Além de conhecerem os filhos, devem os pais saber como agir, a fim de alcançarem os desejados efeitos. Não bastam boas intenções. A correção tem normas e técnicas. Sem isto, poderá ser contraproducente. Vejamos qual deve ser a boa correção.
1.º) Rara
O educador deve ver tudo, dissimular muito, corrigir quando necessário.
– Ver tudo, para conhecer bem a crianças, não se deixar surpreender, nem passar por tolo aos olhos das próprias crianças.
– Dissimular muito, porque muitas faltas não têm realmente importância, umas são próprias da idade e passam com ela, outras as próprias crianças notam e, quando estão sendo educadas, tratam de emendar por si.
– Corrigir quando necessário, porque a correção demasiada é prejudicial à educação. Quando muito freqüente, ela:
* perde o salutar efeito de inspirar desgosto à falta cometida, com o conseqüente desejo de emenda;
* enfraquece a autoridade do educador, ao invés de reforçá-la, como o faz, desde que seja rara;
* insensibiliza a criança, que já não acode às advertências, pela própria impossibilidade de fazê-lo;
* pode mesmo ser contraproducente, tornando-se irritante – e nas poucas recomendações que fez São Paulo sobre a educação dos filhos pediu que não os irritassem (Ef. 5,4).
Premidas por uma disciplina muito estreita, censuradas a cada instante, derivam as crianças para a falta de brio ou para uma situação emocional angustiante, que terminará levando-as ao consultório médico. É pena que muitos pais, precisamente entre os mais zelosos e bem intencionados, insistam, mesmo quando reconhecem que não adiantam suas intervenções, e que até pioram a situação.
Dir-se-ia que o fazem mais em satisfação à própria consciência (mal orientada) que para o bem do filho. Alguns até se aborrecem, quando lhes pdimos para não intervirem.
2.º) Justa
Há de corresponder a uma falta. O senso de justiça é geralmente muito vivo nas crianças, e elas repelem, magoadas, as correções injustas e as suportam, revoltadas, ainda que se trate de simples advertência. Se as repelem, mesmo que seja apenas interiormente, já elas não produzirão os procurados efeitos.
Quando, por si mesma, a criança percebe que errou e decide retificar-se, a interverção dos pais será apenas para apoiá-la e estimulá-la no seu propósito.
3.º) Amorosa
Como toda a educação, a correção é obra do amor. Quando reveste aspectos muito asperos, há de ser (e parecer) tão dolorosa a quem a aplica quanto a quem a recebe – como certos tratamentos médicos que somos obrigados a fazer das crianças, sabe Deus com que dores no coração. Em qualquer caso, ela revelará sempre o cumprimento de um dever, a preocupação de fazer bem, manifestação do amor. Para isto, ela será:
* calma: o educador, no perfeito domínio de si, moderado nas palavras, nos gestos e no olhar, para que não lhe saia obra de cólera o que só deve ser obra de amor, lembrando de que “só a razão tem o direito de corrigir“, como disse Fenelon, e que quem se deixa levar pelas paixões está mais precisado de impor a correção a si do que aos outros;
* bondosa: não a imporemos jamais porque fomos nós desobedecidos, mas porque a criança a requer; não lhe daremos o aspecto de vingança ou desforra, mas de expiação da ordem violada; nunca por motivos nossos, mas pelos interesses da criança e pela manutenção da moral. Por isso, evitaremos as zombarias e humilhações, que mais servem para irritar e endurecer que para mover as crianças e sobretudo a mudarem de vida.
4.º) Profunda
Só é eficaz a correção que vai à raiz das faltas. Não basta ver que a criança furtou: é preciso ver por que furtou. Como não basta obrigá-la a restituir o objeto furtado: é preciso remover o móvel do furto. Diga-se o mesmo dos outros defeitos.
Há faltas isoladas, fruto de meras ocasiões, acidentais portanto: para essas bastam as correções superficiais. Mas há também as que correspondem tendências profundas: se não lhes formos à raiz, ficaremos a limpar permanentemente o terreno, na certeza de que novos frutos cairão na primeira oportunidade.
É possível que, à força de insistências, de extrema vigilância e até de castigos haja uma aparência de melhora: – a criança submeteu-se, mas não se corrigiu, porque a tendência não foi atingida e espera apenas o momento de manifestar-se de novo. Ou também acontece que, reprimida assim numa falta, ela se compensa noutra, às vezes pior do que a primeira…
5.º) Proporcionada
Tenhamos o máximo cuidado de fazer que a maneira de corrigir uma falta seja a que melhor permita ao educando ver as funestas conseqüências morais, naturais ou sociais do seu ato. Só assim lhe facilitaremos compreender o próprio erro e querer emendá-lo, formando-lhe o senso moral e a vontade de ser bom.
Para isto a correção deve ser proporcionada à idade, à pessoa, à falta.
* À idade – Nos pequeninos, na medida em que a vida dos sentidos prevalecer, haverá mais um adestramento, com afirmações simples e categóricas, que visam à formação de hábitos e à impregnação do subconsciente. É preciso atingir-lhes a sensibilidade, uma vez que não se lhes pode apelar ainda para a compreensão. Não lhes satisfazer os caprichos, não ceder a suas insistências e lágrimas, não lhe alimentar as más tendências que se manifestam (gula, teimosia, egoísmo, cólera). E procurar encaminhá-los, de modo positivo, por atos que facilitem hábitos bons.
Com o desenvolvimento da inteligência e da vontade, as preocupações vão passando paulatinamente por este terreno. Apela-se para a compreensão, a começar dos motivos mais simples, com tarefas que lhes vão dando o domínio consciente de si, que lhes toquem os gostos ou a liberdade, com ocupações úteis referentes ao que deviam ter feito ou que realizaram mal.
Se a educação tiver normal desenvolvimento, o adolescente já poderá ser chamado totalmente à razão, cabendo-nos apenas ajudá-lo no autogoverno, pois as paixões o seduzem com especial energia.
* À pessoa – Erro comum entre os pais é tratarem os filhos do mesmo modo. Em casos de fracasso, ouvimos com freqüência a queixa: “Eduquei todos do mesmo modo, e são tão diferentes…” Cada qual deve ser educado de acordo com suas características.
– Se duas filhas têm tipos físicos diversos – uma gorduchinha e baixa, outra magra e pernalta – não ocorrerá certamente à mãe vesti-las com o mesmo manequim, só por serem irmãs. Maiores são as diferenças de espírito e caráter, igualmente visíveis a olho nu. Tratá-las nos mesmos moldes não é tão ridículo, porém é muito prejudicial.
– Imaginem o médico que desse a todas as crianças de sua clínica a mesma receita, alegando que estão na mesma enfermaria, e ele deve tratar a todas do mesmo modo…
É pena que os erros pedagógicos não gritem com a mesma força. Uma errada noção de justiça leva certos educadores a tratarem do mesmo modo todos os educandos. Temem talvez a perda da parcialidade. Fogem às explicações que a diferença de tratamento exige. E prejudicam assim a formação das crianças, pois cada uma delas há de ser conduzidas ao mesmo fim mas por caminhos diferentes.
* À falta – As faltas são mais ou menos graves, conforme o preceito que violam e as circunstâncias em que foram cometidas. Quem mente por vaidade ou em defesa, e quem mente calculadamente para caluniar; quem tira a bola do colega, arrastado pelo desejo de ter uma bola, e quem quebra a boneca da irmã por inveja; quem deixa cair o relógio por decuido, e quem o joga no chão por desaforo… Têm todos uma falta a corrigir mas em graus muito diferentes.
Tanto mais grave a falta, tanto mais cuidadosa a correção. Não percamos de vista o sentido de expiação que ela tem, nem a preocupação de ir às causas, que há de animar o educador e o educando.
Ainda há pais que revelam as desonestidades dos filhos, mas os punem severamente porque quebraram um prato. É porque, infelizmente, muitos pensam mais em castigar que em corrigir. Outros não se importariam com a falta em si, mas se horrorizam com a mera possibilidade de chegar ao conhecimento dos vizinhos…
6.º) Contrária à falta
Cuide o preguiçoso de cumprir bem os deveres realizados sem protelação o seu trabalho de cada dia.
– A menina desarrumada será encarregada de arrumar a casa, tomando consciência do dever a cumprir e do cuidado de fazê-lo bem feito, para a íntima satisfação (e, nos cristãos, para a glória de Deus).
– O egoísta será orientado para a ajuda fraterna em todos os terrenos, principalmente naquele em que mais carecido se revela.
– O mentiroso, que impuser a si mesmo a humilhação de retificar-se, logo perderá o apetite mítico.
– Cura-se mais facilmente o agitado que treinar imobilidades e silêncios voluntários ou compreendidos.
– pede-se aos negligentes o trabalho bem feito, a caligrafia caprichada, etc.
Não julguemos, porém, sejam essas umas fórmulas mágicas que resolvam tudo, rapidamente e que, quando não resolverem, o caso é irremediável. Não há fórmulas mágicas em educação. As soluções rápidas são pedidas em geral pelos que “não têm tempo a perder com os filhos”, e por isso perdem os filhos.
Finalmente, se a falta é apenas um sintoma, não é combatendo o sintoma que se cura um mal, mas indo-lhe à raiz – como há ficou acentuado. E se a raiz não for atingida, desesperam os educadores superficiais… e não se corrige a criança…
Joseph Durr (“L’Art des arts”) tem a propósito uma página sem grande vôo, mas útil, por isso mesmo, ao educador comum. Ele aconselha que à criança gulosa ou preguiçosa se imponham exercícios físicos, trabalho regular e bem feito; à agitada de dê um regime firme, que lhe exija ordem e pontualidade: à trabalhadora e ambiciosa, inclinada a dominar, oferem-se ocasiões de moderação, doçura e paciência; à tímida ministrem-se como antídoto, exercícios físicos, trabalhos de jardinagem e mercearia, etc., cultivando-se-lhe a iniciativa e a confiança em si.
Como vemos, freqüentemente a criança nem sabe que está sendo corrigida… O remédio é levado insensivelmente à causa do mal. Em certos casos é mesmo necessário que as nossas intenções não apareçam.
Corrija o seu filho – Pe. Álvaro Negromonte