“É ímpio perante Deus aquele que é irreverente para com seu pai” (Tertuliano)
Como se divide esta segunda seção relativa ao respeito?
Em três capítulos:
1º – A natureza do respeito;
2º – A importância do respeito;
3º – O objeto do respeito.
Capítulo I – A natureza do respeito
Que é o respeito?
1º – “O respeito é alguma coisa mais que a estima, a deferência, a polidez e as atenções. Têm-se atenções para os iguais, deferência para os amigos, estima pelo mérito, delicadeza com toda a gente; o respeito ascende muito mais, e leva consigo a estima, a deferência, as atenções mais delicadas e, mais ainda, a consideração e a honra, a até alguma coisa superior.
2º – O respeito é a lembrança refletida e o religioso sentimento do que há de divino em si e nos outros. Não, o respeito por si e pelos outros não é outra coisa senão a consideração atenta daquilo que há de mais alto na dignidade humana, isto é, da imagem de Deus, da coisa divina em nós, e, além disso, o sentimento grave e íntimo o sentimento religioso, que esta recordação e esta luz inspiram.” (Mgr. Dupanloup, Da Educação, t. II, p. 487.)
Que é, por exemplo, o respeito de si mesmo, “senão um olhar de admiração sobre si e de religiosa estima por uma dignidade interior e oculta“?(Mgr. Dupanloup)
Que é o respeito das leis, senão a consideração prática do que há de majestoso e de divino na expressão da vontade dos legisladores, para se tirar uma conclusão de religiosa docilidade?
3º – “Se se quisesse definir o respeito, seria preciso denominá-lo: o sentimento dos valores; e, por conseguinte, o respeito é uma virtude intelectual que anda ligada ao juízo e o bom senso.” (F.Kieffer, ob. cit., p.340.)
O que há no fundo de todo o respeito?
Há Deus.
O verdadeiro respeito é divino; eleva-se até Deus e não se dirige senão a Ele. Distingue-se, por isso, e essencialmente, de todos os respeitos humanos, que rebaixam o espírito e aviltam o coração.
Quais são, para as crianças as formas do respeito?
1º – Há o respeito das maneiras:
“O respeito proíbe o desvio dos olhos, o atrevimento dos olhares, a rudeza dos gestos, as atitudes negligentes, as diligências precipitadas, as posições afetadas, os ares desdenhosos, em suma, tudo aquilo que denota a sem-cerimônia ou ao orgulho dum pobre mancebo (ou duma criança), que, pela sua afetação de independência, não faz senão depreciar-se, pretendendo elevar-se.” (Mgr. Baunard, Deus na escola, t. I, p.90)
2º – Há o respeito da linguagem.
a) Quando a criança fala dos seus superiores:
“O respeito não permite a lábios cristãos uma palavra, uma sílaba, uma alusão, uma insinuação, não digo caluniosa, não digo injuriosa, mas mesmo malévola, ou inconveniente, a respeito daquele, cujo caráter e pessoa devem ser sagrados, como a pessoa e a majestade de Deus.” (Mgr. Baunard, Deus na escola, t. I, p. 89)
b) Quando a criança fala aos seus superiores:
“O respeito não levanta a voz diante dum superior, de qualquer grau que seja; não o interrompe, não o contradiz, não fala senão quando é preciso, não diz senão o que deve dizer; fala-lhe com deferência, apressa-se a recolher a um silêncio discreto, como seu próprio domínio. Nada de vulgar, nada de familiar, nada de pretensioso, nada de peremptório, nada de inconsiderado, nem de leviano: mas uma conveniência perfeita no tom e nas palavras, sem excluir este bem-estar que não deixa esquecer que o senhor a quem nos dirigimos é ao mesmo tempo um pai.” (Ibid.)
Capítulo II – A importância do respeito
“Uma criança que se educa é essencialmente um ser respeitoso ou não é nada, e fica abaixo de tudo.”(Mgr. Dupanloup, ob. cit. t.II, p. 524.)
Qual é, na educação, a importância do respeito assim compreendido?
“Há correlação essencial entre a idéia da autoridade e a do respeito, como entre a idéia do direito e do dever.” (Ibid, p. 493)
O respeito completa a autoridade; é a aceitação dela no espírito, no coração e na vontade dos subordinados. E, se é verdadeira como devemos reconhecer, a afirmação de Mgr. Dupanloup: “Que se não educa sem ele e sem a criança o aceitar de boa vontade” (Ibid., ob.cit, t.III, p. 177) a autoridade não poderá produzir os seus frutos de educação, senão quando é aceita pelo respeito.
“O respeito é para todo o homem, e sobretudo para o jovem, a parte mais elevada da distinção. O mundo não estima nada tanto como os hábitos de deferência e comedimento; e aqueles que os têm, possuem por eles um encanto, que atrai todos os corações honestos. A Escritura lá diz: “Em troca do respeito, a boa graça vos será dada: Pro reverentia accedet tibi bona gratia; (Eccli XXXII,9)”. Boa graça ou benevolência – a palavra pode significar uma e outra destas coisas – neste caso uma e outra são verdadeiras.
É em particular a bondade e o encanto imortal da infância e da adolescência, e a Escritura, compara-o a um colar, que junta o seu adorno ao desta idade, bela como a Primavera. É além disso, um tesouro para toda a vossa carreira. Tudo aquilo que um jovem respeitoso dispensa em deferência, ser-lhe-á retribuído em confiança. Quer-se honrar aquele que sabe honrar os outros, e tem-se gosto em corresponder às penhorantes provas de delicadeza e respeito. Àquele de quem se recebem, concebem, concede-se-lhe por unanimidade o título de homem bem educado, que é um dos melhores passaportes para a viagem da vida.” (Mgr. Baunard, Deus na escola, t. I, p. 91-92.)
Esta importância do respeito é suficientemente compreendida?
Há oitenta anos Royer-Collard dizia na Assembléia dos Representantes:
“Dizem que o respeito está morto: nada me aflige, nem entristece mais, porque o respeito é o que eu mais estimo. Mas quem se tem respeitado desde há cinquenta anos?”
Se assim fosse “seria preciso esconder o rosto nas mãos e desesperar do futuro” (Mgr. Dupanloup). Mas não, isto não se dá nem dará enquanto a Igreja, “esta grande escola de respeito” como a chamava o protestante Guizot, puder fazer ouvir a sua voz e exercer a sua ação.
Se é possível dizer-se que o respeito não foi extinto, não é justo afirmar que foi seriamente atingido?
Sim.
Villemain escreveu:
“Uma língua é a forma aparente e visível do espírito dum povo. Há sempre uma relação profunda, ainda que muitas vezes obscura e aparentemente apagada, entre as palavras e as idéias, entre as idéias e o estado social dum povo.”
Se esta reflexão é justa, que se deve julgar do nome de pensão, pela qual se designam correntemente certas casas de educação? Uma pensão é o dinheiro que se dá para alojamento e alimentação; ou ainda: a casa onde se dá cama e comida, mediante um certo preço.
Qual é, pois, o estado da alma dum povo que dá ao lugar onde se recebe e onde se paga a alimentação do corpo o mesmo nome que confere à casa onde se educam as almas?
Esta confusão só pode ser nociva ao respeito que se deve àqueles que se ocupam da formação e da educação.
A criança é, em particular, facilmente respeitosa?
“Esta idade é sem piedade“, disse La Fontaine. Pode acrescentar-se que é sem respeito. E a razão é sempre a mesma. Se a criança é sem piedade, é porque não sabe o mal que faz. Se a criança é sem respeito, é porque não tem a “lembrança refletida e o religioso sentimento do divino” (Mgr. Dupanloup); é porque não tem o “sentido dos valores” (Kieffer, Da autoridade, p. 841).
Catecismo da educação – Abade René de Bethléem