A “PORTA LARGA” ESCANCARADA PELO PAPA FRANCISCO

Economia de Francisco e Clara: um modelo baseado no amor

Por Paolo Pasqualucci

Tradução gentilmente pelo nosso leitor Pedro Henrique Silva

Para onde está indo a Igreja Católica? A Igreja Una e Santa está viva e imaculada perante Seu Noivo; mas será que uma parte visível dela corre o risco de sofrer uma ‘mutação genética’, ou isso já aconteceu contra nossa vontade, e estamos vendo os efeitos dessa ação? Discutamos tal questão para “resistir”, na fidelidade.

I.

O Papa Francisco, em suas viagens ou em audiências, se encontrou repetidamente com indivíduos e associações do mundo dito LGBTQ+, ou arco-íris, denominação devida ao símbolo deles, ou seja, com pessoas que vivem de diversas maneiras no “pecado impuro contra a natureza” (Catecismo de São Pio X) – sendo que algumas delas até mesmo o promovem, ainda que se declarem católicas. Entre os católicos que se mantêm fiéis ao dogma e aos valores tradicionais, essa prática causou e causa escândalo. Mas por qual motivo? Nosso Senhor não permitia que viesse até Ele prostitutas e adúlteras arrependidas, bem como não pregava a todos os tipos de pecadores para convertê-los – “Aproxima-se o reino de Deus; fazei penitência, crede no Evangelho”; “eu não vim chamar os justos mas os pecadores” (Mc 1, 15; 2, 17)? O escândalo então não advém do fato do encontro, mas sim daquilo que o Papa Francisco disse e, ademais, daquilo que ele não disse e que deveria ter dito enquanto sacerdote, ainda mais sendo Romano Pontífice e, portanto, Vigário de Cristo na terra.

De fato, enquanto Nosso Senhor exortava sempre os pecadores com doçura, mas firmeza para “não pecarem mais”, isto é, para mudarem imediatamente de vida, converterem-se, viverem segundo os ensinamentos Dele, já que o “Reino dos Céus” estava próximo, quer dizer que a salvação eterna estava mais “próxima” naquele momento como nunca antes, graças às Suas pregações e ao Seu exemplo. O Papa Francisco, pelo contrário, sempre incitou todos esses pecadores a continuarem como são, visto que ele falou várias vezes: “Deus o ama assim como você é”! Não parece que ele os tenha alguma vez encorajado a mudar imediatamente de vida, a procurar entrar “pela porta estreita” (Lc 9, 23-24), carregando a própria Cruz dos verdadeiros seguidores de Cristo, negando a si mesmos (Lc 9, 23-24); em suma, nada evidencia que ele os tenha aberta e fortemente encorajado a fugir do pecado, a viver como verdadeiros e coerentes católicos, a procurar auxílio da Graça, a projetar a existência na salvação, a vida eterna, o único fato que verdadeiramente conta para cada um de nós!

A homossexualidade é um pecado grave, um daqueles que, como se dizia no passado, “clamam a Deus por vingança”, assim como o homicídio doloso, a opressão dos pobres e a fraude no pagamento dos trabalhadores. Nem mesmo a ciência moderna conseguiu eliminá-lo. Foi em vão, por parte de certos cientistas, também homossexuais, a pesquisa do “cérebro gay” ou do “gene gay” para sustentar a suposta “normalidade” desse desvio e derrotar dessa forma a moral católica. Mas eles conseguiram, em 1973, com intervenções de tipo emotivo, promover a retirada da homossexualidade do elenco das “patologias psiquiátricas” da American Psychiatric Association. Um fato grave, que provocou uma reação em cadeia. Em 17 de maio de 1990, a OMS excluía igualmente a homossexualidade da lista das doenças mentais, fazendo-a assim tornar-se uma variante natural do comportamento humano.

Precisas observações críticas sobre as tentativas de legitimar biologicamente a homossexualidade, ou seja, como tendência natural, foram feitas pelo reconhecido psicoterapeuta holandês de fama internacional, especialista na cura das pessoas homossexuais, Gerard J. M. van den Aardweg, em um notável livro de 1996. Ressalta-se que o dr. van den Aardweg é um católico de orientação tradicional. Se alguém considerar que isso pode ter influenciado as análises científicas dele, leia o que escreve o célebre neurobiólogo inglês Steven Rose, especialista nos estudos sobre o Alzheimer, judeu ateu declarado, um liberal de tipo “radical” no plano ético-político. Em um dos seus mais relevantes textos divulgados sobre o cérebro, ele zomba abertamente das pesquisas voltadas a descobrir o gene ou o cérebro gay, afirmando que isso não é ciência, mas pura “speculation”, além do mais embaraçosas, pois, em certas passagens, parecem mais revelar “as bizarras fantasias sexuais” que obcecam a mente do pesquisador.

Periodicamente, na imprensa, é divulgada a (falsa) notícia de que os geneticistas teriam finalmente demonstrado o caráter biologicamente natural da homossexualidade. Na Itália, uma das últimas, creio, tenha sido a publicação na página cultural de Il Sole24Ore da resenha do livro do prof. Jacques Balthazar, endocrinologista belga, traduzido para o italiano em 2021 por Bollati-Boringhieri. O livro, lançado incialmente em 2010, analisa sobretudo comportamentos homossexuais dos animais, que seriam fruto de determinismo biológico (por ser devido a fenômenos endocrinológicos e genéticos), para sustentar que esse tipo de comportamento poderia ser encontrado também no homem. Essa seria a “demonstração”. Há aí um erro fundamental, típico da ciência moderna e contemporânea, escrava das suas perspectivas evolutivas: aplicar em curto prazo aos homens comportamentos detectados nos animais, como se o animal, privado de razão e de livre arbítrio, pudesse ser um modelo válido para explicar o comportamento humano, no qual opera sempre o livre arbítrio, além de ser afetado por variantes de tipo psíquico e espiritual, influenciadas pelo ambiente. Ademais, a origem supostamente natural da homossexualidade é apresentada pelo professor belga mais como uma possibilidade do que como uma certeza. E, de fato, um estudo muito aprofundado sobre o tema, publicado em setembro de 2019 na conceituada revista científica americana Science, mostra com ampla evidência documental que a origem natural ou genética da homossexualidade continua improvável.

Trata-se de uma pesquisa relevante, considerada a mais completa, até agora, efetuada nesse campo, de árdua leitura para nós não especialistas. Todavia, algumas conclusões fundamentais mostram-se claras.

“Identificamos, a nível de genoma, significativos pontos fixos [loci] associados ao comportamento homossexual e encontramos evidências de uma ampla contribuição graças às variações genéticas comuns. Estabelecemos, de todo modo, que a arquitetura genética subjacente é muito complexa; seguramente não existe um único gene que seja determinante (às vezes definido nas mídias como “o gene gay”). Por outro lado, muitos desses pontos fixos que produzem pequenos efeitos a nível individual, difundem-se no genoma inteiro e em parte se sobrepõem como masculinos e femininos, adicionando a contribuição deles às diferenças individuais na predisposição para o comportamento homossexual. Todas as variantes, medidas coletivamente, explicam [todavia] somente parte da hereditariedade genética a nível de população e não permitem uma significativa predição das preferências sexuais de um indivíduo”. Há, desse modo, dois pontos essenciais: 1. o gene gay não existe; portanto, 2. os indicadores genéticos individualizados são demasiadamente instáveis para “prever as preferências sexuais de um indivíduo”. Quanto ao dito “gene gay”, havia sido afirmado em 1993 a existência em um locus do cromossoma masculino X, chamado Xq28, pelo famoso prof. Dean Hamer, homossexual e também inveterado “ativista gay” no plano cultural, convicto também de ter encontrado uma explicação genética da religião. A demonstração desse estudioso foi amplamente criticada no campo científico, mas tornou-se, não supreendentemente, uma verdade revelada para as mídias. A base da pesquisa, era preciso primeiramente observar, mostrava-se muito restrita, envolvia apenas 65% de um grupo de homossexuais que tinham irmãos homossexuais, ou seja, apenas 6% da população homossexual. Um grupo selecionado com muito cuidado.

Na pesquisa de 2019, reitera-se que não foi detectado rastro desse gene: “Diferentemente de estudos de linkage [como aquele do prof. Hamer] que encontraram uma substancial associação de orientação sexual com variantes presentes no cromossoma X (8, 23), não detectamos nenhum sinal em excesso no cromossoma X (e nenhum locus individual significativo a nível de genoma)”. Mas a propaganda gay buscou igualmente tirar partido dessa pesquisa, já que é afirmada a existência de cinco loci de genes que influenciariam de 8 a 25% no comportamento homossexual. Mas essa ampla oscilação [range], explica o artigo, depende dos “diversos métodos ou hipóteses de prevalência [de uma variação] (Gráfico S11) empregados”. E em todo casos essas “variantes genéticas” influenciam apenas menos de 1% do comportamento efetivo.

O “comportamento efetivo”, reafirmava a pesquisa, é influenciado por uma multiplicidade heterogênea de fatores, que compreendem aqueles psíquicos e culturais ambientais, frequentemente subestimados. Essa pesquisa de 2019 demonstra de todo modo que a palavra de ordem dos movimentos “arco-íris” (“sou feito/a assim”; “esta é a minha natureza, que culpa eu tenho”), além de ofender a Deus Criador e ser contrária ao senso comum, é do ponto de vista científico totalmente infundada.

Immanuel Kant, cujo tricentenário de nascimento é comemorado este ano, equipara estupro, pederastia e bestialidade com “delitos contra a humanidade em geral”. A homossexualidade, escreve ele, lesa a humanidade “em nossa pessoa”. Deve, portanto, ser considerado um “vício contra a natureza”: contra a natureza humana, prejudicada por ele justamente na sua intrínseca essência, que se fundamenta na união do princípio masculino com aquele feminino (“masculum et feminam creavit eos”, Gen 1, 27).  Lesa também no senso estético, na dignidade e no decoro, por causa do caráter repugnante das relações homossexuais.

Como ser moral que é também físico, evidencia também Kant, o homem tem o dever (consigo mesmo) de visar a preservação da espécie, o que constitui um impulso natural. “Os vícios que se contrapõem aqui ao dever do homem perante si mesmo são: o suicídio; o uso contra a natureza que alguém faz da inclinação sexual; o deleite descomedido dos meios de alimentação, que enfraquece em nós a faculdade de fazer um uso conveniente das nossas forças”. De fato, a prática da homossexualidade, sendo intrinsicamente estéril e corrompendo os costumes, contribui amplamente para a extinção dos povos e em perspectiva do gene humano, contradizendo assim a natureza, cujo escopo não pode ser a autodissolução.

II.

Mas é verdade que “Deus o ama assim como você é”? Como foi sempre ensinado, Ele o ama quando você faz a vontade Dele, o que significa, para nós católicos, somente quando nos esforçamos para buscar a nossa santificação cotidiana, segundo os ensinamentos de Cristo. Como diz o cego de nascimento, depois que o Senhor lhe havia devolvido a visão, ao descrever o milagre aos Fariseus que severamente o interrogavam, “Nós sabemos que Deus não ouve os pecadores; mas quem honra a Deus e faz a sua vontade, esse é ouvido por Deus” (Jo 9, 31).

Se você viver obstinadamente no pecado e insistir nisso, Deus não o escuta e não o ama de fato, além do mais, isso suscita a Sua justa ira, a qual resultará na Sua reprovação, que será eterna caso morra sem se mostrar arrependido, mantendo-se envolto nos pecados. Ao repetir obsessivamente aos pecadores que Deus de todo modo os ama “assim como são”, sem necessidade que se corrijam convertendo-se ou retornando a Cristo, o Papa presta-lhes um péssimo serviço: são abertas a essas almas desafortunadas a “porta larga” e a “via espaçosa” que conduzem à condenação eterna. “Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela” (Mt 7, 13; Lc 13, 22).

É uma verdade de fé que haverá os condenados para sempre: uma parte da humanidade não se salvará. Tal fato consta na Palavra do Senhor, várias vezes retomado além do texto que acaba de ser citado: na parábola do semeador (Lc 8, 4 ss); na parábola das virgens prudentes e néscias (Mt 25, 1-15); naquela do rico (Lc 16, 19-30); naquela sobre a separação final do grão de joio (Mt 13, 24); naquela sobre “regalos de bodas”, que se conclui com a célebre inserção: “porque muitos são os chamados, mas poucos os eleitos” (Mt 22, 1 ss; Lc 13, 28); nas advertências escatológicas às cidades incrédulas (Lc 10, 13 ss). Por fim, na revelação do Juízo Final, na qual o próprio Jesus, como Cristo Rei e Juiz em toda a Sua Glória, Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, dividirá para sempre o gênero humano em Eleitos e Reprovados (Mt 25, 31). Essa verdade de fé foi reiterada igualmente por São Paulo: Gl 6, 7-8; Ef 3, 19-19; e pelo Beato Pedro: 2Pd 9 e 17.

Muitos serão, na verdade, também os Eleitos: veja Mt 21, 43; Lc 14, 2-23; Ap 7, 9. Mas é em vão especular sobre o possível número dos Eleitos e dos Reprovados, como fazem alguns, imaginando em qual dos dois grupos constará mais pessoas.

Todavia, o Senhor não veio neste mundo para salvar todos os pecadores, como nos recorda São Paulo: “Em verdade, isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador [a pregação para todos os homens], o qual quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade. Com efeito, há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, que é Jesus Cristo homem, o qual se deu a si mesmo para redenção de todos” (1Tm 2, 3-6)? Certamente, Deus quer a salvação de todos, mas através “do conhecimento da verdade”, ou seja, mediante a nossa conversão em Cristo e nos seus ensinamentos. E a fé não se pode adquirir sem a Graça, que requer, no entanto, a participação do nosso livre arbítrio, por isso serão condenados todos aqueles que tiverem recusado a Graça, perseverando no pecado até o fim das suas vidas.

III.

Portanto, a missão da Igreja fundada por Cristo é justamente aquela de expulsar Satanás do máximo possível de almas antes do juízo final, que ocorrerá quando houver o imprevisto retorno, a presença (parusía) “rápida como um raio” de Cristo como Juiz de toda a humanidade (Mt 24, 27; Lc 17, 24). E, por outro lado, o atual Vigário de Cristo o que faz, senão exatamente o oposto da missão ordenada pelo Senhor Ressuscitado à Igreja (Mt 28, 18-20)? Ao incitar os pecadores a permanecerem na vida de pecado, ele não os entrega de fato a Satanás?  Objetivamente, ele não se comporta como o mau Pastor que deixa as ovelhas à mercê dos lobos, como mencionado em Jo 10, 1-13? É possível que não se dê conta disso?

Façamos uma pequena antologia das intervenções homófilas mais recentes do Papa Francisco.

Em julho de 2023, em um encontro com um “jovem transsexual” que se declarava católico, mesmo insistindo em manter-se naquela situação, o Papa Francisco o encorajou da seguinte forma: “Deus é pai, mãe e irmão para nós. E entender isso é difícil, mas Ele nos ama como somos. Não desamine… Siga em frente…”. Anteriormente, a uma jovem que se proclamava “pessoa não binária”, e isso quer dizer que afirmava não se sentir nem homem nem mulher, ele havia dito: “Deus não recusa ninguém, Deus é pai. E eu não tenho o direito de expulsar ninguém da Igreja”. Aqueles que querem excluir o movimento LGBT da Igreja são, segundo o Papa Francisco, “infiltrados que se aproveitam da Igreja em nome das paixões pessoais, da limitação pessoal. Trata-se de uma das corrupções da Igreja”. De forma similar, o Papa se expressou em um encontro de 22 de abril de 2022 com um grupo de “prostitutas transexuais”, já ajudadas durante a pandemia de Covid em um paróquia próxima a Pomezia, no litoral romano.

É preciso de todo modo questionar-se nesse ponto: por trás das siglas anódinas de conveniência e de conformismos pseudo-humanitários, qual é a autêntica realidade do fenômeno LGBTQ+, constituído por grupos tão restritos de pessoas, mas para os quais mídias chamam nossa atenção de modo exorbitante e obsessivo?

Visto como fenômeno social geral, consta de organizações e redes midiáticas de pessoas de ambos os sexos dominados pelas patologias e pelos distúrbios produzidos pela prática da homossexualidade; redes locais, nacionais com ligações internacionais graças à internet, sustentadas pela alta finança, por muitos governos e pelo business bilionário, bem como pela governança de organizações como a ONU e a OMS, agora descarrilhadas dos trilhos originais: redes que prosperam sobretudo graças à cúmplice loucura da cupio dissolvi que aflige há muito tempo as elites do Ocidente. Essa plêiade não é nada neutra, partilha os objetivos do feminismo, do qual é de certo modo uma réplica, e então quer impor sua visão de mundo e política, pondo em prática uma espécie de “inversão de todos os valores” de tipo nietzschiano, usando o álibi da luta contra a discriminação. Efetivamente, mobiliza-se contra a família tradicional e contra o matrimônio tradicional, contra a religião, em particular a católica, e visa corromper a infância e a juventude graças à prática da educação sexual, que aborda por lei, já desde o ensino fundamental, as instâncias pederásticas e sáficas nas escolas de todo o Ocidente. Tal grupo conseguiu obter em muitos Estados o reconhecimento das convivências homossexuais como “casamento”, com a adoção de crianças, ou a aquisição de “filhos” obtidos com práticas escandalosas como a maternidade de substituição, chamada popularmente de “barriga de aluguel”.

Tudo isso constitui uma abominação nunca vista antes na história, nem mesmo nas épocas de pior decadência.

Ademais, essa plêiade propicia todo tipo de promiscuidade, contribui para a difusão de doenças infecciosas do tipo venéreo, favorece o ofuscamento das nações ocidentais mediante a diminuição cada vez mais difundida da natalidade (a qual oferece uma óbvia contribuição, reforçada por sua defesa indiscriminada ao aborto livre), a reescrita em tom feminista e gay (a mais recente forma de subcultura) da nossa tradição cultural e o apoio ao acolhimento indiscriminado das massas afro-asiáticas de clandestinos que pressionam as nossas fronteiras, em grande parte mulçumanas.

Do ponto de vista individual, no plano sociológico, esse fenômeno trouxe à tona a nova e desconcertante figura do “ativista gay”, isto é, de extremistas de ambos os sexos empregados intensamente na promoção dos ditos “direitos” dos gays considerando os direitos humanos, como se os homossexuais fossem perseguidos nas nossas sociedades, o que de fato não ocorre. Eles tentam impor à sociedade uma visão invertida de mundo, às vezes de maneira também bem agressiva e arrogante, em todo caso não mais nas formas melífluas e lamuriosas do passado. Como podem sacerdotes, freiras e fiéis que praticam a homossexualidade estarem convencidos de que a doutrina da Igreja deva reconhecer como lícito o modo de vida deles, algo expressamente contrário à lei natural e à ética cristã, isso é sem dúvida um dos vários aspectos insondáveis do mysterium iniquitatis? Esses católicos “dissidentes” não procuram de modo algum fazer mea culpa, corrigir-se e retornar para Cristo: pelo contrário, eles querem que o pecado deles seja reconhecido como algo bom e justo pela doutrina da Igreja, a qual declaram abertamente querer mudar!

Porém, entre todos eles, católicos e não católicos, existem seguramente muitas pobres almas que se sufocam em um abismo do qual ficariam bem felizes de emergir, se apenas encontrassem os guias apropriados, na ciência médica e na religião.

IV.

Por outro lado, a “pastoral” do Papa Francisco para as pessoas LGBTQ+, em geral, parece basear-se nos seguintes conceitos:

  1. “O Senhor não tem aversão das nossas realidades, Ele nos ama como somos. E isso é o amor louco de Deus”;
  2. Portanto, ninguém pode ser excluído da Igreja, a qual, aliás, acolhe todos, então:
    3. “Sigam em frente assim como são… Não se arrependam”.

O Papa Francisco parece equiparar a busca de “conversão” dos pecadores à “expulsão da Igreja” dirigida a eles. Mas quem auspicia o efetivo regresso dos católicos que se autodenominam “arco-íris” não defende certamente a “expulsão da Igreja” dessas pessoas, que é uma ação relacionada aos poderes do Papa, sob forma de excomunhão e redução ao estado laical. O que se limita a fazer é pedir que a Suprema Sé e o episcopado exerçam seus poderes do modo devido, segundo a autêntica tradição da Igreja, empenhando-se na obra de conversão das almas e, por conseguinte, condenando como se deve o pecado com os instrumentos oportunos (encíclicas, cartas apostólicas, cartas episcopais, sermões), bem como incitando os pecadores a sair disso no menor tempo possível, para retornarem a praticar efetivamente o verdadeiro catolicismo, com a meta da salvação deles e o bem de todos.

Em vez disso, o Papa Francisco os encoraja a continuarem como são, a seguirem em frente assim como são, e não a partir hoje, há anos, envolvendo nesse encorajamento também representantes de movimentos que nos Estados Unidos e em outros países querem realmente que a Igreja modifique expressamente o seu ensinamento sobre a homossexualidade, definida pelo último Catecismo (art. 2357) como “grave depravação” e “comportamento intrinsecamente desordenado”, “contrário à lei natural”. A homossexualidade impede “com o ato sexual o dom da vida” e “em nenhum caso pode ser aprovada”.

Veja, a propósito, a audiência de 25 de outubro de 2023, durante a qual o Papa Francisco encontrou expoentes da “Global Network of Rainbow Catholics”, uma rede mundial de católicos que se declaram LGBTQ+. Líderes das organizações norte-americanas desse grupo, que busca fundar-se como verdadeira e própria instituição supranacional, declararam que o Papa tinha falado com eles por vários minutos e havia sido “inacreditavelmente compreensivo [gracious]”, dando a esperança de que ele teria de fato conseguido “tornar a Igreja mais inclusiva”. Saibamos o que quer dizer “inclusiva”: aberta a todas as exigências do mundo LGBT, isenta de qualquer condenação. O Papa também lhes teria dito para “seguirem em frente” (go ahead) com a atividade deles, ou seja, para continuarem na via traçada (que é realmente aquela larga e espaçosa que leva à perdição, segundo a parábola mencionada anteriormente).

Uma das organizações LGBT tratadas tão afetuosamente pelo Papa, DignityUSA, apresenta este programa: “estamos trabalhando para o desenvolvimento de uma teologia do sexo e do gênero que comporta a reforma dos ensinamentos e da prática [da Igreja Católica] em relação à sexualidade humana e à identidade de gênero”.

Além de encontrar várias vezes e de encorajar o célebre jesuíta P. James Martin, cuja missão na Igreja parece ser aquela de um ativismo frenético para os supostos “direitos” dos gays, o Papa Francisco concedeu também audiência à não menos célebre freira pro-gay Jeannine Gramick, co-fundadora da New Ways Ministry, outra famosa organização de católicos dissidentes e homófilos. A freira “tem uma [longa] história de ativismo LGBT e abortista, e foi condenada e censurada pelos predecessores”; ainda se, preciso mencionar, de modo globalmente brando (proibição de escrever, de fazer conferências, obrigação ao silêncio). De 2 a 4 de agosto, o já mencionado P. Martin organizou na americana Georgetown University a conferência anual do seu movimento Outreach [abraço universal], o que se propõe a ser um “recurso global” para todos os católicos LGBTQ. O extenso programa previa também a participação de um antigo padre “gay iconographer” e de uma biblista judia não crente, a qual procurou demonstrar a débil tese de que tanto no Antigo quanto no Novo Testamento não haveria uma verdadeira condenação à homossexualidade, como atividade sexual “consensual” entre duas pessoas adultas. Pois bem, o Papa Francisco enviou uma carta a P. Martin na qual afirmava sentir-se “espiritualmente próximo” dos participantes dessa incrível conferência.

V.

A listagem das desconcertantes intervenções papais nesse âmbito poderia continuar, mas creio que os dados apresentados sejam suficientes. As notícias nos informam que o Papa ocasionalmente se expressou em termos inequívocos contra a ideologia de gênero, além de ter lamentado (a portas fechadas) o excessivo número de homossexuais dentro do clero atual. E então por que ele encoraja sodomitas, lésbicas e transgêneros a continuarem a viver como vivem, violando a moral católica e natural? Muitos fiéis estão realmente consternados pelo comportamento contraditório desse Pontífice. Mas a contradição se mostra ineficaz, visto que não soluciona o problema fundamental, constituído por um ensinamento que se mantém constante no não atendimento ao que foi estabelecido por Nosso Senhor quanto à conversão e à salvação das almas.

É necessário então recordar brevemente a verdadeira doutrina católica, não antes, todavia, de mencionar uma acusação absurda dirigida por Papa Francisco àqueles que criticam sua “pastoral” permeada pela falsa “misericórdia” da “porta larga” e da “via espaçosa”. Deixemos de lado os epítetos de “atrasados” e de “austeros” ou realmente de “corruptos”, feitos pelo Papa àqueles que se expõem para defender a doutrina moral tradicional da Igreja. Mais recentemente, ele se voltou aos numerosos críticos do seu decreto Fiducia supplicans, que concede a possibilidade da benção aos casais irregulares também homossexuais, acusando-os de adotarem um comportamento que seria realmente “de natureza cismática”.

O Papa Francisco parece então querer dar um fundamento teológico à sua repulsa a qualquer crítica às suas medidas, no mínimo, singulares, alegando o sofisma segundo o qual essa benção particular não seria dada ao casal que a requer, mas sim aos indivíduos que a requerem, ainda que constituam um casal na vida e recebam tal “benção” como casal, talvez de mãos dadas. Falemos a verdade: cismático não pode certamente considerar-se quem critica aquilo que representa um nítido desvio quanto à moral católica sempre professada pela Igreja – desvio constituído por uma inconcebível aceitação do pecado contra a natureza, seja ele individual ou conjugal, condenado em cartas claras de São Paulo (Rm 1, 24 ss; 1 Cr 6, 10) e por Nosso Senhor quando justificou várias vezes o castigo divino que caiu sobre Sodoma e Gomorra, um castigo que para os antigos hebreus tinha valor realmente paradigmático (Mt 10, 15; 11, 23-24; Lc 10, 12; 17, 29 e 32). Ademais, é algo considerado pelo Magistério de todos os tempos. Com efeito, não foi o cardeal Ladaria, na sua qualidade de Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, em 15 de março de 2021, a responder NEGATIVAMENTE aos bispos alemães que lhe perguntavam precisamente se era lícito abençoar os casais homossexuais? O conceito era que a Igreja não podia abençoar o pecado. É cismático, então, o cardeal Ladaria ao reafirmar uma verdade solar, elementar da moral católica, fundada na Revelação bem como na lei natural?

Para a condenação do ponto de vista da lei natural, leia o que escreve Platão no seu último e incompleto diálogo, As leis:

“ATENIENSE: […] Pois até mesmo esses ‘ginásios’ e as ‘refeições em comum’ são agora um benefício em muitos casos para o Estado, mas nas sedições são uma dificuldade, como demonstram os filhos dos Milesianos e dos Beócios e dos Turianos. E também parece que esse uso tenha corrompido uma antiga lei de natureza que deveria governar sempre os prazeres sexuais não somente dos homens, mas também dos animais. E desses males poderiam ter acusado primeiramente os seus Estados e todos os outros que fazem uso bem amplo dos ‘ginásios’; e, quer pensemos nesse fato de forma divertida ou seriamente, é preciso reconhecer que tal prazer parece ter sido atribuído pela natureza ao gênero feminino e àquele dos machos enquanto entre eles se unem para a geração, mas a união dos machos com os machos ou das fêmeas com as fêmeas é contra a natureza [parà physin], ato temerário criado desde o princípio por desordenado prazer. Todos nós acusamos os Cretenses como inventores do mito Ganímedes; eles, já que a crença era de que as leis vinham de Zeus, criaram além do mais, pelo que se diz, esse mito sobre Zeus, para acolher também esse prazer, mantendo-se respaldados por aquele deus. E deixemos para trás a fábula…”

VI.

Mas foquemos agora na verdadeira doutrina católica, que exige a conversão do pecador. Ela resulta, como deveria ser evidente, do capítulo 3 do Evangelho de João, em que se testemunha a visita noturna de Nicodemos a Jesus. Um dos líderes dos Fariseus, que segundo a tradição se teria tornado cristão, Nicodemos fez na ocasião uma profissão de fé privada a respeito da origem divina de Jesus e das Suas extraordinárias obras. Jesus lhe explicou o significado exato de ser Seu seguidor. A exortação à “penitência” e à “conversão”, com a qual tinha começado a sua missão, constitui na realidade uma exortação à completa regeneração interior, conduzida sob a égide do Espírito Santo.

“Em verdade, em verdade te digo que não pode ver o Reino de Deus, senão aquele que nascer de novo.”. Nicodemos lhe perguntou: “Como pode um homem nascer, sendo velho? Porventura pode tornar a entrar no ventre de sua mãe e renascer?” Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade te digo que quem não renascer da água e do Espirito Santo, não pode entrar no reino de Deus. O que nasceu da carne, é carne, o que nasceu do Espírito, é espírito. Não te maravilhes de eu te dizer: É preciso que vós nasçais de novo. O vento sopra onde quer, e tu ouves a sua voz, mas não sabes donde ele vem, nem para onde vai, assim é todo aquele que nasceu do Espírito” (Jo 3, 3-8). Ser cristão significa então regenerar-se interiormente de modo completo graças ao ensinamento de Cristo. Um ensinamento, como bem se entende, que é colocado em prática, de modo consciente e racional, apesar dos obstáculos representados pelas consequências do pecado original. O que significa que é preciso fazer a vontade de Deus e obedecer aos mandamentos do Senhor, se você quiser agradar à Santíssima Trindade e conquistar a vida eterna.

 “Aquele que retém os meus mandamentos e os guarda, esse é que me ama; e aquele que me ama, será amado por meu Pai, e eu o amarei, e me manifestarei a ele”. Diz-lhe Judas, não o Iscariotes: “Senhor, qual é a causa por que te hás-de manifestar a nós, e não ao mundo?”. Jesus lhe respondeu: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e nós viremos a ele, e faremos nele a nossa morada. O que não me ama, não observa as minhas palavras. E a palavra que ouvistes, não é minha, mas do Pai, que me enviou. Disse-vos estas coisas, permanecendo convosco. Mas o Paráclito, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará todas as coisas, e vos recordará tudo o que vos tenho dito”.

Como se manifesta o Senhor aos homens? “Manifesta-se” interiormente, não exteriormente. Mas apenas àqueles que O amam. E esses são apenas aqueles “que guardam a Sua palavra”; são os fiéis que se esforçam para colocar em prática todo dia os Seus ensinamentos; os quais advêm do Pai: a palavra do Senhor é a palavra do Pai, obedecendo a ela obedecemos ao Pai. Então, também o Pai “nos amará” e virá habitar na nossa alma junto com o Filho. E essa será a ação da Graça em nós, que envolve também o Espírito Santo e gradualmente nos transforma ontologicamente, como nos recordava Romano Amerio.

Com a ação da Graça em nós, ocorre a nossa regeneração em Cristo, na luta contra nós mesmos para a nossa santificação cotidiana. De tal modo, nasce em nós “o homem novo” agradável ao Senhor. Se quisermos entrar no Reino de Deus, o homem novo deve tomar o posto daquele velho, dominado pelo pecado: devemos nos corrigir e não pecar mais. Essa verdade fundamental é explicada várias vezes por São Paulo.

“Isto, pois, vos digo e rogo no Senhor: não andeis mais como os gentios, que andam na frivolidade dos seus pensamentos, que têm o entendimento obscurecido (e estão) afastados da vida de Deus pela ignorância que há neles, por causa da cegueira do seu coração, os quais, de consciência embotada, se entregaram à libertinagem, para cometerem apaixonadamente toda a espécie de impureza. Mas vós não aprendestes assim (a conhecer) Cristo, se é que ouvistes pregar dele, e fostes ensinados nele, segundo a verdade que está em Jesus, a vos despojardes, pelo que diz respeito ao vosso passado, do homem velho, o qual se corrompe pelas paixões enganadoras, a renovar-vos no vosso espírito e nos vossos pensamentos, e a revestir-vos do homem novo, criado segundo Deus na justiça e na santidade verdadeiras” (Ef 4, 17-24, itálicos meus).

Na edição da Sagrada Bíblia anterior ao Concílio, constava o seguinte comentário: “O homem velho é o homem decaído com toda sua bagagem de misérias. O homem novo é aquele reabilitado pela Graça, diante da qual se abrem os radiosos horizontes do Paraíso”. Mas como poderíamos ‘revestir-nos do homem novo’? Não é uma tarefa superior às nossas débeis forças, que sempre devem pagar as consequências do pecado original? Com o auxílio fundamental da Graça, que age em nós com a efusão inefável da divindade una e trina, podemos ter êxito nessa árdua empreitada. São Paulo frisa que ‘pela graça de Deus, sou o que sou, e a sua graça, que está em mim, não foi vã, antes tenho trabalhado mais que todos eles [aqueles que injustamente o criticavam]; não eu, porém, mas a graça de Deus, que está comigo’ (1 Cor 15, 10). Não eu sozinho, mas a Graça de Deus, e não sozinha, mas junto de mim, com a participação ativa do meu livre arbítrio, já que a Graça não se deve esperar que caia do céu, como se costuma dizer.

Mas o Papa Francisco incita inacreditavelmente os pecadores a continuarem como o homem velho, que é aquele do pecado. Ele nunca menciona a Graça, cujo auxílio devemos invocar todos os dias para nos renovar interiormente, nem mesmo prega a vida eterna, na qual pode entrar também o pecador mais inveterado, visto que a misericórdia de Deus é tamanha a ponto de perdoar-lhe qualquer pecado, obviamente, se esse indivíduo fizer a vontade de Deus, arrepender-se, mudar de vida, observar os divinos mandamentos e se, como o Filho Pródigo da famosa parábola, prostrar-se perante Deus, exclamando: “Pai, pequei contra o céu e contra ti; já não sou digno de ser chamado teu filho” (Lc 15, 21).

Os representantes dos movimentos “arco-íris” acusam a doutrina tradicional da Igreja de ser cruel com eles, quase como se ela os sentenciasse, sem possibilidade de apelo, à eterna condenação. Mas não é de fato assim. São Paulo, depois de ter colocado sodomitas e lésbicas diante das graves responsabilidades deles, condenando sem meios termos as suas “torpes paixões” (Rm 1, 26-29), evidencia que entre os pecadores arrependidos e regenerados em Cristo na comunidade cristã havia também homossexuais curados do desvio deles: “Não vos enganeis: nem os impudicos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os que se dão à embriaguez, nem os maldizentes, nem os salteadores possuirão o Reino de Deus. E tais éreis alguns de vós, mas fostes lavados, mas fostes santificados, mas fostes justificados, em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo e mediante o Espírito do nosso Deus” (1Cor 6, 9-11).

Mas como poderão converte-se se quem deve pregar-lhes o Verbo, que é o único que dá a vida eterna, não só se cala, como também realmente os encoraja a permanecer no pecado? “Ou como crerão naquele, de quem não ouviram falar? E como ouvirão, sem haver quem lhes pregue?” (Rm 10, 14).

Devemos rezar para o Papa Francisco, rezar muito para ele – rezar ao Senhor para o faça desvencilhar-se do espesso véu do erro que ofusca a vista dele.

13 de agosto de 2024