I – Uma noite, o profeta Daniel teve uma visão terrificante. Enquanto os quatro ventos do céu se combatiam sobre um vasto mar, ele viu surgir do meio das vagas quatro bestas monstruosas. Eram: um leão, um urso, uma pantera, e um quarto animal medonho de quatro cabeças, dotado de força prodigiosa, tendo dentes e unhas de ferro, e dez chifres na testa. Foi revelado ao profeta que estas quatro bestas significavam quatro impérios que se elevariam sucessivamente sobre as vagas movediças da humanidade.
Ora, enquanto Daniel considerava com horror a quarta besta, viu um chifrezinho nascer no meio dos dez outros, abater três, e crescer acima de todos; e este chifre tinha olhos de homem, e uma boca que falava com insolência; fazia guerra aos santos do Altíssimo, e levava a melhor sobre eles. O profeta perguntou o sentido desta estranha visão. Foi-lhe respondido que os dez chifres representavam dez reis; o chifrezinho era um rei que acabaria por dominar sobre toda a terra com inaudito poder. “Vomitará, lhe foi dito, blasfêmias contra Deus, esmagará debaixo dos pés os santos do Altíssimo; ele pensará que pode mudar os tempos e as leis; e tudo lhe será entregue durante um tempo, dois tempos, e a metade de um tempo”. (Dn. VII).
II – Por este rei todos os intérpretes entendem o Anticristo. Qual é a besta sobre a qual surgiu, no tempo marcado, este chifre de impiedade? É a Revolução, pela qual se entende todo o corpo dos ímpios, obedecendo a um motor oculto e se insurgindo contra Deus: a Revolução, poder Satânico e bestial; satânico, porque animado por um espírito infernal; bestial, porque entregue a todos os instintos da natureza degradada. Ela tem dentes e unhas de ferro: pois forja leis despóticas por meio das quais esmaga a liberdade humana. Procura apoderar-se dos reis e dos governos, que têm de fazer um pacto com ela. Quando o Anticristo aparecer, ela terá dez reis a seu serviço, como os dez chifres da testa.
O Anticristo – nos diz Daniel – aparecerá como um chifrezinho; terá um começo obscuro. Não sairá da família real; será um Maomé, um Mahdi, que se levantará pouco a pouco pela audácia de suas imposturas, secundadas pela cumplicidade do diabo. O chifre que o representa é muito diferente dos outros. Tem olhos de homem; pois o novo rei é um vidente, um falso profeta. Tem uma boca que faz grandes discursos; pois se impõe não menos pelo brilho da palavra e a sedução das promessas, do que pela força das armas e das intrigas políticas.
Cedo todo o mundo terá os olhos voltados para o impostor, seus grandes feitos serão celebrados pelas trombetas de uma imprensa complacente. Sua popularidade sombreará a de muitos soberanos apóstatas, que dividirão então entre si o império da besta revolucionária. Seguir-se-á uma luta gigantesca, na qual, segundo Daniel, o Anticristo abaterá todos os seus rivais. Neste momento todos os povos, fanatizados por seus prodígios e suas vitórias, o aclamarão como o salvador da humanidade. E os outros reis não terão outro recurso que se submeterem a ele. Este será o começo de uma crise terrível para a Igreja de Deus. Pois o chifre da impiedade, alcançando o auge do poder, fará guerra aos santos e prevalecerá contra eles.
III – É provável que durante esse período que poderá durar muitos anos, o homem do pecado afetará ares de moderação hipócrita. Judeu, se apresentará aos judeus como o Messias esperado, como o restaurador da lei de Moisés; tentará torcer a seu favor as misteriosas profecias de Isaias e Ezequiel; reconstruirá, no dizer de muitos Padres da Igreja, o templo de Jerusalém. Os judeus, ao menos em parte, ofuscados por seus falsos milagres e seu fausto insolente, o receberão, o falso Cristo; porão ao seu serviço as altas finanças, toda a imprensa, e as lojas maçônicas do mundo inteiro.
É muito crível também que o Anticristo disporá, para subir, de todos os partidários das falsas religiões. Ele se anunciará como cheio de respeito pela liberdade dos cultos, uma das máximas e uma das mentiras da besta revolucionária. Dirá aos budistas que é um Buda; aos muçulmanos, que Maomé é um grande profeta. Nada impede que o mundo muçulmano aceite o falso messias dos judeus como um novo Maomé.
O que sabemos? Talvez irá até dizer, em sua hipocrisia, como Herodes seu precursor, que quer adorar Jesus Cristo. Mas isso não passará de uma zombaria amarga. Malditos os cristãos que suportam sem indignação que seu adorável Salvador seja posto lado a lado com Buda e Maomé, em não sei que panteon de falsos deuses! Todos esses artifícios, parecidos com a carícia no cavalo do cavaleiro que o quer montar, arrebanharão insensivelmente o mundo para o inimigo de Jesus Cristo; mas uma vez firme nos estribos, usará do freio e das esporas; e a mais terrível tirania pesará sobre a humanidade.
IV – São Paulo nos faz conhecer com um só traço toda a extensão dessa tirania, a mais odiosa que houve e que haverá em todos os tempos. O homem da perdição, diz ele, o filho da perdição, o ímpio, “se oporá e se levantará contra tudo o que se chama Deus ou que é adorado como Deus, até se sentar no templo de Deus, apresentando-se como se fosse Deus”. (II Tess. II, 4). Daniel tinha predito antes de São Paulo: “Não terá em conta para nada o Deus de seus pais; ele mergulhará em deboches; não terá preocupação com Deus algum, levantar-se-á contra tudo”. (Dn., XI, 17).
Assim, quando o Anticristo tiver escravizado o mundo, quando tiver colocado em toda parte seus ordenanças e suas criaturas, quando puder puxar à sua vontade todos os fios de uma centralização levada ao extremo: ele tirará a máscara, proclamará que todos os cultos estão abolidos, se aclamará como deus único e, debaixo das penas mais terríveis e mais infamantes, quererá forçar todos os habitantes da terra a adorar, excluindo qualquer outra, sua própria divindade.
É nisto que desembocará a famosa liberdade de culto da qual se faz tanto alarde; a promiscuidade dos erros exige logicamente esta conclusão. Enquanto esteve na terra, o adorável Jesus, manso e humilde de coração, nunca se propôs à adoração de seus apóstolos sendo Ele Deus; muito ao contrário, pôs-se de joelhos diante deles e lhes lavou os pés. O Anticristo, monstro da impiedade e de orgulho, far-se-á adorar pela humanidade enlouquecida e seduzida; ela terá escolhido este mestre de preferência ao primeiro.
E não se pense que a armadilha será grosseira! Não esqueçamos, diz São Gregório, que o monstro disporá do poder do diabo para fazer falsos prodígios; ao contrário do começo, quando os milagres estavam do lado dos mártires, parecerá que agora estão do lado dos carrascos. Haverá uma ofuscação, uma vertigem. Somente os humildes e firmes em Deus,distinguirão a mentira e escaparão à tentação.
Mas onde o Anticristo estabelecerá seu novo culto? São Paulo nos diz: no templo de Deus; Santo Irineo, quase contemporâneo dos Apóstolos, esclarece melhor e diz: no templo de Jerusalém que ele fará reconstruir. Este será o centro da horrível religião. São João em outro lugar nos dá a conhecer a imagem do monstro será proposta por toda parte à adoração dos homens. (Apoc., XIII, 24).
Então budismo, islamismo, protestantismo, etc. serão suprimidos e abolidos. Mas não é preciso dizer que o furor do mundo se dirigirá contra Nosso Senhor e sua Igreja. Fará cessar o culto público; desaparecerá, diz Daniel, o Sacrifício perpétuo. Só se poderá celebrar a Santa Missa em cavernas e em lugares escondidos. As igrejas profanadas só apresentarão ao olhar a abominação da desolação, a saber, a imagem do monstro elevada aos altares do verdadeiro Deus. (Daniel, pass.). Houve um ensaio dessas coisas na Revolução Francesa.
Aí a mão de Deus se fará sentir. Ele abreviará esses dias de suprema angústia. Essa perseguição, que fará vacilar as colunas do céu, só durará um tempo, dois tempos e a metade de um tempo, a saber, três anos e meio.
O Drama do Fim dos Tempos – Pe. Emmanuel-André