Começará o julgamento, abrindo-se os autos do processo, isto é, as consciências de todos (Dn 7,10). Os primeiros testemunhos contra os réprobos serão do demônio, que dirá — segundo Santo Agostinho:
“Justíssimo juiz, sentencia, que são meus aqueles que não quiseram ser teus”
A própria consciência dos homens os acusará depois (Rm 2,15). A seguir, darão testemunho, clamando vingança, os lugares em que os pecadores ofenderam a Deus (Hb 2,11). Virá, enfim, o testemunho do próprio Juiz que esteve presente a quantas ofensas lhe fizeram (Jr 29,23). Disse São Paulo que naquele momento o Senhor “porá às claras o que se acha escondido nas trevas” (1Cor 4,5). Descobrirá, então, ante os olhos de todos os homens as culpas dos réprobos, até as mais secretas e vergonhosas que em vida eles ocultaram aos próprios confessores (Na 3,5). Os pecados dos eleitos, no sentir do Mestre das Sentenças e de outros teólogos, não serão manifestados, mas ficarão encobertos, segundo estas palavras de David:
“Bem-aventurados aqueles, cujas iniquidades foram perdoadas, e cujos pecados são apagados” (Sl 31,1).
Pelo contrário — disse São Basílio — as culpas dos réprobos serão vistas por todos, ao primeiro relancear d’olhos, como se estivessem representadas num quadro. Exclama São Tomás, “Se no horto de Getsêmani, ao dizer Jesus: Sou eu, caíram por terra todos os soldados que vinham para o prender, que sucederá quando, sentado no seu trono de Juiz, disser aos condenados: “Aqui estou, sou aquele a quem tanto haveis desprezado!”
Chegada a hora da sentença, Jesus Cristo dirá aos eleitos estas palavras, cheias de doçura:
“Vinde, benditos de meu Pai, e possuí o reino que vos está preparado desde o princípio do mundo” (Mt 25,34).
Quando São Francisco de Assis soube por revelação que era predestinado, sentiu altíssimo e inefável consolo. Que consolação não sentirão aqueles que ouvirem estas palavras do soberano Juiz:
“Vinde, filhos benditos, vinde a meu reino. Já não há mais a sofrer, nem a temer. Comigo estais e permanecereis eternamente. Abençoo as lágrimas que sobre os vossos pecados derramastes. Entrai na glória, onde juntos permaneceremos por toda a eternidade”.
A Virgem Santíssima abençoará também os seus devotos e os convidará a entrar com ela no céu. E assim, os justos, entoando gozosos Aleluias, entrarão na glória celestial para possuírem, louvarem e amarem eternamente a Deus.
Os réprobos, ao contrário, dirão a Jesus Cristo:
“E nós, desgraçados, que será feito de nós?”
E o Juiz Eterno dir-lhes-á:
“Já que desprezastes e recusastes minha graça, apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno (Mt 24,34). Apartai-vos de mim, que nunca mais vos quero ver nem ouvir. Ide, ide, malditos, que desprezastes minha bênção…”
Mas para onde, Senhor, irão estes desgraçados?… Ao fogo do inferno, para arder ali em corpo e alma… E por quantos séculos?… Por toda a eternidade, enquanto Deus por Deus.
Depois desta sentença — diz Santo Efrém — os réprobos despedir-se-ão dos anjos, dos santos e da Santíssima Virgem, Mãe de Deus.
“Adeus, justos; adeus, cruz; adeus, glória; adeus, pais e filhos; jamais nos tornaremos a ver! Adeus, Mãe de Deus, Maria Santíssima”.
Nesse instante, abrir-se-á na terra um imenso abismo e nele cairão conjuntamente demônios e réprobos. Verão como atrás deles se fechará aquela porta que nunca mais se há de abrir… Nunca mais durante toda a eternidade!…
Ó maldito pecado! A que triste fim levarás um dia tantas pobres almas!… Ai! das almas infelizes às quais aguarda tão deplorável fim.
AFETOS E SÚPLICAS
Meu Deus e meu Salvador! Que sentença me reservais no dia do juízo? Se agora me pedísseis, Senhor, contas de minha vida, que poderia eu responder senão que mereço mil vezes o inferno? Sim, meu Redentor, é verdade que mereço mil vezes o inferno, mas sabei que vos amo mais que a mim mesmo, e que das ofensas que vos fiz de tal modo me arrependo, que preferiria ter sofrido todos os males do que ter-vos injuriado.
Condenais, ó meu Jesus, os pecadores obstinados, mas não a quem se arrepende e vos quer amar. Aqui estou, a vossos pés, arrependido… Dai-me a vossa palavra de perdão… Mas já me declarastes pela boca do vosso Profeta: “Convertei-vos a mim, e eu me voltarei a vós” (Zc 1,3). Tudo abandono, renuncio a todos os gozos e bens do mundo, e converto-me, abraçando a vós, meu amantíssimo Redentor. Recebei-me no vosso Coração e inflamai-me no vosso santo amor, de modo que jamais cogite em separar-me de vós… Salvai-me, meu Jesus, e que minha salvação seja amar-vos sempre e louvar sempre vossas misericórdias (Sl 88,2).
Maria, minha esperança, meu refúgio e minha mãe, ajudai-me e alcançai-me a santa perseverança. Ainda se não perdeu ninguém, que tenha recorrido a vós… A vós, pois, me recomendo. Tende piedade de mim.
Preparação para a morte – Santo Afonso