Pelo Pe. François-Marie Chautard
Fonte: Le Chardonnet nº 269 – Tradução: Dominus Est
Por mais pertinente que sejam os campos de ação do Apóstolo, e por mais elevado que esse campo seja na sociedade, sua eficácia depende necessariamente de algumas condições pessoais.
Ora, o católico que deseja ver o reino de Jesus Cristo intervém em dois tipos de esfera bem distintas: uma puramente espiritual e a outra puramente temporal. Além disso, o verdadeiro apóstolo deve ser dotado de qualidade espirituais e humanas.
Meios sobrenaturais
Um adágio filosófico extremamente simples ensina que a causa é proporcional ao efeito. Se o apóstolo pretende fazer uma obra sobrenatural, ele mesmo deve ser profundamente sobrenatural. Caso contrário, sua ação será humana e o fruto… humano. Se o apóstolo quer obter um fruto bem profundo e durável, ele mesmo deve ter um vida interior profunda.
O apóstolo deve, portanto, ter necessariamente como apoio uma profunda vida interior. Por isso é que os papas insistem tanto na vida de oração que deve dirigir toda a ação católica, que por sua vez é um prolongamento da ação salvífica de Cristo e dos Apóstolos. E, com efeito, trata-se de uma verdadeira vida de oração, e não do cumprimento de alguns exercícios de piedade. É uma vida de piedade, e não um verniz de piedade que não teria qualquer influência sobre a maneira de viver e julgar.
Essa vida de oração deve igualmente ser acompanhada de uma vida de fé sólida e instruída. E a formação doutrinal deve também ter uma importância de primeira ordem. Enfim, o apóstolo não deve poupar-se de um verdadeiro espírito de sacrifício.
Conforme escreveu São Pio X, «Antes de tudo, é preciso estar profundamente convencido de que o instrumento é inútil se ele não é apropriado ao trabalho que se quer executar. Conforme o que foi evidenciado acima, a ação católica, na medida em que se propõe a restaurar todas as coisas em Cristo, constitui um verdadeiro apostolado para a honra e glória do próprio Cristo. Para bem cumpri-lo é preciso que se tenha a graça divina e que o apóstolo só a receba se estiver unido a Cristo. Somente quando tivermos formado em nós Jesus Cristo é que podemos mais facilmente trazê-Lo às famílias e à sociedade. Todos aqueles que são chamados a dirigir ou que se consagram à promover o movimento católico, devem ser católicos à toda prova, convictos de sua fé, firmemente instruídos nos assuntos religiosos, sinceramente submissos à Igreja e especialmente à suprema Sé Apostólica e ao Vigário de Jesus Cristo sobre a terra; eles devem ser homens de piedade verdadeira, de varonil virtude, íntegros nos costumes e de uma vida de tal modo intemerata que eles sirvam a todos de eficaz exemplo.
Se a alma ainda não está preparada, não só será difícil promover o bem aos demais, mas será quase impossível agir com retidão de intenção e faltar-lhe-ão as forças para suportar com perseverança os problemas que surgem com todo apostolado: as calúnias dos adversários, a frieza e pouca ajuda até mesmo dos homens bons, e finalmente há às vezes os ciúmes dos amigos e dos companheiros de luta (sem dúvida perdoável, dada a fraqueza da natureza humana, mas muito danoso e causador de discórdias, de ofensas e querelas intestinas). Somente uma virtude paciente e firme no bem, e ao mesmo tempo suave e delicada, é capaz de remover ou diminuir essas dificuldades de maneira que a obra a qual estão consagradas as forças católicas não sejam comprometidas. A vontade de Deus, dizia São Pedro aos primeiros cristãos, é que, obrando, vós caleis os insensatos: “porque assim é a vontade de Deus, que obrando bem façais emudecer a ignorância dos homens imprudentes” [1Pe 2, 15]»[1].
Quase meio século mais tarde, Pio XII renovava a mesma advertência insistindo na virtude pessoal. Esse esclarecimento nos parece capital conforme cresce a cada dia a distância entre a vida em comum e a vida pessoal: zelosos em grupo na ocasião de alguma manifestação, muitos católicos abdicam da luta quando estão isolados.
Esses meios sobrenaturais são evidentemente usados nas obras puramente espirituais como um grupo de oração, no apostolado do catecismo, etc. Mas eles têm da mesma maneira seu lugar necessário nas obras temporais: um trabalhador cristão irradiará em sua empresa se ele conhece seu catecismo, se ele é aplicado ao seu dever de estado, se ele reza em seu trabalho, evita as palhaçadas e outras palavras que soam inconvenientes na boca de um cristão, etc.
Qualidades naturais
Dito isso, as qualidades naturais não devem entretanto ser deixadas de lado, longe disso. Seria um sonhador o apóstolo que negligenciasse suas reuniões de apostolado ou de ação sob o pretexto de que ele oferece seu apostolado à Providência. Seria cair num angelismo bem afastado do espírito do cristianismo.
Esses meios naturais são os seguintes: a organização metódica — ou mesmo científica —, a competência, o espírito de equipe, a polidez e a pontualidade. Em suma, esses meios são aqueles que têm todo espírito sério que se lança num empreendimento.
Quantas ações de pequena ou grande envergadura falham por falta de preparação suficiente, por uma estupenda negligência dentre os apóstolos (negligência entretanto sobrenatural), que não permitiriam tal desleixo se se tratasse de seu dever de estado profissional. Pense nas equipes de um movimento de juventude que parte de noite para uma sessão de amostra de cartazes. Eles recitaram antes seu rosário, mas não pensaram em trazer consigo a cola, em ter um plano direcionado àquele segmento visado e discutem entre si sobre preferências supérfluas. E eis que eles se surpreendem com o pouco sucesso do empreendimento.
A imprecisão, a improvisação e o amadorismo devem ser banidos se se tem alguma ambição de sucesso. Como em todas as coisas naturais e sobrenaturais, a negligência não pode jamais produzir frutos.
«…para que a ação católica seja eficaz em todos os aspectos, advertiu São Pio X, não basta que ela seja proporcionada às necessidades sociais atuais; convém antes que ela se faça valer por todos os meios práticos que lhe fornecem hoje o progresso dos estudos sociais e econômicos, as experiências já realizadas em outros lugares, as condições da sociedade civil e a própria vida pública dos Estados»[2].
Ademais, essa ação não deve ser unicamente individual, caso contrário ela seria ineficaz. Ela deve ser dirigida ao cerne das organizações estruturadas e hierarquizadas[3]. Querer agir unicamente de uma maneira solitária reduz consideravelmente o campo e a eficácia do apostolado. O individualismo não convém de maneira alguma, sobretudo no apostolado!
Evidentemente, esses meios naturais são identificados nas obras mais diretamente temporais, mas também se encontram nas obras puramente espirituais: o apostolado de um movimento de juventude desenvolve melhor se os membros desse movimento são pontuais, organizados, disciplinados e sabem trabalhar em equipe. Eis, por exemplo, uma conferência sobre assunto espiritual programada para acontecer num horário determinado. Mas os membros interessados chegam à conta-gotas de modo que a conferência não pode começar senão com meia hora de atraso. Resultado: a refeição prevista após a conferência é marcada para outro dia (e isso irrita a todos), e a prece final é abreviada — quando não pura e simplesmente suprimida. A falha pode incidentalmente vir do próprio conferencista, cuja intervenção pode ser desleixada e mais longa que o previsto. E então, os que vieram pela primeira vez prometem a si mesmos nunca mais voltar num movimento em que os slogans de campanha são diametralmente e ridiculamente opostos às realidades concretas.
É um fracasso: os membros são desencorajados e o demônio esfrega as mãos.
A necessidade de uma elite
Em outros termos, a Ação católica requer um espírito de perfeição antípoda ao espírito do mundo, do espírito de facilidade e do diletantismo. Se o católico quer se envolver em uma ação de qualquer extensão, então que ele se envolva com coragem e perseverança, munido de todas as qualidades que preparam as vitórias do futuro.
Na ordem sobrenatural, somente os santos, as almas verdadeiramente naturais, fazem as coisas avançarem e convertem as almas. Os 12 apóstolos converteram o mundo. Hoje, quantos milhões de católicos há? Eles fazem a Igreja avançar?
Na ordem natural só os espíritos judiciosos, metódicos, organizados e audaciosos obtêm sucesso. Nessa esfera, a competência, o método, o esprit de finesse [espírito de perspicácia] e a força de convicção trazem consigo as boas recomendações. Hoje em dia, quantos católicos consideram o apostolado não como um passatempo, mas como uma ação cuidadosamente organizada, atenciosamente preparada e pacientemente conduzida?
Por fim, quaisquer que sejam as qualidades requeridas, tudo se reduz a isto: o espírito de perfeição. Que possam todos os católicos cultivar esse espírito em vez de simplesmente sonhar com ele. Só o espírito de perfeição poderá trazer de volta à Igreja e à Cidade o brilho com o qual sempre resplandeceram e que são capazes de irradiar em todas as épocas.
Notas:
[1] São Pio X, Il fermo proposito.
[2] Ibidem.
[3] Cf. Léon XIII, Le Laïcat, Les enseignements pontificaux réunis par les moines de Solesmes, Desclée, n° 150; Pie XI, ibidem, n° 548.