Por que é que a inteligência deve ser sinceramente esclarecida?
A inteligência deve ser sinceramente esclarecida porque é a ela que compete tomar as decisões.
Quais são os meios a empregar para garantir a iluminação sincera da inteligência?
1º – É, principalmente, nada fazer que a possa contrariar.
2º – É, em seguida, precavê-la contra as ilusões e causas clássicas de erros de juízo.
3º – É de se reportar aos princípios.
4º – É, se for preciso, pedir conselho.
Quais são as causas que poderiam contrair a iluminação sincera da inteligência?
1º – São as mentiras, os embustes, as infantilidades, etc… nunca se deve enganar as crianças.
2º – São as lisonjas que dariam às crianças uma idéia presumida das suas capacidades e do seu poder de ação, e que as arrastaria a quererem o impossível.
Quais são as ilusões e as causas clássicas de erros de apreciação contra as quais é preciso precaver as crianças que se hão de formar?
São muito especialmente as ilusões que em nós produzem o interesse e o prazer…
Como é que o interesse pessoal falseia a visão?
Criando em nós uma deplorável confusão entre as nossas impressões e as nossas apreciações.
Uma ligeira conversa ouvida num escritório:
– Tu sabes Untel, ele desapareceu, levando 30.000 francos.
– Mas também levou o teu guarda-chuva.
Oh! canalha!
Eis aí o prisma do interesse.
A inteligência considera as coisas sãmente; chama crime o roubo de 30.000 francos, e pequeno furto o roubo dum guarda-chuva. Pelo prisma do interesse pessoal, chamamos finório àquele que rouba 30.000 francos a outrem, e canalha àquele que nos rouba um guarda-chuva.
Como podemos preservar as crianças deste erro de apreciação?
Habituando-as a julgar as coisas como elas são em si mesmas; as suas faltas, como fariam com as dos outros; e os interesses do próximo como os seus próprios interesses.
Quando o profeta Nathan procurou David para exprobar o seu duplo crime, serviu-se de um apólogo. David não se reconheceu nessa alegoria e deixou-se arrebatar pela indignação:
– Quem é esse homem? – exclamou ele.
– Esse homem és tu! – respondeu o profeta.
E David voltou contra si a cólera de que estava possuído.
Como pode o prazer falsear a visão?
Substituindo as prescrições do catecismo e da consciência por fórmulas vãs, máximas ilusórias, preconceitos mundanos.
A luz da fé projeta raios muito claros e muito penetrantes sobre os pensamentos, os sentimentos, os desejos, as imaginações, os olhares, as palavras e os atos nas suas relações com a virtude.
E o mancebo e a donzela, cuja sensibilidade e delicadeza têm sido embotadas pelas leituras, pelas conversações, pelas visitas, pelas diversões, pelos prazeres, satisfazem-se com as palavras que tomam como se fossem razões:
“É preciso gozar a mocidade!”
“A gente não nasceu para freira!”
“Não é proibido ser amável.”
“Não falo nada com má intenção!”
E a conclusão é que não há motivos para constrangimentos. Por outras palavras, não se procura a luz divina: queremos recebê-la do mundo. Não são as estrelas que servem de guia: é o brilho do ouro ou deslumbramento do luxo.
Que se deve fazer para preservar as crianças desta ilusão?
É preciso acordar a sua consciência e habituá-las a raciocinar segundo os princípios.
Qual será a vantagem deste amor aos princípios nas decisões tomadas pela inteligência?
Será de cortar cerce toda a fraqueza, ou melhor, de cortar o mal pela raiz.
Quem se apega aos princípios, aos bons princípios, naturalmente, é guiado pela razão reta, pela consciência e por Deus. Não se pode transviar.
Quais os meios de inspirar nas crianças este amor pelos princípios?
1º – É dar-lhes o exemplo; e, à medida que a sua inteligência se vá desenvolvendo, mostrar-lhes em toda a sua evidência as razões superiores da linha de procedimento a seguir.
2º – Devemos repetir-lhes de maneira a compenetrá-los bem da verdade, algumas sentenças bem escolhidas, algumas máximas expressivas, algumas divisas dignificadoras que iluminem o espírito e despertem um nobre entusiasmo nos corações.
“As sentenças são como pregos agudos que fixam a verdade na nossa lembrança”.
(Diderot: O Espírito Santo disse no Eclesiastes: “Verba sapientium sicut stimuli, et quasi clavi in altum defixi: As palavras dos sábios são como aguilhões e como pregos cravados profundamente” – XII, 11)
“As boas máximas são o gérmen de todo o bem e, fortemente gravadas na memória, alimentam a vontade“. (Joubert)
Eis alguns exemplos:
“Quem trabalha, Deus ajuda!”
“O custar está no principiar!”
“Não há gosto sem desgosto!”
“Faz bem, e deixa falar quem fala!”
A iluminação da inteligência e conhecimento dos princípios são sempre suficientes para dar origem, por si sós, a uma decisão racionalmente fundada?
Não: É preciso em certos casos recorrer à experiência doutrem; é preciso tomar conselho.
O conselho deve ser considerado como necessário?
É muitas vezes necessário aos adultos, pode dizer-se que o é sempre às crianças.
Com que disposições se deve pedir o conselho?
É preciso ser sincero; sincero na exposição do caso; sincero na docilidade prévia, que é a base de toda a consulta séria.
Um dia uma pessoa anunciou-nos que viria visitar-nos, para pedir o nosso conselho sobre uma questão, cujo assunto indicava vagamente. Dizendo-lhe que estimaríamos muito poder ser-lhe útil e teríamos muita honra em receber a sua visita, demos-lhe a entender, ou antes, fizemo-lhe sentir que não estávamos bem de acordo com o seu modo se ver.
Não recebemos a visita anunciada.
Não se tornou a falar na consulta.
E essa pessoa procedeu duma maneira completamente diferente daquela que lhe teríamos aconselhado. (Autêntico)
Catecismo da Educação – Abade René de Bethléem