A fé opera no cristão uma renovação sobrenatural, eleva a alma às coisas celestes e, como diz São Leão, dá à alma impulso em direção ao bem incorruptível, em direção à verdadeira luz, quer dizer, em direção ao próprio Deus.
Mas para que a fé produza no cristão a operação que lhe é própria, é preciso que seja pura, que seja íntegra. Ora, a fé em sua pureza, em sua integridade, é uma fé rara. Magnum est, dizia Santo Agostinho, Magnum est in ipsa intus catholica, integram habere fidem. Traduzindo: Mesmo dentro da Igreja, é uma grande coisa haver uma fé íntegra.
Para bem compreender, é preciso que se lembre o que dissemos sobre o nascimento da fé em nossas almas. É preciso, para que a fé nasça e se desenvolva, o dom de Deus e a palavra do catequista ou a instrução. O dom de Deus é sempre puro, mas a palavra do catequista pode trazer com ela a verdade que vem de Deus ou o erro que vem do homem.
Suponhamos uma criança batizada vivendo numa sociedade separada da Igreja católica. O batismo que recebeu fez da criança um filho de Deus, pôs-lhe na alma a graça habitual; a criança cresce e recebe uma instrução manchada de heresia, aceita a heresia crendo aceitar a fé, é enganado… No dia em que perceber qual é a verdadeira fé católica, ou bem repudiará a heresia ou bem rejeitará a verdade, tornando-se ou decididamente católico ou formalmente herético. No primeiro caso terá perdido a heresia que lhe tinham ensinado e conservado a fé que Deus pôs em seu coração no dia do batismo. É importante que uma criança batizada não receba lições de um mestre que a faça perder a fé. Mas nós estamos em plena Igreja Católica, me dirá a senhora. É justamente por isso que ensino com Santo Agostinho: é muito importante ter a fé em toda sua integridade. Explico-me. A fé está no mundo, Deus a colocou no mundo para nossa salvação. Mas o erro também está no mundo, semeado pelo diabo para nossa perda. A fé, em sua integridade, é uma fé que está ao abrigo de todos os erros, de todos os preconceitos, de todas as opiniões vãs que correm mundo, que enchem os espíritos, que perdem as almas.
Ora, é bom lhe dizer, se é que ainda não notou, que todo espírito manchado pelo erro tem sempre mais zelo por seu erro do que os homens comumente têm pela verdade. É um fato que salta aos olhos; e a razão disso é que, vindo a verdade de Deus e o erro vindo do homem, é mais fácil para o homem seguir o erro fabricado por ele mesmo que a verdade que é feita por Deus.
Daí se segue que, como há homens que trazem em seu espírito um erro, uma falsidade, um preconceito, uma opinião vã, também haverá “missionários” (perdoai-me o emprego desta palavra em tal matéria) que trabalharão para fazer entrar no espírito dos fiéis alguns desses erros que atacarão com furor a fé inteira e abalarão sua integridade.
Ora é grande atualmente, o número desses missionários às avessas. Eles falam alto e em quase toda parte. E como se isso não bastasse, esses homens comandam a imprensa e a mantêm. É para esses que os jornais trabalham.
Todos os dias é feito pelo mundo um terrível trabalho de perversão dos espíritos. Ora atacam um dogma, ora outro. Aqui acreditam ter demonstrado que a fé no mistério da Santíssima Trindade é um absurdo; lá acreditam que arruinaram o mistério da Encarnação e a fé na divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo; mais adiante atacarão a Igreja, seus sacramentos, sua disciplina, seu culto, darão a tudo isso um ar bem pensante, lastimarão os espíritos atrasados e convidarão as almas a entrar nas vias do progresso. Resistirá a fé no meio desse perigos que rondam por toda parte e se apresentam, cada dia, sob as mais diversas formas? Se a fé resistir, será maravilhoso. Se lhe for dado ver este espetáculo, bendiga a Deus; e a vista de todas as ruínas que poderá constatar ao redor de tal acontecimento, a senhora compreenderá a verdade da palavra de Santo Agostinho: É uma coisa rara, mesmo no seio da Igreja Católica, haver a fé em sua integridade.
Digamos juntos: Credo.
Cartas sobre a fé – Pe. Emmanuel-Andre