Meu Senhor, olha com misericórdia para o teu povo e para a hierarquia da santa Igreja. Se perdoares a tão numerosas criaturas, concedendo-lhes a iluminação da inteligência, serás mais glorificado que só por mim, pobrezinha que tanto pequei, responsável por todos os males. Livres das trevas do pecado mortal e da condenação eterna por tua infinita bondade, todos te louvariam. Por essa razão eu te suplico, caridade divina e eterna, que te vingues sobre mim. Tem piedade do teu povo! Não me afastarei de tua presença enquanto não perceber que usaste de misericórdia para com o teu povo. Que prazer teria eu em ganhar a vida eterna, se teu povo estivesse na morte e se a escuridão aumentasse na tua Esposa – que é toda luz – por causa dos meus pecados e dos pecados dos demais?
Eu quero, portanto, e imploro tal graça; que tenhas piedade do teu povo, pela caridade incriada que te levou a criar o homem à tua imagem e semelhança, quando disseste: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança” (Gn 1,26).
Ó sublime e eterna Trindade, agiste assim a fim de que a humanidade participasse do teu ser: deste-lhe a memória, Pai eterno, para que se recordasse do teu benefício, possuindo algo do teu poder; deste-lhe a inteligência com que conhecesse tua bondade e tivesse parte na sabedoria do Filho; deste-lhe vontade para amar tudo quanto a inteligência compreendesse da tua Verdade, e com isso participasse da clemência do Espírito Santo.
Qual foi a razão que te levou a colocar o homem em tão sublime dignidade? Certamente o incompreensível amor, com que o pensaste e dele te enamoraste! Por amor criaste o homem e lhe deste o ser, desejoso de que saboreasse o teu sumo e eterno Bem. Como o compreendo! Pelo pecado o homem perdeu a dignidade em que o colocaras; rebelou-se, entrou em guerra com tua clemência. Tornamo-nos inimigos teus. Tu, movido pelo mesmo fogo criador, providenciaste o modo de reconciliar a humanidade decaída durante a guerra. A fim de transformar essa guerra em grande paz, deste-nos o Verbo, teu Filho, como Mediador. Ele tornou-se nossa justiça (1Cor 1,30). Tomou sobre si mesmo nossas maldades, realizou o que tu, Pai eterno, lhe impuseras por obediência. Tudo a partir do momento em que o revestiste de nossa natureza, pois ele a assumiu.
Ó abismo de amor! Que coração não explodiria ao ver o Altíssimo descer até a pequenez da nossa humanidade! Somos tua imagem, és a nossa imagem pela união feita no homem, quando a divindade se velou sob a miserável nuvem e corrompida matéria de Adão! Tudo por amor! Sendo Deus, te fizeste homem, e o homem se fez Deus! Pois bem, por esse amor inexprimível eu te obrigo e imploro: usa de misericórdia para com tuas criaturas!
O Diálogo – Santa Catarina de Sena