50 ANOS DA NOVA MISSA (PARTE 1): A ELABORAÇÃO DO MISSAL ROMANO

Fonte: DICI – Tradução: Dominus Est

Meio século atrás, o Papa Paulo VI impôs uma reforma liturgica para toda a Igreja  em nome do Concílio que acabara de terminar. Assim nasceu a missa do Vaticano II. Ela foi imediatamente rejeitada por dois cardeais e desde então a oposição contra ela não enfraqueceu. Esse triste aniversário é uma oportunidade para traçar sua história.

Antes de considerar a reforma liturgica de Paulo VI e a nova missa, é necessário recontar a história do Missal Romano, pois essa reforma afirma ser a continuação do passado. A perspectiva histórica ajudará  com o entendimento sobre a inanidade dessa alegação.

**************************

O desenvolvimento do Missal Romano extendeu-se por vários séculos. Mesmo que os elementos essenciais, requeridos para o cumprimento do Santo Sacrifício da Missa, sempre fizeram-se presentes, eles passaram por uma progressiva consagração em ritos os quais os fazem possíveis de se entendê-los e compreender seus profundos significados.

Os Primeiro Três Séculos

Os textos do Novo testamento recontam a instituição da Santa Eucaristia no anoitecer da Quinta Feira Santa. É a refeição pascal, a nova Páscoa, que estabelece a nova aliança com o precioso Sangue de Cristo. O dia escolhido para a renovação é o Domingo, o dia da Ressurreição. O ‘Didaqué’ do fim do primeiro século, fala do ‘Dia do Senhor”, e São Justino atesta isso no Século II.’

Os textos evangélicos também mencionam a ‘partilha do pão’ que traduz um elemento essencial em nessa nova adoração, o cumprimento do mandamento do Senhor: “Fazei isso em memória de mim”. O Livro dos Atos dos Apóstolos mostra essa cerimônia sendo realizada em casas privadas “no primeiro dia da semana, quando nos reuníamos para partilha do pão”(At. 20,7)

As primeiras construções reservadas a adoração apareceram bem rapidamente, já no Século II. A mais velha igreja foi fundada em Doura-Europos no Eufrates, e é datada de por volta do ano 232. Em Roma, teríamos que esperar até o começo do século III para encontrar traços documentais de construções religiosas cristãs.. Mas apesar da Primeira Apologia de São Justino, mártir, ( morto em 165), esse período não fornece qualquer detalhe quanto ao desdobramento da adoração Cristã e das orações empregadas. Aqui está uma notória passagem do santo apologista:

E no dia chamado Dia do sol, todos que viviam nas cidade ou no campo se reuniam em um único lugar, e as memórias dos apóstolos ou os escritos dos profetas eram lidas, tanto quanto o tempo permitia; então, quando o leitor terminava, o sacerdote verbalmente instruía e exortava à imitação dessas coisas boas. Então todos levantavam-se juntos e oravamos, e como nós dissemos antes, quando nossa oração terminava, pão e vinho eram trazidos, e o sacerdote, da mesma maneira, oferecia orações e ação de graças, de acordo com sua habilidade, e a congregação assentia dizendo Amem. E então havia a distribuição a cada um, e a participação sobre a qual eram dadas graças, e àqueles que estavam ausentes a porção era enviada por meio dos diáconos”.

Do Século IV ao VI

O Século IV vê o fim da perseguição. Agora autorizado, O Cristianismo pode finalmente instalar sua adoração pública em construções que lhe são propriamente reservadas: essas são as primeiras basílicas. Temos bastante documentos sobre esse período a respeito da celebração Eucarística. De acordo com essa literatura, parece que a mas velha e única anáfora usada em Roma era o Cânon Romano. Portanto, é desse tempo que havia unidade na liturgia Eucarística Romana.

A missa começava com uma preparação para o sacrifício com leituras, salmos, cantos de hinos, e uma homilia nas quais os catecúmenos estavam presentes. Era seguida pela celebração reservada aos fiéis com o ofertório, o canto do Sanctus, o cânon, a fração, e comunhão. O intróito foi adicionado no século VI. O Kyrie eleison foi emprestado da liturgia Grega já desde o século IV. Ao mesmo tempo, o Gloria veio do Ofício Divino – a recitação de salmos – para a Missa. Do século VI em diante, é atestado que em Roma havia apenas duas leituras: a epístola e o evangelho.

O prefácio antes do cânon é muito antigo, anterior ao século IV, e e é seguido do Sanctus. A cerimonia da fração da hóstia ocorria no fim do cânon, durante o canto do Agnus Dei. O Pater que seguia-se foi colocado por São Gregório Magno como conclusão do cânon, de acordo com um costume Grego. O Libera nos após o Pater é conhecido de todas as liturgias.  O ósculo da paz seguia-se da fração. A Comunhão era realizada com pão e cálice consagrados, sem estar certo de qual modo exatamente eram empregados. Após a bênção o diácono cantava o Ite missa est para dispensar os fiéis.

Do século VI até o século XI

De São Gregório Magno, Papa de 590 a 604, até São Gregório VII (1073-1085) ocorreu um desenvolvimento que consistiu essencialmente na introdução de elementos emprestados da liturgia Franca (Galicana). A gália tinha recebido a fé de Roma, bem como sua liturgia. Mas em um certo grau de  Franconificação (Galicanização) da liturgia Romana levou à adoção  pelo Missal Romano de tradições particulares próprias  aos domínios francos.

Carlos Magno e seus eruditos foram grandemente responsáveis por essa hibridização. Enquanto eles impuseram os usos Romanos no reino Franco, as contribuições locais foram numerosas. Nesse tempo, o canto gregoriano floresceu.

A reforma Gregoriana que ocorreu sob São Leão IX (1002-1054) e completada por Urbano II (1088-1099), soba a influência de papas de origem germânica, introduziram os livros Franco-Romanos na própria Roma, enquanto adicionavam elementos Romanos. A centralização que resultou da reforma gregoriana definitivamente consolidou a liturgia Romana assim enriquecida.

Os livros litúrgicos do século XIII, ancestrais aos livros Tridentinos, são derivados desse duplo movimento de hibridização: a introdução de elementos Francos no período Romano Carolíngeo, e a adição de elementos Romanos no  Franco Romanos, durante a reforma Gregoriana.

O que emergiu dos exames dos manuscritos litúrgicos disponíveis é a grande semelhança geral desses ritos ao Rito Tridentino. Há, entretanto, muitos ritos secundários, que podem variar de acordo com o lugar. Mas sempre há uma preocupação regular com a unidade litúrgica. Ela resulta do dever de se assegurar da ortodoxia, mas também do desejo de evitar a proliferação do que poderia rapidamente tornar-se anarquia.