Fonte: Sì Sì No No, ano XXXIX, n. 18 – Tradução: Dominus Est
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O Magistério é a regra próxima da Fé, enquanto a Escritura e a Tradição são sua regra remota. Com efeito, é o Magistério da Igreja quem interpreta a Revelação e propõe que se acredite no que nela está contido como objeto de fé.
Monsenhor Brunero Gherardini, na revista Divinitas[1], explicou com mais detalhes o munus docendi da Igreja em relação às discussões que surgiram recentemente sobre a questão da relação entre a Revelação e o Magistério.
A palavra Magistério indica o Poder de ensinar, que Jesus deixou à Sua Igreja, e também o Ato e o Conteúdo do ensinamento da Igreja (p. 87).
Na Sagrada Escritura (uma das duas fontes da Revelação, juntamente com a Tradição), encontramos a definição do Magistério, especificamente no Evangelho segundo S. Mateus (XXVIII, 19): “Ide, pois, ensinai todas as gentes”, que literalmente pode ser traduzido como “Faça de todos os povos seus discípulos” (p. 87), ou “Submeta todos os povos ao seu Magistério”. É evidente, pelo que é revelado no Evangelho, que Jesus quis estabelecer um Poder docente ou magisterial na Sua Igreja (ver também Mt. XVIII, 18; Mc. XVI, 15; Lc. XXIV, 47; Jo. XXI, 15-17), embora na teologia eclesiológica a palavra “Magistério” só tenha sido usada recentemente.
A palavra Magistério, com efeito, no seu sentido atual e em sentido estrito, foi introduzida pelos canonistas alemães do século XIX, além disso foi necessário esperar o Concílio Vaticano I (1870) para se ter uma doutrina definida sobre o Magistério eclesiástico. Mas, desde os primeiros tempos do cristianismo, fala-se do “poder de submeter ao ensinamento” que Jesus conferiu a Pedro e aos Apóstolos (Mt. XVI, 16-19; Lc. X, 16; Jo. XXI, 15 ss.). Portanto, a realidade do Magisterium é contemporânea de Cristo[2].
Jesus Cristo, dando existência à sua “Igreja” (Qahal, Èkklesìa, Ecclesia, cf. Mt. XVI, 18), dotou-a de todos os instrumentos necessários para agir e alcançar seu fim, que é a salvação das almas.
A Igreja de Cristo é apresentada pelos Atos dos Apóstolos (XIX, 32-40) e pelas Epístolas de São Paulo (1Cor. X, 32; Gal. I, 13; 1Tim. III, 15; Rom. XVI, 16) como a Comunidade ou Sociedade religiosa da Nova e Eterna Aliança, que substituiu definitivamente a Sinagoga da Antiga Aliança (p. 88).
A Igreja do Novo Testamento possui diversas características:
- a) o Mistério sobrenatural/vertical e a comunhão fraterna entre seus membros;
- b) a Sociedade jurídica nitidamente hierarquizada.
Com efeito, todos os batizados são irmãos em Cristo na Comunhão dos Santos, participando dos mesmos Sacramentos como fonte da Graça divina, mas com ofícios e cargos muito distintos e diversificados: aqueles que governam e aqueles que são governados (Igreja hierárquica ou docente e Igreja discente). No topo da Igreja está Pedro, e ao longo do tempo os seus Sucessores (Mt. XVI, 16) como Cabeça dos fiéis, dos Apóstolos, dos Presbíteros e dos Bispos (p. 88).
Pio XII definiu acertadamente a Igreja como o “Corpo Místico de Cristo” (Encíclica Mystici Corporis Christi, 1943), ou seja, uma Sociedade (Corpo) jurídica e visível, mas também sobrenatural (Mística) enquanto fundada por Cristo, terminada no Paraíso e dotada de instrumentos sobrenaturais (Sacramentos), que conferem a Vida divina ou Graça santificante.
Os “Doutores” ou “Mestres” da Igreja são investidos por Jesus da Tarefa ou Ofício de Ensino ou Magistério (Rom. XII, 7; XV, 4) das Verdades divinamente reveladas. Isso significa que a Igreja tem a tarefa de ensinar não uma verdade qualquer, mas o “Evangelho” ou a Doutrina revelada por Deus e contida no Antigo e no Novo Testamento e na Tradição Apostólica.
O múnus magisterial (Magisterium ou Munus docendi), cronologicamente, precede o múnus santificante através dos Sacramentos (Sacerdotium ou Munus santificandi). De fato, primeiro é necessário ensinar e explicar a Fé e a Moral Cristã, e particularmente o que é a Graça, e depois podem ser administrados os sacramentos[3], como principal canal da Graça, que dá força sobrenatural/sacramental para professar o Credo e observar a moral. Monsenhor Antonio Piolanti escreve: “Jesus conferiu aos Apóstolos o triplo Poder de Magistério, Ministério [Sacerdócio] e Jurisdição (Mt. XXVIII, 19-20)” (Dizionario di Teologia dommatica, Roma, Studium, verbete “Ordine”, IV ed., 1957, p. 293).
A Igreja é dotada por Cristo, como Rei ou Pastor, também do cargo de Império jurisdicional (Imperium ou Munus imperandi seu dirigendi)[4] mostrando aos homens o “Caminho” reto que conduz as almas ao Céu, inculcando os postulados da Moral divina e exigindo obediência a Ela através de Leis específicas, que especificam a Lei natural e revelada, promulgadas por aqueles que têm Autoridade ou Poder para Legislar, e para Julgar aqueles que não as observam, e eventualmente para punir aqueles que as transgridam (Poder legislativo, executivo e judiciário).
O Magistério ou Ensinamento como objeto ou conteúdo foi recebido pelos doze Apóstolos chefiados por Pedro, o “Príncipe dos Apóstolos”, da boca de Jesus e depois transmitido (pela Tradição apostólica) aos seus Discípulos e por escrito sob Inspiração divina (na Sagrada Escritura).
O Magistério como Ofício de Ensinar é o instrumento utilizado pelos sucessores de Pedro e dos Apóstolos cum Petro et sub Petro para interpretar e explicar o verdadeiro significado da Sagrada Escritura e da Tradição, que, além de ser oral, também pode ser escrita.
Mesmo o Magistério, no seu ensinamento constante, constitui um conjunto de elos de uma cadeia viva e ininterrupta (p. 89), que, no caso de um ensinamento constantemente repetido, é infalivelmente assistido (cf. Pio IX, Carta ao Arcebispo de Munique, Tuas libenter, 1863).
A Igreja não dá continuidade a Cristo apenas sacramentalmente através do Sacerdócio, dispensando a Graça através dos Sacramentos, mas continua-O perpetuando e aprofundando o Seu Ensinamento através do Magistério e a Sua Realeza através do Império ou Poder de Legislar (p. 90), exercendo o poder legislativo, executivo e judiciário que lhe foi conferido por Cristo “Mestre, Sacerdote e Rei”.
Por isso a Igreja escuta a Verdade divinamente revelada e ensina-a até ao fim do mundo. Como Cristo, Ela (Atos I, 8) é enviada para “dar testemunho da Verdade” (Jo. XVIII, 37), recebida e retransmitida continuamente (p. 90).
O Magistério eclesiástico enquanto Ofício ensina a Verdade Revelada contida na Tradição e na Sagrada Escritura, explica e interpreta o seu significado exato e está dotado do Poder de julgar ou discriminar entre a Verdade e o erro para promover a primeira e condenar o segundo. Com efeito, a Verdade não pode ser promovida sem condenar o erro e, assim como “as ações são dos sujeitos individuais”, não há erro sem aquele que erra. Portanto, para combater eficazmente o erro, é preciso também ser capaz de condenar aquele que erra, para que ele deixe de espalhar a falsidade ao seu redor e possa eventualmente se converter. Portanto, é permitido combater o errante enquanto errante, mas devemos orar por ele enquanto homem capaz de retornar à Verdade. Portanto, estritamente falando, a fórmula “combater o erro, mas amar aquele que erra” não está de todo correta.
(continua)
Petrus
Notas
- n.° 1 del 2013, Sul Magistero Ecclesiastico, pp. 87-102.
- O mesmo se pode dizer, por exemplo, do termo “Transubstanciação”, nascido apenas na controvérsia contra Berengário de Tours (†1088) e canonizado pelo Concílio de Trento (Dz. 884), que substituiu definitivamente os termos “Transmutatio” e “Transformação”. Entretanto, a realidade da Transubstanciação (assim como a do Magistério) encontra-se nos Evangelhos quando Jesus fala da Instituição da Eucaristia (Lc. XXII, 19; Mt. XXVI, 28). Portanto, também é contemporâneo de Cristo.
- Cf. São Paulo 1Cor. I, 17: “Com efeito Cristo não me enviou a batizar, mas a pregar o Evangelho”. Quando os aspirantes a fiéis ou “catecúmenos” vierem pedir os sacramentos ao Sacerdote, este deve primeiro ensinar-lhes o Catecismo sobre os principais Mistérios da Fé (os doze artigos do Credo), sobre o Decálogo (os Dez Mandamentos) e sobre o quais são os meios sobrenaturais para poder observá-los (os Sete Sacramentos como canal principal da Graça e a oração como canal secundário dela) e só depois, se tiverem aceitado a Fé e a Moral Cristã, pode-se conferir os Sacramentos. Por fim, se forem seus paroquianos, exerce sobre eles uma certa Jurisdição (que recebeu do bispo), orientando-os enquanto Pastor para o Paraíso, encorajando-os a observar a Lei Divina, julgando-os e corrigindo-os nesta matéria.
- Jesus nos redimiu exercendo o triplo ofício ou função de Mestre (Magisterium), Sacerdote (Sacerdotium) e Pastor ou Rei (Imperium), vide João XIV, 6: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Verdade enquanto Mestre que revela os Mistérios salvíficos; Vida porque enquanto Sacerdote nos devolveu a Graça ou a Vida sobrenatural; Vida porque enquanto Pastor ou Rei dirige e guia a humanidade na via ad Patriam, ou seja, rumo ao Paraíso (cf. Santo Tomás de Aquino, S. Th., II-II, q. 39, a. 3).