A MISSÃO EDUCATIVA DA IGREJA CONCORDA ADMIRAVELMENTE A MISSÃO EDUCATIVA DA FAMÍLIA

Resultado de imagem para la reja fsspx hermanasEm primeiro lugar, com a missão educativa da Igreja concorda admiravelmente a missão educativa da família, porque de Deus procedem ambas, de maneira muito semelhante. À família, de facto, na ordem natural, Deus comunica imediatamente a fecundidade, que é princípio de vida, e por isso princípio de educação para a vida, simultaneamente com a autoridade que é princípio de ordem.

a) Direito anterior ao do Estado

Diz o Doutor Angélico com a sua costumada clareza de pensamento e precisão de estilo: « O pai segundo a carne participa dum modo particular da razão de principio que, dum modo universal se encontra em Deus… O pai é princípio da geração, da educação e da disciplina, de tudo o que se refere ao aperfeiçoamento da vida humana » (20).

A família recebe portanto imediatamente do Criador a missão e consequentemente o direito de educar a prole, direito inalienável porque inseparavelmente unido com a obrigação rigorosa, direito anterior a qualquer direito da sociedade civil e do Estado, e por isso inviolável da parte de todo e qualquer poder terreno.

b) Direito inviolável, mas não despótico

A razão da inviolabilidade deste direito é-nos dada pelo Angélico: « De facto o filho é naturalmente alguma coisa do pai… daí o ser de direito natural que o filho antes do uso da razão esteja sob os cuidados do pai. Seria portanto contra a justiça natural subtrair a criança antes do uso da razão ao cuidado dos pais, ou de algum modo dispor dela contra a sua vontade » (21).

E porque a obrigação do cuidado da parte dos pais continua até que a prole esteja em condições de cuidar de si, também o mesmo inviolável direito educativo dos pais perdura. « Pois que a natureza não tem em vista somente a geração da prole, mas também o seu desenvolvimento e progresso até ao perfeito estado de homem, enquanto homem, isto é, até ao estado de virtude »,. diz o mesmo Doutor Angélico (22). Portanto a sabedoria jurídica da Igreja, assim se exprime, tratando desta matéria com precisão e clareza sintética no Código de Direito Canônico, cân. 1113: « os pais são gravemente obrigados a cuidar por todos os meios possíveis da educação, quer religiosa e moral quer física e civil, da prole, e também a prover ao bem temporal da mesma » (23).

Sobre este ponto é de tal modo unânime o sentir comum do género humano que estariam em aberta contradição com ele, quantos ousassem sustentar que a prole pertence primeiro ao Estado do que à família, e que o Estado tenha sobre a educação direito absoluto. Insubsistente é pois a razão que estes aduzem, dizendo que o homem nasce cidadão e por isso pertence primeiramente ao Estado, não reflectindo que o homem, antes de ser cidadão, deve primeiro existir, e a existência não a recebe do Estado mas dos pais, como sabiamente declara Leão XIII: « os filhos são alguma coisa do pai e como que uma extensão da pessoa paterna: e se quisermos falar com rigor, não por si mesmos, mas mediante a comunidade domestica no seio da qual foram gerados, começam eles a fazer parte da sociedade civil » (24).

Portanto: « o poder dos pais é de tal natureza que não pode ser nem suprimido nem absorvido pelo Estado, porque tem o mesmo princípio comum com a mesma vida dos homens », (25) diz na mesma Encíclica Leão XIII. Do que porem não se segue que o direito educativo dos pais seja absoluto ou despótico, pois que está inseparavelmente subordinado ao fim ultimo e à lei natural e divina, como declara o mesmo Leão XIII noutra memorável Encíclica «sobre os principais deveres dos cidadãos Cristãos », onde assim expõe em síntese a súmula dos direitos e deveres dos pais : « Por natureza os pais têm direito à formação dos filhos, com esta obrigação a mais, que a educação e instrução da criança esteja de harmonia com o fim em virtude do qual, por benefício de Deus, tiveram prole. Devem portanto os pais esforçar-se e trabalhar energicamente por impedir qualquer atentado nesta matéria, e assegurar de um modo absoluto que lhes fique o poder de educar cristãmente os filhos, como é da sua obrigação, e principalmente o poder de negá-los àquelas escolas em que há o perigo de beberem o triste veneno da impiedade » (26).

Importa notar, além disso, que a educação da família compreende não só a educação religiosa e moral, mas também a física e civil (27), principalmente enquanto têm relação com a religião e a moral.

c) Reconhecido pela Jurisprudência civil

Tal direito incontestável da família tem sido várias vezes reconhecido, juridicamente, em nações onde se tem cuidado de respeitar o direito natural na legislação civil. Assim, para citar um exemplo, a Corte Suprema da República Federal dos Estados Unidos da América do Norte, na decisão de uma importantíssima controvérsia, declarou: «não competir ao Estado nenhum poder geral de estabelecer um tipo uniforme de educação para a juventude, obrigando-a a receber a instrução somente nas escolas públicas », acrescentando a isto a razão de direito natural: « A criança não é uma mera criatura do Estado; aqueles que a sustentam e dirigem têm o direito, unido ao alto dever, de a educar e preparar para o cumprimento dos seus deveres » (28).

d) Tutelado pela Igreja

A história, particularmente nos tempos modernos, atesta como se tem dado e se dá, da parte do Estado, a violação dos direitos conferidos pelo Criador à família, ao mesmo tempo que demonstra, esplendidamente, como a Igreja os tem sempre tutelado e defendido; e a melhor prova, de facto, está na confiança especial das famílias nas escolas da Igreja, como escrevemos na Nossa recente carta ao Cardeal Secretario de Estado : « A família compreendeu imediatamente que assim é, e desde os primeiros tempos do Cristianismo até aos nossos dias, pais e mães, mesmo pouco ou nada crentes, mandam e levam, aos milhões, os seus filhos aos institutos de educação fundados e dirigidos pela Igreja » (29).

É que o instinto paterno, que vem de Deus, orienta-se com confiança para a Igreja, seguro de encontrar aí a tutela dos direitos da família, numa palavra, aquela concórdia que Deus pôs na ordem das coisas. A Igreja, com efeito, embora consciente, como está, da sua missão divina e universal, e da obrigação que todos os homens têm de seguir a única religião verdadeira, não se cansa de reivindicar para si o direito de recordar aos pais o dever de mandarem batizar e educar cristãmente os filhos de pais católicos: é porém tão ciosa da inviolabilidade do direito natural educativo da família, que não consente, a não ser sob determinadas condições e cautelas, que sejam batizados os filhos dos infiéis, ou de qualquer modo se disponha da sua educação, contra a vontade dos pais, enquanto os filhos não puderem determinar-se por si a abraçar livremente a fé (30).

Temos portanto, como já notamos, no Nosso citado discurso, dois factos de altíssima importância: « a Igreja que põe à disposição das famílias o seu ofício de mestra e educadora, e as famílias que correm a aproveitar-se dele, e dão à Igreja, a centenas e a milhares, os seus filhos, e estes dois factos recordam e proclamam uma grande verdade, importantíssima na ordem social e moral. Eles dizem que a missão de educar pertence antes de tudo e acima de tudo, em primeiro lugar à Igreja e à família, pertence-lhes por direito natural e divino, e por isso de um modo irrevogável, inatacável, e insubstituível »(31).

Carta Encíclica Divini Illius Magistri  – Papa Pio XI

(20) S. Th., 2-2, Q. CII, a. 1: Carnalis pater particulariter participat rationem principii quae universaliter invenitur in Deo… Pater est principiam et generationis et educationis et discipline, et omnium quae ad perfectionem humane vitae pertinent.

(21) S. Th., 2-2, Q. X, a. 12: Filius enim naturaliter est aliquid patris…; ita de iure naturali est quod filius, antequam habeat usum rationis, sit sub cura patris. Unde contra iustitiam naturalem esset, si puer, antequam habeat usum rationis, a cura parentum subtrahatur, vel de eo aliquid ordinetur invitis parentibus.

(22) Suppl. S. Th. 3. p. Q. 41, a. 1: Non enim intendit natura solum generationem prolis, sed etiam traductionem et promotionem usque ad perfectum statum hominis in quantum homo est, qui est virtutis status.

(23) Cod. I. C., e. 1113: Parentes gravissima obligatione tenentur prolis educationem tum religiosam et moralem, tum physicam et civilem pro viribus curandi, et etiam temporali corum bono providendi.

(24) Ep. enc. Rerum novarum, 15 Maii 1891: Filii sunt aliquid patris, et velut paternae amplificatio quaedam personae, proprieque loqui si volumus, non ipsi per se, sed per communitatem domesticam, in qua generati sunt, civilem ineunt ac participant societatem.

(25) Ep. enc. Rerum novarum, 15 Maii 1891: Patria potestas est eiusmodi, ut nec extingui, neque absorberi a republica possit, quia idem et commune habet cum ipsa hominum vita principium.

(26) Ep. enc. Sapientiae christianae, 10 Ian. 1890: Natura parentes habent ius suum instituendi, quos procrearint, hoc adiuncto officio, ut cum fine, cuius gratia sobolem Dei beneficio susceperunt, ipsa educatio conveniat et doctrina puerilis. Igitur parentibus est necessarium eniti et contendere, ut omnem in hoc genere propulsent iniuriam, omninoque pervincant ut sua in potestate sit educere liberos, uti par est, more christiano, maximeque prohibere scholis iis a quibus periculum est ne malum venenum imbibant impietatis.

(27) Cod. I. C., c. 1113.

(28) « The fundamental theory of liberty upon which all governments in this union repose excludes any general power of the State to standardize its children by forcing them to accept instruction from public teachers only. The child is not the mere creature of the State; those who nurture him and direct his destiny have the right coupled with the high duty, to recognize, and prepare him for additional duties ». U. S. Supreme Court Decision in the Oregon School Cases, June 1, 1925.

(29) Carta ao Card. Secretario de Estado, 30 de Maio de 1929.

(30) Cod. I. C., c. 750, § 2. S. TH., 2, 2. q. X, a. 12.

(31). Discurso aos alunos de Mondragone, 14 de Maio de 1929.