
“É preciso compreendermos bem o papel da mulher no pecado para compreendermos bem o seu papel na Redenção. Eva explica Maria”
Thomas Dehau, op, Eve e Marie, 1950, p. 76.
Pelo Pe. Jean-Michel Gleize, FSSPX
Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est
Em 8 de dezembro de 1854, na Constituição Apostólica Ineffabilis Deus, o Papa Pio IX definiu o dogma da Imaculada Conceição; em 2 de fevereiro de 1904, na encíclica Ad diem illum, o Papa São Pio X ensinou que a Mãe de Deus estava associada ao seu Filho no ato redentor de toda a humanidade; em 11 de outubro de 1954, na encíclica Ad caeli reginam, o Papa Pio XII baseou-se nesse duplo ensinamento de seus predecessores para declarar que a Mãe de Deus também compartilha a realeza de seu Filho sobre todas as almas. Assim, por mais de um século e meio, os papas prepararam o caminho para uma futura definição dogmática: espera-se que estas possam oferecer à fé de toda a Igreja Católica o que seria o dogma da Mediação Universal da Santíssima Virgem Maria.
Essa solene afirmação chegaria no momento oportuno para dissipar todas as ambiguidades decorrentes do Concílio Vaticano II. De fato, uma das consequências desse ecumenismo, que inspira a nova teologia, é a rejeição, mais ou menos velada da ideia de mediação. No caso de Cristo, assim como no de sua Mãe Santíssima, a ideia de mediação, real e objetiva, é substituída pela ideia de sacramentalidade: assim como seu divino Filho, a Virgem Santíssima é apresentada primordialmente como modelo para a consciência da Igreja; esta é, aliás, a ideia que aparece no Capítulo 8 da constituição Lumen Gentium. Observemos, por fim, o seguinte: esta verdade da mediação mariana nos dá acesso à compreensão profunda de um mistério que está, por ora, e providencialmente, no centro da devoção do povo católico: o mistério do Coração Imaculado e Doloroso de Maria. Se esse mistério fosse melhor explicado por meio desses ensinamentos do magistério, sem dúvida essa devoção que o expressa ganharia todo o seu sentido e se tornaria mais proveitosa.
Estado da questão
A teologia distingue dois aspectos na mediação de Cristo. Por um lado, há a mediação objetiva, que equivale ao ato da redenção. Por este ato, Cristo conquistou a salvação como sua causa ou princípio, e para toda a humanidade. Este é o ato único e definitivo da Sexta-Feira Santa(1). Por outro lado, há a mediação subjetiva, que equivale ao ato que Cristo exerce agora como cabeça invisível da sociedade visível da Igreja, recorrendo a instrumentos distintos que são os sacramentos. Esta atividade é múltipla e repetida se considerada sob a perspectiva das criaturas; Cristo age, assim, para dispensar a graça da salvação e para exercer a sua mediação não só em princípio, mas efetivamente e para cada indivíduo em particular(2). De maneira semelhante, aplica-se a mesma distinção quando se fala da assistência prestada pela Virgem Maria à atividade redentora de Cristo. Falaremos de Maria como Corredentora para designar a assistência na redenção objetiva; e falaremos de Maria, Medianeira de Todas as Graças, para designar a contribuição para a redenção subjetiva. As considerações que se seguem focam-se principalmente no primeiro destes dois aspetos.
Dificuldade da questão
Parece que a Bem-Aventurada Virgem Maria não pode cooperar no ato da redenção, precisamente porque este ato é aquele pelo qual Cristo redime toda a humanidade. Todo crente batizado pode cooperar no ato da redenção, em dependência de Cristo e na medida em que toda satisfação humana imperfeita deriva seu valor da satisfação perfeita do Deus-Homem(3). Este é o sentido da declaração do Apóstolo São Paulo aos Colossenses:
“Eu que agora me alegro nos sofrimentos por vós e que completo na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo seu corpo(místico), que é a Igreja”(4).
No entanto, tal cooperação permanece essencialmente subordinada, pois ninguém pode adquirir a primeira graça para si mesmo; e, consequentemente, tal cooperação é essencialmente restrita, de modo que ninguém pode adquirir a graça para todos os fiéis da Igreja. Quando os santos cooperam na Paixão de Cristo, o valor do seu ato pode certamente beneficiar toda a Igreja, mas apenas como exemplo e modelo a ser imitado(5); somente o ato de Cristo possui esse valor satisfatório e redentor suficiente para a salvação de toda a humanidade(6). Assim é com a Santíssima Virgem, como com toda criatura: ela depende do ato redentor de Cristo, visto que é este ato que é a fonte da graça primeira de Maria, que é a graça da Imaculada Conceição. Essa dependência coloca-a no mesmo nível que nós e impede-a de cooperar na Paixão, como no ato que redime toda a humanidade. Parece, portanto, lógico, reduzir a mediação universal da Santíssima Virgem Maria ao exercício de uma causalidade exemplar, como fez o Vaticano II. Acrescentemos isto: o ato de redenção se realiza por um sacrifício cruento, onde Cristo oferece a sua vida como satisfação pelo pecado; e, de fato, a Santíssima Virgem Maria não cooperou com tal ação oferecendo a sua própria vida como satisfação pelo pecado, enquanto inúmeros mártires o fizeram(7).
Solução para a questão
No entanto, os Papas ensinam claramente que a Santíssima Virgem Maria poderia ser associada forma única no ato redentor em que Cristo realiza a redenção de toda a humanidade. São, em particular, as afirmações explícitas de São Pio X: “Maria mereceu legitimamente tornar-se a reparadora da humanidade decaída” (8); de Bento XV: “Pode-se dizer que Maria redimiu o gênero humano com Cristo” (9) e de Pio XII: “Na realização da redenção, a Santíssima Virgem esteve certamente muito intimamente unida a Cristo” (10). Além disso, a Tradição (11) chama Maria de “nova Eva” e significa com isso que Maria está unida a Cristo na obra da redenção, assim como Eva está unida a Adão na obra do pecado; ora, Eva foi a cúmplice de Adão para precipitar todo o gênero humano no pecado; a Tradição afirma, portanto, implicitamente que Maria foi a associada de Cristo para realizar a redenção de toda a humanidade (12).
Explicação da solução
Na encíclica Ad diem illum , o Papa São Pio X oferece a explicação deste ensinamento:
“Maria excede a todos em santidade e em união com Cristo, e por ter sido associada por Ele à obra redentora, ela nos merece de congruo, segundo a expressão dos teólogos, o que Jesus Cristo nos mereceu de condigno, sendo ela ministra suprema da dispensação das graças.”(13)
Acrescentemos a isso que a redenção de toda a humanidade é realizada por Cristo, na medida em que o ato de sua paixão merece, com toda justiça, todas as graças da salvação para toda a humanidade. Daí resulta que a Santíssima Virgem pôde merecer, por conveniência, todas as graças da salvação para toda a humanidade, o que equivale a dizer que a Santíssima Virgem pôde redimir toda a humanidade com Cristo. Em outras palavras, ser corredentora com Cristo significa merecer por conveniência, ou seja, na dependência do mérito em toda justiça de Cristo. Esse mérito subordinado decorre do mérito em toda justiça e o pressupõe. E, no caso da Santíssima Virgem, esse mérito por conveniência obtém, na dependência do mérito em toda a justiça de Cristo, a redenção de toda a humanidade. Tudo depende, de fato, da caridade que está no princípio do mérito, pois o efeito do mérito corresponde ao princípio do mérito, e o princípio do mérito é a caridade; e a caridade da Santíssima Virgem é precisamente de uma ordem à parte, pois é uma caridade que está no princípio de um mérito único em seu gênero e singular, que é de natureza a obter, por conveniência, como seu efeito próprio, a redenção de toda a humanidade.
Para entender isso, consideremos que a caridade é obtida na criatura pelo mérito de Cristo, que faz a expiação pelo pecado dessa criatura. E Cristo satisfaz pela Santíssima Virgem de uma maneira mais sublime do que pelas demais criaturas, pois essa satisfação a livra antecipadamente do pecado que ela não cometeu(14). Por meio disso, a caridade da Santíssima Virgem é de uma ordem absolutamente única, pois é a caridade de uma criatura que não contraiu o pecado original, caridade da Imaculada Conceição ou caridade da primeira redimida. Primeira não em termos de tempo, mas em termos do plano da sabedoria divina: pois, para ser redimida e depender do ato redentor de Cristo, Maria não é redimida da mesma forma que as outras criaturas e não depende de Cristo como elas dependem dele.
“A graça é concedida a Maria no exato momento em que, ao se tornar filha do homem, deveria assumir esse pecado. Por um lado, há a humanidade considerada como um único homem pecador, do qual Adão é a cabeça. E Jesus morre em seu nome para expiar esse pecado. Por outro lado, há Maria, que não está incluída nesse pecado coletivo nem nessa expiação. Sua redenção consiste precisamente em ser separada da natureza pecaminosa, em não ter que se beneficiar de uma reparação que visa um pecado com o qual ela não pode ter qualquer ponto em comum. E se essa criação na graça, que é o efeito próprio para Maria da morte de Jesus, pode, no entanto, ser chamada de redenção, é de uma maneira diferente daquela para a humanidade. O sacrifício de Cristo vale, portanto, separadamente para a Virgem Santa e separadamente para todo o resto da humanidade”(15).
Maria é redimida em antecipação aos méritos de Cristo e “antes” da redenção de toda a humanidade. Esse “antes” não expressa, obviamente, uma anterioridade temporal que distinguiria dois atos de redenção; antes, essa expressão designa uma ordem entre efeitos que decorrem distintamente do mesmo ato redentor, e é a ordem em que a Sabedoria divina quis que as graças da redenção fossem adquiridas. Para expressar essa ordem de uma maneira um pouco menos abstrata, o Papa São Pio X evoca a imagem de São Bernardo: Maria é como o aqueduto que recebe todas as águas antes de espalhá-las por todos os canais. Ou ainda, para retomar a comparação de São Bernardino de Siena, Maria é como o pescoço, que conecta o corpo à cabeça e concentra nele todas as influências da cabeça antes de transmiti-las ao corpo. Sendo a caridade de Maria anterior, segundo o ponto de vista assinalado, à de qualquer outra pessoa, é-lhe então possível cooperar nesta obra de redenção universal, merecendo, na dependência de Cristo, o princípio do mérito para o resto de toda a humanidade.
“O sofrimento de Cristo redime primeiro a Virgem no sentido de que ela obtém a sua criação fora da solidariedade com o pecado humano, cuja concepção na carne foi a causa natural; depois, ele se une ao sofrimento e ao mérito da Virgem para redimir com ela toda a humanidade pecadora. O ato redentor permanece então indivisível se a redenção de Maria, que é seu primeiro efeito, estiver ordenada à redenção de todos os homens, se a redenção do gênero humano começar na de Maria, que lhe é anterior apenas para contribuir para realizá-la, se a graça da Imaculada Conceição a separa do corpo dos outros redimidos apenas para torná-la capaz de agir sobre ele”(16).
A graça da Imaculada Conceição, equivalente à graça de uma redenção anterior e mais sublime, não é, portanto, a causa da corredenção, mas sua condição: ela é necessária, embora não seja suficiente. Ela apenas a torna possível. A verdadeira causa, que torna a corredenção não mais uma possibilidade, mas uma realidade, só pode ser a livre decisão de Deus, baseada em uma conveniência. Essa conveniência é o próprio fato da maternidade divina: somente Maria é capaz de merecer sofrendo de uma maneira única, como somente uma mãe pode sofrer pela morte de seu filho. Uma vez que, no plano da sabedoria divina, o modo concreto de nossa libertação deve ser o de uma redenção e, portanto, de uma paixão, se Deus decide associar uma criatura privilegiada ao sofrimento de Cristo, não poderia haver conveniência maior do que associar a própria mãe de Cristo Jesus.
Respostas às dificuldades
Fundamento da co-redenção: a Imaculada Conceição – É claro, portanto, que a graça da Imaculada Conceição é a condição necessária para essa cooperação única da Virgem Santa no ato redentor de Cristo. Maria só poderia ser Co-Redentora se sua Conceição fosse Imaculada. Assim, se se recusa essa condição, recusa-se o que dela depende necessariamente. É por isso que todos os teólogos que negaram a Imaculada Conceição foram levados a negar também a coredenção universal de Maria. A dificuldade que impedia esses teólogos já não nos impede, e é a própria dificuldade da Imaculada Conceição. Essa dificuldade é resolvida se admitirmos que, para redimir toda a humanidade, o mérito de Maria não decorre menos do mérito de Cristo, e que a graça capital continua sendo privilégio exclusivo deste. Da mesma forma, nossa caridade é o princípio meritório de todos os nossos atos salvíficos e, no entanto, essa caridade deriva da caridade de Cristo e continua sendo um dom gratuito de Deus(17). Em outras palavras, pode-se estabelecer a seguinte analogia: a relação da Santíssima Virgem, primeira redimida pela vontade retificada pela primeira graça operante é proporcionalmente idêntica à relação da redenção de toda a raça humana realizada por Maria com Cristo com a vontade que merece sob o movimento da graça cooperante.
No fundamento da compaixão: a Maternidade Divina
Fica, portanto, claro também que nem o sofrimento nem a morte são, em si mesmos, causa suficiente de redenção; esta é, antes de tudo, um ato meritório, e a imolação física tem valor na medida em que é oferecida sob o impulso da caridade. O próprio martírio tira seu valor do ato de caridade perfeita do qual deriva. A Santíssima Virgem Maria não suportou o sofrimento físico do martírio, mas, mesmo assim, sua caridade superava a de todos os mártires juntos(18). Esse grau único de caridade já teria sido suficiente; mas, concretamente, a caridade de Maria se exerceu, como a de Cristo, na perseverança. Mãe de Cristo Redentor, ela coopera na Paixão sofrendo como só uma Mãe pode sofrer a dor e a morte de seu próprio Filho. Aqui encontramos uma exigência do mistério da Encarnação, e essa exigência poderia explicar a diferença entre a corredenção propriamente dita e a compaixão. Maria pode nos redimir em união com Cristo porque ela é a Imaculada Conceição; Mas para nos redimir, Maria sofre em união com o sofrimento de Cristo, e assim sofre um sofrimento único, porque ela é a Mãe daquele que suporta a Paixão.
No fundamento do comportamento exemplar: a Nova Eva
Por fim, Maria também age como mulher. Ela está associada a Cristo na obra desta redenção da humanidade, assim como Eva esteve associada a Adão na obra do pecado original. Assim, ao lado do novo Adão, ela representa a nova Eva: é, portanto, toda a natureza humana que é usada por Deus para realizar a obra da redenção(19). Desta perspectiva, a Virgem Santíssima, à semelhança de Cristo, age como um exemplo e um modelo. Isto continua a ser verdade, desde que não sejam negligenciados os dois aspectos anteriores.
Epílogo: a devoção ao Imaculado Coração
A devoção ao Coração Imaculado e Doloroso de Maria é a expressão apropriada dessas verdades teológicas. O Coração designa o amor sobrenatural da Santíssima Virgem e, portanto, a sua caridade. Este Imaculado Coração significa a caridade absolutamente única da Imaculada Conceição, condição indispensável para a Corredenção. Finalmente, o Imaculado e Doloroso Coração designa essa caridade tal como ela se exerce para merecer, no ato de uma satisfação corredentora única, através da compaixão de uma Mãe. Tal é o objeto que se impôs à devoção na Santa Igreja: há aí um fato sem dúvida providencial. Nem a liturgia nem a piedade popular acolheram tão prontamente a expressão do Coração da Mãe de Deus, inicialmente propagada por São João Eudes. Por outro lado, é impressionante ver como a devoção foi expressa preferencialmente pela expressão do Coração Imaculado e Doloroso de Maria, uma expressão que é a tradução mais precisa possível do mistério da Corredenção, tal como Deus o revelou e o confiou à Tradição da sua Igreja.
Notas:
- Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, 3a , q. 49, a. 1, ad 3. “Pela sua paixão, Cristo nos libertou dos nossos pecados por um modo de causalidade: a paixão, de fato, estabelece a causa da nossa libertação, uma causa pela qual quaisquer pecados, presentes ou futuros, podem ser perdoados a qualquer momento; como um médico que prepara um remédio capaz de curar qualquer doença, mesmo no futuro.”
- Ibidem, ad 4. “A Paixão de Cristo, como acabamos de dizer, é como a causa anterior da remissão dos pecados. É, no entanto, necessário que ela seja aplicada a cada pessoa, para que seus próprios pecados sejam apagados. Isso se faz por meio do batismo, da penitência e dos outros sacramentos, que derivam seu poder da Paixão de Cristo, como será explicado mais adiante.”
- “Omnis satisfactio imperfecta in satisfaze perfecta fundatur” (Santo Tomás de Aquino, Summa Theologica, 3a , q 1, art 2, ad 2).
- Colossenses I, 24.
- São Tomás de Aquino, Suma Teológica, 3a , q 48, art 5, ad 3. “Os sofrimentos dos santos beneficiam a Igreja, não por meio de redenção, mas como exortação e exemplo.”
- Ibidem , art. 5. É próprio de Cristo e somente dele ser o redentor.
- Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, 3a , q. 66, art. 12. O martírio ou batismo de sangue é o ato em que melhor se imita a paixão de Cristo.
- São Pio X, Ad diem illum, Solesmes, n. 233.
- “Dici merito queat ipsam cum Christo humanum genus redemisse” – Bento XV: Sodalitati Nostrae Dominae a Bona Morte , 2 de março de 1918.
- Pio XII: Ad caeli reginam, Solesmes, n° 704.
- Veja sobre este assunto o livro do Padre Terrien, sj, A Mãe de Deus e a Mãe dos Homens, 2 parte, livro 1º , capítulos 1–2. Santo Alberto Magno assim se expressa em sua obra Mariale, questão 150: “Ut ipsam participem faceret beneficii redemptionis, participem esse voluit et poenae passionis, quatenus sic adiutrix redemptionis per compassionem, ita mater fieret omnium per recreationem: et sicut totus mundus obligatur Deo per suam passionem, ita et Dominae omnium per compassione”.
- Esse é o raciocínio teológico em que se baseia o Papa Pio XII na encíclica Ad caeli reginam, Solesmes, n. 705.
- “Universis sanctitate praestat Maria conjunctioneque cum Christo atque a Christo ascita in humanae salutis opus de congruo ut aiunt promeret nobis quae Christus de condigno” (DS 3370).
- Pio IX, Ineffablis Deus de 8 de dezembro de 1854, Solesmes, n.º 43. “A Santíssima Virgem Maria, Mãe de Deus, em antecipação aos méritos de Jesus Cristo, Nosso Senhor e Redentor, nunca esteve sujeita ao pecado original; mas foi inteiramente preservada da mancha do pecado original e, consequentemente, redimida de modo mais sublime (sublimiori modo redempta).”
- Pe. Marie-Joseph Nicolas, OP., “A doutrina da corredenção no âmbito da doutrina tomista da redenção” em: Revue thomiste de 1947, página 24.
- Ibidem
- “Maria não merece a sua própria caridade. Mas o primeiro efeito do mérito de Cristo é obter para Maria a caridade especial que a torna sua associada na obra da redenção. Em seguida, com ela, Ele dá aos homens o que primeiro deu a ela. É um pouco o que acontece com cada um de nós, em uma ordem restrita e pessoal. Minha primeira graça é puramente dada. É o puro efeito do mérito e da caridade de Cristo. Mas, uma vez justificado e com Cristo, que permanece como causa primeira do apoio perpétuo da minha graça, contribuo com meus atos pessoais para merecer o aumento dessa primeira graça e, finalmente, a glória eterna à qual ela me ordena intrinsecamente. A diferença aqui é que, para Maria, trata-se de obter não apenas sua bem-aventurança pessoal, mas também a primeira graça de todos os homens” (RP Marie-Joseph Nicolas, art. cit. página 25
- Cf. 2a2ae, q. 124, art. 4, ad. 1: se se diz que a SintíssimaVirgem suportou o martírio aos pés da cruz, isso deve ser entendido num sentido impróprio e devido a uma certa semelhança. A expressão na Liturgia de 15 de setembro estabelece a distinção entre o ato objetivo e a recompensa que ele merece: isso é particularmente evidente na Comunhão da Missa: “Felices sensus beatae Mariae Virginis qui sine morte meruerunt martyrii palmam sub cruce Domini”. Permanece sempre possível merecer, na ordem da causalidade moral, o efeito correspondente a um ato que não se praticou na ordem da causalidade física, e esse é o caso aqui da Santíssima Virgem em relação ao martírio. Mesmo que ela não tenha morrido aos pés da cruz, sua preeminente caridade permitiu-lhe obter o grau de glória equivalente ao martírio, e mesmo maior. O mesmo se pode dizer em relação à redenção das almas: a Virgem Santíssima não redimiu as almas no sentido estrito da metáfora, na medida em que não as satisfez derramando o seu sangue como Cristo o fez. Mas, por meio da sua compaixão, ela mereceu o mesmo resultado que o sofrimento corporal e a morte de Cristo produziram segundo a eficácia física. Veja Terrien, op. cit., Parte 2 , Livro 3, Capítulo 3, pp. 226–232.
- “Para que todo o homem reparasse, era necessário que, na realização da própria obra da Redenção, estivessem presentes o homem e a mulher, cada um desempenhando o seu próprio papel. Este é o mistério da nova Eva. A ideia de associar a mulher ao homem na obra da exaltação e da redenção da humanidade está profundamente ligada à ideia de fazer do próprio homem, em toda a sua natureza, o autor da sua Redenção” (Padre Marie-Joseph Nicolas, op. cit., p. 36).