A FORMAÇÃO DA VONTADE: A DURAÇÃO NA DECISÃO E NO ESFORÇO

Filhos Obedientes | Silêncio e Palavras
A DURAÇÃO NA DECISÃO

Que é preciso para praticar esta primeira forma da perseverança: a duração na decisão?

É preciso resguardarmo-nos e proteger as crianças das más influências que possam exercer-se sobre a vontade.

Quais são as influências más de que é preciso resguardarmo-nos e das quais é necessário proteger as crianças?

Todas as que são capazes de desanimar a vontade, de enfraquecer a energia, ou arruinar a perseverança:

1º- A inconstância natural;

2º – O mau exemplo;

3º – O temor das dificuldades.

A inconstância é, portanto, natural no homem?

Cremos que sim; e, na generalidade dos casos, o homem carece dum certo esforço para chegar a manter uma decisão um pouco onerosa.

Entregue às suas naturais inclinações, o homem seria, em breve, uma imagem do tipo do inconstante traçado por Boileau:

“Vai dum extremo ao outro, sem a menor pena,

o que louva de dia, à noite já o condena,

pra todos maçador, a si próprio incomoda.

Muda constantemente a opinião e a moda.

O menor vento o vira; os golpes menos crus

o fazem despenhar, andando muito à roda.

Hoje, num capacete; amanhã, num capuz”.

(Boileau, Sátiras, VIII)

É preciso advertir as crianças dos maus exemplos que estão expostas a encontrar no mundo?

Sim, a seu tempo, a criança deve saber que no mundo há loucos, mentirosos, enganadores, malévolos, covardes, homens que se vendem, homens que são vítimas dos respeitos humanos, etc.; que existem desgraçados, pessoas mal educadas, que se devem lastimar, mas nunca imitar.

Não se deve contar com dificuldades?

Sim, é preciso encará-las, mas não temê-las, nem subordinar-lhes as resoluções tomadas…

A DURAÇÃO NO ESFORÇO

Qual é a importância desta segunda forma de perseverança: a persistência no esforço?

1º – Sem ela, a vontade deixa de ser vontade; nenhum progresso é possível; não se chega senão a fracassos: e, muitas vezes mesmo, corre-se para a morte…

2º – Com ela, todos os obstáculos se aplanam, são transpostos ou removidos; a inteligência abre-se e desenvolve-se; firma-se a virtude e a beleza moral resplandece com um brilho cada vez mais vivo.

Que é preciso fazer para chegar a praticar a persistência no esforço?

É preciso:

1º- Evitar a diversidade excessiva;

2º- Cingir-se às pequenas coisas;

3º – Concluir.

Por que é preciso evitar a excessiva diversidade?

1º – Porque é um dissolvente da vontade.

Ao passo que a mudança de ocupações é necessária tanto para enriquecer e repousar o espírito como para amaciar a vontade, uma diversidade excessiva desagrega.”

(P. Gaultier)

São Francisco de Sales descobre nisso um ardil do diabo, “porque muitas vezes o inimigo procura fazer-nos empreender e começar muitas coisas a fim de que, oprimidos com tanto trabalho, nada acabemos e deixemos tudo imperfeito.”

(Tratado do amor de Deus, VIII, XI)

2º- Porque daí nasce um estado de excitação, e se confunde a agitação com a ação.

É muito necessário cingir-se às pequenas coisas?

1º- “O esforço banal e sem interesse aparente é a pedra do toque da vontade, o obstáculo que distingue os fortes, que triunfam, dos fracos que se deixam vencer.”

(P.Gaultier)

2º – “As pequenas coisas”, aliás, constituem a trama ordinária da nossa vida, e. por conseguinte, oferecem à vontade frequentes ocasiões de fazer sacrifícios necessários para a sua conservação e formação.

3º – “As pequenas coisas”, enfim, são como que o alicerce do edifício da nossa vida moral.

Nunca teremos grandeza, solidez, beleza, se não estabelecermos como base da nossa ação a fidelidade constante e generosa aos pequenos deveres.

Quais são os “pequenos deveres” aos quais devemos esforçar-nos por ser fiéis?

Desde o primeiro instante do despertar até o momento de se entregar nas mãos de Deus, antes de ir repousar, as ocasiões dos atos da vontade aparecem às centenas.

1º- Para se levantar, por exemplo:

Muitos só marcam de manhã a hora exata do começo dos seus trabalhos. É o meio mais certo de ceder à preguiça. A hora deve ser marcada duma vez para sempre, ou fixada na véspera á noite.

Pela manhã, chegado o momento, a preguiça reclamará aos seus direitos, parecerá mesmo, às vezes, que se está indisposto, etc. São os assaltos do animal, descontente porque foi incomodado. É a hora do ato da vontade. É preciso então levantar-se sem hesitação: primeira vitória.

2º – Os exercícios de piedade.

Sentimo-nos mal dispostos, o coração sem amor, o espírito sem luz, a alma sem gosto. Que fazer nestas condições? Não é melhor deixar tudo e aguardar disposições mais favoráveis?

É o assalto do velho homem. É o momento de fazer agir, sem discutir, uma vontade imediata e enérgica.

3º – O trabalho.

Apresenta-se para se fazer. Teoricamente, impõe-se antes do divertimento e do repouso.

E é se tentado a deixar para mais tarde aquilo que mais custa e ter primeiramente alguma distração ou repouso. É o momento da vontade.

4º – A todos os momentos do dia, a graça atual, que é uma luz sobrenatural dada por Deus, para nos ajudar a evitar o mal e fazer o bem, oferece uma virtude a praticar, um sacrifício a fazer, uma instrução a ouvir, um sacramento a receber; é se tentado a dizer: amanhã.

E a vontade deveria obrigar a dizer: hoje, imediatamente.

5º – Em resumo: de cada vez que se faz um ato, em conformidade com a luz divina da fé, fortifica-se, e, portanto, forma-se a vontade.

Mas de cada vez que se hesita ou recua, enfraquece-se a vontade e, portanto, deforma-se…

Que se deve entender por esta expressão “concluir”?

Quer se dizer com isso que é preciso:

1º – Ir até ao fim da obra começada;

2º – Dar-lhe toda a perfeição de que é susceptível.

É difícil concluir?

Sim.

E convencer-nos-emos sem dificuldade, se atendermos ao pequeno número daqueles que conhecem a arte e realizam as condições dela: bem poucas são as crianças que levam até ao fim o caderno dos seus exercícios quotidianos; bem poucas são as pessoas grandes que lêem até ao fim um livro a sério; bem poucos são os cristãos e cristãs que recitam piedosamente até ao fim as suas preces quotidianas.

Sabia psicologia aqueles diretor espiritual que perguntava aos seus dirigidos: “Tendes dito bem: Assim seja?”

 (…)

Esta dificuldade (concluir) é insuperável?

Longe de nós tal pensamento!

1º- “Vai se longe ainda depois de cansado“, diz um velho provérbio cheio de espírito e de sabedoria.

2º – “O trabalho concluído com probidade deixa no espírito um sentimento de alegria e, dalgum modo, de apetite satisfeito“.

(Citado por Payot, na Educação da vontade, p. 150)

É importante o concluir?

A arte de concluir é o sinal mais indiscutível da força e o mais poderoso agente de influência sobre os homens.”

(J.Guiberv)

Por isso, nunca será demasiado cedo habituar as crianças a prosseguirem e a levarem com cuidado até o final os pequenos trabalhos a que se dedicam, nunca será demais incutir-lhes ânimo.

Uma grande escola católica, “A escola das artes e ofícios”, em Lille, tomou  por divisa: “Finir!” – “Concluir!”. O conselho lê-se sobre os escudos armoriados colocados em todas as arestas da cantaria.

Um professor de literatura, querendo acostumar os seus discípulos a faça bem, repetia-lhes: “Nunca deixeis nas vossas conversações uma frase incompleta“.

Concluir!

Acabar!

Ir até ao fim!

É sempre importante.

É uma questão de vontade!

A vontade deve realizar esse propósito.

Catecismo da Educação – Abade René de Bethléem