TIBIEZA: CONTENTAR-SE COM NÃO OFENDER A DEUS PELO PECADO MORTAL, MAS NÃO QUERER EVITAR O PECADO LEVE

Resultado de imagem para tibiezaFonte: Capela Santo Agostinho

Que é a tibieza?

A tibieza é uma doença espiritual e das mais graves e perigosas. É o verme roedor da piedade. Micróbio terrível! Mina o organismo espiritual sem que o enfermo perceba. Enfraquece a pobre alma. Amortece as energias da vontade. Inspira horror ao esforço. Afrouxa vida cristã. Espécie de langor ou torpor, diz Tanquerey, que não é ainda a morte, mas que a ela conduz sem se dar por isso, enfraquecendo gradualmente as nossas forças morais. Pode-se compará-la a estas doenças que definham, como a tísica, e consomem pouco a pouco algum dos órgãos vitais. É uma sonolência, um sistema de acomodações na vida espiritual.

O tíbio não quer lutar. Tem horror ao combate da vida cristã. Não compreende a palavra de Nosso Senhor: Eu não vim trazer a paz, mas a guerra!

Guerra ao pecado, guerra às paixões, guerra à indiferença.

Quem não é por mim, é contra mim!

O tíbio não compreende este radicalismo sublime do Evangelho e da cruz. Numa palavra o define bem o Espírito Santo: é morno. Nem frio, nem quente.

Nem o ardor da caridade, o fogo do amor, nem o gelo da descrença e da impiedade e da morte da alma.

A tibieza é uma inércia espiritual. Um estado lamentável da alma.

É a mediocridade que se contenta com não ofender a Deus pelo pecado mortal, mas não quer evitar o pecado leve, fugir do relaxamento da vida espiritual.

Enfim, para defini-la com precisão e distingui-la do que a ela apenas se assemelha, como a aridez e outras provações da vida espiritual, vamos dar a sua definição.

Definição

Santo Afonso define a tibieza pelo que a caracteriza: o pecado venial.

A tibieza, diz o Santo Doutor, é o hábito do pecado venial plenamente voluntário.

Guardemos bem esta definição.

Para a tibieza essencial, são necessárias três condições:

O pecado venial plenamente voluntário;

O hábito do pecado venial voluntário;

A paz com este hábito e a ausência de esforços para se corrigir.

Desde que falte uma destas condições, já não há tibieza propriamente dita.

Uma alma talvez caia de vez em quando nalguma falta venial. Cai por fragilidade, por miséria. Emenda-se logo. Toma boas resoluções, corrige-se. Todavia é tão grande a fraqueza humana! Uma vez ou outra chora uma falta venial. Não é tibieza.

Houve o pecado venial, mas não o hábito do pecado venial e muito menos ainda a paz com o pecado venial. Há esforço, generosidade, boa vontade, arrependimento sincero.

O Pe. Desurmont define a tibieza comentando admiravelmente Santo Afonso: “A tibieza é o hábito não combatido do pecado venial, ainda que seja um só. É um hábito fundado num cálculo implícito: Esta falta não ofenderá a Nosso Senhor gravemente, não me há de condenar. Pois vou cometê-la.

É um ato dificílimo de se desarraigar da alma. É um hábito muito espalhado sobretudo entre as pessoas que fazem profissão de piedade e entre as almas consagradas a Deus.

Espécies de tibieza

A tibieza propriamente dita é a que definimos como sendo o hábito do pecado venial voluntário e a paz com este hábito. Há, entretanto, outras espécies de tibieza.

A tibieza de fragilidade e irreflexão. Até os santos a experimentaram. Só a Virgem Imaculada não a teve. Nosso Senhor permite nos Santos algumas fragilidades e misérias, para conservar neles as virtudes fundamentais da humildade, a desconfiança de si, a compaixão para com as misérias alheias, o desapego da terra e o desejo do céu. Ó, os santos tiveram as suas pequenas fragilidades e misérias. Como se humilhavam!

Um dia São Vicente de Paulo, num ato irrefletido de amor próprio, envergonha-se de um parente pobre! Como se humilhou perante seus irmãos por esta falta!

Santa Teresinha, no leito de morte, sente-se pobrezinha e imperfeita com uma fragilidade: “Como sou feliz, diz ela, vendo-me tão imperfeita e com tanta necessidade da misericórdia do Bom Deus no momento da morte”.

Bernadete, o anjo de Lourdes, lamenta as suas imperfeições, a teimosia que a humilhava tanto.

Santa Catarina Labouré lamenta igual defeito.

Guido de Fontgalland expia no leito de dores o que ele chamava as sua preguiças.

Poderia multiplicar os exemplos. São as misérias inerentes a esta pobre natureza humana.

A perfeição inteira e absoluta não se encontra neste mundo. O Concílio de Viena condenou o erro dos que afirmavam que o homem, nesta vida mesmo pode adquirir um tal grau de perfeição, que se torna impecável e incapaz de progredir na virtude. Tal foi também o erro dos Iluminados.

O Concílio de Trento é mais claro ainda. Condena quem disser que o homem pode, durante esta vida, evitar as mais pequeninas faltas, a não ser por um privilégio especial de Deus. E este privilégio só o teve Maria Santíssima.

A tibieza da fragilidade é inevitável. Não nos perturbemos com elas. Recorramos à oração, aos sacramentos e sobretudo à Santa Eucaristia, e nos purificaremos sempre destas fragilidades e misérias.

Tibieza da vontade. É mais grave que a de fragilidade. É a vontade enfraquecida. Deus a permite para confusão de nosso orgulho e melhor nos convencer de nossa miséria. Um firme propósito, um gesto de arrependimento sincero, com a resolução de se vigiar com mais cuidado, e tudo está reparado. A tibieza da vontade é facilmente remediável.

Tibieza do pecado venial voluntário e habitual e é desta que aqui vimos tratando.

[Por Mons. Ascânio Brandão]