A TROCA DE CARTAS ENTRE FRANCISCO E O HERESIARCA HANS KUNG

O teólogo Küng havia escrito a Bergoglio pedindo-lhe uma reflexão: “Ele respondeu-me com uma carta fraterna, apreciando as minhas considerações. Ele não colocou limites à discussão sobre o dogma  sancionado pelo Primeiro Concílio do Vaticano e pelo Papa Pio IX em 18 de julho de 1870”.

Hans Kung

Hans Kung

Por Gian Guido Vecchi, Corriere della Sera | Tradução:FratresInUnum.com –  Hans Küng diz que a carta de Francisco, datada de 20 de Março, foi entregue através da nunciatura em Berlim.  Uma carta “que responde ao meu pedido para uma discussão livre sobre o dogma da infalibilidade” do Papa. “Ele respondeu de um modo muito fraterno, em espanhol, dirigindo-se a mim como Lieber Mitbruder, ou seja, querido irmão, e estas palavras pessoais estão em manuscrito”, disse Küng. O grande teólogo suíço, “pela consideração que tenho ao Papa” não cita frases do pontífice. Mas ele diz que “Francisco não estabelece quaisquer limites para a discussão“, ele “apreciou” suas observações. E com espanto indisfarçável ele aponta como é “importante para mim“, o fato de que ele respondeu pessoalmente, e acima de tudo, “não deixou, por assim dizer, cair no vazio o meu texto.”

Na verdade, o texto, dirigido a um papa, foi imperativo: “Imploro Papa Francisco, que sempre me respondeu de uma forma fraternal: receba essa extensa documentação e consinta em nossa Igreja uma discussão livre, aberta e sem preconceitos sobre todas as questões pendentes e removidas relacionadas com o dogma. Não se trata de um relativismo banal que mina os fundamentos éticos da Igreja e da sociedade. E nem mesmo de um dogmatismo rígido e tolo amarrado a uma interpretação literal. Está em jogo o bem da Igreja e do ecumenismo”.  Küng já tinha tornado esse texto público e traduzido em várias línguas, no dia 9 de Março.  Ao aproximar-se de seus 80 anos de aniversário, “como teólogo e até o final dos meus diasnutro uma profunda simpatia pelo papa e por sua ação pastoral”. O  pensador suíço levantou novamente “um apelo que muitas outras vezes levantei durante um década de longa discussão”.

Francisco jamais falou do dogma da Infalibilidade

Francisco nunca falou do dogma da infalibilidade, sancionado pelo Primeiro Concílio do Vaticano e pelo Papa Pio IX em 18 de Julho de 1870. Afinal, ninguém Além do Tibre jamais pensou em questionar isso. Bergoglio é o Papa da colegialidade, mas está tão consciente das prerrogativas de Papa, que ele as recordou em um discurso memorável no dia 18 de outubro de 2014, no final do Sínodo, citando o Código de Direito Canônico: o Papa é “quem garante a obediência e conformidade Igreja com a vontade de Deus, o Evangelho de Cristo e a Tradição da Igreja, deixando de lado qualquer vontade pessoal, sendo – por vontade do próprio Cristo – o “pastor e doutor supremo de todos os fiéis” (cânon 749) e ao mesmo tempo goza “do poder ordinário que é supremo, pleno, imediato e universal na Igreja” (cânones 331-334). “

O Concílio Vaticano I

Diferente é dizer que Francisco não colocou nenhum limite à discussão, como relatou Kung. Mesmo porque se trata de um dos dogmas mais mal compreendido, bem como por demais debatido. O Concilio Vaticano I jamais disse, como muitos acreditam, que o Papa é infalível em tudo. O Papa é um ser humano e a primeira coisa que Bergoglio disse no conclave, após a eleição, foi: “Eu sou um pecador”. Após longas discussões, em 1870, foi determinado que o Papa é infalível apenas “quando fala ex cathedra, isto é, quando ele exerce o seu cargo de Supremo Pastor e Doutor de todos os cristãos, e que em virtude de sua autoridade apostólica suprema define uma doutrina relativa à fé e moral”.  São casos muito raros, como quando em 1950 o Papa Pio XII proclamou solenemente o  dogma da Assunção de Maria ao céu. Mas a extensão da infalibilidade permanece motivo de debate entre os teólogos. A posição de Küng é clara: ele quer que esse dogma seja abolido ou que passe por uma revisão radical. Já o fato de que Francisco não pôs um limite para a discussão, segundo o teólogo, já é uma boa notícia: “Eu acho que agora é indispensável usar esta nova liberdade para levar adiante a reflexão sobre as definições dogmáticas que são uma fonte de polêmica dentro da Igreja Católica e no seu relacionamento com outras igrejas cristãs. “