A ACÉDIA

Mas, do que se trata? Por que falar sobre isso?

Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est

A acédia é uma forma de tristeza avassaladora que produz, no espírito humano, um profundo desânimo, uma verdadeira desolação da alma. É uma “depressão”, na qual qualquer forma de entusiasmo, de desejo genuíno, são transformadas e concentradas em um único desejo: o de não fazer mais nada, de cessar a luta.

Santo Tomás de Aquino define-a como “um torpor do espírito que não consegue empreender o bem”. Em última análise, é uma tendência que mergulha a alma em um grande cansaço, dando-lhe aversão aos exercícios espirituais e ao devido respeito pelas exigências da religião. Portanto, ela afeta, de modo particular, o exercício da nossa vida cristã.

Devemos estar atentos porque esse defeito, porque é efetivamente um defeito, é um mal que pode acarretar sérias consequências se não for combatido. É por isso que é necessário falar sobre isso.

São Gregório afirma: “Ninguém pode permanecer muito tempo sem prazer, em companhia da tristeza”. O mesmo acontece com a natureza humana e vemos que uma pessoa triste terá, obviamente, uma tendência a se afastar daquilo que lhe está causando dor e a se voltar para outras atividades nas quais espera encontrar prazer e alegria.

Mas isso é ainda mais verdadeiro para o homem que sofre de acedia. Esse pesado langor, que o impede de realizar suas atividades, é uma fonte de tormentos tão grande que ele buscará, mais do que qualquer outra coisa, escapar dessa tristeza. Como diz Aristóteles: “Aqueles que não conseguem saborear as alegrias espirituais voltam-se para as alegrias corporais“. Assim, quem passa por essa provação não apenas tenderá a abandonar sua vida de oração, ou mesmo a prática religiosa, por vezes até mesmo odiando-a, mas também se voltará para coisas exteriores que proporcionam prazer e aliviam sua tristeza. É a fuga para prazeres proibidos de todos os tipos: desde a divagação da mente à má curiosidade, passando pela calúnia e até pela difamação; da má curiosidade à rejeição de quaisquer preceitos morais. Esse é o triste destino das almas que abandonam Deus.

ALGUMAS CAUSAS

O demônio

Mas de onde vem essa desolação, esse cansaço, esse desgosto, esse sentimento de tristeza que às vezes parece querer nos invadir? As causas são bem diversas para esse estado de espírito, algumas das quais podem ser concomitantes. Embora a tibieza de nossas vidas obviamente favoreça a acedia e mereça nossa atenção (o que faremos seguindo as considerações do Padre Hyacinthe-Marie Cormier O.P. no próximo artigo), são necessárias outras causas mais sutis às quais é necessário prestar atenção.

Em primeiro lugar, é claro, há o demônio. O demônio, em seu ódio a Deus e às almas fervorosas, se servirá de todas as “causas secundárias”, ou seja, as nossas fraquezas humanas, nossas fragilidades, nosso ambiente de vida, nossas penas, etc., para agir sobre a nossa imaginação, ampliar nossas misérias e nos fazer afundar no desânimo.

O discernimento dos espíritos, tão caro a Santo Inácio, ensina-nos muito sobre as “técnicas” que Satanás usa para nos fazer cair em pecado grave.

Assim, para aqueles que vivem habitualmente em pecado mortal, o demônio agirá de forma grosseira despertando prazeres aparentes para melhor prendê-los aos seus pecados. Mas para aquelas almas fervorosas que vivem afastadas do pecado mortal e que se esforçam para combater o pecado venial e permanecer fiéis a Nosso Senhor Jesus Cristo, então Satanás agirá de uma maneira “diabolicamente” mais sutil para tentar perturbá-las, entristecê-las e fazê-las perder a paz de sua alma.

Não nos esqueçamos que Satanás é o pai da mentira. Ele tentará destruir qualquer forma de entusiasmo na vida cristã dessas belas e fiéis almas, suscitando falsos raciocínios para instilar temor e ansiedade em seus corações, temor pelas suas faltas passadas, embora bem acusadas e absolvidas na confissão, ansiedades sobre o futuro ou angustia por não cumprir perfeitamente o dever de Estado. Todos esses ataques do diabo são “comuns” em pessoas com temperamentos um tanto temerosos.

Em termos gerais, Satanás cria todas as condições necessárias para perturbar e agitar nossa alma, para melhor desviá-la do seu dever principal. Assim, em vez de trabalhar para corrigir as poucas falhas e imperfeições do próprio comportamento, em vez de ter o cuidado de intensificar a contrição da própria imperfeição e de honrar a Misericórdia divina que tanto nos perdoou, o nosso coração concentra-se nesta angústia e permanece paralisado a ponto de não empreender mais nenhuma reforma, a ponto de desesperar pela nossa salvação.

Assim, a oração torna-se uma tarefa árdua, sem esperança e a vida espiritual, um pensamento tedioso e repulsivo. Mas não esqueçamos que Satanás é e continua sendo um mentiroso, mestre nesse assunto, se é que se pode falar de maestria, e a confusão e a dúvida fazem parte de seus artifícios. Trata-se, portanto, de rejeitá-los como rejeitamos as tentações da impureza.

A confusão e a complexidade não são de Deus. O Bom Deus deseja que as almas vivam em paz. Essa é a paz interior, a paz da alma, longe de todo tumulto, todo medo, toda angústia.

Falta de discernimento nas tentações

Depois há, como outra fonte desta tristeza espiritual, a falta de discernimento entre “tentação e pecado”, e também “culpa diante das tentações”.

A alma acredita ser pecadora no próprio ato da tentação e, então, considera impossível a fidelidade a Deus. A vida espiritual a desencoraja. Foi o caso de Lutero que, atordoado pelo temor resultante desse estado, simplesmente inventou outra religião para se libertar do seu erro! Quais são as consequências deste empreendimento funesto!

É necessário, portanto, fazer uma distinção clara. O que é tentação? A tentação é uma solicitação ao mal, um movimento interior, excitado em nós, para nos levar ao pecado. Portanto, a tentação não é pecado. O que é pecaminoso é o consentimento que damos a ela.. É, portanto, absolutamente fundamental diferenciar a tentação do pecado. Há uma espécie de gradação da tentação ao pecado que devemos perceber cuidadosamente para não nos confundirmos sem motivo. “Sentir ou consentir“, eis a verdadeira questão!

Em primeiro lugar, há a sugestão ou simples proposição que é a representação do pecado oferecida ao nosso espírito. É uma solicitação ao mal, mas enquanto não se consente, não há pecado. Depois há o deleite não deliberado produzido por essa sugestão do mal. É uma espécie de complacência ou prazer sentido como resultado dessa sugestão, o fruto de nossa pobre concupiscência. Por mais violento que seja, desde que não seja totalmente deliberado e totalmente voluntário, não é pecado, mesmo que continue a ser uma imperfeição. Por fim há o consentimento à tentação, a etapa que constitui o pecado, a vitória do demônio através da nossa adesão da vontade ao mal sugerido. O prazer desordenado oferecido pela sugestão é livremente desejado, querido, aceito e consentido com plena atenção. Isso é pecado.

É fundamental distinguir claramente esta gradação da tentação ao pecado, porque fazer bem essa distinção é, como dissemos, aliviar muitas consciências que vivem no verdadeiro medo do pecado.

Para aqueles que habitualmente se esforçam para renunciar ao pecado, é especialmente importante não se preocupar se houver uma dúvida em seu consentimento. Na maioria das vezes, essa dúvida decorre de um deleite não deliberado. O pecado não está no fato de sentir prazer. Não está em nosso poder não sentir a tentação. O pecado está no consentimento, que pressupõe nossa liberdade moral e depende absolutamente de nossa vontade.

Falta de esperança e confiança em Deus

Na lista das causas da tristeza espiritual, devemos acrescentar também a falta de recurso real a Deus. Com muita frequência, para não dizer constantemente, confiamos em nossa própria força, sem confiar em Deus, sem o qual nada podemos fazer. Logo nos damos conta de que é absolutamente impossível resistir a todas as exigências do mundo. É nesse momento que desistimos da luta.

Certamente temos razão em pensar que as exigências do mundo ou do demônio excedem, em muito, a nossa capacidade de resistência, mas esquecemos que, se essas exigências excedem a nossa natureza, é precisamente porque Deus nos fornece uma ajuda sobrenatural: a graça. Confiamos em nós mesmos em vez de confiarmos em Deus. Não nos esqueçamos que o Bom Deus não permite que “sejamos tentados além das nossas forças”.

Em termos gerais, isso é uma falta na virtude da Esperança. É um pecado que nos paralisa e nos faz desafiar o amor do Bom Deus. Não é o pecado mais grave, mas é o pecado mais perigoso porque nos faz esquecer Aquele que é a nossa força. É tão perigoso que Santo Isidoro pôde dizer: “Quando começamos a nos desesperar, começamos a descer ao Inferno!” “. Por que palavras tão duras? Porque quando começamos a nos desesperar, começamos a esquecer o motivo e a certeza da nossa vitória, o propósito da nossa vida. Vivemos olhando para o vazio, perdendo o equilíbrio, enquanto deveríamos elevar o olhar para o Céu, mantendo os pés no chão.

Cada dia tem seu próprio castigo, porque cada dia tem sua própria graça de Deus para superar os obstáculos e nos ajudar a suportar as cruzes, por mais pesadas que sejam. A esperança é a certeza dessa graça, não a expectativa dela. Fortalecidos pela esperança, os obstáculos só existem para serem superados.

Portanto, não nos deixemos levar nessa rede de perturbações, angústias, desespero que levam tristeza à alma. É claro que somos fracos, pouco numerosos e pouco poderosos. Mas a nossa força, nosso número, nosso poder é Deus, em quem todas as coisas são possíveis. Nossa coragem está ancorada em Deus, a quem nada nem ninguém pode resistir.

Como bem disse Padre Pio: 

“Senhor, abandono o meu passado à vossa misericórdia, meu presente ao vosso amor, o meu futuro à vossa Providência!” 

Que estas palavras sejam nossas, em total abandono a Deus, nossa única Esperança.

Pe. Gonzague Peignot, FSSPX