Após definir a fortaleza e mostrar em que consiste a disciplina, tratarei do papel da educação na aquisição dessas virtudes segundo Dom Lefebvre. Irei também considerar os defeitos e as virtudes ligadas à fortaleza e à disciplina. Isso nos fornecerá diretivas práticas segundo o modelo de um homem exemplar.
Definições de fortaleza
Disciplina é o controle de si, a ordem interior da alma e do corpo, que é a fonte da ordem exterior das coisas e dos homens. É fruto do dom de sabedoria (ordenar é próprio do sábio) e do dom de fortaleza (“sou mestre de mim mesmo e do universo”, são as palavras que o dramaturgo Corneille põe na boca do Imperador Augusto).
Fortaleza, ou coragem, é uma das virtudes cardeais; é assistida pelo dom de fortaleza, um dos sete dons do Espírito Santo. O seu objeto é dominar o temor a fim de obter o bem difícil, seja na ordem temporal, como uma grande obra, uma vitória militar, ou na ordem espiritual, como a santidade e a salvação eterna.
O papel da educação e da escola na aquisição dessas virtudes
Essas virtudes e esses dons do Espírito Santo devem ser postos em prática desde a primeira infância, em casa ou na escola, para que sejam adquiridos de maneira estável.
O Marechal Foch, comandante supremo das forças aliadas na Primeira Guerra Mundial, via no infatigável trabalho do jovem a fonte do controle de si e da confiança, sobretudo na arte militar, que ele mesmo aprendeu na escola em Metz.
“Não creia em dons da natureza! Creia em trabalho duro!”, exclamava a seus aspirantes. É pelo trabalho duro que se obtém conhecimento, e o conhecimento é o que constitui a dignidade do profissional e da sua habilidade. É o conhecimento, adquirido por meio da prática incansável, que o provê da confiança com que é capaz de tomar decisões sem ter de sempre recorrer a conselhos! Essa confiança estabelece o exercício da habilidade de decidir em meio às adversidades, e isso justamente é o que permite que confiemos nele.
O conhecimento adquirido por Foch foi o que lhe permitiu reagir imediatamente ao violento ataque inimigo nos terríveis dias da primavera de 1918: não se apavorou nem perdeu a cabeça, mas movimentou exércitos inteiros para preencher lacunas e contra-atacar com sucesso.
Dom Lefebvre vê a fonte da disciplina no espírito de sacrifício instilado na escola. Em 31 de março de 1982, numa escola, expressou-se deste modo:
“A escola católica”, disse ele, “é a escola em que se aprende a disciplinar-se, em que se aprende o sacrifício, já que não se pode ser católico sem sacrifício. Por que sacrificar-se? Para encher-se da caridade e do amor.
“Fomos criados para amar a Deus, amar o próximo: isso é toda a lei de Deus. Não há outra lei. Toda a lei do Evangelho resume-se na caridade. Mas, para nos tornarmos caridosos, devemos nos sacrificar. Se não nos sacrificarmos, não nos devotaremos, não nos daremos.
“O egoísta, que pensa apenas em si mesmo, não é caridoso. Portanto numa escola católica deve-se aprender o sacrifício, a disciplina: a disciplina da inteligência, da vontade, do coração.
“Aprende-se a disciplinar a inteligência por meio do recebimento da verdade, da submissão à verdade ensinada. A verdade nos é ensinada desde cedo na infância até o último dia na escola. Assim se aprende a formar a inteligência conforme a verdade que nos ensina Nosso Senhor Jesus Cristo.
“Aprende-se também a formar a vontade, a discipliná-la. Todos temos defeitos, nascemos com o pecado original, e os efeitos dele permanecem em nós até a morte.
“Assim, temos de lutar contra as más tendências, os maus desejos em nós, e disciplinar a vontade, com a ajuda de Deus e da graça. É por isso que na escola há uma capela, que é o coração, o principal edifício. Tudo se orienta à capela, a Nosso Senhor Jesus Cristo: Ele é a nossa Verdade, a nossa força, o nosso amor.”
Defeitos adversos à fortaleza e à disciplina
Por falta de educação, de prática, de exercício, a fortaleza e a disciplina perdem lugar para a covardia e o desleixo, e em vez da coragem vê-se a fraqueza do apetite irascível. O apetite irascível é a paixão da alma, a paixão da parte sensível da alma humana. A paixão irascível deseja e busca o bem difícil, e o apetite concupiscível deseja o bem sensível e deleitável.
A falta do apetite irascível causa a pusilanimidade, a inconstância; também causa hesitação na inteligência, que, em vez de aplicar heroicamente os princípios, procura escapatórias, acordos, diante de um adversário ou de uma adversidade.
Em vez da disciplina, do controle de si, há a raiva (amiúde reação da fraqueza), desordem (na pessoa e nas coisas), e preguiça. O último, a preguiça, não consiste em não fazer nada, mas em preferir o trabalho menos útil ao mais útil e necessário.
Também aqui se vê o vestir desleixado ou o vestir contrário à modéstia corporal. Se compararmos o comportamento e o vestir dos rapazes em 1916 com o dos de 2016, notaremos a perda da virilidade, em apenas um século, da população inteira de um país, graças ao lento progresso de efeminação do comportamento e vestimenta dos rapazes.
Repercussão da força física na força da alma
É papel da família católica e da escola católica exercitar as crianças e os jovens na resistência física: através da fadiga, jejuns, vigílias, caminhadas etc.
Uma noite de oração ou uma hora de adoração noturna é excelente exercício de resistência física e piedade. A escola tem aulas semanais de educação física para ensinar os rapazes a ganhar flexibilidade e músculos. Sabe-se bem que a força e o tônus físicos são auxílio ao tônus moral.
O jovem Eugênio Pacelli, alto e magro, praticou exercícios físicos da infância até a adolescência, a fim de poder manter-se sempre ereto. Fazia equitação e tornou-se experiente e incansável cavaleiro nas suas corridas pelo interior romano. Em toda a sua vida, quando de pé, sentado, ou na sela, sempre se esforçou por manter-se impecavelmente aprumado com incansável disciplina corporal. Já como Papa Pio XII, nos visitantes inspirava de imediato respeito: “Só se podia aproximar de Pio XII com grande respeito”, lembrava Dom Lefebvre.
A prática do controle de si e da ordem
O bom Pe. Barrielle, diretor espiritual do Seminário São Pio X em Écône, ensinou aos seminaristas princípios de ordem que lhes seriam muito úteis na direção de priorados, escolas e distritos. Ensinou as cinco regras do Fayolismo (do engenheiro Fayol, não do General Fayolle, que foi derrotado em 1917), que são, conforme o mesmo padre:
Planejar com antecedência: os objetivos e os meios: lugar, tempo, coisas, atribuições das pessoas. Organizar: as etapas, os gerentes, as reuniões preparatórias. Comandar: tomar decisões, organizar as pessoas com precisão. Controlar: as coisas, as pessoas, lembrá-los dos seus deveres. Trabalho de gabinete: escritos, telefone, arquivos.
Agora um exemplo tirado de Dom Lefebvre. Tão logo retornou de uma viagem, leva a bagagem ao quarto e vai direto à capela rezar o terço em comunidade, embora já tivesse rezado quinze dezenas com o motorista — “os deveres em comunidade têm precedência”. Após a refeição, desfaz as malas, e leva a roupa suja à lavanderia. No dia seguinte, abre a abundante correspondência e, com bela e constante caligrafia, responde a cada carta com uma palavra cordial, mesmo que uma delas estivesse cheia de insultos.
À noite, dá conferência espiritual aos seminaristas. Espera ao pé da plataforma até o horário exato. Após o Veni Sancte Spiritus, senta-se com os pés juntos, sem nunca acostar-se. Descansa os pulsos na beirada da mesa e fala (às vezes sorrindo, às vezes sério quando há reprimendas a fazer) com a sua pequena, modesta, mas distinta voz.
Sua batina é simples, não se percebem os botões, amarrada na cintura com a modesta faixa espiritana, e os sapatos esmeradamente polidos.
É o exterior e o comportamento de um modesto sacerdote, de um respeitado e amado líder, que, sem ostentação, é um exemplo de ordem e controle de si para os seus filhos, membros da sua Fraternidade Sacerdotal São Pio X.
De onde recebeu tal disciplina, tal força interior? Certamente da sua família, do pai, que foi chefe de uma indústria; mas também do Pe. Henri Le Floch, reitor do seminário em Roma; e finalmente do noviciado espiritano. Foi bem ensinado, e se manteve homem forte, vir fortis, cuja mansidão conquistou a sua própria alma e a alma dos outros. “Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra.” Dito de outra forma, nas palavras de Dom Delatte: “Terram quam terunt, terram quam gerunt, terram quam sunt — terra que pisam, terra que mandam (seus subordinados), terra que são (suas almas)”.
(The Angelus, september 2016 )
Fonte: Permanencia