D. GERALDO DE PROENÇA SIGAUD E OS FUNDAMENTOS DA LIBERDADE RELIGIOSA

“OBSERVAÇÕES ESCRITAS SOBRE O CAPÍTULO V DO Esquema SOBRE A LIBERDADE RELIGIOSA (DIGNITATIS HUMANAE)”

Estas observações escritas foram redigidas pelo Bispo de Proença Sigaud no final da nonagésima quinta assembleia geral do Concílio Vaticano II, entre dezembro de 1963 e maio de 1964. Elas constam nos Atos sinodais do Concílio Vaticano II (atos oficiais). [1]

Fonte: Courrier de Rome n°639 – Tradução: Witor Lira

I – ONDE TRATAR DESTA QUESTÃO?

  1. Parece que o lugar para tratar da doutrina da Igreja sobre a liberdade religiosa, ou melhor, a liberdade de consciência, não é mais precisamente o esquema do ecumenismo, mas  o da presença da Igreja no mundo. E aqui está a razão: o esquema sobre o ecumenismotenta estabelecer os princípios e normas capazes de facilitar o caminho para a unidade dos cristãos na verdadeira religião. No entanto, a questão da liberdade religiosa diz respeito muito mais à relação da Igreja com o mundo de hoje dividido em várias denominações religiosas.

II – A QUESTÃO DA LIBERDADE RELIGIOSA

      2. No que diz respeito à própria doutrina, o esquema manifestamente não está suficientemente atento aos princípios inabaláveis ​​e, quando utiliza certas noções, não considera as deformações que sofreram sob a influência do liberalismo. Como resultado, o esquema propõe afirmações que o concílio não pode fazer suas próprias.

A. PRINCÍPIOS AOS QUAIS O ESQUEMA CLARAMENTE NÃO ESTÁ ATENTO O SUFICIENTE

1 – Primeiro princípio

  1. O primeiro princípio ao qual o esquema não dá importância suficiente pode ser enunciado da seguinte forma, nas palavras do Papa Pio XII: “O que não corresponde à verdade ou ao padrão de moralidade objetivamente não tem direito, nem de ser, nem se propagar, nem agir” [2].
  2. Na realidade, a noção de direito, ela própria derivada da noção de justiça, baseia-se nas exigências da natureza humana para poder atingir, pelo uso da razão, o próprio fim. Ora, esse fim próprio da natureza humana é o verdadeiro e o bom, fim ao qual é ordenado por sua qualidade de razoável. O homem tem, portanto, o direito de aderir à verdade e fazer o bem. Em outras palavras, sua natureza seria frustrada se ele fosse privado de sua capacidade de aderir à verdade e fazer o bem, o que seria contrário à ordem estabelecida pelo Criador. Inversamente, como nem o erro nem o mal moral são próprios da natureza racional, o homem não tem direito ao erro ou ao mal moral.
  3. Segue-se, portanto, que o homem não pode ser impedido por ninguém de aderir à verdade ou de fazer o bem; pelo contrário, por si só, não se pode dizer que rationabiliter invitus [3], ou sofre uma injustiça, quando é impedido de aderir a um erro ou de cometer um pecado. Ele, de fato, não tem direito nem ao erro nem ao pecado.
  4. No entanto, no estado atual da natureza humana, pode acontecer que o homem invencível, portanto sem culpa de sua parte, venha aderir ao falso; não se segue disso para ele um direito ao erro. Segue-se, por outro lado, que ninguém pode forçá-lo a consentir com a verdade; certamente não em nome de um direito que ele teria de errar, mas do fato de que o ato interno pelo qual o homem adere à verdade ou ao erro, ao bem ou ao mal moral, não pode ser imposto de fora. Com efeito, por vontade divina, o foro da consciência é inviolável por qualquer poder humano, devendo o homem determinar-se livremente na escolha do seu fim último. Essa liberdade interna cria o direito do homem de não ser forçado por ninguém a professar esta ou aquela ideologia. E somente este direito;
  5. Por si mesma, então, na vida em sociedade, a manifestação externa da adesão ao erro pode e deve ser evitada. Por um lado, porque o erro se opõe à natureza humana, porque esta é dotada de razão, e por outro lado, porque a manifestação do erro, especialmente em matéria religiosa, prejudica os outros na medida em que pode ser causa de escândalo para ele. Por acidente, no entanto, pode, e às vezes deve, ser tolerado.
  6. É o que ensina Pio XII na famosa alocução, Ci riesce, na mesma linha do trecho citado acima. Com efeito, o discurso continua: “Não impedir que ele (aquele que não atende a verdade ou o padrão de moral), por meio de leis estaduais e disposições coercitivas, pode, no entanto, ser justificado pelo interesse de um bem cada vez maior” [4]. Considerando as coisas com cuidado, o Papa afirma duas coisas aqui. Por um lado, por si mesmas, as leis civis devem coercitivamente prevenir o erro e o mal moral. E, por outro lado, por acidente, a permissão do mal e do erro moral pode, no entanto, ser justificada em um caso excepcional, que deve ser sempre verificado, como para qualquer exceção. Por fim, deve-se notar que Pio XII, neste discurso, propõe propositadamente resolver a questão da relação do Estado com a religião quando se trata de uma Comunidade de Povos em que convivem católicos e não católicos. Além disso, é óbvio que o Papa fala sempre do erro que se opõe à verdade religiosa e não do erro científico.

2 – Segundo princípio

  1. Somente a religião católica é verdadeira, e todos os homens são obrigados a adotá-la. E Deus, por sua vontade de salvar todos os homens, concede a todos graças suficientes para chegar à verdadeira religião, para que ninguém seja condenado sem culpa de sua parte.

3 – Terceiro princípio

  1. A sociedade civil tem o dever de reconhecer a verdadeira religião e honrar a Deus segundo esta mesma religião: “Os homens, de fato, unidos pelos laços de uma sociedade comum, não são menos dependentes de Deus do que individualmente; tanto quanto ao indivíduo, a sociedade deve dar graças a Deus, de quem detém a existência, a preservação e a inumerável multidão de seus bens. É por isso que, assim como a ninguém é permitido negligenciar seus deveres para com Deus, […] as sociedades políticas não podem, sem crime, comportar-se como se Deus não existisse de forma alguma; […] ao honrar a Divindade, devem seguir rigorosamente as regras e o modo segundo o qual o próprio Deus declarou querer ser honrado” [5].

4 – Quarto princípio

  1. O ato interno de fé é perfeitamente livre. Portanto, não pode haver obstáculo de coação, quer se trate do ato de fé verdadeira, quer se trate do ato de fé falsa, de forma culposa ou não. A manifestação, no entanto, da fé pública pode ser evitada, e por si só deve ser, pois o erro como tal não tem nenhum direito objetivamente. Consequentemente, sua tolerância não pode ser considerada como uma exigência de justiça e, portanto, sempre válida, mas apenas como uma permissão para um mal menor [6].

B. O ESQUEMA USA NOÇÕES DISTORCIDAS

1 – Noção de liberdade

  1. O esquema obviamente considera que a essência da liberdade consiste nesta possibilidade que os homens têm, por causa da fraqueza da vontade humana, de escolher o bem ou o mal. Se a verdadeira liberdade está intimamente ligada à verdade, segundo esta passagem do Evangelho: “A verdade vos libertará” [7]; a eleição do mal, ou do pecado, bem como a adesão ao erro devem ser antes consideradas como escravidão: “Aquele que comete pecado é escravo do pecado” [8]. Segue-se, portanto, que a adesão à verdade ou ao bem, por um lado, não pode ser julgada da mesma forma que a admissão do erro ou do pecado, por outro, mesmo quando se trata de pessoas que vagueiam de boa fé. Objetivamente, a maior diferença separa aqueles que aderem à verdade e ao bem daqueles que admitem o mal ou o erro. Como resultado, não podemos reconhecer direitos idênticos para ambos. Aquele que adere à verdade aperfeiçoa objetivamente a natureza humana em si mesmo, enquanto aquele que se apega ao erro a distorce. E na esfera social, é preciso levar em conta essa diferença.

2 – Noção de dignidade humana

  1. A dignidade da pessoa humana deve ser considerada apenas como consequência da própria natureza do homem, uma natureza racional que tem como objeto próprio a verdade e o bem. Deste modo, a dignidade da pessoa é aperfeiçoada pela adesão à verdade e ao bem e, pelo contrário, diminuída, embora sempre preservada, quando o homem se afasta da verdade e do bem. Certamente, uma vez que a noção de dignidade envolve uma relação muito mais com a ordem moral do que com a ordem intelectual, sem dúvida é necessário considerar especialmente o caso de quem erra de boa fé. Este, aliás, não deforma sua natureza de maneira voluntária, muito mais seu ato pode ser bom e meritório; porém, objetivamente, diminui a excelência de sua natureza. No entanto, pelo motivo que acabamos de mencionar,Pacem in terris, ou seja, que o homem que cometeu o erro permanece um ser humano e, portanto, não perde a dignidade de sua pessoa [9]. Com efeito, o fundamento da dignidade humana encontra-se na própria natureza racional do homem, e o fundamento permanece mesmo que o uso da razão cesse ou seja mau. No entanto, assim como aqueles que sofrem de doença mental podem ser impedidos de usar sua liberdade para não prejudicar os direitos dos outros, também aqueles que erram de boa fé, mantendo os direitos fundamentais da pessoa humana, podem, no entanto, ser impedidos de manifestar, e a fortiori de propagar, seus erros, para não prejudicar os outros.

3 – Noção de bem comum

  1. A noção de bem comum, tal como está implícita no esquema, é manifestamente insuficiente. Com efeito, quando se trata do bem comum, o esquema não considera suficientemente o fim sobrenatural do homem, ao passo que a sociedade civil não só não pode ignorar tal fim, mas também deve promovê-lo positivamente. Esta doutrina é expressa explicitamente na encíclica Pacem in terris: “Composto de um corpo e de uma alma imortal, o homem não pode, durante esta existência mortal, satisfazer todas as exigências de sua natureza nem alcançar a felicidade perfeita. Também os meios implementados em benefício do bem comum não podem ser um obstáculo à salvação eterna dos homens, mas devem ainda ajudá-la positivamente” [10].

4 – Noção de liberdade religiosa

  1. Quanto à noção de liberdade religiosa, tal como entendida no esquema, deveríamos antes falar de tolerância religiosa, pois a verdadeira liberdade não é dada para fazer o mal, mas apenas para fazer o bem. O mal e o erro só podem ser permitidos como coisas que são encontradas por acidentena natureza humana em seu estado atual na terra, mas não como um corolário necessário que flui da natureza da liberdade.

C. PROPOSIÇÕES INACEITÁVEIS

1 – Primeira proposição

“O Santo Concílio afirma solenemente que o direito ao exercício público da liberdade de consciência em matéria religiosa existe sempre e em toda parte, exceto para o bem comum, e que deve ser reconhecido por todos” [11] .

  1. Por causa dos princípios já mencionados, não se pode admitir que exista sempre e em toda parte um direito à liberdade de consciência, tal como o esquema o entende, ou seja, mesmo para uma consciência invencivelmente errônea. 
  2. Primeiramente, aliás, porque não é um direito em sentido estrito, Pio XII ensina que só a verdade pode criar direitos reais [12]. Em segundo lugar, porque na vida pública, nos assuntos sociais, as ações ditadas por uma consciência errônea devem, por si mesmas, ser impedidas pelo fato de que, pelo mau exemplo que dariam aos outros, seriam, por si mesmas, prejudiciais. Portanto, às vezes elas só podem ser permitidas por um motivo diferente, para evitar um mal maior, por exemplo. Com efeito, todos têm o direito de serem conduzidos à verdade e ao bem pela vida em sociedade. É precisamente nisso que os homens procuram o que lhes falta para a perfeição de sua vida e o que não podem obter por si mesmos, especialmente o que lhes falta para alcançar a perfeição, tanto a inteligência quanto a vontade. Ora, a inteligência só se aperfeiçoa pela verdade, a vontade só pelo bem. A vida em sociedade, não pode, portanto, por si só admitir o que, pelo contrário, afasta os homens da verdade e do bem, como seria o reconhecimento de um direito real em favor da manifestação pública das falsas religiões. Nesse caso, não se poderia dizer que a vida em sociedade favorece positivamente a salvação eterna dos homens, como deveria, como afirma a doutrina da encíclica Pacem in terris, como vimos acima. Assim, tolerar a manifestação pública de falsas crenças religiosas não é lícito sempree em toda parte, mas apenas quando as circunstâncias concretas o exigirem.
  3. A doutrina contida na asserção em questão se baseia na encíclica Pacem in terrisde João XXIII, na seguinte passagem: o direito de honrar a Deus segundo a justa regra de sua consciência e de professar sua religião em privado e vida pública” [13]. Na realidade, este texto obviamente não pode ser compreendido pela consciência invencivelmente errônea, como afirma o autor do diagrama, mas apenas pela consciência conforme à verdade. O contexto desta citação prova isso. João XXIII, de fato, pretende estabelecer sua afirmação a partir de dois textos, um de Lactâncio, outro de Leão XIII. Lactâncio, por sua vez, evoca o direito que os homens têm, por nascimento, de prestar a Deus uma justa e devida homenagem [14]. Isto pode, portanto, ser entendido como tributos devidos e justos objetivamente falando, ou seja, tributos que o próprio Deus pede e ordena aos homens. Não há termo para indicar que Lactâncio significava a consciência invencivelmente errônea em oposição à verdadeira consciência. Leão XIII, por outro lado, trata da liberdade de consciência que os apóstolos proclamaram constantemente, que os apologistas demonstraram e que os mártires consagraram com seu sangue [15]. Mas, os apóstolos, os apologistas e principalmente os mártires sempre lutaram apenas pela liberdade da verdadeira religião, e não pela das falsas religiões, mesmo que fossem professadas de boa fé. Além disso, Leão XIII, na encíclica Immortale Dei, não admite esse direito absoluto à liberdade religiosa, no qual, segundo o esquema, consiste na liberdade religiosa. Ele declara, com efeito, que a sociedade civil deve honrar a Deus da maneira e pelo caminho que Deus declarou querer ser honrado [16] , e não de uma maneira que seria ditada pela consciência dos cidadãos, mesmo que seja invencivelmente errônea. Além disso, João XXIII, nesta mesma encíclica Pacem in terris, apresenta como fundamento da paz (daí o título da encíclica) e da ordem social, em primeiro lugar, a verdade; depois vem a liberdade, que ele também apresenta como fundamento da ordem social, mas uma liberdade que não deve ser entendida senão como aquela que não está em contradição com a verdade. Caso contrário, seria preciso admitir uma contradição no pensamento do Pontífice. A verdade, de fato, é algo objetivo e universal, ao qual as ações do livre arbítrio do homem também devem corresponder objetivamente, para que a paz e a ordem social sejam alcançadas. Deve, portanto, concluir-se que o texto de João XXIII só pode ser compreendido pela verdadeira consciência.
  4. O autor do esquema afirma então que a doutrina que ele sustenta, e considera ser a de João XXIII, encontra confirmação no discurso proferido por Paulo VI, felizmente reinante, na abertura da segunda sessão do Concílio Vaticano II [17]. No entanto, as palavras de Paulo VI não parecem resolver a dificuldade. De fato, o Papa trata da liberdade religiosa que é oprimida em alguns lugares, assim como de outros direitos humanos fundamentais. Isso não significa, porém, que ele tenha ouvido falar dessa liberdade religiosa da qual o erro poderia se beneficiar desde o momento em que é professada de boa fé. Com efeito, como é óbvio que, por um lado, o erro não pode de modo algum criar um direito objetivo [18], e que, por outro lado, aquele que vagueia sofre mais de certo cativeiro do que goza de verdadeira liberdade, as palavras do Pontífice, salvo prova em contrário, devem ser entendidas da liberdade de profissão da verdadeira religião.

         Além disso, as outras palavras do mesmo Paulo VI no endereço mencionado não são mais favoráveis ​​ao autor do esquema. De fato, o Pontífice expressa ali sua dor ao ver que muitos sofrem muitos insultos na confissão livre e honesta de sua religião. Assim, o Sumo Pontífice está interessado em um fato particular que de forma alguma indica que ele está falando de um direito absoluto ou de uma tolerância que deveria ser permitida em um caso específico. Além disso, é claro que Paulo VI tem diante de seus olhos os povos que gemem sob o jugo comunista. No entanto, o comunismo pretende destruir os próprios fundamentos da religião – fundamentos que também são encontrados nas falsas religiões, ou seja, a afirmação de um ser supremo e a dependência dos homens dele. Devido ao qual, seu modo de ação é condenável e representa uma verdadeira injustiça, inclusive quando se esforça para destruir as falsas religiões. Os povos assim oprimidos pelo comunismo sofrem, portanto, realmente uma injustiça. Com efeito, no direito de professar a verdadeira religião está contido o direito fundamental e natural de professar a religião natural. Essa é até uma das razões pelas quais às vezes é tolerado professar publicamente uma religião falsa de boa fé. Mas não decorre disso um direito real que as falsas religiões teriam, sempre e em todos os lugares, de exercer-se aberta e publicamente. Com efeito, no direito de professar a verdadeira religião está contido o direito fundamental e natural de professar a religião natural. 

  1. O autor do esquema procura expor uma doutrina de certa novidade e, consequentemente, pretende mostrar que essa novidade nada mais é do que a evolução de uma doutrina idêntica, mas expressa de forma diferente ao longo dos anos em virtude das distintas circunstâncias históricas e ideológicas. É indubitavelmente verdade que a doutrina revelada, embora imutável, pode sofrer uma certa evolução quanto ao seu conhecimento. De tal forma, porém, que o sentido permaneça sempre idêntico, e o significado idêntico .. Mas precisamente esta regra de ouro de São Vicente de Lérins claramente não é respeitada no esquema. Segundo o autor do esquema, a doutrina constante é aquela que diz respeito à dignidade da pessoa humana, bem como a preocupação com a liberdade do homem. E esta doutrina deve ser aprofundada pela introdução de uma dupla distinção, a saber, primeiro entre as falsas ideologias e os movimentos ou instituições que delas surgiram, e em segundo lugar entre os erros religiosos e os direitos dos que erram de boa fé. A conclusão a que o autor chega contém, assim, uma doutrina verdadeiramente nova e estranha à Tradição. Com efeito, ele conclui que as falsas religiões têm um direito genuíno de manifestação pública, e a absoluta incapacidade do Estado em matéria religiosa, como privados de direitos em face do foro de consciência. No entanto, a doutrina tradicional, constante e independente das circunstâncias do tempo e do lugar, extraída da própria natureza e da Revelação, afirma por um lado que o erro nunca pode criar um direito real na cidade, dado que os direitos do homem fluem de sua natureza feita para o verdadeiro e, por outro lado, que a sociedade, pelo fato de que ela mesma procede de Deus, deve reconhecer o verdadeiro Deus e servi-lo de acordo com a maneira pela qual ele obviamente quer ser honrado.

       Quanto à distinção formulada por João XXIII na encíclica Pacem in terris , uma distinção entre ideologias e os movimentos que delas derivam, deve-se ler com atenção as palavras do Pontífice para não aprovar movimentos que procedem dessas falsas ideologias [20]. Uma vez que, como já dizia São Tomás, em todo erro há uma tendência essencial do espírito para a verdade, tais movimentos, tirando suas origens de falsas ideologias, podem, no entanto, apesar de tudo, buscar em si algum bem e coisas condizentes com a natureza. E é somente a esse respeito, na medida em que podem ser separadas dessas falsas ideologias, que elas são de natureza a serem aprovadas e admitidas. Quanto à outra distinção feita por João XXIII, o Pontífice não conclui dela senão a permanência da dignidade humana naqueles que erram de boa fé. Portanto, é errado concluir dessa distinção um direito das falsas religiões a serem publicamente reconhecidas.

  1. Quanto aos demais documentos pontifícios citados pelo esquema para fundamentar essa doutrina, o que devemos pensar deles ficará exposto na crítica das demais proposições do esquema. De fato, pelas mesmas razões, outras propostas do esquema não podem ser aprovadas.

2 – Segunda proposição

“Enquanto permanecer em erro invencível, a pessoa humana é digna de estima e sua liberdade religiosa é reconhecida e defendida pela Igreja” [22].

  1. Em apoio a esta tese, o Papa Pio XII é citado em seu discurso You Wantedde 7 de setembro de 1955. No entanto, o Papa trata aí da liberdade de abraçar a fé, que é uma questão também das convicções daqueles que ainda não têm a fé, convicções dadas como razão, embora não a principal, de tolerância para com eles [23]. Pio XII nada diz sobre o direito à liberdade religiosa, o direito para o qual o esquema pede esta citação, o direito de manifestar publicamente uma crença errônea de boa fé. Pelo contrário, a evocação de uma razão de tolerância mostra claramente que não se trata de um direito real. Aqueles que não podem ser defendidos pela lei são de fato tolerados.

3 – Terceira proposição

“Esta mesma liberdade religiosa deve ser respeitada não apenas em relação aos cristãos, mas em relação a cada um dos homens, bem como em relação às associações humanas” [24].

  1. Em apoio a esta tese, são citados os textos dos Papas João XXIII, Pio XII, Pio XI e Leão XIII.
  2. Já examinamos o texto da encíclica Pacem in terrisde João XXIII na exposição das razões pelas quais rejeitamos a primeira proposição.
  3. Pio XII, na radio mensagem de 24 de dezembro de 1942, evoca o direito fundamental da pessoa humana de prestar culto a Deus tanto em privado como em público. Ele não especifica, no entanto, que também está falando do culto errôneo professado de boa fé. Por conseguinte, podemos e devemos entendê-lo a partir do culto verdadeiro e próprio, isto é, aquele que o próprio Deus impôs ao homem pela criação da Igreja na qual todos devem entrar; especialmente porque Pio XII não reconhece um direito real ao erro: “O que não corresponde à verdade ou ao padrão de moralidade, objetivamente não tem direito, nem de ser nem de ser propagado, nem de agir” [25].
  4. Quanto ao Papa Pio XI, quando afirma que o fiel tem o direito, direito inalienável, de professar e praticar a sua fé, quando afirma que as leis contrárias a este direito estão em contradição com a lei natural [ 26], fala apenas de fé verdadeira e não de erro, incluindo o erro inocente, como é evidente em toda a encíclica Mit brennender Sorge, na qual o Pontífice trata com cuidado a fé autêntica em Deus, impossível sem a fé em Jesus Cristo que a única Igreja Católica mantém com vigor.
  5. Leão XIII, por sua vez, trata da liberdade de consciência que o homem tem de seguir a vontade de Deus e cumprir seus preceitos. O que só pode ser entendido corretamente a partir da vontade objetiva de Deus, e não da vontade suposta de Deus por aquele que está em erro; isto é evidente pelo fato de que o Papa também fala dos preceitos; Os mandamentos de Deus de fato são objetivos ou não, nenhuma obrigação poderia ser dada para seguir um mandamento inexistente de Deus. Ora, precisamente, a consciência invencivelmente errônea é aquela que crê ver um preceito onde não há preceito objetivo de Deus.

4 – Quarta proposição

“A Igreja Católica declara a intolerância religiosa no mais alto grau odiosa e ofensiva à pessoa humana. De fato, por ela o homem é privado de sua liberdade de observar as exigências ditadas por sua consciência, exigências estas que são supremas e mais sagradas mesmo para os que erram de boa fé” [27].

  1. Para provar esta afirmação, o Papa João XXIII é citado na encíclica Pacem in terrise Pio XII na radiomensagem de 1 de junho de 1941.
  2. Tanto João XXIII [28]como Pio XII [29]evocam o dever dos homens de reconhecer e respeitar os direitos dos outros. Este dever pressupõe, evidentemente, que se trata de direitos reais. No entanto, como vimos acima, a liberdade religiosa, como entendida pelo esquema, não cria um direito real porque o erro não pode objetivamente fundar nenhum direito.
  3. Quanto à afirmação em questão, não se pode afirmar universalmente que a intolerância religiosa seja no mais alto grau odiosa e ofensiva à pessoa humana. Com efeito, quando se trata aqui de um Estado onde a unidade religiosa se estabelece em torno da verdadeira fé, o bem comum de tal nação exige que essa unidade não seja prejudicada pela manifestação pública de falsas religiões. Portanto, em tal estado, a adoração falsa não poderia ser tolerada sem pecado .
  4. Tampouco se pode dizer que tal intolerância seja ofensiva à pessoa humana, pois, no que diz respeito à vida em sociedade, o bem comum pode até exigi-la. Finalmente, embora as exigências da consciência possam parecer muito sagradas para quem erra de boa fé, não estando objetivamente em conformidade com a verdade, elas não criam objetivamente nenhum direito para ele, nem nenhum dever para os outros.

5 – Quinta proposição

“Em matéria religiosa, a Igreja Católica reivindica a exclusão de toda coação externa… para que a verdadeira liberdade religiosa, ou o direito da pessoa, não possa ser impedida por ninguém. A Igreja Católica afirma que tal liberdade pertence tanto às pessoas humanas tomadas individualmente como às associações de homens que, segundo as exigências de sua consciência, se reúnem para conduzir e promover uma vida religiosa” [31].

  1. Em apoio a esta tese, são citados dois textos dos Papas João XXIII, encíclica Pacem in terris, e Leão XIII, encíclica Sapientiæ christianæ, textos dos quais o autor do diagrama conclui: “Como resultado, um governo age de forma abusiva e viola no mais alto grau esta coisa sagrada que é o homem quando interfere no governo ou no cuidado das almas (nota 7) .
  2. No entanto, o lugar citado da encíclica Pacem in Terris, onde João XXIII recorda a prática nos Estados modernos de registar os direitos dos cidadãos, persegue apenas um objetivo, o de mostrar como os homens estão atualmente a adquirir uma maior consciência da sua própria dignidade. Nada mais. Além disso, o fato de João XXIII reconhecer que o poder civil tem o dever de reconhecer os justos limites da liberdade, bem como de assegurar o devido respeito aos direitos [34], não constitui argumento válido na medida em que, como vimos, o erro não pode criar um direito real.
  3. O texto de Leão XIII, por sua vez, não contém a conclusão do autor do esquema. Com efeito, o Pontífice trata da competência do Estado em matéria religiosa, competência que no estado atual do gênero humano foi confiada apenas à Igreja [35]. No entanto, é errado concluir que o Estado pode ignorar o que é a verdadeira religião e, portanto, permitir o culto de todas as religiões. Vimos acima o mesmo Leão XIII afirmar o dever da sociedade civil de reconhecer a verdadeira religião e empregar para o culto aquela pela qual Deus manifestou seu desejo de ser honrado [36].
  4. Por outro lado, João XXIII ensina claramente que entre os constituintes do bem comum, cujo cuidado é confiado à sociedade civil, está o dever de prover o necessário para obter a salvação eterna dos homens. Consequentemente, o poder civil deve reconhecer e promover a verdadeira religião.
  5. Portanto, parece claramente que a afirmação, como proposta pelo esquema, é simplesmente errônea, a Igreja Católica não pode de forma alguma reconhecer o direito à profissão pública, bem como à propagação de falsas religiões, quer seja para indivíduos sozinhos ou para assembleias compostas de homens que professam os mesmos erros. E a razão para isto é, por um lado, que não existe tal direito verdadeiro e, por outro lado, que tal profissão e propagação são inerentemente opostas ao bem comum, criando para os homens um escândalo tal que os afasta da verdadeira religião. A Igreja pede apenas que a profissão pública de falsas religiões seja tolerada em certas circunstâncias manifestas.

6 – Sexta proposição

“O poder público não pode impor aos cidadãos a profissão de determinada religião como condição para que possam participar com plenos direitos da vida da nação e da cidade. O poder humano deve respeitar a justiça e a equidade para com todos aqueles que obedecem em matéria religiosa ao que sua consciência ditar” [38].

  1. Tal proposição é perfeitamente óbvia. É certo, de fato, que o poder público não pode impor aos cidadãos a profissão de determinada religião como condição necessária para o gozo do bem da vida social, pois a profissão religiosa é um ato interno a cada homem e o poder público não pode julgar o foro interno. Por outro lado, pode impor a profissão da verdadeira fé no exercício de certos ofícios, que o bem comum pode, de fato, exigi-lo.
  2. A segunda parte da proposição é correta na medida em que não se estende à profissão de falsas religiões, uma vez que não gozam de direitos reais [39], e também na medida em que a profissão pública de falsas religiões não é considerada inofensiva a outros cidadãos.

7 – Sétima proposição

“Tal liberdade religiosa é ofendida tanto por sentenças de morte por motivos religiosos, como pela espoliação de bens também por motivos religiosos, a privação do que é necessário para uma vida digna, a recusa da igualdade social, civil ou nacional, ou mesmo a impossibilidade de praticar atos civis e exercer os direitos fundamentais comumente reconhecidos por todos os povos” [40].

  1. Esta proposição também é evidente. Em primeiro lugar, não distingue boa-fé de má-fé entre aqueles que professam uma religião falsa. Em segundo lugar, a liberdade religiosa, como também diz respeito às falsas religiões, deve ser distinguida da liberdade de professar a verdadeira fé. Com efeito, a profissão de uma religião falsa pode ser prejudicial à vida social de tal maneira que pode e deve ser reprimida por penas impostas à revelia, penas mais ou menos pesadas segundo o grau de nocividade e perversidade.
  2. Quanto ao documento apresentado em apoio deste argumento, não é conclusivo. De fato, João XXIII, na citada passagem da encíclica Pacem in terris, apenas elogia o reconhecimento geral da dignidade da pessoa humana [41]. Resta provar que esta dignidade humana requer liberdade de consciência e profissão pública do erro.

8 – Oitava proposição

“No nosso tempo e em toda a terra, a liberdade religiosa deve ser objeto de uma atenção particular, porque hoje em dia as relações cada vez mais frequentes unem homens de vários cultos e religiões” [42] .

  1. Como tal, a proposta não pode ser aprovada. Com efeito, apresenta como argumento a favor da liberdade de profissão pública do erro as “relações cada vez mais frequentes” entre homens de vários cultos e religiões. Obviamente, tal argumento não é suficiente para admitir que a unidade da verdadeira fé existente em um determinado estado possa ser exposta à destruição pelas relações com homens de outras religiões. Nunca se deve fazer o mal para obter um bem, a fortiori, quando o bem esperado deveria, na realidade, ser chamado de mal menor. Devemos antes afirmar, pelo contrário, que é necessário tomar todos os meios lícitos para que a unidade da verdadeira fé não seja prejudicada por relações cada vez mais frequentes com seguidores de falsas religiões.
  2. O documento pontifício citado em primeiro lugar, o discurso de Pio XII aos membros do tribunal da Rota Romana de 6 de outubro de 1946 [43], não trata da tolerância religiosa em geral, mas apenas da tolerância “quando dentro do mesmo pessoas” são misturadas várias denominações religiosas. Isso significa que a tolerância civil e social parece necessária apenas quando essa circunstância é verificada (“in tali circostanze”).
  3. Quanto ao discurso de Ci Riesede 6 de dezembro de 1953, também citado em apoio a esta tese, não parece de forma alguma conclusivo, como afirma o autor do esquema. Aliás, eis o que diz o discurso: “Dentro de seu território e para os seus cidadãos, cada Estado determinará os assuntos religiosos e morais de acordo com a sua própria lei . Ou seja, qualquer Estado, de fé islâmica por exemplo, incorporado em uma Comunidade de Estados, poderia resolver questões religiosas em seu território e para seus súditos de forma a impor a religião islâmica a todos os cidadãos. E segundo o autor do esquema, Pio XII permitiria que “os cidadãos católicos e os chefes de Estado católicos aprovassem em consciência tal lei” [45]. Em outras palavras, seria dizer que em tal estado os católicos e a Igreja renunciariam em sã consciência a obedecer ao preceito do Senhor de pregar o Evangelho a todas as criaturas. O autor do esquema obviamente conclui apressadamente. Na realidade, Pio XII rejeita tal conclusão. As palavras citadas pelo autor do diagrama expressam um princípio provável segundo o qual os assuntos religiosos seriam ordenados dentro de uma Comunidade de Estados onde coexistem diferentes religiões. Mas este estatuto legal, que ele considera provável, Pio XII de modo algum aprova [46]. E, de fato, um pouco mais adiante no mesmo discurso, ele expõe claramente os direitos imutáveis ​​da verdade em qualquer Estado: “Primeiro, deve-se afirmar claramente que nenhuma autoridade humana, nenhum estado, nenhuma comunidade de caráter, não pode dar um mandato positivo ou uma autorização positiva para ensinar ou fazer o que seria contrário à verdade religiosa e ao bem moral. Um mandado ou autorização deste tipo não seria vinculativo e permaneceria ineficaz. Nenhuma autoridade poderia dá-los porque é contra a natureza compelir a mente e a vontade do homem ao erro e ao mal ou considerar ambos indiferentes 

III. Proposta

  1. Que o capítulo Da Liberdade Religiosaseja revisto de alto a baixo. Chame-se antes de Liberdade de Consciênciae exponha a doutrina tradicional a respeito dos direitos da verdade, da necessidade de entrar na Igreja Católica e da tolerância em assuntos religiosos.

Dom Gerald de Proença Sigaud

Notas de rodapé

  1. Dom de Proença Sigaud, “Observações escritas sobre o capítulo V do esquema sobre a liberdade religiosa” in Acta synodalia sacrosancti concilii oecumenici vaticani secundi, Vol. III, parte III, pág. 648-657. Estas observações escritas foram redigidas no final da nonagésima quinta assembléia geral do Conselho, entre dezembro de 1963 e maio de 1964. 
  2. “Ciò che non risponde alla verità e alla norma moral, non ha oggettivamente alcun diritto nascido all’esistenza, nascido alla propaganda, nascido all’azione”. Discurso de Ci Riesce a juristas católicos italianos, 6 de dezembro de 1953; Discursos e mensagens de rádio de SS Pio XII, XV, p. 488. 
  3. [A expressão rationabiliter invitus, que poderia ser traduzida aqui como razoavelmente contra, qualifica em teologia moral um sujeito que por si mesmo, razoavelmente, não se opõe à ação que se submete, ainda que, por outra razão que não a sua razão, seja de fato contra ela. Aqui o homem não deve se opor a ser impedido de aderir ao erro ou fazer o mal, pois esse impedimento é, em si, bom para ele. Não seria razoável se opor a isso, mesmo que, de fato, ele se oponha]. 
  4. “Il non impedirlo (scilicet, quod veritati vel normae moralitatis non respondet) per mezzo di leggi statali e di dispositivos coercive può nondimeno essere giustificato nell’interesse di un bene superiore e mais vasto”. Pio XII, Alocução Ci riesce; ênfase do autor. 
  5. Leão XIII, Encíclica Immortale Dei, 1 de novembro de 1885, §§12 e 13. [  ]
  6. Cf. Pio XII, Alocução Ci riesce citada acima. 
  7. João VIII, 32.
  8. João VIII, 34. 
  9. “O homem que é desencaminhado no erro permanece sempre um ser humano e conserva a sua dignidade de pessoa”. João XXIII, Encíclica Pacem in terris , 11 de abril de 1963, §158, AAS, t. 55, pág. 299. 
  10. “Homines, utpote qui ex corpore et animo im-mortali constent, intra mortalem hanc vitam neque suas explere necessitates, neque perfectam adipisci felicitatem possunt. Quocirca commune bonum eiusmodi viis atque rationalibus parandum est, quibus non modo æternæ hominum saluti non officiatur, sed etiam eidem serviatur”. João XXIII, encíclica Pacem in terris , §59. João XXIII repete o mesmo princípio mais adiante, §146: “Esforçar-se-ão também para que as instituições relativas à vida econômica, social, cultural ou política não impeçam, mas, ao contrário, ajudem o ‘esforço de aperfeiçoar os homens, tanto no plano natural como no sobrenatural’. Pio XI, Encíclica Quadragesimo Anno , 15 de maio de 1931, AAS, t. 23, pág. 215.
  11. “Sacra Synodus solemniter afirmaat ius ad libertatem conscientiæ in re religiosa external EXERCISE, salvo bono communi, sempre et ubique valere et ab omnibus agnoscendum esse”, n. 5 versus finem .12 Ci riesce discurso citado acima. 
  12. Ci riesce discurso citado acima. 
  13. “In hominis iuribus hoc quoque numerandum est, ut et Deum, ad rectam conscientiæ suæ normam, venerari possit, et religionem privatim publice profiti”. João XXIII, encíclica Pacem in terris , §14. 
  14. “Recebemos a existência para render a Deus, que nos concede, a justa homenagem que lhe é devida, de conhecê-lo somente e segui-lo somente. Esta obrigação de piedade filial nos acorrenta a Deus e nos liga a Ele, daí o nome religião”. Lactantius (250-325), Instituições Divinas, Livro IV. 
  15. “Esta verdadeira liberdade, verdadeiramente digna dos filhos de Deus, que protege adequadamente a nobreza da pessoa humana, prevalece contra toda violência e toda tentativa injusta; a Igreja sempre o pediu, nunca teve nada mais caro. Os apóstolos reivindicaram constantemente essa liberdade, os apologistas a justificaram em seus escritos, os mártires em massa a consagraram com seu sangue”. Leão XIII, encíclica Libertas præstantissimum , 20 de junho de 1888.
  16. “Assim, as sociedades políticas não podem, sem crime, comportar-se como se Deus não existisse de forma alguma; … ao honrar a Divindade, eles devem seguir estritamente as regras e o modo segundo o qual o próprio Deus declarou querer ser honrado”. Leão XIII, Immortale Dei , 1 de novembro de 1885, §13. 
  17. “Como estamos angustiados ao ver que em certos países a liberdade religiosa e outros direitos humanos fundamentais são violados por princípios e métodos de intolerância política, racial ou anti-religiosa. Sofremos ao ver como no mundo ainda existem tantas injustiças contra a profissão honesta e livre da própria fé religiosa”. Paulo VI, Discurso de abertura da segunda sessão do Concílio Vaticano II, 29 de setembro de 1963. 
  18. Cf. Pio XII, Alocução Ci riesce citada acima. 
  19. [“In eodem scilicet dogmate, eodem sensu, eademquessentia”. São Vicente de Lérins, Commonitorium , n. 28. Esta regra foi repetida nas próprias palavras de São Vicente de Lérins na Constituição Dei Filius do primeiro Concílio Vaticano.] 
  20. “Da mesma forma, não se pode identificar falsas teorias filosóficas sobre a natureza, origem e finalidade do mundo e do homem, com movimentos históricos fundados com uma finalidade econômica, social, cultural ou política, ainda que estes tenham sua origem e ainda se inspirem. dessas teorias. Uma doutrina, uma vez fixada e formulada, não muda, enquanto os movimentos que têm por objeto as condições concretas e mutáveis ​​da vida não podem deixar de ser amplamente influenciados por essa evolução. Além disso, na medida em que esses movimentos estão de acordo com os sólidos princípios da razão e respondem às justas aspirações da pessoa humana, quem se recusaria a reconhecer neles elementos positivos dignos de aprovação? » João XXIII, encíclica Pacem in terris, §159. 
  21. “É justiça sempre distinguir entre o erro e aqueles que o cometem, mesmo que sejam homens cujas ideias falsas ou insuficiente de noções concernem à religião ou à moral. O homem desencaminhado no erro permanece sempre um ser humano e preserva a sua dignidade de pessoa a quem é sempre necessário ter em consideração”. João XXIII, encíclica Pacem in terris , §158. 
  22. “Quamdiu in errore invincibili versatur, persona humana æstimatione digna est atque eius libertas religiosa ab Ecclesia agnoscitur et vindicatur”. pág. 4, não. 2, l. 18-20. 
  23. Pio XII, Discurso aos participantes do X Congresso Internacional de Ciências Históricas, 7 de setembro de 1955: “Aos não católicos, a Igreja aplica o princípio retomado no Código de Direito Canônico, ad amplexandam fidem catholicam nemo invitus cogatur (c 1351), e considera que suas convicções constituem uma razão, mas não a razão principal, para a tolerância”. Discursos e mensagens de rádio de SS Pio XII, t. XVII, pág. 211-222. 
  24. “Eadem libertas religiosa non tantum a christianis, sed ab omnibus et singulis hominibus et a communi hominum conviventia observanda est”. pág. 4, não. 3, iniciação
  25. Ci riesce discurso citado acima. 
  26. “O crente tem o direito inalienável de professar sua fé e vivê-la como ela quer ser vivida. As leis que sufocam ou dificultam a profissão e a prática desta fé estão em contradição com a lei natural”. Pio XI, encíclica Mit brennender Sorge (10 de março de 1937), §36. 
  27. “Ecclesia catholica intolerantiam religiosam summo gradu odiosam atque offensivam erga personam humanam esse declarat. Ipsa, enim, homo privatur libertate sua in observandis iis dictaminibus conscientiæ suæ quæ ipsi etiam bona fide erranti ut suprema et sacratissima aparente”. pág. 5, não. 3 subs finos
  28. Encíclica Pacem in terris , §44: “Seus próprios direitos, é sobretudo como tantas expressões de sua dignidade que ele (o homem) deverá reivindicá-los, e sobre todos os outros recairá a obrigação de reconhecer esses direitos e respeitá-los”. 
  29. Radiomensagem por ocasião do cinquentenário da Rerum novarum , 1º de junho de 1941: “A proteção deste direito assegurará a dignidade pessoal do homem e lhe dará a facilidade de se dedicar ao cumprimento, em justa liberdade, deste conjunto de obrigações constantes e decisões pelas quais ele é diretamente responsável perante o Criador. Com efeito, compete ao homem o dever inteiramente pessoal de conservar e aperfeiçoar a própria vida material e espiritual, a fim de atingir o fim religioso e moral que Deus designou a todos os homens e lhes deu como suprema norma, obrigando-os sempre e em todos os casos, antes de todos os seus outros deveres”. 
  30. Cf. a análise da proposição n° 1 e a doutrina do Papa Pio XII. [  ]
  31. “In materia religiosa prædicta externæ coactionis exclusio ab Ecclesia catholica vindicatur… ut vera “libertas religiosa” seu ius personæ ne ab aliis impediatur quominus observet et proclamaet oficia sua publica et privada erga Deum et erga homines, singulariter vel coletiva sumptos, prout conscientia manifestantur. Ecclesia catholica afirmat talem libertatem religiosam competere tum singulis personis humanis tum coetibus hominum, qui demandeiis suæ conscientiæ adducuntur ut collatis viribus vitam religiosam ducant vel promoveant”. pág. 5, não. 4. 
  32. pág. 10, nota 7.
  33. “Na organização jurídica das comunidades políticas na era moderna, notamos antes de tudo uma tendência a redigir em fórmulas claras e concisas uma carta de direitos humanos fundamentais. (…) No entanto, as tendências que acabámos de assinalar o comprovam bastante: os homens do nosso tempo adquiriram uma consciência mais aguçada da sua dignidade”. Pacem in terris , §§75 e 79. 
  34. “A razão de ser dos poderes públicos é alcançar o bem comum, cujo elemento fundamental consiste em reconhecer o justo domínio da liberdade e proteger seus direitos”. Pacem no território, §104. 
  35. Leão XIII, Encíclica Sapientiæ christianæ, 10 de janeiro de 1890, § 37: “Abalaríamos a integridade da fé se duvidássemos que somente a Igreja foi investida de tal poder para governar as almas, com exclusão absoluta da autoridade civil. [Mas esta distinção entre a Igreja e o Estado, por causa de seu domínio próprio, não significa, no pensamento de Leão XIII, um desinteresse do Estado no que concerne à religião: “É por isso que, da tranquilidade da ordem pública, fim imediato da sociedade civil, o homem espera os meios para se aperfeiçoar fisicamente e, sobretudo, o de trabalhar por sua perfeição moral, que reside exclusivamente no conhecimento e na prática da virtude. […] Desde então,Sapientiæ christianæ , §§ 40 e 41.] 
  36. “Assim, as sociedades políticas não podem, sem crime, comportar-se como se Deus não existisse de forma alguma; … ao honrar a Divindade, eles devem seguir estritamente as regras e o modo segundo o qual o próprio Deus declarou querer ser honrado”. Immortal Dei , § 13.
  37. “Assim, os meios implementados em benefício do bem comum não podem ser um obstáculo à salvação eterna dos homens, mas devem ainda ajudá-la positivamente”. Pacem no território, §59. 
  38. “Potestas publica nequit impoonere civibus professionem determinatæ religionis tamquam conditionem ut pleno et integro iure vitae nacionali et civili participare valeant. Potestas humana debet iustitiam et æquitatem observae erga omnes qui in re religiosa dictamini suæ conscientiæ obediunt”. pág. 6, não. 5, l. 15-19. 
  39. Cf. Pio XII, Alocução Ci riesce citada acima. 
  40. “Hæc libertas religiosa pariter offenditur præprimis damnatione mortis propter rationes religiosas, sed præterea religionis causa peractis spoliatione bonorum, privatione eorum quæ ad vitam decentem requiruntur, abnegatione æqualitatis socialis vel civilis, nationalitatis, competente ad actus civiles, exercitium conbus fundamentali er nation eorum iurum agnoscuntur”. pág. 6, não. 5, l. 20-25. 
  41. “Os homens de nosso tempo adquiriram uma consciência mais aguçada de sua dignidade; que os leva a participar ativamente nos assuntos públicos e a exigir que as estipulações do direito positivo dos Estados garantam a inviolabilidade de seus direitos pessoais”. Pacem no território, §79.
  42. “Nostris temporibus ubique terrarum libertas religiosa speciali modo urgenda est quia in dies frequentiores fiunt relationses quibus homines disparis cultus et diversae religionis inter se connectuntur”. pág. 6, não. 5 sub finos.
  43. “Os contatos cada vez mais frequentes e a mistura confusa das várias confissões religiosas dentro de um mesmo povo levaram os tribunais civis a seguirem o princípio da ‘tolerância’ e da ‘liberdade de consciência’. Há também uma tolerância política, civil e social para com os seguidores de outras religiões que, neste tipo de circunstâncias, é também um dever moral para os católicos. » Discurso de Sua Santidade Pio XII à Rota Romana, 6 de outubro de 1946, AAS, 38, 1946, p. 391. [  ]
  44. “Nell’interno del suo território e per i suoi cittadini ogni Stato regolerà gli affari religiosos e morali con una propria legge”. 
  45. pág. 11, n.11 sub-multa. 
  46. [O Papa Pio XII evoca aqui, perante uma assembléia de juristas italianos, a possibilidade de ver aparecer nas Comunidades dos Estados leis relativas às religiões e aplicáveis ​​a todos os países membros dessas Comunidades. “De acordo com as probabilidades e as circunstâncias”, disse ele, “esta regulamentação do direito positivo seria assim formulada: dentro de seu território e para seus cidadãos, cada Estado determinará os assuntos religiosos e morais de acordo com sua própria lei”. Pio XII não pretende de modo algum tornar seu este princípio, apenas considera provável que num futuro mais ou menos próximo as Comunidades de Estados venham a adoptar este tipo de princípio. Com este provável princípio sendo exposto, Pio XII continua: “Para o jurista, político e Estado católico, surge aqui a questão: eles podem consentir em tal acordo quando se trata de entrar na Comunidade dos Povos e lá permanecer? O princípio citado não é, portanto, a expressão do pensamento do Papa, mas Pio XII pretende opor-se a ele com o ensinamento da Igreja. 
  47. “Innanzi tutto occorre affermare chiaramente: che nessuna autorità umana, nessuno Stato, nessuna Comunità di Stati, qualunque sia il loro carattere religioso, religiosa pode ousar um mandatório positivo ou uma autorização positiva d’insegnare o di fare ciò che sarebbe contrário alla verità o al bene moral. Un obrigatório o una autorizzazione di questo genere non avrebbero forza obligatoria e resterebbero inefficaci. Nessuna autorità potrebbe darli, perché è contro natura di obrigare lo spirito e la volontà dell’uomo all’errore ed al male oa considere l’uno e l’altro come indidifferenti”.