EU PODERIA, SE QUISESSE

caminhosA nossa vontade não é bastante firme; e essa é a origem de quase todos os nossos defeitos. Se o fosse mais, bem depressa seríamos perfeitos … Calígula, o tirano de Roma, exaclamava um dia: “Quisera que todos os Romanos reunidos só tivessem uma cabeça, para fazê-la abater de um só golpe!” – Pois bem! tu também só tens uma cabeça para abater; e essa cabeça é a fraqueza da tua vontade.

Ouço com frequência moços que me dizem: “Ora, eu bem poderia fazer isto ou aquilo, se quisesse”. – Se eu quisesse … Sempre esse “se”.

Mas esses jovens que pretendem ter vontade nunca tentam dela servir-se. Entretanto, essa tentativa testemunharia que eles a têm verdadeiramente. Parecem as caricaturas de soldados que têm sempre o fuzil no rosto, semblante terrível, como a dizer: “Atiro já, já!”, e com os quais ninguém se assusta, porque eles não atiram nunca. – “Eu poderia, se quisesse”. “Se … se … Ah! se esse se não existisse! …

Nenhuma arte reclama tanta sagacidade como a formação de nossa alma, pois nossa alma é mais nobre do que o mais puro mármore e o mais precioso metal.

Já te falaram, de certo, algumas vezes, do livre arbítrio do homem. Receio que não o tenham feito bastante. Pois bem, sim, a vontade humana é livre, mas é fraca também; e a tua é como a dos outros, a não ser que desde cedo a exercites. Uma vontade firme não é um presente do céu que achamos no berço; é um tesouro raro que cada um de nós deve comprar a preço de lutas incessantes. Seria, pois, ridículo imaginar que a nossa pode tornar-se assim firme, de um dia para outro … ridículo exclamar num momento de entusiasmo: “A partir de hoje, quero ter uma vontade de ferro! …”. Essa vontade de ferro, nunca a tingiremos, a não ser por um trabalho aturado e assíduo.

A força de vontade mede-se pelos esforços que cada qual desenvolve para alcançar esse tesouro, pelas violências que faz a si próprio, a fim de subtrair-se ao império dos sentidos. Consiste na disciplina, no dmínio dos sentimentos elevados da alma sobre os desejos materiais do corpo. A tua vontade assemelha-se a um grão semeado na alma. Se o cuidares, e o ajudares a desenvolver-se, virá a ser um carvalho possante que resistirá a todas as tempestades. Mas, se o descurares, as formigas dos teus pequenos defeitos hão de roê-lo e fazê-lo apodrecer. A liberdade moral só pode ser a recompensa de miu´dos esforços que não esmorecem, de um trabalho lento, e emenda contínua. A maioria dos homens recuam diante deste trabalho austero, que exige esforços quotidianos. A empreendê-lo, preferem eles ficar sob o jugo do pecado.

“Eu poderia, se quisesse …”. Tenta, pois, querê-lo! Se queres tornar-te homem sério, é por aí que hás de começar. O “quisera” e o “quero” diferem um do outro como cachorrinhos amimados no colo de senhoras idosas diferem dos bons cães de guarda. Os primeiros não sabem nem ladrar, nem morder, nem ser úteis, de qualquer modo; só sabem comer e gemer; e, com isso, são caros de sustentar. Os segundos não gemem, porém ladram com toda a força, e, quando preciso, não hesitam em fincar os dentes no calcanhar do visitante importuno. Assim, o jovem que tem vontade não se queixa, porém late bem alto contra as tentações do pecado; morde-as mesmo com todos os dentes, para impedi-las de fazerem o mal; e só as larga quando alcança o seu objetivo.

Como sucede isso? Exatamente como o dissemos acima. Faço-te, por exemplo, esta pergunta: “Queres ser o primeiro de tua classe?” – “Quero!”, respondes-me. Pois bem , dize então incontinenti: “Avante!”, isto é: “Começo imediatamente a aprender minha lição de amanhã!”. Mas imediatamente, sem demora, sem esperar pela pr´xima semana! … E depois, direito, esquerdo, direito, esquerdo, direito, esquerdo, vamos, ao assalto da lição! Tua mesa de trabalho é a bigorna em que forjas a tua boa ou má fortuna para o porvir.

Queres ser fiel às tuas orações? “Quero!”. Então, cmeçarás desde hoje, desde esta noite. – “Mas há tarefas que fazer!” Não importa! Podes sempre tomar cinco minutos do teu dia! – “E, pela manhã, cumpre que me apresse para não chegar atrasado à escola!”. Nunca me farás acreditar que não podes levantar dez minutos mais cedo!

O moço de caráter – Dom Tihamer Toth