A cada comunhão que oferece, o sacerdote repete: “Que o Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo guarde vossa alma para a vida eterna!”
Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est
Na noite de Páscoa, Nosso Senhor “fingiu” afastar-se dos discípulos de Emaús, que imediatamente “O exortaram, dizendo: Fica conosco, porque faz-se tarde, e o dia declina” (Lc XXIV, 29). Sem este convite imediato, a graça de reconhecer o Cristo ressuscitado ter-lhes-ia escapado. Quando o tempo pascal se aproxima do fim, fazemos nossas as orações deles. Queremos que a alegria da Páscoa permaneça conosco.
Cristo, que “ressuscitou para nossa justificação” (Rm IV, 25), quer que participemos desta vida na Sua paz, através da graça da perseverança em seu amor. Pela Paixão e Ressurreição de Nosso Senhor, estamos mortos para o pecado e vivos para Deus (cf. Rom. VI, 11). Assim como Cristo retomou a posse de sua vida para nunca mais morrer, assim, a alma redimida deve conservar para a vida eterna o dom precioso da graça. O altar onde se renova o sacrifício de Cristo é a nova árvore da vida onde o fiel católico encontra o alimento que lhe permitirá permanecer, livre de faltas, no amor do bom Deus segundo esta promessa: “Quem come a Minha carne e bebe Meu sangue permanece em mim e eu nele.” (Jo VI, 57). A cada comunhão que oferece, o sacerdote repete: “Que o Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo guarde vossa alma para a vida eterna! “
A perseverança é, antes de tudo, uma virtude que enfrenta a longitude do tempo. Santo Tomás ensina que ela “tende a perseverar” apesar da perspectiva de uma vida de luta, mas acrescenta imediatamente que não se segue necessariamente que, tendo virtude, a pratiquemos inevitavelmente até os últimos dias [1]. Entretanto, o termo perseverança também designa o fato de permanecer em estado de graça até o final. Às almas que se salvam, “o que é dado pela graça de Cristo não é apenas poder perseverar, mas perseverar de fato”, observa Santo Agostinho [2] .
A boa teologia nos ensina que a perseverança não pode ser obtida senão por meio da oração. A fidelidade, por mais longa que seja, não pode exigir este dom, que é o mais importante precisamente porque é o último, aquele que traz consigo a coroação de toda a vida. Por isso, a Igreja quis que repetíssemos este pedido a cada Ave Maria: que a Santíssima Virgem reze por nós “agora e na hora da nossa morte”!
No entanto, São João Crisóstomo ensina que quando Cristo nos disse que só aquele que perseverasse até o fim seria salvo (Mt XIII, 14), Ele não quis se limitar a uma exortação à oração. Poderíamos multiplicar as citações da Sagrada Escritura que indicam que há atos a serem praticados para não vacilar. “Ninguém que, depois de ter metido a sua mão ao arado olha para trás, é apto para o reino de Deus.” (Lc IX, 62). Esta é, de fato, toda uma atitude de procrastinação que é justamente vilipendiada aqui. A salvação eterna está ligada a uma perseverança que deve estar, de alguma forma, ao nosso alcance. A todos nós, como na Igreja de Esmirna, somos ordenados: “Sê fiel até a morte, e eu te darei a coroa da vida.” (Ap. II, 10)
A teologia ensina, com efeito, que existem dois tipos de méritos. Há aquele que é segundo a justiça, que é antes de tudo de Nosso Senhor na Cruz, mas que também nos pertence enquanto a promessa divina atribuiu às boas obras desta vida uma recompensa proporcional no outro mundo. Mas há também um mérito de conveniência como o da Santíssima Virgem Maria em relação a todos os eleitos. Ela não é a Cabeça do Corpo Místico, mas seus sofrimentos aos pés da Cruz, oferecidos pelos pobres filhos da primeira Eva, alcançaram sua salvação segundo certo “direito de amizade” que ela possui sobre o Coração de seu Filho.
Este mérito de conveniência é certamente o mérito que qualquer alma cristã pode possuir em relação à sua perseverança final. Prova disso é a surpresa e o temor que nos desperta o fracasso de uma alma que há muito tempo foi fiel. Houve apenas um apóstolo em doze que traiu seu Mestre. Os servos de Deus, devotos de muito tempo, que morrem na impiedade recusando os sacramentos, são prodígios que nos consternam e que são raros. Normalmente as coisas não acontecem assim. Os homens morrem da forma que viveram.
Que a oração confiada a Nossa Senhora da Santa Esperança seja acompanhada pela fidelidade à freqüente recepção dos sacramentos e a todas as boas obras. Nunca ouvimos dizer que tais almas tenham sido abandonadas!
Pe. Thierry Gaudray, FSSPX
Notas
- Cf. II-II q. 137 a. 4 ad 1um
- Citado em II-II q. 137 a. 4 ad 2um