A Arca da Aliança é – entre outras coisas – uma figura da Santíssima Virgem Maria.
Fonte: Le Chardonnet n ° 367 – Tradução: Dominus Est
Esta relicário misterioso nunca deixou de nutrir a imaginação, especialmente desde seu desaparecimento. Romances, lendas, mitos e filmes giram em torno de uma questão aparentemente sem resposta: o que aconteceu com a Arca da Aliança? Mas esta não é uma questão inútil? Todos esses exploradores não estão a procura de algo sem valor? Eles não deveriam se concentrar na pessoa figurada e não na figura?
O que era a Arca da Aliança?
No Sinai, Deus havia dado a Moisés todas as prescrições relativas ao culto divino, com uma grande riqueza de detalhes, impressionantemente precisos. No meio do santuário, deveria estar o tabernáculo, uma espécie de grande e bela tenda retangular. E no interior deste tabernáculo, entronizado um baú (caixa) de madeira de acácia, revestido com ouro por dentro e por fora, com 2,5 côvados de comprimento, 1,5 côvado de largura e essa mesma altura (ou seja, cerca de 1,3m x 0,8m x 0,8m). Esse baú era chamado de Arca da Aliança e continha as duas tábuas da lei, uma medida de maná (que foi milagrosamente preservada) e a haste florida de Aarão. A tampa, chamada propiciatório, consistia em uma placa de ouro puro e sustentava dois querubins com asas estendidas, também de ouro. O conjunto era transportado por meio de duas barras que passavam por quatro anéis.
Após a construção do templo por Salomão, a arca foi colocada no Santo dos Santos, um lugar temido que era visitado apenas uma vez por ano, e apenas pelo sumo sacerdote. Esta arca, assim colocada no centro de todo aparato litúrgico, era considerado o objeto mais sagrado, e ninguém podia olhá-la diretamente e muito menos tocá-la, a não ser alguns poucos privilegiados.
O que aconteceu com ela?
No segundo livro dos Macabeus, é relatado que Jeremias escondeu a Arca da Aliança no momento da deportação do reino de Judá para a Babilônia, no século VI aC. Esse esconderijo se encontrava na montanha onde Moisés morreu, ou seja, o Monte Nebo. Contudo, apesar desta localização que parece bastante precisa, nunca foi possível encontrar a arca, e o templo reconstruído de Jerusalém nunca mais conteve esta preciosa urna: assim, no tempo de Nosso Senhor, o Santo dos Santos estava vazio.
No texto mencionado acima, parece que o famoso esconderijo será encontrado no final, “quando Deus reunir o seu povo disperso e usar com ele de misericórdia”.(1)” Palavras enigmáticas, cujo significado deve ser esclarecido por uma passagem do mesmo Jeremias:
Naqueles dias, diz o Senhor, não se falará mais da arca da aliança do Senhor; não lhes virá ao pensamento, não se lembrarão nem terão saudade dela, e não se fará outra. Naquela época, chamarão Jerusalém trono do Senhor! (Jeremias 3,16-17)
Por que devemos agora esquecer um objeto que já foi tão importante? Não será porque a figura já passou e a verdadeira arca da aliança está em outro lugar?
O que ela representa?
Seguindo os Padres da Igreja, podemos afirmar sem qualquer hesitação que a Arca da Aliança é – entre outras – uma figura da Santíssima Virgem Maria. Como assim? Os Padres da Igreja nos guiam com segurança e só precisamos segui-los.
Em primeiro lugar, a Arca da Aliança foi feita de uma madeira incorruptível para marcar a pureza da Bem-Aventurada Virgem Maria, imaculada em sua alma e em seu corpo, e que, mesmo depois de sua morte, foi preservada da corrupção. Embora a Virgem tivesse vindo da descendência de Adão, contaminada pelo pecado, ela foi, no entanto, escolhida e preparada pelo Espírito Santo, em razão do ofício para o qual foi eleita por Deus.
A arca continha as tábuas da Lei de Moisés, assim como Maria foi a arca que continha os segredos das palavras divinas.(2) “Levanta-te, Senhor, para o lugar de teu repouso, tu e a arca da tua majestade(3).” Assim, Maria é a verdadeira arca, toda brilhante de ouro por dentro e por fora, a arca que recebeu todo o tesouro da santificação(4).
A arca da aliança representa a Imaculada que recebeu o pão da verdadeira vida, o Verbo co-eterno do Pai. Com efeito, Maria não contém nem o maná nem as tábuas da lei, mas foi aquela que deu o maná e que é o próprio autor da lei.
No Santo dos Santos, a arca da aliança foi colocada em seu meio: assim como a Virgem Mãe de Deus se coloca entre Deus e as criaturas, unindo o homem ao seu Deus e por isso é chamada Medianeira de todas as graças.
O Padre de Monléon completa esta rápida enumeração e acrescenta alguns outros objetos litúrgicos, também figuras da Santíssima Virgem: “Maria é o tabernáculo feito de madeira preciosa de sua carne imaculada, no qual o Filho de Deus foi abrigado durante os nove meses precedentes ao seu nascimento; ela é o propiciatório, no qual Deus apenas pronuncia palavras de misericórdia e perdão; o candelabro de ouro, modelado pelo martelo da Paixão, e sobre o qual brilha a luz que ilumina o mundo; o véu precioso, que cobriu a divindade no mistério da Encarnação. Seu coração é ao mesmo tempo o altar dos holocaustos, sobre o qual foi oferecido o sacrifício por excelência, aquele que substitui todos os outros, o do Cordeiro divino, e ao mesmo tempo o altar dos perfumes onde o incenso da mais requintada devoção arde perpetuamente(5)“.
Maria é, portanto, a Arca viva do Senhor(6), a verdadeira Arca da Aliança(7). A busca pela arca perdida é irrelevante para nossa vida espiritual. Mas muito diferente deve ser nossa busca pela verdadeira Arca, Maria Mãe de Deus, dispensadora de todas as graças, nosso refúgio nos perigos e tentações, e o caminho que nos levará a Deus.
Ao segui-la, não se desviarão. Ao rezar a ela, estarão fora do perigo do desespero. Ao pensar nela, não cairão no erro. (São Bernardo)
Pe. Guillaume d’Orsanne, FSSPX
Notas:
- 2 Macabeus 2,7
- São Boaventura, Expositio em 2 cap. Lucæ.
- Salmo 131,8.
- Proclo de Constantinopla, Homilia sobre a Mãe de Deus.
- Dom Jean de Monléon, Moïse p. 225.
- Sequência da Assunção no Missal de Paris.
- Litanias de Loreto.