In propria venit, et sui eum non receperunt — “Veio para o que era seu, e os seus não O receberam” (Io. I, 11).
Sumário. A cidade de Belém, que recusa dar abrigo a Jesus Menino, foi figura daqueles muitos corações ingratos que dão acolhida a tantas miseráveis criaturas e não a Deus. Reflitamos, porém, no que a Virgem Maria disse a uma alma devota: Foi uma disposição divina que a mim e a meu Filho nos faltasse abrigo entre os homens, a fim de que as almas, cativadas pelo amor de Jesus, se oferecessem a si próprias para o acolherem.
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I. Quando um rei faz a primeira entrada numa cidade do seu reino, que manifestações de veneração se lhe preparam! Que pompas! Quantos arcos de triunfo! Prepara-te, pois, ó Belém venturosa, para receberes dignamente o Rei do céu; fica sabedora que entre todas as cidades és tu a ditosa que ele escolheu para nela nascer em terra, a fim de reinar depois no coração dos homens. Ex te enim egredietur qui sit dominator in Israel — “De ti sairá aquele que há de reinar em Israel”.
Eis que já entram em Belém esses dois excelsos viajantes, José e Maria, que traz no seu seio o Salvador do mundo. Entram na cidade, dirigem-se para a casa do ministro imperial, a fim de pagarem o tributo e serem alistados nos registros dos súditos do César. Mas quem os reconhece? Quem lhes vai ao encontro? Quem lhes oferece agasalho? In propria venit, et sui eum non receperunt — “Ele veio para o que era seu, e os seus não O receberam”. Eles são pobres, e como pobres são desprezados; são tratados ainda pior do que os outros pobres, e até repulsos.
Chegada a Belém, Maria entendeu que se aproximava a hora de seu parto. Avisou a São José, e este diligenciou achar agasalho em uma casa dos habitantes de Belém, a fim de não ter de levar sua esposa à hospedaria, lugar pouco conveniente para uma tenra donzela. Ninguém quis atender-lhe o pedido, e é bem verossímil que da parte de alguns fosse taxado de insensato por trazer consigo a esposa próxima ao parto em tempo noturno e de tanta afluência de povo. Para não ficar durante a noite no meio da rua, viu-se afinal obrigado a levar a Virgem Maria à hospedaria pública, onde já muitos pobres se tinham alojado para a noite. Mas como? Também dali foram repulsos e foi-lhes respondido que não havia lugar para eles: Non erat eis locus in diversorio (1) — “Não havia lugar para eles na estalagem”. Havia ali lugar para todos, também para os mais abjetos, mas não para Jesus Cristo. Contemplemos quais devem ter sido os sentimentos de São José e de Maria Santíssima, vendo-se desprezados e repulsos de cada um.
II. A estalagem de Belém foi figura daqueles corações ingratos que dão acolhida a tantas criaturas miseráveis e não a Deus. Quantos há que amam os parentes, os amigos, até os animais, mas não amam Jesus Cristo e nenhum caso fazem de sua graça e de seu amor. Maria Santíssima disse a uma alma devota: Foi uma disposição divina que a mim e a meu Filho nos faltasse agasalho da parte dos homens, a fim de que as almas cativadas pelo amor de Jesus se oferecessem a si próprias para o acolherem e o convidassem amorosamente a tomar morada em seus corações.
Sim, meu Jesus, vinde nascer pela vossa graça em meu pobre coração! Eu não me animaria a pedir-Vos esta graça, se não soubesse que Vós mesmo me inspirais o pensamento de Vô-la rogar. Ó Senhor, eu sou aquele que com os meus pecados Vos tenho tantas vezes expulso cruelmente da minha alma. Mas já que baixastes à terra para perdoar aos pecadores arrependidos, perdoai-me, porque me pesa sobre todas as coisas de Vos ter desprezado, meu Salvador e meu Deus, que sois tão bom e me tendes tão grande amor. Nestes dias dispensais grandes graças a tantas almas; consolai também a minha. A graça que quero, é a de Vos amar para o futuro, de todo o meu coração; abrasai-me todo em vosso amor. Amo-Vos, meu Deus, feito Menino por meu amor. Ah, não permitais que eu Vos deixe de amar. Ó Maria, minha Mãe, vós podeis tudo com as vossas súplicas; eis aí o que unicamente vos peço: rogai a Jesus por mim, e obtende-me a graça de amá-Lo com todas as minhas forças, a fim de desagravá-Lo assim de tantas ofensas, que em outro tempo lhe tenho feito. Ó minha Mãe amantíssima, rogo-vos, exatamente pela vossa maternidade divina, tomai o meu coração e conchegai-o ao vosso; conchegai-o também ao de vosso divino Filho, e fazei que seja todo consumido nas belas chamas do amor a vós e a Jesus.
- Luc. 2, 7.
Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I – Santo Afonso