A GENEROSIDADE DA DONZELA CRISTÃ

donzelaÉ uma virtude altiva e corajosa, que imprime à vontade a força de resistir, de sofrer e de agir segundo o dever, segundo a fé e segundo Deus. Apesar das provações, das dificuldades, dos perigos, dos desânimos, ela segue seu caminho sem se deixar abater, sem desanimar, sem tremer; à maneira do sol, que segue o seu caminho acima das tempestades e que só desaparece à tarde para iluminar outros céus e renascer no dia seguinte.

O P. de Ravignam escrevia: “quero assinalar-me no serviço de Nosso Senhor, distinguir-me para Sua glória e para Seu serviço.” Tende, também vós, esta altiva paixão. Tendes recebido tanto de Deus, sede agradecida! Vós, que sois delicada com todos, sede-o sobretudo com Nosso Senhor: “Que devia eu fazer por vós que não tenha feito?”, diz-vos Ele… Não poderíamos também dizer-vos: “Quanta coisa poderíeis ter feito por Deus e não fizeste!…”?

A generosidade pode às vezes ser ajudada, sustentada por um temperamento feliz, por uma sensibilidade maior, pelas graças trazidas por uma vocação de escolha, mas antes de tudo é uma virtude que pede esforços, renúncias e lutas.

a)Sede generosa e forte no cumprimento do dever cotidiano

Sê-lo-eis facilmente um dia, uma semana; mas todos os dias, até à morte, dura muito! É preciso uma grande soma de energia para assim saber vencer-se sempre. No fundo, basta para isso ver em cada um dos acontecimentos que formam a trama habitual da vossa vida a mão de Deus e a sua santa vontade!

Por que é que não tendes a força de cumprir assim esse dever monótomo, e às vezes tão duro, que se impõe a vós cada manhã? É porque a idéia de Deus está ausente do vosso coração. Se pensásseis em que é Ele quem vos chama e vos envia ao vosso dever, seríeis mais corajosa!

Ora, esse dever só raramente vos pede esforços heróicos, as mais das vezes é modesto, porém exige de vós uma renúncia de todas as honras. É mister aceitá-lo alegremente, e servir a Deus sem ruído, sem brilho, sem murmuração, sem desfalecimento.

É fácil ser generoso nesse minuto “deslumbrante e breve“, nesse “relâmpago que vale a eternidade“, em que o entusiasmo vos soergue acima de vós mesma e vos esconde sob um véu de glória o horror do sacrifício, lançando-vos cegamente na trilha soberba que se abre diante de vós.

Mas ser fiel ao dever cotidiano, durante a longa série dos dias que passam um após outro, pardacentos, monótonos, pesados, frios como dias de inverno, de um inverno que não traria de novo a primavera, eis aí a verdadeira generosidade cristã.

Ainda quando tivésseis de ver despegar-se de vós, pedaço por pedaço, tudo o que faz a vossa alegria ou a vossa razão de viver, juventude, saúde, afetos, “chances”, de felicidade, sonhos de futuro, persisti, resisti, ficai firme, ainda quanto tivésseis de morrer nesse posto que Deus vos deu, e, se preciso for, “morrer longo tempo“.

Sereis, talvez, admirável sem o saberdes, heroína modesta da oficina ou do lar; mas a vossa abnegação e os vossos sofrimentos terão atraído sobre vós, senão o olhar dos homens, certamente os olhares de Deus.

b)Sede generosa e forte nos sofrimentos físicos e morais

A vida é cheia deles, não os evitareis. No Calvário havia três crucificados, um inocente e dois culpados. Jesus era inocente e sofria por amor de nós. E vós, que haveis pecado, quereríeis não sofrer? Os dois ladrões eram culpados, mas um sofreu bem e salvou-se, ao passo que o outro sofreu mal e não obteve a mesma promessa do Salvador.

Em face da dor, uns se enrijam num estoicismo brutal e declaram que não sofrem. Orgulho! Outros murmuram e dizem: “Que fiz eu a Deus para que Ele assim me faça sofrer?” O Cura d’Arc lhes responde: “Infelizes, vós O crucificastes, e Ele, que tinha feito?”

O cristão compreende a sublime beleza do sofrimento, aceita-a, não só em silêncio, com resignação e coragem, mas com amor.

Vós, ide mais longe, ensaiai sorrir ao sofrimento Tirar-lhe-eis assim um boa parte do seu amargor, e agradareis a Deus. Santa Joana d’Arc, ferida, dizia: “Não me lastimeis! não é sangue que corre, é glória!” Dizei também, nos vossos sofrimentos pequenos ou grandes: Não me lastimeis, é por Deus que eu sofro! O sofrimento depura, engrandece, vem de Deus, a Ele nos conduz ou reconduz.

E se, em certas horas vos retém este pensamento lancinante que circula tanto entre os que têm pouca fé:“Por que será que Deus, que é bom, me faz assim sofrer?”, compreendei bem o que segue.

1 – A dor é um instrumento divino que forja nossas almas.

2 – A dor é inseparável do amor; não se pode amar sem sofrer, mormente sabendo como se deve expiar.

3 – O próprio Jesus, o Inocente, descido do céu para vir salver seus “irmãos” culpados, quis aturar os mais terríveis suplícios, por que?…

4 – Maria, a doce e bela criatura, a sublime Mãe de Deus, também sofreu tanto, que a Igreja a chama “Rainha dos mártires“. Ora, compreendeis por que foi que Jesus, que amava Maria tanto quanto um filho pode amar sua mãe (e quanto mais Ele, que era Deus), permitiu que Ela tivesse de sofrer tanto?… Por que foi que Ele quis fazer de Sua mãe a “Mãe das dores”?…

Meditai estes fortes pensamentos nos dias em que não compreenderdes o “por que do sofrimento”.

c) sede generosa e forte mesmo depois de vossas quedas

Podem ocorrer quedas na vida. A nossa existência não se passa em cair e levantar-se? Sabei, pois, levantar-vos sempre, levantar-vos imediatamente, apesar da humilhação da derrota, e repor-vos imediatamente em forma para afrontar novos combates. Quando uma falta vos abater e mordesdes o pó, sereis tentada a dizer como Paulo, após a sua queda no caminho de Damasco:

Que quereis que eu faça?” Uma voz respondeu-lhe: “Levanta-te”… “Levanta-te e anda”, diz o anjo ao profeta Elias. Ele se levantou, e andou até à montanha do Senhor. Não vos deixeis, pois, entorpecer pelas quedas, pelas tentações, por todas essas misérias inevitáveis aos pobres seres frágeis deste mundo. Levantai-vos e andai!

Se sois uma triste vítima do respeito humano, quebrai vossos grilhões, alçai a fronte, reerguei-vos,levantai-vos e andai!

Se sois uma alma desanimada ou adormecida à beira da estrada, acordai, levantai-vos e andai!

Se sois uma cristã de água de rodas, sede-o de água do batismo, regenerada no sangue de um Deus, levantai-vos e andai!

Se sois uma cristã intermitente ou incompleta, que tentais satisfazer, a um tempo, a Deus e ao mundo, não vos esqueçais de que não se pode servir a dois senhores, Jesus vos chama, ide a Ele, levantai-vos e andai!

Se sois como aquele pobre paralítico que “não tinha ninguém para mergulhá-lo na piscina“, tendes um Deus feito homem que vem a vós e que vos quer curar: deixa-O mergulhar-vos na piscina do sofrimento, e depois ide, levantai-vos e andai!

Se sois como Lázaro, se a vossa pobre alma está morta, então, sobretudo, compreendei esta palavra tornada célebre: “De pé, mortos! de pé!” Saí do túmulo do pecado! Jesus aí está, pertinho de vós, que vos chama para quebrar as ataduras que retêm cativa a vossa alma. Saí do túmulo da morte, ressuscitai, de pé, levantai-vos e andai!

Um pequeno ferido dizia, impaciente de voltar ao combate: “Um ferimento é como a sopa, faz crescer!”…Podereis ser ferida na luta pela virtude. Mas, se quiserdes, esse ferimento vos fará crescer com a condição de saberdes ser humilde e generosa.

Formação da donzela – Pe. J. Baeteman