Prezados amigos, leitores e benfeitores, louvado seja Nosso Senhor Cristo.
Iniciamos hoje a publicação de um texto de Hugh Ross Williamson (1901-1978) historiador britânico e dramaturgo. Ordenou-se sacerdote anglicano em 1943. Em 1955 converteu-se ao Catolicismo romano e escreveu várias obras históricas com tom apologista católico. Em 1956 publicou sua autobiografia, The Walled Garden e foi crítico às reformas introduzidas pelo Concílio Vaticano II.
O texto que publicamos agora é parte de sua obra The Great Betrayal: Some Thoughts on the Invalidity of the New Mass. Britons, 1970 (Tradução: Dominus Est) e aborda com mestria a sutileza das maquinações heréticas contra Nosso Senhor Jesus Cristo na Eucaristia, nosso Tudo e maior tesouro da Igreja.
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O Evangelho, a “Boa Nova de Jesus Cristo”, é, acima de tudo, o fato histórico de sua Ressurreição. Ao ressuscitar dos mortos, o Deus Encarnado interrompe o processo da natureza e dá uma nova dimensão à existência humana. Em vez da morte e a decadência, que pareciam ser o fim inevitável de todas as coisas, temos agora a Vida Eterna diante de nós.
Os apóstolos foram testemunhas presenciais deste evento singular, aqueles que podiam dizer: “Eu O vi; eu falei com Ele; aprendi com Ele; eu O toquei, comi com Ele depois de sua ressurreição dentre os mortos”. Por isso, esses homens não tiveram medo da morte, quando em mãos daqueles que não acreditavam, por sua grande fé e pela esperança certa de sua própria ressurreição.
Hoje, quando para a maioria dos homens o Evangelho não significa nada além de uma narrativa, uma lenda de certos episódios da vida de Cristo e o “apóstolo“ não passa de um mestre peregrino de barbas brancas do primeiro século da Igreja, é impossível imaginar o impacto desta “Boa Nova” da abolição da morte, que era “escândalo para os judeus e loucura para os gregos”.
Embora a ressurreição de Cristo seja a base de nossa fé católica, há uma grande multidão de nomeados cristãos, que substituíram esta esperança da própria ressurreição por um interesse insaciável na melhoria social, uma preocupação para com as coisas deste mundo, que parece indicar a convicção de que “a morte é o fim de tudo”, embora continuem dizendo em palavras que acreditam na ressurreição e na vida eterna.
Antes de sua morte e ressurreição, Cristo manifestou aos seus discípulos as condições necessárias para alcançar a vida eterna. Disse-lhes na sinagoga de Cafarnaum, um dia depois que anunciou e prefigurou a Eucaristia, ao alimentar uma multidão de mais de cinco mil almas com alguns pães e alguns peixes, que Ele abençoou: “Se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia”.
A, partir daquele momento, muitos de seus discípulos O abandonaram, dizendo: “Como pode este homem dar-nos de comer a sua carne e de beber o seu sangue?”. Este ensinamento, esta verdade é demasiado absurda para a soberba humana. Os primeiros a protestar, antes da paixão e morte do Senhor, tinham a desculpa de que Jesus não lhes explicara o fato sobrenatural da transubstanciação, graças ao qual podemos realmente comer a Carne e beber o Sangue do Filho de Deus. Tal instrução foi reservada para os doze apóstolos, que em Jerusalém estiveram com Ele no Cenáculo, na noite anterior em que, como um malfeitor, foi executado. E quando Ele, tomando o pão em suas mãos, disse: “ISTO É O MEU CORPO” e um cálice de vinho: “ESTE É O MEU SANGUE”, os Apóstolos, entre outras emoções inefáveis, devem ter sentido um alívio, visto que essas palavras misteriosas de Cafarnaum foram, finalmente, cumpridas e esclarecidas pelo Mestre.
Deste ponto de vista, a Igreja é a organização estabelecida para proteger a verdade de que o passaporte para a Vida Eterna é a Missa. Os outros Sacramentos estão, de certa forma, instituídos para salvaguardar este, que é como o centro de toda a religião. No batismo, através de uma participação simbólica e sacramental na morte de Cristo, chegamos a ser elegíveis para a gloriosa ressurreição e, eliminando o pecado original, alcançamos o estado de graça, necessário para não “comer, nem beber, em nossa condenação” o Corpo e o Sangue de Cristo. O sacramento da penitência nos permite, através da absolvição, recuperar esse estado de graça, que talvez seja perdido devido a um pecado grave e pessoal. O sacramento da Ordem Sacerdotal é uma garantia de que o milagre da transubstanciação constantemente seja repetido pelos sacerdotes escolhidos com este fim, que são sucessores dos Apóstolos, cujo mistério, por conseguinte, é válido.
No ataque secular contra a Igreja pelas forças do mal, os inimigos, de uma forma ou de outra, apontaram para a Missa; umas vezes, por assim dizer, suas objeções foram direcionadas para o que é externo ao Sacrifício Eucarístico como a sucessão apostólica, a confissão auricular, em outros momentos, concentraram sua batalha na própria Missa.
Nos primeiros séculos, a ênfase herética estava em negar a Encarnação. A questão de afirmar ou negar que o pão e o vinho se convertiam ou não, no Corpo e no Sangue de Cristo, era uma questão secundária em relação à questão fundamental se Deus tivesse tomado ou pudesse tomar um corpo humano ou, antes, tornar-se verdadeiro homem, sem deixar de ser Deus. Isto é o que podemos chamar de “heresia”, porque desde o primeiro século, até nossos dias, é a raiz de todas as heresias; negando a Encarnação, porque a matéria sempre é má. O “Espírito”, que é bom, não poderia habitar na carne, que é má. Assim, o gnosticismo, doutrina filosófica e religiosa, mistura a doutrina cristã com as crenças judaicas e orientais, com diversos nomes, desafiando a Igreja, desde os primeiros anos de sua existência, quando São Justino Mártir fez da “RESSURREIÇÃO DA CARNE” o grito de combate contra o gnosticismo, que proclamava somente “a imortalidade da alma”, admoestando os fiéis: “Se acreditais somente na imortalidade da alma e não admitis a ressurreição dos corpos, não sois cristãos.
A recrudescência mais perigosa e generalizada do gnosticismo, na Europa do século XIII, foi a dos cátaros a religião dos “puros” contra os quais lutou São Domingos e sua Ordem de pregadores e Simon de Montfort que levantou uma cruzada.
Embora o movimento tenha sido dominado, não foi de todo destruído, aparecendo ainda mais no Puritanismo a insistência de que a “matéria” era má e, portanto, a transubstanciação não podia ser admitida ou ensinada. Isolando de seu contexto algumas palavras do Novo Testamento “Deus é espírito e aqueles que o adoram, devem fazê-lo em espírito e na verdade”, os Puritanos, então os mesmos que agora, negam implicitamente a doutrina essencial do Cristianismo, a Encarnação do Verbo, a Redenção na Cruz e a Ressurreição de Cristo.
Não podiam, como os seus sucessores na Reforma, eliminar facilmente o serviço litúrgico da comunhão, porque está claramente ensinado na Escritura; mas eles, como os seus sucessores em heresia, eliminaram o significado ortodoxo deste Sacramento. Na oração de consagração dos cátaros, em seu serviço da Ceia, dizia-se: “Oh Senhor Jesus Cristo, que abençoaste a água, que se converteu em vinho: abençoai, em Nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, este pão, peixe e vinho, não como uma oferenda sacrificial, mas como uma simples comemoração da Santíssima Ceia de Jesus Cristo com seus Apóstolos”.
Aqui está a base dos posteriores aparecimentos de doutrinas heréticas sobre a Eucaristia, o repúdio à oblação e ao Sacrifício.
Uma das respostas da Igreja contra a ameaça dos cátaros foi a instituição, em 1282, da recitação do Último Evangelho pelo sacerdote, antes deste retornar do altar para a sacristia. Sua genuflexão ao pronunciar as palavras “et Verbum Caro factum est” (e o Verbo se fez carne) era uma garantia de que ele não era um cátaro em segredo e que, na Missa por ele celebrada, realmente tivera a intenção de consagrar, fazendo que suas palavras efetuassem a transubstanciação. Nem foi a escolha do Prólogo de São João como a passagem irrelevante a ser lida para a questão. Este fora originalmente um hino gnóstico que havia sido cristianizado pela interpolação dos versos históricos referindo-se a João Batista e a Jesus e pela adição de “e o Verbo se fez carne”, que destruiu toda a base da heresia.
Quando, após quase 700 anos, a leitura do último Evangelho foi suprimida em 1965, sob o pretexto de que “não estava no rito primitivo”, os que conhecíamos um pouco a nossa teologia e a história da Igreja, compreendemos que os ataques da heresia contra a Missa tinham começado novamente em nossos dias.
O Quarto Concílio Ecumênico de Latrão, que se reuniu em 1215 e com a participação de 400 bispos, 800 abades e priores e representantes das monarquias da Cristandade, em sua definição dogmática, contra os albigenses e os cátaros. Como fruto manifesto do Concílio e suas definições, durante o século XIII, a devoção e o culto à Divina Eucaristia cresceram de maneira palpável. Foi instituída a celebração de CORPUS CHRISTI, a qual Santo Tomás de Aquino deu esplendor com seus magníficos hinos. As procissões e a Exposição do Santíssimo Sacramento neste e no século seguinte tornaram-se cada vez mais populares, contribuindo de forma muito eficaz para o crescimento da vida cristã entre os fiéis.
Mas os ataques de heresia não cessaram. Na Inglaterra, John Wyclif e na Boêmia, seu discípulo, John Hus, negaram que as palavras de Cristo significassem o que elas diziam, mas deveriam ser interpretadas dessa maneira: “Este é o meu Corpo” deveria ser traduzido: “Isto significa meu Corpo”. Desta forma, os significados protestantes subsequentes foram preparados.
Em 1577, foi publicado um livro na Alemanha, contendo 200 diferentes interpretações das palavras: “Hoc Est Corpus Meum”.
Ambos, Wyclif e Hus, negando a transubstanciação, acrescentaram outros erros contra a doutrina católica, para sustentar sua heresia. Wyclif negou a sucessão apostólica e o direito exclusivo dos sacerdotes hierárquicos para consagrar, ensinando que somente os homens “bons” poderiam presidir a ceia. Hus exigiu a comunhão sob as duas espécies, para contrariar a doutrina ortodoxa, que afirma que, sob a aparência apenas do pão ou apenas do vinho, recebemos todo o Cristo, porque Cristo não se divide, agora novamente a partir da introdução do NOVUS ORDO é exigida a comunhão sob as duas espécies, o Sacrifício é negado e o rito é chamado de “memorial da Última Ceia”.
Continua….