de definir e obrigar a crer. É, com efeito, fundamental que fique claro, de uma forma ou de outra, que o papa quer definir (de maneira “ordinária” ou “extraordinária”) uma verdade que deve ser acreditada obrigatoriamente, pois é divinamente revelada.
O Concílio Vaticano I, sess. III, cap. 3, DB 1792 ensina infalivelmente: “São para se crer como de fé divino-apostólica todas as coisas que estão contidas na Palavra de Deus escrita ou transmitida e que são propostas para serem cridas pela Igreja como divinamente reveladas [elemento essencial], seja com o juízo solene seja com o Magistério ordinário [elemento acidental modal]”. Como se vê, o Magistério ordinário consiste num julgamento não solene ‘quanto à forma’ de se expressar, mas, se manifestar a voluntas definiendi também de maneira ordinária, comum ou não solene, é igualmente infalível (Cf. Pio XII, Humani Generis).
O Concílio Vaticano I não declarou em que condições um concílio ecumênico é infalível. Mas, por analogia com o Magistério Papal, pode-se afirmar que as condições são as mesmas. Tal como o Papa, o Concílio também tem a faculdade de ser infalível, mas pode utilizá-la ou não, conforme sua vontade.
Muitos católicos mal informados poderiam neste momento objetar que sempre ouvimos que todo concílio ecumênico é necessariamente infalível. Não é, porém, o que dizem os teólogos: “a posse ad esse non valet illatio”, isto é, a possibilidade de algo sê-lo não significa que ele necessariamente já o é. São Roberto Bellarmino afirma que somente pelas palavras do Concílio se pode saber se os seus decretos são propostos como infalíveis e conclui que, quando as expressões a este respeito não são claras, não é certo que a doutrina enunciada seja de Fé. E, se isso não for certo, não há sequer a obrigação de se crer, porque, segundo o Código de Direito Canônico, “nenhuma verdade deve ser considerada como declarada ou definida como para ser crida, a menos que isso seja manifestamente estabelecido”.
Ora, o Cardeal Joseph Ratzinger, mais tarde Bento XVI, afirmou: “O Concílio Vaticano II impôs-se não para definir nenhum dogma, mas optou deliberadamente por permanecer em um nível modesto, como um simples Concílio puramente pastoral” (Card. J. Ratzinger, Discorso alla Conferenza Episcopale Cilena, Santiago del Chile, 13 de julho de 1988, in “Il Sabato”, n. 31, 30 julho-agosto de 1988). É, portanto, ponto pacífico que o último Concílio não foi dogmático e nem infalível.
A constância do ensinamento também faz com que o Magistério ordinário se torne infalível
O Padre J. A. Aldama escreve: “Embora o Magistério ordinário do Romano Pontífice não seja em si infalível [a menos que se manifeste a intenção de emitir uma sentença definitiva sobre um assunto ainda controverso], se contudo [mesmo sem manifestar a voluntas definiendi] ele constantemente e por um longo período de tempo ensina uma determinada doutrina a toda a Igreja, a sua infalibilidade deve ser absolutamente admitida; caso contrário, a Igreja induziria ao erro” (J. A. de Aldama, Mariologia, in Sacrae Theologiae Summa, BAC, Madrid, 1961, vol. III, p. 418).
Neste caso estamos diante da infalibilidade do Magistério ordinário devido à continuidade do mesmo ensinamento. O fundamento doutrinal dessa infalibilidade é o indicado pelo Padre Aldama: se, numa longa e ininterrupta série de documentos ordinários sobre o mesmo ponto, os Papas e a Igreja universal pudessem estar enganados, as portas do inferno teriam prevalecido contra a Esposa de Cristo. Ela teria se transformado em uma mestra de erros, cuja influência perigosa e até prejudicial os fiéis não teriam como escapar.
Evidentemente o fator tempo não é o único que deve ser levado em consideração. Existem vários outros. Segundo a fórmula clássica de São Vicente de Lérins, devemos acreditar no que foi ensinado “sempre, em todo lugar e por todos”, “quod sempre, quod ubique, quod ab omnibus”. Na verdade, faltaria a assistência do Espírito Santo se uma doutrina ensinada “sempre, em todo lugar e por todos” pudesse ser falsa (v. Pio IX em “Tuas libenter” de 21 de dezembro de 1863).
(continua)