Descobrindo seu ponto sensível; sem abandonar o nosso “eu” (nosso posto de observação), encontrar o do nosso filho. Para isto, é necessário, evidentemente, certa habilidade, e o senso de adaptação, de observação. Infelizmente, a perspicácia é uma qualidade de que os educadores mais carecem; eis porque tantas palavras ficam inúteis, não esclarecem; ora, despertar uma alma é iluminá-la. Importa, pois, primeiramente, que delas nos aproximemos com simpatia, suscitando-lhe confiança e amor. Se nas famílias tantas almas caminham sozinhas lado a lado, e não se compreendem, embora recebendo iguais contribuições num mesmo ambiente, é porque não foram tocadas na região impenetrável e misteriosa que somente a intuição e o carinho podem descobrir.
Fala-se muito de ciências familiais; e com razão; a educação é uma ciência, mas é mais ainda – uma arte, um conhecimento intuitivo das incógnitas, uma “adivinhação”.
A grande infelicidade, quando pais inteligentes e cultos, muitas vezes “fracassam” e não têm nenhuma influência sobre os filhos, é de não procurarem, ao menos, fazer seu exame de consciência com lealdade e humildade. Em vez de dizer: “Faltam-me a psicologia, a paciência, não sou bastante arguto, nem carinhoso”, declaram: “Não há nada a fazer com esta criança, ela é insensível, teimosa e orgulhosa”.
Multiplicam então exortações, os conselhos, as ameaças, e só fazem cavar ainda mais o abismo; a alma da criança, em vez de se abrir, concentra-se, tornando-se solitária, inatingível.
Uma atitude severa, uma palavra enérgica, um tom firme são muitas vezes necessários na educação, principalmente com naturezas difíceis, mas só obtém resultados quando ditados por uma vontade calma, invencível, e não um enervamento que acabará em capitulação, uma vez passada a cólera.
A voz tem uma importância maior do que se pensa e convém aprender a bem utilizar de suas mil nuanças. Para despertar uma alma, jamais empregar uma voz esganiçada, aguda, nervosa; mas sim, uma voz doce, quente, grave ou alegre, cujo tom coadune bem com as proposições e solicitações, uma voz atraente, que variará segundo o local, o espaço e o momento. No decorrer de um passeio alegre, de um belo espetáculo, de uma festa de família, a voz jovial, contente, otimista, irá despertar na alma da criança entusiasmos indubitavelmente muito mais formadores do que os principios declamados friamente. Porém é principalmente antes dos filhinhos dormirem , que o pai ou a mãe procurará deles se aproximar; a conversinha da noite, por mais curta e apressada, deve ser sempre individual. Nesse momento, os brinquedos estão arrumados, a exuberância acalmada, os pequeninos corpos distendidos; tudo está tranquilo, na casa reinam silêncio e paz; é a hora feliz das sementeiras espirituais, hora em que uma por uma das palavras murmuradas têm, naquelas alminhas puras, ressonâncias infinitas. Esses colóquios são desejados pelas criancinhas, que os reclamam, se porventura os pais sobrecarregados de afazeres viessem a esquecê-los. “Fala comigo, como no outro dia”. – “Diga-me ainda aquelas palavras tão bonitas!” – “Quando falas, é como se minha cabeça se abrisse e o que eu quero dizer sai tão facilmente; por que, antes, eu não sabia que tudo isto estava na minha cabeça?”
Sim, eles não sabiam – os pequeninos tesouros – que tudo se achava em suas cabecinhas, adormecido como no castelo da “Bela Adormecida”. A alma de uma criança só desperta para a bondade quando um carinho mágico a toca docemente; então, a criança aprende a se concentrar para ouvir essas vozes misteriosas e revelar não tanto as suas faltas (sobre as quais é prefrível não aprofundar muito) como as riquezas de suas boas intenções.
Os dez mandamentos dos pais – Vérine