II. MEDITAÇÃO
Quanto às virtudes, ou eficácia do augustíssimo nome de MARIA, a mesma Senhora, falando com Sta. Brígida, lhe disse que o seu nome quando se proferia devotamente alegrava os Anjos no Céu e rendiam louvor a Deus; e os da nossa guarda se chegavam mais para os justos, e no Purgatório as almas se aliviam, como o enfermo na cama quando alguém o consola; e os demônios fogem e deixam a alma que tinham nas unhas, como as aves de rapina fogem quando ouvem algum som que as espanta. O que parece quis o Céu confirmar com aquele caso maravilhoso que traz o Padre Cristovão da Vega. Criara certa donzela um pássaro daquela espécie que aprendem a falar o que lhes ensinam, e lhe ensinara a dizer: Ave MARIA; e ele repetia muitas vezes, com aplauso e gosto dos que ouviam. Sucedeu vir uma ave de rapina e levá-lo nas unhas; e o passarinho, repetiu o que costumava: Ave MARIA; e no mesmo ponto a ave de rapina, como se a ferissem com um pelouro, caiu morta em terra, e o passarinho tornou alegre às mãos de quem o ensinava e sustentava. Sem dúvida quis Deus mostrar quanto vale o nome poderoso de MARIA contra os repentinos assaltos do tentador; pois em sendo invocado da alma fiel e devota, logo a infernal ave de rapina solta a presa e desaparece.
Considera particularmente como este augustíssimo nome conforta na hora da morte, e por isto se lhe aplica aquilo dos Cantares, principalmente dito pelo Esposo (Ct 1, 2): Oleum effusum nomen tuum. — O vosso nome é azeite derramado; porque assim como os lutadores se ungiam com azeite para que as mãos do competidor escorregando não pudessem empregar nos braços do lutador toda sua força; e por isto aos moribundos se administra a Santa Unção, instituindo Cristo por matéria deste Sacramento o azeite para significar e conferir a graça que nele nos dá para entrarmos em luta com o demônio; assim o nome de MARIA, invocado com fé e devoção, parece que Deus lhe comunicou esta eficácia e conforto naquela apertada hora para nos animar contra o inimigo comum; ainda que não seja novo Sacramento; contudo, não é crível senão que o nome de Mãe do Salvador ajude também a salvar, e se glorie o Senhor de a ter por co-salvadora nossa; e por isso disse o Sábio Idiota que o seu nome ungia os lutadores: MARIÆ nomen ungis agonistas; e S. Bernardo, que não temem tanto os inimigos os esquadrões numerosos e bem formados do campo contrário, como os demônios se atemorizam e desmaiam com o nome, patrocínio e exemplo de MARIA: Non sic timent hostes visibiles hostium multitudinem copiosam, sicut aerea potestates MARIÆ vocabulum, patrocinium, exemplum. E Ricardo a S. Laurentio iguala ou avantaja este auxílio do nome de MARIA ao do soberano nome de JESUS: Sicut nomem JESU, mel in ore, in aure melos, in corde jubilus; ita et nomem MARIÆ et amplius, si dicere audeamus.
Por fruto deste ponto colhe costumar-te repetir o nome de MARIA Santíssima com grande freqüência, veneração e gosto. Porque se os pais folgam de ouvir e pronunciar os nomes dos filhos e os esposos os nomes das pessoas a quem amam; e se estão ausentes, isto basta para lhes causar saudade ou consolação: quanto mais racionável e honesto é que nunca da língua nem da memória nos caia o dulcíssimo nome de MARIA, nossa insigne benfeitora, nosso refúgio, nossa corredentora, nossa Mãe do Céu e Mãe do mesmo Deus? Conta-se de um Imperador do Grão Mogor, por nome Echebat, que adorava o Sol três vezes cada dia; ao nascer, ao meio-dia e ao pôr-se; e de cada vez correndo pela mão um como rosário de pedras preciosas, o saudava com mil e quatrocentos nomes, ou títulos de seu louvor. Inumeráveis são os com que nós podemos saudar aquela Grã Senhora, Imperatriz do Céu e da terra que é Electa ut Sol, escolhida como o Sol; e se todas as estrelas do firmamento compusessem um rosário de diamantes, para ir repassando por eles os seus elogios ou nomes honoríficos, ainda faltariam contas e sobrariam nomes, ficando curto o Poeta que disse: Tot tib sunt dotes Virgo, quot sidera Cœlo; Mas um só nome que é o de MARIA, basta por todos, pois os compreende; quem diz MARIA, diz, ainda que o não intente, nem exprima, quantas flores há no prado, quantas luzes no Céu, quantas pérolas no mar, quantas fragrâncias nas árvores odoríferas, quantos tesouros na terra, quantas lindezas no Universo. Prova tu, alma minha, e acharás que, quanto mais nomeares este nome e cuidares nele, tanto mais te afeiçoa, recende, consola, alegra e levanta às vivas esperanças de ver esta Senhora no Empíreo.
III. MEDITAÇÃO
Quanto à devoção e afeto que os santos e varões pios tiveram com este Nome dulcíssimo de MARIA. Primeiramente, S. Estevão Rei de Hungria, introduziu em todo aquele Reino tal devoção com a Senhora, que se não a nomeia ali, senão por antonomásia: A Grã Senhora; e se alguém pronunciava MARIA, punha o joelho em terra. Em Polônia, por reverência deste Nome, nenhuma mulher se costuma chamar MARIA, assim como na mais Cristandade, nenhum fiel se chama JESUS. Ludovico Vives diz que para bem, se havia de ordenar por decreto dos Magistrados da República que toda a mulher que não tivesse trato honesto se tirasse ou abrogasse o nome de MARIA; e com razão (diz o Pe. Teófilo Reinaldo, varão bem conhecido por seus copiosos e eruditíssimos escritos), pois na célebre República de Atenas, se ordenou antigamente, que nenhum escravo, nem oficial mecânico, se chamasse Hermodion, nem Aristogiton, porque estes dois famosos varões livraram a República dos tiranos. E aqui vem também a propósito o que Alexandre Magno disse a um soldado covarde, que tinha o mesmo nome de Alexandre: Aut muta nomen, aut mores: ou muda de nome, ou de procedimentos.
S. Jossio, monge do Mosteiro de S. Bertino, entre as suas tarefas ou exercícios espirituais quotidianos observava o de rezar com grande devoção cinco Salmos, que começam pelas cinco letras do Nome amabilíssimo de MARIA, que são Magnificat; Ad Dominum cum tribulares; Retribue servo tuo; In convertendo Dominus; Ad te levavi oculos meos. Caso maravilhoso (e foi no ano de 1163). Sucedeu que os monges o acharam morto na sua cela, e cercado de luz; e tinha cinco rosas; a saber, duas nas mãos, duas nos ouvidos e uma na boca, e em todas as folhas escrito com letras de ouro o Nome Santíssimo de MARIA. E foi esta prodigiosa demonstração significadora, sem dúvida, da graça que a devoção do Nome da Virgem lhe alcançara, para não obrar, nem falar, nem ouvir coisas fora do agrado de seu bendito Filho.
S. Hermano, da Ordem Premonstratense (a quem a mesma Virgem impôs o nome de seu sagrado esposo José) tinha tanta reverência ao augustíssimo nome de MARIA, que não falava à Senhora (falando com ela freqüentemente) senão pelo nome de Rosa, e por Rosa a invocava, e a Senhora assim invocada lhe acudia; bem como os rabinos antigos, para mais recatar, e honrar o inefável nome de Deus Tetagramaton, não usavam dele, e substituíam em seu lugar o de Adonai.
O Valorosíssimo mártir André Chio, grego de nação, padeceu esforçada e constantemente por dez dias esquisitos e crudelíssimos tormentos invocando sempre no princípio da luta o nome de MARIA de que usava em sua vida em todas as urgências e trabalhos ocorrentes; e tanto se ungia com este óleo que sentia tal valor, que os turcos ou lutadores se confundiam da constância do Mártir. Pode ler-se a história mais por extenso porque é notável.
Em Lisboa, no Convento das Inglesinhas (conforme refere o Hagiológio Lusitano) houve uma religiosa tão devota dos suavíssimos nomes de JESUS e MARIA, que lhe acharam depois de morta, resmas e resmas de papel escritas de margem a margem só com estes dois nomes. A Superiora, não aprovando este novo modo de devoção, mandou lançar fogo um daqueles livros, quando a religiosa era ainda viva. Obedeceu então com lágrimas, porém não quis Deus que ardesse, pois ainda hoje se conserva por memória.
Muitos outros exemplos pudéramos trazer, mas bastam estes para afeiçoar o coração à devoção desta amabilíssima Senhora, de quem até o nome é tão poderoso para atrair, defender e confortar. Por onde o fruto desta meditação, será o mesmo que da antecedente, procurando a alma entranhar em si este pio afeto, como estudante que decora a mesma lição muitas vezes, para lhe ficar mais impressa e pronta; ou como pintor que dá muitas capas de tinta à pintura para que permaneça viva mais tempo contra as injúrias dele.
Ó Soberana Virgem, Senhora de todos os corações; se Deus chamou Mar à congregação das águas (Gn 1, 10): Congregationes aquarum apellavit Maria; com razão vos chamam a vós MARIA, pois sois a Congregação, tesouro de todas as graças, dotes e excelências da graça e da natureza; o mesmo é MARIA que amável ou digníssima de ser amada.
Est MARIA affectu dignissima cordis amari, Nempe sibi hoc propriu ex nomine, nomen habet.
Desejo pois ter estampado em meu coração o vosso dulcíssimo nome, como vosso devotíssimo S. Ignácio mártir, que teve a dita de vos ver e escrever nesta vida que achou ter no coração estampado o nome de vosso Filho JESUS; alcançai-me dele graça eficaz com que toda minha vida, no interior e no exterior, se conforme de modo que minha alma se purifique e faça capaz de imprimires nela o vosso nome, como marca ou ferrete de escravo vosso, que é o mesmo que de vosso Filho, e nosso Salvador JESUS Cristo, a quem seja dada glória por toda a eternidade. Amém.