Se o mundo mergulha no marasmo, é porque está à altura dos “heróis” que escolheu a si próprios: homens inúteis cuja fama assenta unicamente na cobertura midiática e não mais na verdadeira virtude.
Fonte: Editorial da revista Fideliter n°263 – Tradução: Dominus Est
A admiração instiga a reflexão. Um acontecimento inusitado, uma atitude inapropriada, uma resposta absurda, surpreende-nos. Todos os sentidos despertados nos incitam a encontrar a razão dessas manifestações inusitadas. E então, com mais ou menos cuidado, nos preocupamos em descobrir o porquê. Alguns se cansarão rapidamente da busca, mas outros, mais perseverantes, irão querer fugir dessa ignorância que os atormenta. Sabemos que os grandes pensadores foram todos pessoas obstinadas que viraram e reviraram, em todos os sentidos, estas observações iniciais para finalmente descobrir o segredo escondido sob a aparência inicialmente desoladora. Conhecemos, por exemplo, o grito de vitória de Arquimedes em sua banheira: eureka, encontrei; e conhecemos o pessimismo de Blaise Pascal, inquieto, que admitiu: “O que mais me surpreende é o fato que nem todos estão surpreendidos com sua fraqueza.” Mas o exemplo mais tocante e mais divino de admiração continua sendo o da Bem-Aventurada Virgem Maria quando o anjo lhe anuncia o privilégio de se tornar a mãe de Deus: “Como se fará isso, eu que não conheço homem algum?”
“O extraordinário provoca admiração e emoção.”
O inusitado, por definição, como o extraordinário, o incomum, o raro, efetivamente provoca admiração; é uma emoção que pode lançar uma vida inteira na busca de uma certeza. O nosso tempo, por mais rico que seja em descobertas científicas, não vê apaziguar esta furiosa paixão pelas novas descobertas, sob o risco de abolir não só toda a moral, mas também as leis naturais sobre as quais não pode deixar de se apoiar. Mas, paradoxalmente, os meios eletrônicos atuais tendem a abafar qualquer admiração: a facilidade que oferecem para possuir tudo e rapidamente gera, em muitos, desencanto e decepção. Mentes desiludidas e cansadas tornam-se incapazes de admirar; o virtual destrói o inusitado.
E, no entanto, a natureza, sua flora e fauna criadas pelo bom Deus, nunca deixará de nos surpreender no pouco que lhe prestamos atenção. “Que Deus me conceda o dom de ouvir sempre… a imensa música das coisas…de descobrir os maravilhosos bordados da vida”, disse um jesuíta inclinado ao Ômega.
Mas o inusitado pode ter um encanto tão grande que a admiração que provoca mergulha em temor reverencial. A Sagrada Escritura não é desprovida de expressões quando quer expressar a emoção da alma diante de Deus, feita de temor misturado com respeito pela grandeza incompreensível da onipotência divina; São Pedro diz bem: “Vós sois a raça eleita… para que possais proclamar a grandeza daquele que vos chamou das trevas para a sua admirável luz”. Todos os milagres e discursos de Nosso Senhor admiravam as almas de boa vontade; São Mateus o atesta: “Tendo Jesus terminado todos os seus discursos, o povo admirava a sua doutrina.” Se a República abdicasse de sua inveja, seus filhos poderiam então descobrir o segredo divino: o coração do Filho de Deus é o santuário da justiça e do amor, liberal a todos os que o invocam.
“A grandeza sobrenatural provoca admiração e imitação.”
Além disso, quando o inusitado é uma bela ação humana, a admiração cessa e a contemplação invade a mente. A emoção torna-se admiração. Esse sentimento de estima pelo grande homem que foi capaz de realizar essa ação provoca a imitação e inspira o desejo de reproduzir, incentiva a imitar ou a se assemelhar. A admiração é a fonte da elevação pessoal: a magnanimidade aparece então ao alcance daquele que primeiro se surpreendeu. A grandeza, seja ela natural ou sobrenatural, é imitada. Um herói desperta a coragem de muitos homens e um santo conduz à virtude. Uma sociedade inteira é finalmente aprimorada. É óbvio, então, que a fonte da dignidade de uma vida social humana e virtuosa é a admiração. Se o mundo mergulha no marasmo, é porque está à altura dos heróis que escolheu a si próprios: homens inúteis cuja fama assenta unicamente na cobertura midiática e não mais na verdadeira virtude. Mas os católicos, marcados com o selo do batismo de Jesus Cristo, tendem sempre por sua vocação a serem dignos cidadãos do céu, precisamente admiradores dos santos e dos justos que nunca deixam de dar-lhes o exemplo.
Pe. Benoît de Jorna, Superior do Distrito da Fsspx na França