ALEGRIA E BOM HUMOR

Imagem relacionadaEstranharás talvez que um religioso te estimule à alegria e jovialidade e pensarás que haveria coisas mais importantes para as quais poderia ele impelir-te. No entanto, quero mostrar-te que também a alegria é um dom de grande preço que um religioso com muita razão pode colocar em teu coração.

1º – Na alegria bem ordenada se esconde uma grande bênção

A jovialidade que te recomendo é uma pacífica e bem fundada alegria, uma irradiação da paz interna e da harmonia que residem no coração. Vem a ser, para ti, um grande bem. Desta alegria diz João Paulo: “A jovialidade é um céu sob o qual tudo prospera, menos o veneno”. Certo que é grande o encômio, mas verdadeiro. A alegria contribui para que os bons germes e disposições naturais do coração se desenvolvam do melhor modo possível.

A primavera é na natureza a quadra da alegria e dos prazeres. Quão afável e doce nos sorri o céu azul! Sobre montes e vales, derrama o sol seus raios dourados, os quais penetram até o íntimo do nosso coração! Os pássaros, com seus cantos alegres e variados, enchem a floresta! Solícita e contente, esvoaça a abelha, de flor em flor para sugar o mel. As flores ostentam sua beleza à nossa vista, amáveis crianças em trajes festivos!

Por toda a parte deparamos alegria e beleza!

Mercê desta alegria, como tudo se desenvolve e prospera na natureza! Então contemplamos o fermentar e germinar, o abotoar e florescer, como se tudo, montes e vales, estivesse cheio de uma vida nova e misteriosa. Como tudo se transforma e modifica, sob a ação do inverno duro e rigoroso, qual fantasma do terror domina por toda a parte, afugentando a fresca vida da natureza. Eis a imagem do que sucede, também, contigo, jovem cristã.

Quando permite que se apodere de ti uma disposição sombria e triste, que te domina por longo tempo, secam-se em teu coração as fontes da vida, como no inverno fenece a natureza. Torvas imagens e tenebrosas impressões descem sobre tua alma qual fria neve; teu espírito se escurece, entibia-se tua vontade e tua fantasia se povoa de melancólicos devaneios. Como poderão desenvolver-se, cheios de esperança, os bons germes, a inclinação para a virtude, que Deus te concedeu?

Deverão, necessariamente, perecer naquela aflição íntima, como a experiência diária o demonstra à sociedade. Só quando os raios brilhantes do sol penetrarem em teu coração, quando uma alegria interior e uma pacífica harmonia animarem todo o teu ser, sentirás prazer e gosto na prática do bem. A graça de Deus, com sua força, lançará em ti os germes da virtude, para crescimento rico de esperanças.

Eis por que vivamente nos admoesta o Divino Espírito Santo que nos mostremos alegres no serviço de Deus. “Servi o Senhor com alegria” (Sl. 99,1). E, noutro passo da Sagrada Escritura, denomina esta alegria íntima – a vida do homem – quando diz: “O júbilo do coração é a vida do homem e um tesouro inexaurível de santidade… fixa o teu coração na santidade do mesmo Deus, e afugenta para longe de ti a tristeza” (Ecli. 30, 23-24).

A alegria contribui, além disso, para que cumpras melhor os teus deveres de estado.

A satisfação e a alegria te infundem na alma força e coragem e a revestem de intrépida energia. Conduzem-te mui suavemente sobre todos os pensamentos, dificuldades e embaraços com que talvez hajas de defrontar; tornam leve o que é pesado e fazem-te sentir muito menos os apertos da vida. Por isto, diz de si mesmo o Cantor Real que não somente caminhou, mas ainda correu pela estrada dos mandamentos do Senhor, porque o espírito de Deus, o espírito de alegria, lhe tinha dilatado, o coração (Sl. 118,32).

Ao contrário, uma disposição melancólica e sombria não faz com que tudo te seja duplamente fastidiosa? Não se abate como um peso de chumbo sobre todo o teu viver, de modo que, além do fardo dos deveres, deves suportar-te a ti mesma com o fardo do teu mau humor e tormentos internos? A alegria contribui ainda para que mantenhas relações boas e pacíficas com teu próximo. Aquele que trata com os homens, deve exercitar-se na paciência. Na verdade, ainda os melhores têm as suas imperfeições e singularidades; de modo que, sempre e por toda a parte, será preciso suportar algo.

Se estiveres intimamente alegre e satisfeita não te ofenderás com qualquer coisa, não serás uma “sensitiva”, ser-te-á mais fácil passar por cima de muitas pequenas contrariedades, e, como se costuma dizer, farás boa cara a mau jogo. E assim ficarão incólumes a paz e as boas relações com os demais. Se, pelo contrário, te deixares dominar pelo mau humor e pela tristeza, tudo interpretarás mal e de cada coisa insignificante farás, como vulgarmente se diz, “um cavalo de batalha”. Será, então, para se admirar que ninguém te suporte, que pessoa alguma se disponha com prazer a tratar contigo, e que se procure quando possível evitar a tua companhia?

É um prazer freqüentar pessoas que pelo domínio de si próprios conseguiram harmonia interna, e a fazem transparecer externamente como um sol sereno; ao passo que todos porfiam por evitar aquelas sobre cuja fronte se estende constantemente uma nuvem ameaçadora. A alegria concorre para te proporcionar abundantes graças, nos trabalhos que depois compreenderes. Como se explica que São Felipe Neri, durante muitos anos, tenha exercido tão grande influxo sobre a mocidade masculina de Roma? Foi antes de tudo por causa da sua alegria jovial, que poderosamente atraía a mocidade romana.

Sereno, permitia também aos rapazes inocentes divertimentos e muitas vezes ele mesmo tomava parte nos seus folguedos. Quando alguém o censurava e bem assim aos rapazes, dizia tranqüilamente: “Deixai-os murmurar! não vos perturbeis, porém, na vossa alegria! Nada mais exijo de vós senão que eviteis o pecado”. E, por que motivo a atividade de São Francisco de Sales, o grande Bispo de Genebra, exercia tão desusado domínio, com os mais excelentes resultados? Era porque ele, apesar das suas máximas firmes, em toda parte se apresentava com extraordinário bom humor, e sua fisionomia se iluminava e refletia uma alegria celestial.

És ainda jovem e, contudo, já terás talvez observado como este homem ou aquela mulher soube granjear popularidade e por meio desta, um grande influxo. Terás sempre verificado que era homem ou mulher de caráter brando e suave, pessoas que, por suas maneiras afáveis e serenas, arrebatam todos os corações. Acerca-se a gente com absoluta confiança de tais pessoas, e esta confiança facilita e abençoa depois a sua atividade. Eis porque te será da maior importância procurar, desde a tua adolescência, adquirir certa jovialidade, certo bom humor. Surge agora em teu espírito esta pergunta:

2º – Como adquirir a jovialidade e o equilíbrio?

Se quiseres obter e conservar esta alegria que te há de tornar feliz, preza antes de tudo à pureza de coração, que é a raiz da verdadeira alegria. Quem possui a amizade de Deus, tem o direito de estar alegre. Este pensamento: – nada há no meu íntimo que possa ofender os olhos de Deus; é meu Pai que me ama como a filha querida, e deseja o meu maior bem – é pensamento que estimula o teu coração, introduz em tua alma juvenil uma paz celeste e lhe infunde suave confiança.

Serás mil vezes mais feliz que outras jovens escravas da paixão vil e baixa, que se entregam amiúde e por longo tempo, a prazeres excessivos e participam de divertimentos malsãos. A experiência quotidiana não demonstra que tem estas o coração dominado muito mais pela melancolia e mau humor?

Quem adquirir e conservar a alegria que faz feliz, ame, além disso, o trabalho.

Ocupa-te, de bom grado, em coisas úteis, e esforça-te, conscienciosamente, em cumprir em toda a parte, os teus deveres. Com todo o acerto diz Grasmus: “Assim como a rosa, a mais amada e apreciada das flores, desabrocha numa base espinhosa, assim também do trabalho sério e áspero procede o melhor dos frutos, isto é, a satisfação interior”.

Lê-se na Sagrada Escritura: “A vida do homem laborioso é suave, e tu acharás nela um tesouro” (Ecli., 40,18). Queres permanecer sempre alegre e satisfeita? Aprende a desculpar, de boa vontade, as fraquezas e as folhas dos outros, principalmente se eles parecem guardar certe prevenção contra ti. Tens necessidade de tratar, muitas vezes com os demais… pode acontecer que às vezes alguém te dirijas palavras pouco amáveis, que te seja algo descortês, que te pise um pouco no pé.

Se pesares cada palavrinha e a considerares através do vidro de microscópio, para encontrares ali uma ofensa; se supuseres, sempre, que é com plena deliberação e má intenção que te dizem isto ou fazem aquilo, não te libertarás do enfado e do despeito: levada por tua sensibilidade tudo interpretarás mal, e na tua imaginação, que tudo pinta com cores negras, as ninharias e bagatelas tomarão o tamanho desproporcional e grande peso. Neste caso, esvai-se tua alegria e bom humor.

Sê, portanto sensata e precavida; coloca-te indiferente acima dessas bagatelas e reflete contigo mesma: por um pequenino grão de areia não quero perder o grande bem de minha paz interior. Esforça-te em perdoar as ninharias e dize contigo mesma: não houve má intenção; foi apenas o efeito de um mau humor passageiro, de que talvez já se tenha arrependido, amargamente. Dirige antes a tua atenção principalmente para a afabilidade que te manifestam, e para o bem que te fazem.

Procede de acordo com o velho provérbio alemão: Die Beleidigungen schreibe in den Sand, die Wohitaten dagegen an die Marmorwand und denke: Ich stehe in Gottes Hand – “Escreve as injúrias sobre a areia; os benefícios pelo contrário sobre o mármore, e assim reflete: estou nas mãos de Deus”.

Isto contribuirá sobremaneira para preservar teu coração de enfado e de molestas disposições. Queres permanecer sempre alegre e satisfeita? Convence-te de que até mesmo o árduo, o adverso na vida tem para ti grande significação. Devem prestar-te poderoso concurso para o enobrecimento moral e para a formação de caráter. Já terás observado como faz o artista, quando se um bloco de pedra bruta pretende tirar uma magnífica estátua. Toma o martelo e o cinzel e golpeia desapiedado o mármore. Estilhaços voam em todas as direções!

Fosse à pedra sensível e pudesse falar, que altos brados não soltaria e como se queixaria amargamente do artista! E, no entanto, só assim é que se pode formar de uma pedra informe uma obra de arte. Ora, o que é para a pedra o martelo, são para o homem o sofrimento, as fadigas e as dificuldades da vida. Não contribuem, acaso, para mortificar, em nós, a leviandade e o orgulho, a frouxidão e a moleza? Não concorrem para gerar e fortalecer a energia e atividade, a coragem e a magnanimidade, o interesse pelos outros e o amor ao próximo? Sim, executam um importante trabalho em nós.

Aprende, pois, a estimá-los e suportá-los de maneira cristã, procura tirar deles, por uma corajosa paciência, a utilidade que, segundo o querer de Deus, devem causar-te. Faze isto, e viverás em paz e alegria. Converte teus sofrimentos em bênçãos. Não permitas, pois, que as contrariedades inevitáveis da vida te arrebatem a doce e alegre disposição da alma.

Donzela Cristã – Pe. Matias De Bremschei