NÓS CATÓLICOS NÃO PODEMOS APOIAR A CRIAÇÃO DE UM TERCEIRO TEMPLO EM JERUSALÉM

O ministro israelense Ben-Gvir visita o Monte do Templo em Jerusalém

Artigo postado originalmente em Lifesitenews

Traduzido pelo excelente Verbum Fidelis

Entre as consequências da campanha militar de Israel em Gaza, que já dura mais de um ano, está um entusiasmo renovado entre judeus e sionistas cristãos pela construção do chamado “terceiro templo” em Jerusalém.

Em agosto passado, por exemplo, o ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, de extrema direita, visitou o Monte do Templo (pela sexta vez), onde reivindicou o direito dos judeus de orar no local e construir uma sinagoga. O jornal israelense Haaretz, que cobriu o evento, chamou-o de um “ato ardiloso”, ocultando o objetivo de longo prazo de destruir as estruturas islâmicas no Monte do Templo e construir o terceiro templo.(1)

No início do ano passado, em uma entrevista na televisão, um membro de extrema direita do Knesset endossou a construção do terceiro templo onde “poderemos comer (…) dos sacrifícios da Páscoa”(2). Após a eleição presidencial de novembro nos EUA, Yosef Berger, o rabino responsável pelo local da Tumba do Rei Davi, declarou que “Como Ciro, Deus colocou Donald Trump no poder para construir o Templo e preparar o caminho para o moshiach [messias] (3).

Nas fileiras americanas, os jornalistas descobriram um discurso de 2018 de Pete Hegseth, o novo secretário de Defesa de Donald Trump, no qual ele parecia endossar o “milagre do restabelecimento do templo”(4). A revista Jewish Currents observou recentemente que republicanos notáveis, como o ex-vice-presidente Mike Pence, o deputado Jim Jordan e o governador da Flórida Ron DeSantis, se reuniram com membros de organizações kahanistas radicais, que fazem parte da espinha dorsal do movimento do terceiro templo de Israel(5).

Certamente a cobertura jornalística desde outubro de 2023 concentrou-se na terrível campanha de Gaza, seguida pelo cessar-fogo de janeiro de 2025, que entrou em vigor um dia antes da segunda posse de Trump. Durante esse tempo, a possível construção de um terceiro templo não passou de uma nota jornalística. No entanto, em círculos restritos, o interesse israelense em construir o terceiro templo agora parece estar no mesmo nível da demolição de Gaza, da anexação da Cisjordânia e até mesmo de uma barata tomada de terras na Síria.

Sob o novo governo Trump, fortemente pró-sionista, há a possibilidade de que os Estados Unidos endossem — ou pelo menos não se oponham — a uma iniciativa israelense de construir o terceiro templo(6). Além das imensas ramificações internacionais de tal ato, o católico — e qualquer cristão sério — deve considerar suas consequências morais e espirituais.

Se alguém fosse julgar o empreendimento sionista de Israel pelos dois grandes mandamentos de Cristo (amor a Deus e amor ao próximo), ele receberia notas baixas em ambos os quesitos (não que os Estados Unidos ou a maioria dos países se saíssem melhor). Entretanto, a construção do terceiro templo, com sua aparente retomada da lei mosaica e do sacrifício de animais, representa uma afronta ao céu, pois caracteriza uma rejeição aberta à redenção de judeus e gentios por Jesus Cristo. Isso é qualitativamente diferente dos muitos outros pecados institucionais da humanidade nos últimos dois mil anos. E à medida em que os gentios não se opõem ao templo, eles o apoiam(7). As ações de Deus e dos judeus ao longo da história com relação ao conceito de um “templo” são intrigantes e merecem uma análise mais detalhada.

Este artigo, embora não seja de forma alguma exaustivo, propõe-se a oferecer alguns insights sobre o conceito de “templo” como um elemento-chave na história da salvação, que ainda está acontecendo hoje, possivelmente em direção a um clímax perigoso.

O Templo de Salomão

A história do planejamento do primeiro templo (sob Davi) e sua construção (sob Salomão) está espalhada em vários livros do Antigo Testamento, incluindo 2 Samuel, 1 e 2 Crônicas e 1 Reis.

Concepção artística do templo de Salomão. Ele continha os objetos mais sagrados para o povo judeu, incluindo a Arca da Aliança e as tábuas dos Dez Mandamentos, ambos perdidos para a história após o saque de Jerusalém pelos babilônios por volta de 586 a.C. (Crédito: Wikicommons)

No entanto, a base divina para o templo, sua aquisição por Davi e sua localização são reveladas em um curto capítulo. O capítulo 24 do segundo livro de Samuel começa com um relato da decisão de Davi de fazer um censo no auge de seu reinado — um ato de orgulho pelo qual Deus puniu o povo judeu com uma praga em toda a terra:

Mandou, pois, o Senhor a peste a Israel, desde aquela manhã até ao tempo assinalado, morrendo do povo, desde Dan até Bersabé, setenta mil homens. Tendo estendido o anjo do Senhor a sua mão sobre Jerusalém para a destruir, o Senhor compadeceu-se da sua aflição e disse ao anjo exterminador do povo: Basta, detém agora a tua mão. O anjo do Senhor estava junto da eira de Arauna Jebuseu. Davi, logo que viu o anjo ferindo o povo, disse ao Senhor: Eu sou o que pequei, eu fui o que procedi mal; que fizeram estes, que são as ovelhas? Volte-se, te peço, a tua mão contra mim, e contra a casa de meu pai. (2Sam. 24, 15-17)

Nesse ponto, o autor do segundo livro de Samuel, tendo transmitido o remorso de Davi por seu pecado, muda abruptamente de assunto:

Gad foi naquele dia ter com Davi, e disse-lhe: Vai, e levanta um altar ao Senhor na eira de Arauna Jebuseu.E Davi foi, conforme o que Gad lhe tinha dito, por ordem do Senhor. Tendo Arauna levantado os olhos, viu que vinham para ele o rei e os seus servos, e, adiantando-se, fez ao rei uma profunda reverência, prostrado o rosto em terra, e disse: Que motivo há para que o rei meu senhor venha a casa do seu servo? Davi respondeu-lhe: Para comprar a tua eira e edificar nela um altar ao Senhor, para que cesse a mortandade que grassa no povo. Arauna disse a Davi: Tome-a o rei meu senhor, e sacrifique como bem lhe parecer; eis aqui estão bois para o holocausto um carro e jugos de bois que servirão de lenha. Arauna deu tudo ao rei. Arauna disse mais ao rei: O Senhor teu Deus receba o teu voto. O rei respondeu-lhe: Eu não posso receber o que tu me ofereces, mas comprar-te-ei pelo que vale, e não oferecerei ao Senhor meu Deus holocaustos que me não custem nada. Comprou, pois, Davi a eira e os bois por cinquenta siclos de prata. Davi edificou ali um altar ao Senhor, e ofereceu holocaustos e hóstias pacíficas. O Senhor compadeceu-se da terra, e cessou o flagelo que assolava Israel. (2 Sam 24, 18-25).

O que podemos concluir desse capítulo?

É claro que o “altar ao Senhor” que Davi se propôs a comprar de Arauna se tornaria o templo de seu filho Salomão no devido tempo. E foram os “holocaustos e ofertas pacíficas” no templo que aplacariam a ira divina, pelo menos até certo ponto. Podemos inferir, pelo estímulo do profeta Gad, que o templo foi ideia de Deus, não de Davi. Na verdade, ele parece ser um presente de Deus para Davi em troca de seu arrependimento sincero.

Portanto, o primeiro templo não nasceu de uma vitória militar, como a conquista das terras árabes em 1967 (ou 2025?). Certamente Davi teve muitas vitórias, se esse fosse o critério de Deus. Tampouco nasceu do orgulho ou da prosperidade (veja abaixo uma discussão sobre o templo de Herodes). Em vez disso, o primeiro templo foi o produto da misericórdia de Deus combinada com a contrição e a humildade de Davi. Um segundo ponto é que Davi recusou a eira como um presente gratuito de Arauna; em vez disso, ele insistiu em pagar algo semelhante ao “valor justo de mercado” pela propriedade. Novamente vemos um contraste com o terceiro templo proposto. Os israelenses, apesar de toda a sua riqueza, nunca demonstraram interesse em comprar o Monte do Templo do governo da Jordânia ou de seu Waqf islâmico em Jerusalém, ou de fornecer uma compensação(8). Em vez disso, a suposição generalizada dentro do universo sionista é que Israel possui a propriedade (mesmo antes de sua captura em 1967) com base simplesmente nas Sagradas Escrituras. Mas Israel não pode ter as duas coisas: não pode reivindicar um direito divino à terra com base nos escritos milenares dos profetas hebreus e, ao mesmo tempo, afirmar as proteções do direito internacional moderno para suas outras ações.

Aprendemos mais sobre o primeiro templo e o plano divino por trás dele em outros versículos do Antigo Testamento.

No segundo livro das Crônicas, capítulo 3, versículo 1, descobrimos que o local escolhido por Davi para o templo, a eira dos jebuseus, ficava “no Monte Moriá”. Isso é mencionado apenas uma outra vez nas Escrituras (Gênesis 22, 2), quando Deus orientou Abraão a sacrificar seu filho Isaque em uma montanha na “terra de Moriá”. Portanto, a própria localização do templo era importante para Deus por causa do ato supremo de amor e obediência de Abraão a Deus cerca de mil anos antes.

Em segundo lugar, parece que Deus proibiu Davi de ter o privilégio de construir o templo, por causa de seu passado guerreiro. Como o próprio Davi diz em 1Crônicas 28, 3: “Deus, porém, disse-me: ‘Tu não edificarás uma casa ao meu nome, porque és um homem guerreiro, tens derramado sangue’”(9). Em vista dessa declaração da Torá, como os líderes do Israel moderno, um dos estados mais militaristas do mundo, podem acreditar que o Senhor agora os está chamando para honrá-Lo com um templo, sendo que este foi um privilégio que Ele negou a Davi?

Por fim, é preciso observar que o Templo de Salomão foi principalmente, mas não exclusivamente, um projeto judeu. Embora Arauna, o jebuseu, tenha fornecido o terreno, havia também milhares de trabalhadores, inclusive artesãos qualificados sob os auspícios do rei Hiram de Tiro, que contribuíram para a construção. Sabemos, pela genealogia de Cristo, que alguns de seus antepassados não eram judeus, especialmente as mulheres Tamar e Raabe (ambas cananeias), Rute (moabita) e Bate-Seba, que legalmente era hitita(10). Por que deveríamos nos surpreender ao ver que o templo que Deus ordenou que fosse construído também deveria envolver os gentios?

O templo de Salomão, construído aproximadamente em 966 a.C., durou cerca de 400 anos. Esse era o templo conhecido por Isaías, Ezequiel e Jeremias, todos os quais fizeram severas advertências ao povo judeu sobre o arrependimento de seus maus caminhos. Jeremias, que profetizou a destruição de Jerusalém em sua própria vida, fez uma forte repreensão a seus compatriotas no próprio portão do templo:

Eis o que diz o Senhor dos exércitos, o Deus de Israel: Tornai bons os vossos caminhos e as vossas obras, e eu habitarei convosco neste lugar. Não ponhais a vossa confiança em palavras de mentira (dos) que dizem: É este o templo do Senhor, o templo do Senhor, o templo do Senhor! Mas se dirigirdes bem os vossos caminhos, se emendardes as vossas obras, se fizerdes justiça aos que pleiteiam entre si, se não oprimirdes o peregrino, o órfão e a viúva, nem derramardes o sangue inocente neste lugar, se não andardes após os deuses alheios, para vossa desgraça, então habitarei convosco neste lugar, nesta terra que dei a vossos pais, pelos séculos dos séculos. Contudo, eis que confiais, para vosso mal, em palavras de mentira, que vos não servirão para nada. Pois quê! Furtar, matar, adulterar, jurar falso, sacrificar a Baal e ir após os deuses estranhos, que não conheceis, e (depois disto) vir à minha presença nesta casa, onde o meu nome é invocado, e dizer: Estamos livres (de todo o mal) – com a ideia de continuar a cometer todas estas abominações! Logo, esta minha casa, onde é invocado o meu nome, é, a vossos olhos, um covil de ladrões? Eu, eu também vi (as vossas abominações), diz o Senhor. Ide ao meu santuário, a Silo, onde habitou o meu nome, a princípio, e vede o que eu lhe fiz por causa da malícia do meu povo de Israel. E agora, porque tendes feito todas estas obras, diz o Senhor, e porque, quando vos falei e avisei com tempo, não me ouvistes, quando vos chamei, não me respondestes, farei a esta casa onde o meu nome é invocado e na qual pondes a vossa confiança, a este lugar, que vos dei a vós e a vossos pais, (farei, digo) o mesmo que fiz a Siló; (Jer. 7, 3-14)

Siló, que já foi o lar da tenda ou santuário que abrigava a Arca da Aliança, havia sido reduzida a ruínas na época de Jeremias(11).

Em 586 a.C., o Senhor permitiu que os babilônios, sob o comando do rei Nabucodonosor, conquistassem o Reino de Judá, capturando Jerusalém e destruindo o magnífico templo de Salomão, com a Arca da Aliança. Hoje, a evidência arqueológica do majestoso templo de Salomão é “quase nula”. De acordo com a BBC, por exemplo, “[a] única evidência é a Bíblia. Não há outros registros que o descrevam e, até o momento, não há nenhuma evidência arqueológica do Templo”(12). Com as dez tribos perdidas de Israel já desaparecidas na história, as duas tribos restantes, Judá e Benjamim, começaram um exílio de mais de 40 anos na Babilônia, pois a nação judaica não existia mais.

O Segundo Templo

Nos misteriosos caminhos de Deus, os judeus tiveram uma segunda chance na Terra Prometida, graças à conquista da Babilônia pelos persas em 539 a.C.

O rei persa Ciro emitiu um édito autorizando os judeus cativos não apenas a retornar à sua terra natal, mas também a reconstruir seu templo em Jerusalém, com os vasos do templo que haviam sido capturados pelos babilônios. Vale ressaltar que o interesse atual na construção de um terceiro templo gerou uma comparação bizarra entre Donald Trump e o rei Ciro.

A política externa fortemente pró-sionista de Trump durante seu primeiro governo, especialmente o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel em 2017, criou uma aparente semelhança com o antigo rei persa, pelo menos entre judeus e sionistas cristãos. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, endossou publicamente essa comparação. Por sua vez, alguns sionistas cristãos começaram a considerar Trump como uma espécie de instrumento divino, por mais imperfeito que seja (não há problema nisso!), que realiza a vontade de Deus para a preservação de Seu povo escolhido(13). A reputação de Ciro como um instrumento divino parece garantida; o livro deuterocanônico de 1 Esdras afirma que “o Senhor suscitou o espírito de Ciro, rei da Pérsia, o qual mandou fazer em todo o seu reino, de viva voz e por escrito, a seguinte proclamação:’Assim fala Ciro, rei da Pérsia: O Senhor, Deus do céu, deu-me todos os reinos da terra e encarregou-me de construir-lhe um templo em Jerusalém, que fica na terra de Judá’” (Esd. 2, 1-2). Quanto a Trump, embora existam documentos da Casa Branca para suas muitas decisões pró-Israel como presidente, nenhum deles cita a vontade de Deus como um fator.

A paixão dos judeus por um terceiro templo aumentou drasticamente após o início da primeira presidência de Donald Trump em 2017. O “Sinédrio” moderno em Israel cunhou uma réplica de um meio-shekel de prata apresentando Trump com o rei persa Ciro e o primeiro-ministro britânico Arthur Balfour, autor da Declaração de Balfour exatamente cem anos antes. (Crédito: temple-coins.com)

Ao retornarem à Judeia, os judeus começaram a reconstruir seu templo sob a liderança de Zorobabel, que havia nascido na Babilônia durante o exílio. O novo templo, finalmente dedicado em 515 a.C., era uma imitação pobre de seu antecessor, dada a pobreza que se abateu sobre os judeus durante o exílio.

No livro de Esdras, capítulo 3, versículo 12, é relatado o choro dos anciãos na cerimônia de dedicação, presumivelmente porque eles reconheceram a inferioridade do segundo templo em comparação com o original(14). No entanto, o templo de Zorobabel duraria quase até a época de Cristo. Durante essa época, a Judeia gradualmente se helenizou e também foi reduzida a um peão por vizinhos mais fortes, como os persas, os ptolomeus e os selêucidas. Foi o templo de Zorobabel que foi profanado por volta de 169 a.C. pelo infame rei Antíoco IV Epífanes da Síria.

De acordo com um historiador grego, Antíoco “sacrificou um grande porco à imagem de Moisés e ao altar de Deus que ficava no pátio externo e os aspergiu com o sangue do sacrifício. Ele ordenou também que os livros, com os quais eles eram ensinados a odiar todas as outras nações, fossem borrifados com o caldo feito de carne de porco. E apagou a lâmpada (chamada por eles de imortal) que ardia continuamente no templo. Por fim, obrigou o sumo sacerdote e os outros judeus a comerem carne de porco”(15). Esse incidente ultrajante, também documentado como o ‘horror terrível’ ou ‘abominação da desolação’ no livro deuterocanônico 1 Macabeus, tornou-se o ímpeto para a revolta macabeia, um dos episódios mais célebres da história judaica. No entanto, o triunfo macabeu foi apenas temporário. Cerca de cem anos depois (63 a.C.), o templo de Zorobabel testemunhou uma humilhação final quando o general romano Pompeu conquistou Jerusalém. A captura do monte do Templo por Pompeu “foi acompanhada de grande matança. Os sacerdotes que estavam oficiando apesar da batalha foram massacrados pelos soldados romanos, e muitos cometeram suicídio; além disso, 12.000 pessoas foram mortas. O próprio Pompeu entrou no Templo, mas ficou tão impressionado com sua santidade que deixou o tesouro e os vasos caros intocados”(16).

O Templo de Herodes

Na época da profanação do templo por Pompeu, o futuro rei Herodes, o Grande, tinha nove anos de idade.

Em 40 a.C., o Senado romano nomeou Herodes como rei da Judeia, onde se esperava que ele representasse os interesses romanos. Em voga em sua época, Herodes provou ser um dos grandes construtores da antiguidade(17).

Sua obra-prima foi um novo templo, projetado para substituir perfeitamente o templo de Zorobabel, agora com 500 anos de idade (talvez porque o templo de Zorobabel não tenha sido realmente destruído, mas efetivamente “reformado e ampliado”; de acordo com a Wikipédia, o termo “segundo templo” tem sido aplicado historicamente a ambas as estruturas)(18). De qualquer forma, Herodes reconstruiu o segundo templo a partir do zero, com mármore e ouro. O edifício principal tinha mais de quinze andares e sua fundação incluía blocos de calcário de 500 toneladas(19).

Um projeto tão elaborado, incluindo os pórticos circundantes, os pátios e o restante do complexo, levou cerca de 80 anos para ser concluído, muito além do tempo de vida do próprio Herodes. Quando Herodes anunciou a iniciativa pela primeira vez (por volta de 20 a.C.), ele se gabou de que seria “a mais gloriosa de todas as suas ações” e serviria como “um memorial eterno dele”, de acordo com o historiador judeu Flávio Josefo. Da mesma forma, Herodes lembrou arrogantemente a seus súditos que “com a ajuda de Deus, eu levei a nação dos judeus a um grau de felicidade que eles nunca tiveram antes”(20).

Na época de sua conclusão, em 63 d.C., apenas sete anos antes de sua destruição total pelo general romano Tito, Josefo pôde testemunhar sua magnificência da seguinte forma: “Ora, a face externa do templo, em sua frente, não tinha nada que pudesse surpreender a mente ou os olhos dos homens, pois era toda coberta com placas de ouro de grande peso que, ao nascer do sol, refletiam um esplendor muito ardente e faziam com que aqueles que se forçavam a olhar para ele desviassem os olhos, como teriam feito com os raios do próprio sol. Mas este templo parecia aos estranhos, quando se aproximavam dele à distância, como uma montanha coberta de neve; pois as partes dele que não eram douradas eram extremamente brancas”(21). O complexo do templo de Herodes não era apenas grandioso, mas enorme. As estimativas modernas são de que todo o monte do templo tinha cerca de 36 acres, aproximadamente o dobro do tamanho do templo original de Salomão e do Fórum de Trajano em Roma(22). Apesar de sua majestade, no entanto, a sala mais interna do templo (o Santo dos Santos) estava vazia, já que a Arca da Aliança e seus dois querubins de ouro que a acompanhavam haviam desaparecido há muito tempo.

Na época de Cristo, a realização de sacrifícios no templo era um setor importante. Como observa o autor Paul Johnson, “muitos milhares de sacerdotes, levitas, escribas e judeus piedosos trabalhavam na área do templo e em seus arredores”. Os sacerdotes eram responsáveis pelos sacrifícios de animais e outros rituais. De acordo com Aristeas, um peregrino judeu de Alexandria, cerca de 700 sacerdotes se dedicavam a “realizar os sacrifícios, trabalhando em silêncio, mas manuseando as pesadas carcaças com habilidade profissional e colocando-as exatamente na parte certa do altar”. Devido ao grande número de animais, o abate, a sangria e o corte das carcaças tinham que ser feitos rapidamente; e para se livrar das grandes quantidades de sangue, a plataforma não era sólida, mas oca, um gigantesco sistema de limpeza” contendo 34 cisternas. Várias aberturas traziam água das cisternas, enquanto os drenos levavam as torrentes de sangue, de modo que “todo o sangue era coletado em grandes quantidades e lavado em um piscar de olhos”(23).

O templo, Cristo e sua Mãe

O templo de Herodes foi o cenário de vários eventos importantes na vida de Cristo, começando com sua apresentação e circuncisão logo após o nascimento. No entanto, vamos considerar primeiro a “purificação do templo” feita por Cristo no primeiro ano de seu ministério público, conforme registrado por São João. Após a expulsão de Cristo dos mercadores e cambistas:

Tomaram então a palavra os Judeus, e disseram-lhe: “Com que sinal nos mostras tu que tens autoridade para fazer estas coisas?” Jesus respondeu-lhes: “Destruí este templo, e o reedificarei em três dias.” Replicaram os Judeus: “Este templo foi edificado em quarenta e seis anos, e tu o reedificarás em três dias?” Ora ele falava do templo de seu corpo. (Jo. 2, 18-21)

Obviamente Jesus não tinha 46 anos de idade nessa época e a referência a 46 anos pode não ter nenhum outro significado. No entanto, os escribas bíblicos, e especialmente João, frequentemente têm significados ocultos em seus textos que faríamos bem em explorar.

Já que os 46 anos não se referem ao próprio Cristo, será que poderiam se referir ao corpo de Sua Mãe? As revelações de Maria à Beata Maria de Ágreda (autora de A Mística Cidade de Deus), embora não pretendam responder a essa pergunta diretamente, fornecem um nível fascinante de detalhes sobre a vida da Santíssima Virgem e de Seu Filho divino. Nesse caso, podemos considerar o texto fornecido no final da vida de Maria, que afirma que “…quando Cristo, nosso Salvador, nasceu, sua mãe virginal tinha quinze anos, três meses e dezessete dias de idade”(24).

Embora não saibamos a idade de Cristo nesse momento inicial de seu ministério público, não é inconcebível que os judeus estivessem se referindo, sem saber, à idade de Sua Mãe Santíssima. Em outras palavras, enquanto Herodes e seus entusiastas seguidores judeus lançavam seu projeto terreno de um novo e grandioso templo, não poderia o próprio Deus estar introduzindo simultaneamente a nova aliança por meio da Imaculada Conceição (ou nascimento) de Maria? Será que Maria talvez fosse o verdadeiro novo templo ou até mesmo a Arca da Aliança definitiva, que era o objeto mais sagrado do templo original?(25) A resposta a essa pergunta aguarda a eternidade.

De fato, os escritos de Maria de Ágreda estão repletos de referências à Santíssima Virgem como o novo templo e/ou a nova Arca da Aliança no plano divino da salvação. Seguem alguns exemplos:

(1) Antes da Anunciação, a preparação de Maria por Deus para sua grande missão a descreve como um templo.

Para dar o último toque a essa prodigiosa obra de preparação de Maria Santíssima, o Senhor estendeu seu braço poderoso e renovou expressamente o espírito e as faculdades da grande Senhora, dando-lhe novas inclinações, hábitos e qualidades, cuja grandeza e excelência são inexprimíveis em termos terrestres. Foi o ato de acabamento e o retoque final da imagem viva de Deus, a fim de formar, nela e dela, a própria forma na qual o Verbo eterno, a imagem essencial do Pai eterno (2 Cor. 4, 4) e a figura de sua substância (Heb. 1, 3), deveria ser moldado. Assim, todo o templo de Maria Santíssima, mais do que o de Salomão, foi coberto com o ouro mais puro da Divindade, por dentro e por fora (1Rs. 6, 30), de modo que em nenhum lugar se podia ver nela qualquer grosseria de uma filha terrena de Adão. Todo o seu ser foi feito para resplandecer a Divindade, pois como o Verbo divino deveria sair do seio do Pai eterno para descer ao seio de Maria, Ele providenciou a maior semelhança possível entre a Mãe e o Pai.(26)

(2) Da mesma forma, na Visitação, sua prima Elizabeth se refere a Maria como um templo e como a nova Arca da Aliança.

A fim de encontrar algum consolo, Santa Elisabeth resolveu abrir seu coração à Senhora celestial, que, no entanto, não ignorava sua tristeza; e disse a Ela com grande submissão e humildade: “Prima, querida Senhora, por causa do respeito e da consideração com os quais sou obrigada a te servir, não ousei até agora falar de meu desejo e da tristeza em meu coração; dê-me agora a permissão de aliviá-los, tornando-os conhecidos. O Senhor, em sua misericórdia, condescendeu em enviar-te até aqui, para que eu pudesse ter a bênção imerecida de conversar contigo e de conhecer os mistérios que sua divina Providência confiou a ti, minha Senhora. Não sou digno de louvá-Lo eternamente por esse favor: “Tu és bem-dito sobre o trono do teu reino, digno do máximo louvor e exaltação, por todos os séculos” (Dan. 3, 53). Tu és o templo vivo da sua glória, a arca do Testamento, contendo o Maná, que é o alimento dos anjos” (Heb. 9, 4). “Tu és a tábua da verdadeira lei, escrita no seu próprio Ser” (Salmos 77, 25).(27)

(3) Após a Ascensão de Nosso Senhor, ficamos sabendo do papel singular desempenhado por Maria nos primeiros dias da Igreja, em cumprimento à promessa de Cristo de que “Eu estarei convosco convosco todos os dias…” (Mt 28, 20).

[Jesus] permaneceu sacramentalmente presente em sua Mãe desde a última Ceia, conforme relatado acima. Mas isso não teria sido inteiramente cumprido após sua Ascensão, se Ele não tivesse realizado esse novo milagre na Igreja; pois naqueles primeiros anos os Apóstolos não tinham um templo ou um arranjo adequado para preservar continuamente a Sagrada Eucaristia e, portanto, eles sempre a consumiam inteiramente no dia de sua consagração. Somente Maria Santíssima era o santuário e o templo, no qual, por alguns anos, o Santíssimo Sacramento foi preservado, a fim de que a Igreja de Cristo não fosse privada, nem por um momento, do Verbo feito carne, desde o momento em que Ele ascendeu ao céu até o fim do mundo. Embora não estivesse presente naquele Tabernáculo para o uso dos fiéis, estava ali para o benefício deles e para outros fins mais gloriosos, já que a grande Rainha oferecia suas orações e intercessões por todos os cristãos no templo de seu próprio coração e adorava o Cristo sacramental em nome de toda a Igreja, enquanto que, por sua habitação naquele seio virginal, Cristo estava presente e unido ao corpo místico dos fiéis. Acima de tudo, essa grande Senhora foi a causa da suprema felicidade daquela época; pois, ao abrigar assim em seu seio seu Filho e Deus sacramental, assim como Ele está agora abrigado nos santuários e tabernáculos, Ele foi continuamente adorado com a mais alta reverência e piedade pela Maria Santíssima, e nunca foi ofendido, como Ele é agora, em nossas igrejas”.(28)

(4) Finalmente, Maria de Ágreda nos oferece este comentário inspirado sobre a morte de Maria:

Então essa alma puríssima passou de seu corpo virginal para ser colocada em glória sem limites, no trono à direita de seu divino Filho. Imediatamente a música dos anjos pareceu se retirar para o ar superior, pois toda aquela procissão de anjos e santos acompanhou o Rei e a Rainha até os céus empíreos. O corpo sagrado de Maria Santíssima, que havia sido o templo e o santuário de Deus em vida, continuou a brilhar com uma luz resplandecente e exalava uma fragrância tão maravilhosa e inaudita, que todos os espectadores se encheram de doçura interior e exterior.(29)

Coletivamente, essas referências, entre muitas outras, devem nos levar a considerar que, com a vinda do Redentor e sua nova e eterna Aliança, o conceito original de um templo físico foi substituído por algo muito mais sublime, que necessariamente está no reino espiritual.

A destruição do templo de Herodes

Voltando à saga do templo de Herodes, durante a vida de Cristo ele já havia se tornado não apenas o foco religioso da aliança mosaica, mas também o centro político, social, cultural e até mesmo econômico da vida judaica.

Quando Jesus foi questionado por seus seguidores sobre a magnificência do complexo do templo, o Evangelho de São Mateus (24, 2) registra sua resposta: “Vedes tudo isto? Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra sobre pedra que não seja derribada”(30). A conquista romana de Jerusalém e a destruição do templo que cumpriu essa profecia ocorreria em 70 d.C., cerca de uma geração no futuro. Entretanto, uma pista perturbadora sobre o destino do templo deveria ter alarmado os líderes judeus apenas alguns anos depois, quando eles executaram Cristo, seu tão esperado Messias, como um criminoso comum.

Essa pista, é claro, foi o rasgo do véu do templo em dois, conforme documentado por três dos evangelistas (Mateus 27, 51, Marcos 15, 38, Lucas 23, 45). Quando nos voltamos novamente para Maria de Ágreda, aprendemos que foi o apelo inspirado da Virgem Santíssima a Deus Pai, para proteger a honra de seu (e dela) Filho divino, que causou o rompimento da cortina do templo e outros eventos milagrosos:

Quando a grande Rainha dos anjos, a Santíssima Maria, percebeu que os judeus, em sua perfídia e inveja obstinada, procuravam desonrá-Lo, blasfemá-Lo como o mais perverso dos homens e desejavam apagar seu nome da terra dos vivos, como Jeremias havia profetizado (Jer. 11, 19), Ela se inflamou com um novo zelo pela honra de Seu Filho e verdadeiro Deus. Prostrada diante da pessoa do Crucificado e adorando-o, Ela suplicou ao Pai eterno que zelasse pela honra de seu Unigênito e a manifestasse por meio de sinais tão evidentes que a perfídia dos judeus pudesse ser confundida e sua malícia frustrada em seu intento. Depois de apresentar essa petição ao Pai, Ela, com o zelo e a autoridade da Rainha do universo, dirigiu-se a todas as criaturas irracionais e disse: ‘Criaturas insensíveis, criadas pela mão do Todo-Poderoso, manifestais vossa compaixão, que, em uma loucura mortal, é negada a Ele por homens capazes de raciocinar. Vós, céus, sol, lua e vós, estrelas e planetas, parai em vosso curso e suspendei vossa atividade em relação aos mortais. Vós, elementos, mudai vossa condição, a terra perde vossa estabilidade, deixai que vossas rochas e penhascos se rasguem. Vós, sepulcros e monumentos dos mortos, abri e enviai vossos conteúdos para a confusão dos vivos. Vós, véu místico e figurativo do templo, dividi-vos em duas partes e, com vossa separação, ameaçai os incrédulos com castigo, dai testemunho da verdade e da glória de seu Criador e Redentor, que eles estão tentando obscurecer’.(31)

Em 66 d.C., o atrito contínuo entre os judeus e Roma resultou em uma invasão da Palestina pelos exércitos romanos sob o comando de Vespasiano e seu filho Tito, ambos futuros imperadores. O historiador judeu Josefo, testemunha em primeira mão dessa campanha (e que mudou de lado no meio), deixou-nos um relato detalhado.

A guerra de quatro anos culminou com o cerco romano a Jerusalém, com a destruição de toda a cidade e a queima do templo em agosto de 70 d.C. Assim como o templo de Salomão, mais de seis séculos antes, a obra-prima de Herodes foi totalmente demolida. Josefo registra que Jerusalém “foi tão completamente destruída até o chão por aqueles que a escavaram até o alicerce, que não restou nada que fizesse com que aqueles que chegassem lá acreditassem que ela já havia sido habitada. Esse foi o fim a que Jerusalém chegou pela loucura dos que eram a favor de inovações; uma cidade que, de outra forma, seria de grande magnificência e de grande fama entre toda a humanidade”(32). É importante observar que o avanço das legiões romanas sobre Jerusalém levou os cristãos a fugirem para a cidade de Pela, na margem leste do Jordão. Assim, eles foram poupados do terrível destino dos defensores judeus. Os cristãos estavam bem cientes das palavras de advertência de Cristo: “Mas quando virdes que Jerusalém é sitiada por exércitos, então sabei que está próxima a sua desolação. Os que então estiverem na Judeia, fujam para os montes; os que estiverem no meio da cidade, retirem-se; os que estiverem nos campos, não entrem nela; porque estes são dias de vingança, para que se cumpram todas as coisas que estão escritas. Ai das mulheres grávidas, e das que amamentarem naqueles dias! porque haverá grande angústia sobre a terra, e ira contra este povo. Cairão ao fio da espada, serão levados cativos a todas as nações, e Jerusalém será calcada pelos gentios, até se completarem os tempos dos gentios” (Lucas 21, 20-24).(33)

Destruição do templo de Herodes em agosto de 70 d.C. O metódico cerco romano a Jerusalém durou cinco meses e causou fome em massa entre os desesperados defensores judeus (Crédito: Wikicommons)

Ao contrário dos judeus, os cristãos sabiam que seu reino — o Reino de Deus — não estava nos imóveis da Palestina, mas na Igreja, em seus sacramentos e no coração dos fiéis. Como se as ações das legiões de Tito não fossem suficientes para cumprir a profecia de Cristo, o imperador Adriano acrescentou mais um insulto várias décadas depois. Em suas viagens pelo império oriental em 130 d.C., Adriano ordenou que toda a cidade de Jerusalém fosse reconstruída em estilo romano com um nome romano — Aelia Capitolina — e que o templo de Javé fosse substituído por um templo para o deus pagão Zeus. Certamente, Jerusalém já estava “calcada pelos gentios”.

Por falar em templos

À medida que a pequena semente do cristianismo se expandia, no primeiro século d.C., da Judeia para o grande mundo mediterrâneo, ela se beneficiava de inúmeros milagres realizados pela Santíssima Virgem. Mais uma vez, vemos que as revelações documentadas por Maria de Ágreda no século XVI fornecem detalhes intrigantes. Consideraremos brevemente a experiência de São Tiago (irmão de São João) na Espanha e um incidente durante a estada da Santíssima Virgem em Éfeso. No primeiro caso, o resultado foi a construção de um novo templo (ou seja, uma igreja) dedicado especificamente a Maria como Nossa Senhora do Pilar. No segundo, que ocorreu apenas alguns anos depois, o resultado foi a destruição milagrosa de um templo pagão dedicado à deusa Diana, ou Artemis.

Tiago foi o primeiro dos apóstolos a deixar Jerusalém, segundo a tradição. Cerca de dezessete meses após a paixão e morte de Nosso Senhor, ele seguiu a ordem de Cristo de levar o Evangelho para a longínqua Espanha, onde enfrentou a perseguição dos judeus da diáspora. Cristo, sempre atento às necessidades de seus discípulos, apareceu a Maria e se dirigiu a ela da seguinte forma:

Desejo que você o visite [Tiago] na Espanha, onde ele está pregando em meu nome… Vá a Saragoça, onde ele está agora, e ordene-lhe que volte a Jerusalém [para ser martirizado]. Mas antes que ele deixe aquela cidade, ele deve construir um templo em teu nome e título, onde você será venerada e invocada para o bem-estar daquele país, para minha glória e louvor, e o da Santíssima Trindade”(34).

A Santíssima Virgem então foi milagrosamente para a Espanha e encontrou Tiago em oração às margens do rio Ebro. Os anjos que a acompanhavam traziam consigo ‘uma pequena coluna talhada em mármore ou jaspe e uma imagem não muito grande de sua rainha’. Por ordem de seu Filho, Maria se dirigiu a Tiago da seguinte maneira: ‘Meu filho Tiago, este lugar que o altíssimo e onipotente Deus do céu destinou para ser consagrado por ti na terra para a construção de um templo e casa de oração, onde, sob meu patrocínio e nome, Ele deseja ser glorificado e magnificado, onde os tesouros de sua mão direita serão distribuídos e todas as suas antigas misericórdias serão abertas para os fiéis por meio de minha intercessão, se eles as pedirem com verdadeira fé e sincera piedade. Em nome do Todo-Poderoso, prometo-lhes grandes favores e bênçãos de doçura, bem como minha proteção e assistência, pois essa será minha casa e templo, minha herança e posse. Uma garantia dessa verdade e de minha promessa será esta coluna [pilar] com minha imagem colocada sobre ela. No templo que você construirá para mim, ela permanecerá e será preservada, juntamente com a santa fé, até o fim do mundo. Você começará imediatamente a construir esse templo de Deus e, depois de concluí-lo, partirá para Jerusalém, pois meu Filho divino deseja que você ofereça o sacrifício de sua vida no mesmo lugar em que Ele ofereceu a dele para a salvação da raça humana’.(35)

Essa foi, em resumo, a origem do santuário de Nossa Senhora do Pilar, hoje uma catedral e basílica mundialmente famosa.

Pouco depois desse incidente na Espanha, a Santíssima Virgem, acompanhada por São João, foi conduzida à cidade de Éfeso, onde realizaria outro grande milagre. Como explica Maria de Ágreda, Éfeso era uma cidade que estava sob controle diabólico há séculos. O ponto central eram as amazonas, um grupo de mulheres de inspiração demoníaca que, com o passar do tempo, criaram seu lar em um templo e escolheram uma delas — Diana — como deusa. O templo se tornou o local de atos sexuais imorais e, por fim, Lúcifer “se apropriou da estátua de Diana como assento ou trono de sua maldade”(36).

Enquanto isso, São João apelou para a Santíssima Virgem, percebendo que somente ela poderia agir para impedir a adoração de demônios “naquele lugar abominável”(37). Depois de apelar em oração para seu Filho divino, Maria “ordenou que todos os demônios do templo de Diana descessem imediatamente para as profundezas do inferno e deixassem o lugar, que haviam infestado como se fosse deles por tantos anos”(38). “Após sua vitória, a grande senhora do mundo, com o consentimento de Cristo, nosso Salvador, ordenou imediatamente que um de seus santos anjos fosse ao templo de Diana e o destruísse sem deixar pedra sobre pedra”(39). Em resposta, seu anjo “executou a ordem de sua rainha e senhora e, no mais curto espaço de tempo, o rico e famoso templo de Diana, cujo estabelecimento havia consumido muitas eras, foi reduzido a pó: tão repentina foi sua destruição e ruína que despertou o espanto e o medo dos habitantes de Éfeso”(40). “Esse evento parece ser referenciado no apócrifo Atos de João, que “relata uma história em que o apóstolo João orou no templo, resultando na divisão de seu altar e no colapso de uma parte do templo”(41).

Juntos, esses dois incidentes ilustram a ajuda milagrosa que Cristo forneceu a Seus apóstolos por meio de Sua Santa Mãe nesse momento crítico para a Igreja nascente. No primeiro caso, Cristo recompensou Sua Mãe com um templo (igreja) especialmente reservado em sua honra; ele se tornaria a primeira de milhares de igrejas dedicadas dessa forma. Em um segundo momento, Maria recebeu o poder de destruir milagrosamente um templo de uma falsa deusa. Assim começou a era da Igreja apostólica, quando os templos desapareceram, milagrosamente ou não, e surgiram igrejas em todo o Império Romano.

O Templo de Juliano, o Apóstata

Vamos agora avançar para o século IV para considerar nosso último templo da história.

Ao contrário de todos os outros, esse templo nunca saiu do papel. Foi uma ideia de um sobrinho de 31 anos do grande imperador Constantino, que morreria em batalha contra os persas apenas um ano depois, tendo governado o império por apenas dezenove meses. Ao ser proclamado imperador em 361 d.C., o jovem Juliano revelou ao mundo que havia renunciado à fé cristã e se convertido ao paganismo, adorando os deuses e deusas de seus ancestrais(42). Na verdade, as novas crenças de Juliano eram sincréticas, “absorvendo uma grande variedade de crenças e práticas”. Com efeito, Juliano estava aberto a quase tudo, exceto ao cristianismo, que ele chamava de “doença”(43).

Um esboço de 1877 intitulado “Incêndios subterrâneos derrotam o esforço de Juliano para reconstruir o templo”, iniciado em 19 de maio de 363 d.C. Testemunhado por vários observadores confiáveis, esse evento levou muitos pagãos à fé cristã. (Crédito: Wikicommons)

Além de emitir vários decretos prejudiciais ao cristianismo, ele anunciou seu plano de reconstruir o templo de Jerusalém, que havia sido destruído pelos romanos quase três séculos antes. Em uma carta à comunidade judaica, Juliano declarou que reconstruiria “a cidade sagrada de Jerusalém [incluindo o templo, mencionado em outro lugar], que por tantos anos vós desejardes ver habitada, e [vós] podereis trazer colonos para lá e, juntos, poderão glorificar o Deus Altíssimo nela”(44).

Felizmente, temos várias fontes contemporâneas, tanto cristãs quanto pagãs, que documentaram a tentativa abortada de Juliano de reconstruir o templo em 363 d.C. Entre elas estão os futuros santos Gregório de Nazianzeno e Efrém da Síria, bem como o historiador romano Ammianus Marcellinus. Sabemos que os judeus de Jerusalém abordaram esse projeto com grande entusiasmo; até mesmo as mulheres contribuíram com ornamentos e carregaram a terra com seus vestidos, conforme relatou Gregório.

Efrém observou que os judeus “se enfureceram, deliraram e tocaram as trombetas” e que “todos eles se enfureceram loucamente e não se contiveram”(45). “Apesar desse início auspicioso, o trabalho no templo provavelmente durou apenas alguns dias. Diversos relatos, tanto pagãos quanto cristãos, atribuem a interrupção do trabalho a um incêndio e, talvez, a um terremoto. O historiador romano Ammianus Marcellinus relatou que “bolas de fogo aterrorizantes continuavam a irromper perto das fundações do Templo”, queimando alguns dos trabalhadores até a morte e pondo fim ao empreendimento. Gregório de Nazianzo escreveu sobre “uma furiosa rajada de vento” e “”uma chama [que] saía do lugar sagrado”. Efraim observou que houve ventos, terremotos e relâmpagos, e que um ‘fogo saiu’”(46).

O destino do projeto de Juliano, assim como o do templo de Diana três séculos antes, parece claramente ter origem em causas sobrenaturais. Os cristãos da época, é claro, tinham plena consciência da profecia de Cristo sobre o templo (“não ficará aqui pedra sobre pedra”). Se Juliano tivesse tido sucesso com seu templo, isso teria validado a crença judaica de que Cristo não era o Messias e, portanto, o cristianismo era uma religião falsa. O entusiasmo dos judeus pelo templo foi, em parte, para demonstrar que eles continuavam sendo o povo escolhido de Deus. A motivação de Juliano para construir um terceiro templo tem sido debatida por estudiosos. Seu objetivo era insultar os cristãos, agradar os judeus ou restaurar a cultura pagã tradicional? Possivelmente todas essas coisas. Um motivo parece certo: Juliano era um conhecido defensor do sacrifício de animais, que certamente seria ressuscitado se os judeus conseguissem construir um terceiro templo. Com o fim abrupto e dramático do projeto de Juliano, o Apóstata, o cristianismo continuou a florescer, a comunidade judaica continuou a se atrofiar e a Palestina ficou cada vez mais empobrecida e despovoada.

E quanto ao Terceiro Templo?

O surgimento do sionismo no final do século XIX, embora fosse um movimento secular, foi o catalisador da migração de milhares de judeus religiosos para a Palestina.

Durante a era do mandato da Palestina (1922-1947) e os primeiros anos da independência israelense, as questões de crescimento econômico e segurança tinham prioridade esmagadora e o interesse em um terceiro templo era insignificante. Entretanto, a vitória dramática de Israel na guerra de junho de 1967, erroneamente considerada “milagrosa” por alguns,(47) fez com que o interesse no templo proliferasse. Em grande parte, isso se deveu ao fato de o exército israelense ter avançado apenas algumas centenas de metros pela “Linha Verde” até a antiga Jerusalém, capturando assim o Monte do Templo dos jordanianos(48).

Em agosto, o futuro rabino-chefe de Israel, Shlomo Goren, estava liderando as orações públicas dos judeus no Monte do Templo. Desde então, o Monte do Templo tem sido palco de conflitos e até mesmo de violência entre judeus religiosos ou de direita e os árabes muçulmanos, que continuaram a ter o direito de acessar o Monte do Templo e rezar na Mesquita Al-Aqsa. Ironicamente, desde então, o rabinato israelense se opôs ao direito dos judeus de rezar no monte por causa da “impureza ritual”(49). Talvez convenientemente, isso ajudou a minimizar o contato entre judeus e muçulmanos, especialmente no sábado, reduzindo assim as chances de violência. No entanto, o Monte do Templo ocasionalmente é palco de uma visita provocativa de líderes israelenses de direita, inevitavelmente precipitando a violência com os árabes. Por exemplo, em setembro de 2000, o falecido líder do Partido Likud, Ariel Sharon, fez uma visita ao local, cercado por centenas de policiais israelenses, o que resultou em uma briga em grande escala com os palestinos. No ano seguinte, Sharon foi nomeado primeiro-ministro.

O acesso ao Monte do Templo também estimulou o ativismo judaico a começar a se preparar para o terceiro templo. Pelo menos três grandes organizações têm trabalhado para atingir esse objetivo há várias décadas. Elas são o Temple Institute (Instituto do Templo)(50), o Temple Mount and Land of Israel Faithful Movement (Movimento de Fiéis do Monte do Templo e da Terra de Israel, abreviado como TMF)(51), e o Returning to the Temple Mount (Retornando ao Monte do Templo)(52). É importante observar que todas as três organizações mantêm sites em inglês, calculados para atrair os muitos sionistas cristãos americanos e europeus que apoiam a iniciativa do templo.

Coletivamente conhecidas como o “Movimento do Monte do Templo”, essas organizações representam uma mistura eclética de judeus ortodoxos e sionistas seculares. O Instituto do Templo, financiado pelo governo, administra um centro de visitantes e um museu em Jerusalém, treina sacerdotes, fabrica vasos para uso em cerimônias rituais e doutrina crianças de escolas israelenses com sua agenda. Surpreendentemente, o Instituto do Templo afirma conhecer a localização precisa e oculta da Arca da Aliança, “aguardando o dia em que ela será revelada”(53).

O site do TMF afirma que “o Monte do Templo nunca poderá ser consagrado ao Nome de D’us sem a remoção desses santuários pagãos [a Mesquita de Al-Aqsa e o Domo da Rocha]. Foi sugerido que eles fossem removidos, transferidos e reconstruídos em Meca”. Além disso, a consagração do Monte do Templo o tornará “o centro moral e espiritual de Israel, do povo judeu e do mundo inteiro”(54). Em 1990, o TMF tentou colocar a pedra angular do terceiro templo, resultando em um tumulto no Monte do Templo no qual dezessete palestinos foram mortos(55). O líder do movimento, Gershon Salomon, lamentou apenas que o sangue muçulmano tenha contaminado o Monte do Templo. Em 2022, o TMF anunciou no Facebook que “oferecerá um prêmio em dinheiro para aqueles que conseguirem sacrificar um cordeiro no Monte do Templo, bem como para aqueles que forem presos durante o processo”(56).

Israel continua sendo uma sociedade amplamente secular e o interesse em um terceiro templo está predominantemente confinado aos judeus ultraortodoxos (ou haredi). No entanto, os haredim são o grupo que mais cresce em Israel; de 13% da população do país em 2023, espera-se que sejam 16% até o final da década.(57)

No entanto, a motivação judaica para controlar o monte do templo e construir um terceiro templo não é totalmente religiosa. De acordo com uma pesquisa de 2014 com judeus religiosos, uma pergunta indagava por que os judeus deveriam “subir” ao Monte do Templo. Enquanto 54% responderam que a visita deveria ser feita para cumprir um “mandamento positivo” e orar no local, 97% também responderam que visitar o local constituiria “uma contribuição para fortalecer a soberania israelense no local sagrado”(58).

Em uma análise de 2013 sobre o movimento do templo, uma organização judaica escreveu:

Nossas descobertas mostram um aumento dramático no número e na influência de organizações que abrangem desde a conscientização contemporânea sobre o papel do Templo até o objetivo ativo de restabelecê-lo no Monte do Templo/Haram al-Sharif. Vinte anos atrás, essas organizações estavam nas margens radicais do mapa político e religioso, mas desde 2000 elas alcançaram uma posição respeitável dentro da corrente principal da direita política e religiosa e se beneficiaram de laços estreitos com as autoridades do Estado de Israel. Há uma correlação entre a escalada do conflito israelense-palestino no Monte do Templo/Haram al-Sharif e ao redor dele desde 2000 e um aumento paralelo na atividade das organizações do Templo. Embora as várias organizações do Templo possam ter objetivos diferentes e impactos variados, um denominador comum de messianismo religioso e nacionalista distingue o movimento como um todo. A religião se tornou uma ferramenta para a realização de objetivos nacionais extremos em um local que é um ponto focal de tensão política e religiosa(59).

Os entusiastas do templo têm se ocupado há décadas com a fabricação de artefatos para uso no templo, como a menorá (que pesa meia tonelada),(60) vestimentas sacerdotais e vasos de cobre. Já em 1986, a jornalista americana Grace Halsell documentou as observações de um guia turístico israelense sobre os planos para o futuro templo:

Temos todos os planos desenhados para o templo. Até mesmo os materiais de construção estão prontos. Eles estão escondidos em um local secreto. Há várias lojas onde os israelenses trabalham, fabricando os artefatos que usaremos no novo templo. Um israelense está tecendo o linho puro que será usado nas vestimentas dos sacerdotes do templo. Em uma escola religiosa… localizada perto de onde estamos, os rabinos estão ensinando os jovens a fazer sacrifícios de animais.(61)

Por fim, nenhuma discussão sobre o terceiro templo estaria completa sem mencionar a busca pela inapreensível “novilha vermelha”, um projeto do Instituto do Templo que atraiu a atenção internacional.

De acordo com a ordem do Senhor a Moisés e Arão em Números 19, 1-10, o povo de Israel deve obter “perfeita, na qual não haja nenhum defeito, e que não tenha (ainda) levado o jugo”. Como descreve a autora Victoria Clark, o sacrifício ritual da novilha “fornecerá as cinzas necessárias para a purificação, primeiro dos construtores e depois dos futuros sacerdotes do Templo. De acordo com as instruções divinas detalhadas em Números 19, o animal deve ser sem um único defeito e vermelho da cabeça aos pés. Se houve nove dessas novilhas entre o final do século XIII a.C., quando Moisés viveu, e a destruição do Segundo Templo, em 70 d.C., não houve nenhuma nesse intervalo de quase dois mil anos”(62). (O filósofo judeu do século XII, Moisés Maimônides, havia proclamado que o aparecimento da décima novilha sinalizaria a vinda do Messias).

Os sionistas cristãos americanos vieram em socorro, primeiro na pessoa de Clyde Lott, um pregador pentecostal e criador de gado do Mississippi. Depois de prolongadas negociações com rabinos ortodoxos do Temple Institute na década de 1990, Lott se preparou para enviar milhares de cabeças de gado red angus para Israel, onde a novilha vermelha perfeita, de acordo com as diretrizes rabínicas, poderia ser criada. Lott viajou pelos Estados Unidos, falando em igrejas e conferências e levantando fundos significativos. Os doadores eram solicitados a patrocinar, por exemplo, a compra de uma novilha vermelha por US$ 1.000, ou uma meia novilha, ou a passagem aérea para uma vaca por US$ 341.(63)

O projeto da novilha vermelha evocou toda a gama de reações previsíveis em Israel, em grande parte secular, onde, por exemplo, o autor judeu Gershom Gorenberg se referiu sarcasticamente a Lott e seus associados como “criadores de gado do Apocalipse”. O Temple Institute teve pelo menos dois “quase-acidentes” em seus esforços de reprodução ao longo dos anos. Isso inclui o muito divulgado nascimento de Melody em 1996, uma bezerra vermelha pura que, inconvenientemente, desenvolveu um tufo de pelos brancos em sua cauda antes dos dois anos de idade(64). Destemidos, os ativistas judeus, com o apoio dos sionistas cristãos americanos, continuam sua busca pela novilha vermelha perfeita.

Em 2022, outro fazendeiro americano do Texas entregou cinco novilhas vermelhas a Israel, que foram recebidas com a devida cerimônia no Aeroporto Ben Gurion. De acordo com o Jerusalem Post, “se elas permanecerem 100% vermelhas e não apresentarem nenhuma mancha que as desqualifique, cada uma delas será elegível para ser usada para criar as cinzas exigidas pela lei judaica para purificar aqueles que estiveram em contato com um cadáver”(65). Para os não iniciados, a crença judaica ortodoxa considera todos os judeus, inclusive os sacerdotes, impuros devido ao contato com um cadáver e, portanto, incapazes de entrar no templo. No entanto, os sacerdotes (kohanim) teriam permissão para realizar serviços no templo depois de serem purificados com as cinzas de uma novilha vermelha, “tornando a criação de tais cinzas um requisito necessário para qualquer tentativa de restabelecer o Templo(66).

Novilhas vermelhas nascidas no Texas, transplantadas para Israel em 2022. De acordo com a crença judaica, se uma delas permanecer completamente vermelha e sem manchas, suas cinzas purificarão os sacerdotes judeus para entrar no terceiro templo. (Crédito: YouTube Screenshot from the Daily Wire)

Observações finais

A história de três mil anos dos templos na comunidade judaica é, em grande parte, uma história de tragédia devido ao orgulho, à descrença e à punição. No plano divino, o advento do Messias e o estabelecimento de sua Igreja foram planejados para convencer os judeus de que o templo e o sacrifício mosaico não eram mais necessários, tendo sido substituídos pela Nova Aliança. O próprio Cristo em seu corpo místico era o verdadeiro templo (João 2, 19-22), o grande sumo sacerdote (Heb. 4, 14) e o Cordeiro sacrificial de Deus (João 1, 29). Quanto ao templo em Jerusalém, ele estava destinado à lata de lixo da história.

Cristo até mesmo abordou essa questão com os samaritanos. A mulher à beira do poço o questionou:

Nossos pais adoraram sobre esta montanha, e vós dizeis que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar. Jesus disse-lhe: ‘Mulher, crê-me que é chegada a hora, em que não adorareis o Pai, nem nesta montanha, nem em Jerusalém. Vós adorais o que não conheceis, nós adoramos o que conhecemos, porque dos Judeus é que vem a salvação. Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade, porque é destes adoradores que o Pai deseja’” (Jo. 4, 20-23).

Em seus escritos, São Paulo reforçou o conceito do Corpo Místico de Cristo: “Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Se alguém destruir o templo de Deus, Deus o destruirá. Com efeito, é santo o templo de Deus, que vós sois” (1Cor. 3, 16-17).

Infelizmente, a ascensão do protestantismo no século XVI, que foi ainda mais distorcida pelo sionismo cristão no século XIX, corrompeu o conceito de “templo” conforme ordenado por Deus em seu plano de salvação. Atualmente, milhões de cristãos ocidentais aprovam e até apoiam a construção de um terceiro templo em Jerusalém, com sacrifício de animais e dezenas de regras arcanas que foram abolidas pelo sacrifício supremo de Cristo no Calvário. Como é possível que os sionistas cristãos, que presumivelmente acreditam no batismo, também aceitem a exigência de matar uma novilha vermelha para purificar um judeu? A reinstituição do templo judaico e de seus rituais do Antigo Testamento não é a rejeição final do Filho de Deus, que cumpriu a Lei e os profetas? (Mt. 5, 17).

A maioria dos pré-requisitos para um terceiro templo já está em vigor. As únicas exceções são o acesso ao Monte do Templo e uma novilha vermelha adequada. Como potência ocupante em Jerusalém Oriental, o governo israelense poderia, a qualquer momento, autorizar a destruição das estruturas muçulmanas no Monte do Templo, permitindo assim o início da construção do templo.

No entanto, os israelenses sabem muito bem que essa medida enfureceria o mundo muçulmano. No entanto, na era de Donald Trump, parece haver novas possibilidades.

Durante seu primeiro governo, Trump intermediou o que ficou conhecido como os ‘Acordos de Abraão’ entre Israel e quatro países árabes. Da mesma forma, seu governo testemunhou a criação da Abrahamic Family House, um “complexo inter-religioso” até então inimaginável, composto por uma mesquita, uma igreja católica e uma sinagoga em Abu Dhabi. Dado seu ego considerável e seu status de “pato manco”(67) como presidente, seria totalmente típico de Trump intermediar algum acordo que permitisse a construção do terceiro templo. Além disso, Trump é um homem do setor imobiliário por profissão: ele pode se relacionar com (e possivelmente invejar) os grandes papéis de Salomão, Ciro e Herodes na construção dos templos anteriores. O rabino Yosef Berger, citado no início deste artigo, declarou em novembro que “assim como Ciro, Deus colocou Donald Trump no poder para construir o Templo e preparar o caminho para o moshiach [messias]”. O Templo será construído por não judeus, o que “só será totalmente revelado depois que Trump cumprir esse papel”(68).

Por fim, observamos um comentário intrigante de David Ben Gurion, o primeiro primeiro-ministro de Israel, em 1962. Escrevendo para a Look Magazine, o autoproclamado ateu previu:

Em Jerusalém, as Nações Unidas (as verdadeiras Nações Unidas) construirão um Santuário dos Profetas para servir à união federada de todos os continentes; essa será a sede da Suprema Corte da Humanidade, para resolver todas as controvérsias entre os continentes federados, conforme profetizado por Isaías.(69)

Estaria Ben Gurion, conscientemente ou não, prevendo o terceiro templo? Ele parece estar se referindo a um local que invoca a preeminência judaica sobre os gentios, em vez de um local projetado para adorar o Deus Todo-Poderoso. Outro ato de orgulho em vez de humildade. O que quer que o futuro traga com relação a um terceiro templo — com ou sem Donald Trump — ele não pode ser agradável a Deus e, mais cedo ou mais tarde, sofrerá o mesmo destino dos templos anteriores. Pois “Jesus Cristo [é] a principal pedra angular, sobre o qual todo o edifício (espiritual) bem ordenado se levanta para ser um templo santo no Senhor” (Ef. 2, 20-21).

Notas de Rodapé: Cfr. na tradução original