“André foi encontrar seu irmão Simão e disse-lhe: “Encontramos o Messias”. No dia seguinte, Simão chegou pontualmente para seu primeiro encontro com Cristo.
Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est
Os dois primeiros discípulos que haviam sido conquistados pela simples visão de Jesus, logo trouxeram-lhe outros. Primeiro foi Simão, irmão de André. E no dia seguinte, quando partiram para a Galileia, Filipe e Natanael.
Essa narração é muito simples: um grupo de homens que se encontram às margens do Jordão. A primeira vocação dos discípulos tem sua atração… somente uma testemunha ocular poderia contá-la dessa maneira. São João não tem a intenção de acrescentar algo ao relato muito preciso dos evangelhos sinóticos, mas sim de nos dar, em sua maneira simples de dar seu testemunho para os séculos vindouros, o que o homem que Jesus amava viu: o que ele admira no encontro entre Cristo e esses homens é o que ele compreende o que o Senhor realiza nele… ele contempla, admira, dá graças. Nem sempre conseguimos notar, em nossa própria experiência, o que reconhecemos de relance na experiência dos outros.
Já refletimos sobre o impacto de certos eventos que ocorreram durante séculos e séculos? E se Simão não tivesse seguido seu irmão no dia seguinte? O que teria sido da Igreja?
Naquela manhã, Simão deixou-se guiar pelo simples anúncio do irmão. Ele chegou pontualmente para esse encontro com alguém que ainda não conhecia. O abandono, o terno respeito pelos caminhos de Deus, tanto interiores como exteriores, essas são as disposições do espírito de fé que esse homem já possui.
O Bom Deus tem planos para Simão, assim como para cada um de nós, e Ele mesmo traça os caminhos pelos quais devemos seguir. Em vez de recordar a difícil questão da relação entre graça e livre arbítrio, não seria melhor, nesse momento, contemplar os surpreendentes caminhos de Deus, como São João faz na simplicidade da sua narração: tudo o que Simão tinha de fazer era deixar-se guiar… o Senhor conduz os justos por caminhos retos.
Ser justo… toda a antiga Aliança era uma pedagogia para estar pronto para o encontro com o Messias. Abraão viu o meu dia e se alegrou, não hesitou o Senhor em afirmar aos fariseus que o contendiam.
O Senhor conduz os justos por caminhos retos, diz o livro da Sabedoria…o justo é aquele que é íntegro, reto, é aquele que age com fidelidade. Não anda por si mesmo, é o Senhor quem o conduz, deduxit dominus. Se ele se permitir ser dócil, então, pelo preço da sua docilidade, o Senhor lhe mostrará o seu reino, et ostendit ei regnum Dei, isto é, o admitirá nas alegrias da intimidade divina. Há perspectivas que escapam totalmente àqueles que não estão no ponto desejado. A perspectiva do reino de Deus se perde rapidamente sem uma grande retidão interior.
Simão era um homem simples, mas era um homem justo. Uma lealdade como a de Simão deve ser flexível, essa retidão deve ser capaz de se adaptar aos desígnios de Deus. Não se trata de seguir nossos próprios caminhos, mas de seguir os caminhos Dele. De agora em diante se chamarás Pedro.
A simplicidade dos caminhos divinos é desconcertante, assim como a simplicidade da história da vocação dos primeiros apóstolos. Retocar, reformar, modificar os caminhos de Deus, como se Deus precisasse do auxílio da nossa razão, é uma tendência tão humana, mas tão deplorável. Simão não diz nada, o Bom Deus deu-lhe um nome em sua Igreja, um nome religioso… Pedro. Ele não impede o progresso da Providência. Interferir no plano de Deus seria tanto temerário quanto insensato. E é notável que aquele que se oporá ao Mestre anunciando sua Paixão, assim como desembainhará sua espada no Jardim das Oliveiras, esteja em silêncio nesse momento. Ele se deixa guiar e levar.
Seguir os caminhos de Deus é muito bom, mas não é suficiente. Ainda precisamos nos encontrar, a cada momento de nossas vidas, no lugar exato onde Deus nos quer. Após a ressurreição, a presença física do Cristo ressuscitado será limitada a alguns episódios breves e espaçados. Pedro, o primeiro Vigário de Cristo, saberá como conduzir o seu rebanho. Estar em seu lugar é como o reconhecimento concreto da presença contínua, porém invisível do Senhor. Eles foram para a Galiléia. Para que? Porque é lá que o Senhor os aguarda… onde, quando e como são meros detalhes para aqueles que são confortados por essa presença. Eles estão em seu lugar, fazendo a vontade de Deus.
O Bom Deus tem planos para cada um de nós que dizem respeito não só ao todo, mas também aos mínimos detalhes da nossa vida. Basta olhar novamente para a cena do nosso evangelho. O encontro é preciso, todos esses homens estão na hora certa, esse encontro de um momento, um amanhã, é um encontro eterno. Essa realidade divina é ainda mais surpreendente com o episódio da Samaritana… vemos Cristo percorrendo o caminho que vai da Judeia à Galileia; a diligência o levou a uma cidade da Samaria, chamada Sicar, perto do poço de Jacó… Se Jacó não tivesse cavado esse poço, Nosso Senhor não teria podido descansar ali no exato momento em que esta mulher foi buscar água. Mas, graças à precisão de sua obediência, ele chegou ao poço de Jacó exatamente na hora do meio-dia, determinada por Deus desde toda a eternidade para esse encontro abençoado, que garantiria a salvação de tantas almas… nada é deixado ao acaso, nada escapa a Deus.
O quarto evangelho é a obra de um homem idoso que encontrou sabedoria. O seu olhar não é tanto o testemunho de gestos inéditos de Cristo, mas do repouso encontrado pela alma que encontrou Cristo, que segue os Seus caminhos, que faz a Sua vontade, que está em seu lugar.
Pe. Vincent Bétin, FSSPX