O TEMPO DE FÁTIMA ACABOU?

Nossa Senhora de Fátima - 13 de Maio

Fonte: Permanencia

A história prova Fátima. A Rússia NÃO se converteu nem está se convertendo!

O tema da minha palestra é: “O tempo de Fátima se encerrou?” Entendo por “tempo de Fátima” o tempo em que a mensagem e os pedidos de Fátima, bem como os eventos que com ela têm fortes ligações, nos trazem sua lembrança, ou lhe fazem alusão, mantêm-se atuais.

Esta aula consiste em duas partes: na primeira, nomearei alguns eventos históricos que aconteceram em datas importantes desde o ponto de vista de Fátima. Na segunda parte falarei porque a Rússia não se converteu nem está se convertendo – um dos pontos-chave para entendermos se o tempo de Fátima se encerrou, ou se ainda o estamos vivenciando. 

Primeira parte: A história prova Fátima. 

Não posso lembrar exatamente a primeira vez que escutei sobre Fátima. Isto ocorreu quando eu ainda era universitário ou quando ainda ia para a escola. Mas sempre me interessei por história e sempre pensei que a história do mundo tem algum propósito (a mensagem de Fátima teve grande dimensão histórica), e também como russo (Fátima teve uma grande relação com a Rússia), desde o começo fascinei-me com os eventos daquela longínqua vila portuguesa no ano de 1917 (ano que eu, como anticomunista convicto desde tenra idade, penso ser o ano mais trágico da história russa), e comecei a refletir sobre o que aquilo significava para a Rússia, para o mundo e para toda a humanidade. O que descobri foi um dos fatores que influenciaram a minha conversão à fé católica. Porém mesmo quando já era católico, durante meus estudos e pesquisas históricas, descobri mais fatos que somente reforçaram minha fé e credo na autenticidade de Fátima. 

Para mim, um dos fatos, ou melhor, série de fatos, é que muitos dos notáveis eventos históricos depois de 1917 aconteceram em “datas de Fátima” (com isso quero dizer os dias 13 dos meses de maio a outubro, com exceção de agosto, em que o dia é 19 – dias das aparições de Nossa Senhora de Fátima) e o fato de que eles provam a propagação dos “erros da Rússia” pelo mundo. Alguns desses eventos são amplamente conhecidos, outros não. Descobri a maioria dos eventos por conta própria, embora depois eu tenha encontrado alguns deles nas obras dos autores chamados “fatimistas”. 

Para relatar todos eles seria necessário escrever um livro, pois não é algo para o formato de uma curta palestra, portanto durante a minha conferência irei me ater  apenas a citar os mais impressionantes e fascinantes e, talvez, alguns pouco conhecidos. 

13 de junho de 1918 – Próximo à cidade russa de Perm, os bolcheviques assassinaram o primeiro membro da família imperial russa, ninguém menos que o grande duque Miguel, em favor do qual o imperador Nicolau II abdicou do trono na primavera de 1917. Embora Miguel não tenha aceitado o trono, de acordo com alguns historiadores e juristas ele foi, de fato, o último detentor do trono russo. A dinastia Romanov começou com Miguel e terminou com Miguel. De certo modo, podemos considerar seu assassinato simbolicamente como o fim da Velha Rússia. O corpo do grande duque até hoje não foi encontrado. 

19 de agosto de 1927 – A imprensa soviética (jornal oficial “Izvestia”) torna pública a Declaração de Sérgio Stragorodsky, ato patriarcal do então locum tenens (lugar-tenente) da igreja ortodoxa na Rússia sobre a “Lealdade incondicional da igreja ortodoxa russa ao governo soviético”. Apesar deste importante documento ter sido assinado antes, ele foi publicado exatamente no “dia de Fátima” de 19 de agosto. Infelizmente esse evento não é muito conhecido fora da Rússia, inclusive em círculos religiosos, mesmo sendo algo diretamente ligado com religião 1. O documento criou as bases de um certo fenômeno (ao qual os ortodoxos que a ele se opõem consideram heresia 2.) chamado Сергианство (Sergianismo). Na declaração, Sergio e os outros bispos que a assinaram, disseram que a igreja ortodoxa “decisivamente e irrevogavelmente” ingressou numa atmosfera “de lealdade” ao governo soviético (comunista e ateu) e sugeriu que o povo ortodoxo deixasse suas convicções políticas em casa e levasse para a igreja “apenas a fé”, ou, se eles não pudessem “fugir dos assuntos”, que a Declaração mudava apenas as “relações com o poder”, mas “a fé e a vida ortodoxa mantêm-se intactas” (o que não foi verdade) 3. No documento, Sergio também silenciou sem qualquer vergonha as perseguições religiosas na Rússia soviética, chamou as forças anticomunistas (incluindo clérigos ortodoxos) de “inimigos”, e disse que as “alegrias e sucessos” do governo soviético são “nossas (isto é, ortodoxas) alegrias e sucessos” e seus fracassos – “nossos fracassos” (sabemos porém que as “alegrias” do governo comunista incluem a destruição de igrejas e o assassinato de cristãos). Sergio todavia considerou qualquer golpe ao poder soviético como um “golpe contra nós” (ortodoxos). Porém, o mais importante é o primeiro parágrafo, citado acima. Como disse o autor russo Boris Talantov, a declaração criou uma situação em que as pessoas puderam ser chamadas ao mesmo tempo de crentes ortodoxos e leais, e cidadãos entusiastas do governo comunista 4De modo que uma pessoa poderia acreditar em Deus, ir à igreja, rezar, comungar, etc., mas fora da igreja, a mesma pessoa poderia (e deveria) aderir fervorosa e lealmente ao regime comunista — regime que prega o ateísmo, materialismo, perseguição a cristãos, terror vermelho e assim por diante — não somente na Rússia, mas em todo o mundo. Esta é a essência do Sergianismo: A rejeição direta do Reinado Social de Jesus Cristo

Embora alguns bispos, padres e fiéis ortodoxos (que podemos chamar de um tipo de “ortodoxos tradicionalistas”) tenham sido contrários à Declaração de Sergio, logo foram silenciados, exilados ou assassinados. E fatalmente o sergianismo se tornou doutrina oficial da igreja ortodoxa (o próprio Sergio foi eleito patriarca de Moscou em 12 de setembro de 1943, com a ajuda de Stalin). E não obstante a igreja ortodoxa ter uma longa história de submissão ao poder estatal (cesaropapismo, período sinodal na Rússia, etc.), houve naquele ato algo sem precedentes: a submissão da igreja ortodoxa a um regime abertamente anti-cristão e ateu, que rompeu até com a tradicional doutrina ortodoxa sobre as relações entre igreja e estado. Outro ponto interessante sobre esse evento, é que tal mudança doutrinal aconteceu contra o plano de fundo de preservação da liturgia ortodoxa tradicional, das práticas litúrgicas ortodoxas tradicionais, etc. Quando hoje muitas pessoas do Ocidente (inclusive alguns católicos tradicionais) admiram a liturgia oriental ortodoxa, eles não entendem que essa forma tradicional não traz a essência tradicional 5. Isso foi uma astuta estratégia dos bolcheviques, verdadeiros instigadores da Declaração de Sergio, que depois de verem falhar esse primeiro atentado para destruir a igreja ortodoxa por dentro – também chamado de obnovlenchestvo (“renovação”), que incluiu a modernização da doutrina liturgia – fizeram um segundo e mais bem-sucedido atentado (Sergianismo) para mudar a doutrina quase sem mudar a liturgia. A igreja ortodoxa e o povo ortodoxo, que foram (como podemos ver através da história) muito apegados às formas simples, frequentemente sem levar em consideração a essência, caíram vítimas desse engano. 

Curiosamente, esse evento ocorre em 1927, ano em que a Irmã Lúcia pela primeira vez recebeu do céu a permissão de revelar as primeiras duas partes do segredo de Fátima. 

Quero falar agora sobre os anos de 1929 a 1931, cruciais para todo o mundo do ponto de vista de Fátima. Por quê? Neste ano de 2017, muitas pessoas esperam algo incomum, um evento grandioso para acontecer, pois este ano é o centenário das aparições de Fátima. Mas eu, bem como outras pessoas que acreditam e se interessam por Fátima, não concordo com isso. Porque o ano em que Nossa Senhora pediu a consagração da Rússia foi 1929. Em 1917 Nossa Senhora disse: “virei pedir a Consagração da Rússia…”, e de fato ela veio pedi-la em 1929 (aparição em Tuy no dia 13 de junho). Por que ela escolheu aquele ano de 1929 e por que os anos de 1929 a 1931 (em 1931 Nossa Senhora apareceu em Rianjo e disse que o papa e os bispos estavam atrasados na consagração) são tão cruciais? 

1929 – É uma interessante coincidência que esse ano tenha sido chamado na historiografia soviética de “o ano da grande virada”, pois em 1929 o governo soviético finalmente renunciou a política econômica anterior (menos radical e mais liberal) e acelerou a coletivização da agricultura diretamente contra os camponeses. A reação à essa política foi a onda de revoltas de camponeses em várias regiões da URSS entre 1929 e 1931. Em sua entrevista nos anos 80, o ex-ministro das relações exteriores de Stalin, V. Molotov, disse que considera a vitória comunista contra os camponeses russos durante a coletivização como um evento de grande importância, até mesmo mais importante do que a vitória na Segunda Guerra Mundial 6Então ele percebeu que naqueles anos, mais que qualquer outro momento, esteve em jogo o destino da dominação comunista na Rússia, e foi quando a queda do poder comunista esteve mais próxima de acontecer. Depois a revolta dos camponeses foi esmagada e a coletivização se realizou (1931-32), a espinha dorsal da Velha Rússia, que eram os camponeses russos, foi quebrada econômica, política e culturalmente… 

1929 – Foi também o ano da crise econômica nos EUA, que começou em outubro, pouco depois do dia 13. Essa crise econômica gerou uma depressão que, de acordo com alguns pesquisadores, devido a políticas equivocadas implementadas pela administração de Herbert Hoover e Franklin D. Roosevelt, se tornou a “Grande Depressão” (curiosamente, Hoover trabalhou antes na American Relief Administration, ligada à Rússia pós-revolucionária, e Roosevelt usou conselhos de especialistas econômicos da escola keynesiana, os quais admiravam e usavam experiências soviéticas, portanto aqui encontramos novamente “erros da Rússia”7.) A Grande Depressão influenciou os panoramas econômicos e políticos de todo o mundo. 

1929 – Foi também exatamente o ano em que um prisioneiro italiano começou a escrever seus “Cadernos da prisão”. Esse homem, Antonio Gramsci, foi o fundador do partido comunista italiano e seus cadernos serviram como a base do Marxismo Cultural, uma praga que tem devastado o Ocidente moderno e, de muitas maneiras, a Rússia moderna e o mundo inteiro. Mas Gramsci não foi o inventor dessa ideologia. Ele usou a experiência dos bolcheviques que recebeu enquanto morava na Rússia soviética, em Moscou, entre 1922 e 1923 8Ali, ele não só casou-se com uma revolucionária russa de uma família de amigos de Lenin, como conheceu o próprio Lenin e assistiu não só a implementação das políticas econômicas comunistas, mas também viu como os bolcheviques buscavam mudar a cultura tradicional. Ele observou as consequências da legalização do aborto (o estado soviético foi o primeiro na Europa a legalizá-lo), provavelmente a preparação da primeira edição da Grande Enciclopédia Soviética, na qual proclamou-se a tolerância do poder soviético à homossexualidade (ao contrário dos estados “capitalistas” ocidentais), observou os desfiles de homens e mulheres nus sob a bandeira vermelha nas ruas de Moscou (mais tarde organizada na organização bolchevique “Abaixo a vergonha!“) que proclamou a vergonha como um “preconceito burguês”, e o indivíduo humano como “apenas um animal”, assistiu à devassidão na Rússia bolchevique, seguida da disseminação de teorias como a famosa “teoria do copo d’água” de Alexandra Kollontai, revolucionária e feminista (mais tarde primeira embaixadora mulher da União Soviética, que notavelmente não foi vítima dos expurgos de Stalin dos velhos bolcheviques e viveu confortavelmente sob o governo stalinista até o fim de sua vida em 1952) e que proclamou não existir o amor e que as relações entre homem e mulher são “apenas uma necessidade fisiológica”, “como beber um copo d’água”, de modo que as mulheres podem se satisfazer com qualquer homem, em qualquer momento, etc. Todas essas coisas fascinaram Gramsci e ele as usou em seu desenvolvimento do Marxismo Cultural. A Rússia “espalhará seus erros…” 

Setembro de 1931 – O Japão invade a Manchúria, na China, evento que muitos historiadores hoje consideram o primeiro da cadeia de eventos que culminou na Segunda Guerra Mundial. 

1931 – Nosso Senhor disse à Irmã Lúcia: “Não quiseram atender ao Meu pedido! … Como o Rei da França, arrepender-se-ão, e fá-lo-ão, mas será tarde. A Rússia já terá espalhado os seus erros pelo mundo, provocando guerras e perseguições contra a Igreja.” 

Agora, quero falar um pouco sobre os acontecimentos na história do país que durante muitos anos foi objeto de meus estudos históricos: a Espanha. Em 1931 aconteceu uma revolução naquele país, caiu a monarquia e proclamou-se a República. Desde o início, a Segunda República Espanhola manifestou tendências anticatólicas. 

11-13 de maio de 1931 – Em diversas grandes cidades da Espanha foram queimadas, saqueadas e destruídas muitas igrejas e conventos. O governo republicano ignorou (e por vezes encorajou) tais eventos. 

13 de outubro de 1931 – Durante os debates parlamentares sobre artigos anti-religiosos e anticatólicos da nova Constituição da República Espanhola, o líder dos liberais de esquerda e futuro primeiro-ministro Manuel Azana proclamou solenemente: “A Espanha deixou de ser católica.” 

13 de maio de 1936 – Após a vitória da Frente Popular de extrema esquerda (coalizão de socialistas, comunistas e liberais de esquerda apoiados por anarquistas) nas eleições gerais no inverno daquele ano, após a qual Azana se tornou presidente da República, seu sócio Santiago Casares Quiroga tornou-se o novo primeiro-ministro. Durante os famosos debates parlamentares de 16 de junho, em que o líder da oposição de direita, o monarquista José Calvo Sotelo culpou o governo da Frente Popular pela desordem e violência que naqueles dias reinavam na Espanha, Casares respondeu-lhe que se algo acontecesse, o único responsável seria o próprio Calvo Sotelo. Os radicais de esquerda que participavam da sessão entenderam essa ameaça no sentido de que, se cometessem algumas ações contra a oposição de direita e contra Calvo Sotelo pessoalmente, não seriam punidos pelo governo. 

13 de julho de 1936 – Às três da madrugada, um grupo da polícia republicana, acompanhado de membros do Partido Socialista Espanhol, chegou ao apartamento de Calvo Sotelo em Madri, eles o prenderam ilegalmente e depois o assassinaram no carro da polícia. O assassinato do líder da oposição do parlamento pela polícia estatal teve um efeito tão forte no país, que foi exatamente depois disso que muitas pessoas — entre as quais o general Franco — que ainda tinham dúvidas sobre se unir à possível insurreição contra as forças revolucionárias do governo, decidiram agir antes que fosse tarde demais. A insurreição de 17-18 de julho, que terminou em abril de 1939 com (usando as palavras do papa Pio XII) “a vitória da Espanha católica” começara. Outro fato interessante sobre isso é que José Calvo Sotelo, assassinado naquela “data de Fátima” de 13 de julho de 1936, nasceu na cidade de Tuy, numa casa situada não muito longe do convento em que a Santíssima Trindade com Nossa Senhora apareceram à Irmã Lúcia em 1929! 

Quanto à Segunda Guerra Mundial, não é amplamente conhecido o seguinte evento: 

19 de agosto de 1939 – Como se sabe, o pacto entre a Alemanha nazista e a União Soviética (conhecido como Pacto Molotov-Ribbentrop) foi assinado em 23 de agosto de 1939, mas de fato fora decidido anteriormente, na data de 19 de agosto. Naquele dia assinou-se o acordo de crédito Alemão-Soviético, que precedeu o Pacto final. Além disso, esta é a data do suposto discurso de Stalin (suposto porque alguns historiadores, seguindo a historiografia soviética, negaram a sua existência, no entanto outros historiadores pensam que este discurso foi real), em que ele explicou que a URSS precisava rejeitar a união com a Grã-Bretanha e a França em favor de um acordo com a Alemanha, e que interessava à URSS 9 um conflito entre Alemanha, Grã-Bretanha e FrançaO embaixador alemão na URSS, Schulenburg, estava convencido de que a decisão sobre o Pacto de Stalin com a Alemanha (com seu protocolo secreto) ocorrera exatamente no dia 19 de agosto. Depois da assinatura do Pacto, Hitler entendeu que Stalin não impediria suas ações na Polônia, e o caminho para a guerra mundial estava aberto. 

Penso que todos esses acontecimentos, de grande importância histórica, ocorridos nas “datas de Fátima” no período anterior à Segunda Guerra Mundial, mostram-nos claramente o significado e a autenticidade da mensagem de Fátima. Como nosso tempo aqui é limitado vou apenas citar algumas datas semelhantes do período posterior à Segunda Guerra Mundial. 

13 de outubro de 1962 — Foi o dia da primeira importante vitória da facção liberal durante o Concílio Vaticano II da Igreja Católica (referente à questão da composição das comissões do Concílio) 10No mesmo dia, de acordo com algumas fontes, representantes da igreja ortodoxa russa do patriarcado de Moscou chegaram ao Concílio 11. O Sergianismo, um dos principais “erros da Rússia”, entrou na Igreja Católica não apenas literalmente através desses representantes, mas através das inovações introduzidas nos documentos conciliares pela facção liberal, cujo objetivo era uma “adaptação” da Igreja Católica ao “mundo moderno”, rejeitando o Reinado Social de Jesus Cristo. 

13 de setembro de 1963 — Foi o dia da segunda importante vitória da facção liberal no Concílio Vaticano II (quando o novo papa Paulo VI nomeou quatro cardeais-moderadores com amplos poderes, três dos quais eram liberais, assegurando e reforçando com isso o domínio liberal no Concílio). 

Chegamos agora aos tempos do colapso da URSS. Curiosamente, mais uma vez, uma das principais pessoas que, juntamente com o  presidente dos EUA Ronald Reagan, derrotou a URSS na fase final da Guerra Fria, a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher nasceu na “data de Fátima”, 13 de outubro de 1925. Eventos que levaram diretamente ao colapso da URSS (prisão de Gorbatchov, tentativa frustrada de golpe de Estado por parte dos comunistas linha-dura, confronto em Moscou, etc.) aconteceram nos dias 19-21 de agosto de 1991. Entretanto, o dia da Independência da Rússia (da URSS, agora hipocritamente chamado simplesmente de o Dia da Rússia) é celebrado em 12 de junho (não 13, mas no dia anterior), talvez seja uma alusão do Céu ao fato de que a conversão da Rússia, não está concluída. 

Podemos dizer realmente, mesmo levando em consideração todos os eventos históricos ocorridos nessas datas características, que a “Época de Fátima” terminou e faz parte apenas da história, como algumas pessoas dizem? Começarei agora a segunda parte da minha palestra, na qual falarei sobre o tema da “conversão da Rússia”.  

Segunda Parte: A Rússia NÃO está convertida nem está se convertendo! 

“Pelos seus frutos os conhecereis” (Mt 7,16). 

Podemos realmente dizer que a Rússia se converteu à Fé (mesmo que não para a católica, mas para alguma fé “cristã”) ou que pelo menos se converteu do comunismo? 12

Sei que há uma tendência no Ocidente contemporâneo e, o que me surpreende, mesmo em círculos tradicionalistas, de considerar que a Rússia atual passa por algum tipo de reavivamento político e cultural, religioso e “tradicionalista”. Como exemplo, tomarei o artigo de um respeitado autor, Robert Siscoe, que li há alguns anos em uma cópia do jornal The Remnant, adquirido por mim na capela da FSSPX na Grã-Bretanha 13. A principal mensagem deste artigo é a de que a Rússia de hoje é quase tradicional materialmente, e que precisa apenas da essência (a fé católica) para alcançar a conversão formal ou final. Infelizmente, com todo o respeito ao Sr. Siscoe, devo dizer que tal visão da Rússia atual não é mais do que um pensamento conseqüente a um desejo. Devo discordar dele categoricamente, pois a realidade que vivemos na Rússia hoje é tão distante do quadro do Sr. Siscoe, que às vezes parece-me um pesadelo. 

Não, a Rússia não se converteu nem está se convertendo, nem sequer materialmente! Pelo contrário, está cada vez pior, comparando-se à situação de 15-20 anos atrás. Nos últimos anos, a Rússia tem passado não por um renascimento espiritual, mas por um renascimento soviético, que não pode prometer nada de bom. 

Não muito longe daqui, na praça Vermelha, a múmia de Lênin ainda está em seu mausoléu satânico. Centenas de monumentos a Lênin e seus asseclas ainda estão nas praças e ruas das cidades, vilas e aldeias russas. Apenas alguns deles foram destruídos nos anos 90. Hoje, eles não só são mantidos sob o pretexto de que “tudo isso é nossa história”, mas foram acrescidos de novos monumentos a ninguém menos que Josef Stalin. Sim, nos últimos anos, em diferentes lugares da Rússia, foram instalados muitos monumentos e bustos para Stalin 14. O último foi erguido (em torno da nova escultura de Lênin) na chamada “Viela dos chefes de Estado” em Moscou, inaugurado em setembro deste ano na presença do ministro da Cultura da Federação Russa e outros funcionários. Essa tendência é algo sem precedentes, porque mesmo nas últimas décadas da URSS, na Rússia, monumentos a Stalin eram praticamente inexistentes, já que tinham sido destruídos durante os tempos de Khrushchov e só agora começaram a ser reerguidos! 

Milhares e milhares de ruas de cidades, vilas e aldeias russas ainda são batizadas com nomes de Lenin e outros criminosos comunistas e assassinos em massa (não apenas russos). Basta simplesmente olhar o mapa de qualquer (qualquer!) cidade, aldeia ou vila russa na internet para entender isso! Quando propostas para rebatizá-las aparecem, geralmente são combatidas sob o pretexto de que rebatizá-las é “caro”. Mas isso não é verdade, porque é barato. Além do mais, é uma hipocrisia, pois quando por exemplo algumas pessoas danificaram a grande estátua de Lenin em São Petersburgo, na praça atrás da estação de trem “Finlândia” (inclusive, para o revestimento desta praça foram usadas pedras de um cemitério católico de São Petersburgo destruído pelos bolcheviques), esta estátua foi restaurada “em todo o seu esplendor”, à custa de milhões do dinheiro dos contribuintes. Por outro lado, quando surgem tentativas modestas de instalar algo que glorifique os heróis da resistência anticomunista, essas tentativas encontram hostilidade. Recentemente, por exemplo, houve uma tentativa de pendurar uma pequena placa no prédio em que viveu o almirante Kolchak, um dos líderes do Movimento Branco, que lutou contra os bolcheviques durante a guerra civil. Esta placa dizia apenas que Kolchak fora um oficial e explorador russo, não havia sequer menções sobre sua liderança do Movimento Branco ou sobre a sua luta contra o bolchevismo. Mas, de qualquer forma, as organizações pró-comunismo, depois de muitas vezes vandalizarem a placa, foram ao tribunal e ela foi removida, por decisão do tribunal e das autoridades. Assim, nos mapas das cidades russas é praticamente impossível encontrar quaisquer ruas dedicadas aos heróis da resistência anticomunista, ou mesmo aos czares ou personalidades do tempo imperial, e o mesmo acontece com os monumentos. Se existe algum, o número é tão ínfimo que é apenas uma exceção à regra. 

Há alguns anos aconteceu algo semelhante ao incidente acima em Moscou. Alguém decidiu abrir um restaurante com o nome de “Anti-Soviético”. A razão não era ideológica, mas apenas uma piada, pois no lado oposto da avenida havia uma “Cafeteria Soviética”. Algumas pessoas, no entanto, também foram ao tribunal, exigindo eliminar esse nome, porque era “ofensivo” (não o “soviético”, mas o “anti-soviético”!). Consequentemente, o nome foi removido, e o homem que iniciou o processo contra o restaurante “anti-soviético” foi nomeado pelo prefeito de Moscou, Sobyanin, como nada menos que Representante oficial de Moscou na Alta Câmara do Parlamento russo (13 de setembro de 2013)! 

Estes são fatos de caráter ideológico, mas e a esfera espiritual? Diz-se que a Rússia passa por algum renascimento espiritual, pelo menos ortodoxo. Mas é verdade? Os espectadores ocidentais, normalmente, observam apenas a hostilidade da atual Rússia ao casamento gay e à homossexualidade. Mas não entendem que as razões contra essas coisas na Rússia geralmente não são de caráter moral e, o que é mais impressionante, é que muitas pessoas na Rússia se opõem ao casamento homossexual ao mesmo tempo em que, por exemplo, apoiam o aborto. Não parece lógico, mas é verdade. A taxa de aborto na Rússia ainda é uma das mais altas do mundo, e, o que é especialmente curioso, não há um forte movimento Pró-Vida na Rússia, em comparação aos países ocidentais, sobretudo católicos. Até mesmo a igreja ortodoxa, à exceção de poucos indivíduos, prefere não falar sobre este importante tema, temendo uma reação hostil do público (quero dizer, não de grupos liberais, mas de um espectro mais amplo da sociedade) e de autoridades. Na verdade, a igreja ortodoxa continua a política sergiana de submissão à vontade do governo, mesmo que o governo não seja muito cristão. As autoridades na Rússia, de fato, têm uma postura pró-aborto. Às vezes, elas podem fazer algumas declarações sobre o “perigo da baixa taxa de natalidade”, etc., mas em geral são apenas declarações, de modo que o aborto continua sendo um tema que não se pode tocar, e os indivíduos que tentam defender a sua proibição são zombados e silenciados. Além disso, os contraceptivos, os divórcios, a pornografia, a prostituição, etc., também são comuns na atual Rússia. 

A imprensa ocidental gosta de criar a sensação de um suposto “renascimento espiritual” da fé ortodoxa na Rússia de hoje. Eles geralmente observam, neste caso, a proximidade de autoridades do governo com a igreja ortodoxa russa, e longas filas de pessoas que querem ver algumas relíquias. Quanto ao primeiro ponto, já falei sobre o Sergianismo, quanto ao segundo, eles não levam em conta a curiosidade do povo russo. O mais importante, porém, é que tais expectadores, jornalistas, etc., só têm interesse em criar uma impressão falsa (ou fake news, se quiser), eles não vão a nenhuma celebração normal de domingo na igreja ortodoxa. Caso contrário, veriam um quadro bastante diferente: um número de fiéis muito pequeno, mesmo nas grandes catedrais de cidades como Moscou e São Petersburgo, comparado por exemplo, ao número de fiéis em países como a Polônia ou até mesmo nações hoje mais secularizadas da Europa Ocidental como a Espanha e a Itália. Falei sobre os domingos comuns, porém mesmo nas grandes festas, as estatísticas testemunham a mesma tendência. De acordo com estatísticas policiais, que são mais objetivas neste caso, nas celebrações da Páscoa de 2014, por exemplo, participaram 300 mil pessoas 15. A população de Moscou é de cerca de 12 milhões de pessoas, ou até mais. Pode-se contar quão pequeno é o número de verdadeiros crentes ortodoxos na capital da Federação Russa! Na realidade, o número de crentes ortodoxos não mudou muito durante a última década e não ultrapassa os 10%, mesmo nas regiões “mais ortodoxas”; em outras é cerca de 2-4%16. Por outro lado, o número de muçulmanos vem crescendo constantemente e em festas muçulmanas é possível ver multidões de muçulmanos rezando ao redor de suas mesquitas em Moscou, São Petersburgo e outras cidades e vilas. 

Além disso a espiritualidade ortodoxa, tal como praticada na Rússia de hoje, é muito peculiar. O sergianismo está vivo não só em mera forma, mas também em essência. Nos últimos anos houve casos de “ícones de Stalin” em algumas igrejas ortodoxas. Por exemplo, um certo “ícone” foi venerado no bairro de São Petersburgo de Strelna, não muito longe do palácio do Congresso Presidencial 17. Embora esses “ícones” similares não sejam oficiais, há tendências stalinistas e pró-comunistas difundidas entre os ortodoxos na Rússia, e até entre o clero. As mesmas pessoas podem se considerar ortodoxas e louvar a União Soviética, Stalin  que é descrito por alguns extremistas como um “líder ortodoxo” (sic!) — e até Lenin, etc. Muitos ortodoxos pediram a canonização de Sérgio Stragorodsky, o instigador do sergianismo. Até o próprio Patriarca Cirilo pediu que se reconhecessem “as conquistas do período soviético”18.(sic!) Alguns dias atrás, na ocasião da abertura do monumento às vítimas das repressões políticas (por algum motivo, incrivelmente, não são chamadas de vítimas das repressões comunistas), Cirilo disse que o comunismo era uma “grande ideia para construir um mundo livre e justo” (sic!) e apenas a sua implementação na prática estava errada 19

O próprio presidente Putin, em janeiro do ano passado (2016), disse que “gostava e ainda gosta de idéias comunistas e socialistas” (sic!). E comparava o chamado “Código moral do construtor do comunismo” nada menos do que à Bíblia 20! Apesar de ele também ter dito depois que a “incorporação prática” dessas ideias não foi perfeita, essa declaração é, de qualquer maneira, bastante notável. Antes, Putin apresentara uma cópia do “Manifesto Comunista” de Marx e Engels como presente de aniversário ao líder do Partido Comunista da Federação Russa, Guennadi Ziuganov, e depois disse: “São para esses tempos, devemos nos orientar nessa direção”21(sic!). 

Portanto o que está se passando na Rússia agora não é um renascimento espiritual, mas um renascimento soviético (ou neossoviético), envenenando todas as esferas da vida. Quem for a qualquer grande livraria de Moscou, São Petersburgo, etc., verá dezenas ou até centenas de livros de autores que podemos chamar de “revisionistas soviéticos“. Pode-se ver prateleiras de livros sobre Stalin, por exemplo, a maioria enaltecendo-o como “grande líder”, “gestor eficaz”, etc., e rejeitando os fatos das repressões soviéticas, dizendo que “elas nunca aconteceram” ou justificando-as; livros enaltecendo outros líderes soviéticos, até mesmo os mais sangrentos deles, como Beria, etc., e livros justificando a URSS 22. Comparado com eles, o número de livros que contam a verdade sobre as atrocidades comunistas, sua ideologia, seus líderes, etc., e livros sobre os heróis da resistência anticomunista é muito pequeno. O povo russo está hoje ativamente submetido a uma lavagem cerebral por essa propaganda neossoviética. Quem assistir canais de TV estatais russos (não canais como RT para espectadores estrangeiro, mas para o espectador doméstico em primeiro lugar), verá muitos filmes, séries, documentários que, se não elogiam, ao menos apresentam o período soviético como heróico, inofensivo e até mesmo “fofo” (como talvez não perfeitos, mas “velhos bons dias”). Diversas pessoas pró-soviéticas e pró-stalinistas participam regularmente de programas de entrevistas nos canais de TV russos (para o espectador doméstico, em primeiro lugar) como convidados bem-vindos, geralmente com apoio do público 23. Alguns anos atrás também foi aprovada uma lei que proíbe a crítica às ações do Exército Vermelho durante a Segunda Guerra Mundial e a comparação da União Soviética com a Alemanha nazista 24Mitologia soviética e arquétipos, estereótipos e slogans da propaganda soviética são ativamente usados hoje na política externa russa, especialmente nas relações com países vizinhos e ex-membros da URSS. Essa propaganda esteve especialmente ativa durante as últimas crises na política externa. Quando durante esse período assisti aos canais estatais da televisão russa e li fontes pró-governo na internet, pareceu-me que tinha voltado à URSS, porque toda a retórica estava repleta de clichês tirados diretamente dos tempos soviéticos. Na arena da política externa, a Rússia agora tem amizade com a Venezuela socialista, Cuba, Coréia do Norte e China comunistas, Irã islâmico, etc. A única coisa boa que posso apontar sobre a atual política externa russa são suas ações na Síria, mas elas estão sendo realizadas por razões outras que a defesa dos cristãos ou do cristianismo. 

Se compararmos a Rússia atual com a Rússia dos anos 90, por exemplo, veremos que se nos anos 90 o principal discurso ideológico  se houve algum  em que existiu algum elemento de arrependimento dos crimes do comunismo era sobre o assassinato da família do imperador Nicolau II; agora o principal discurso ideológico do regime é a vitória na Segunda Guerra Mundial, que, não importa como seja abordada, foi também uma vitória comunista. Sob o prazer dessa vitória, muitas coisas soviéticas (de bandeiras vermelhas, agitadas maciçamente nas ruas hoje, até justificativas ideológicas ao regime comunista e suas diversas ações), como disse anteriormente, estão retornando às nossas vidas.

Na verdade, a sociedade contemporânea russa  de líderes a pessoas comuns — que critica ativamente o liberalismo em palavras, na prática, conscientemente ou inconscientemente, professa um dos princípios fundamentais do liberalismo: o relativismo moral. Especialmente em relação à sua própria história. “Tudo isso é a nossa história”: é o chavão das pessoas que tentam defender os monumentos de Lenin, os crimes de Stalin, etc. Mas elas não entendem que não há “simplesmente história”, o que há é boa história e má história, e para começar uma nova vida feliz, um homem ou um país deve avaliar o seu passado e condenar os seus pecados, tentando não repeti-los. 

Mas esta simples verdade cristã é o que está faltando na Rússia hoje! A maioria esmagadora do povo russo, do governo até à igreja (ortodoxa) e os homens comuns, está em estado de atrofia moral. Eles não têm arrependimentos pelos crimes do comunismo soviético nem compaixão por suas vítimas, eles se recusam a condenar essa ideologia maligna, que causou tanto dano não só ao mundo, mas em primeiro lugar ao próprio povo russo. Pelo contrário, como uma vítima da “síndrome de Estocolmo”, a sociedade russa, à exceção de alguns indivíduos corajosos, começa a justificar e até louvar aquela época, tentando diminuir ou até mesmo rejeitar como “mentiras” (inventadas por “malfeitores anti-soviéticos”) as atrocidades do regime comunista, ou mesmo aprovando-as, dizendo que eram “corretas e justas” e que as vítimas dos comunistas eram “traidores, fascistas”, etc.; ou até mesmo começa a inventar mitos óbvios, como o de que a URSS era “um país cristão” (não explicitamente, mas “em sua alma” e ações, dizem) e que Stalin era “um czar ortodoxo”, “fiel disfarçado” e teorias malucas parecidas 25. Ou pelo menos, diz-se que o comunismo era uma “idéia boa e bonita”, apenas sua implementação não foi tão perfeita etc. Pergunte a qualquer um nas ruas da atual Rússia o que pensa sobre o período soviético, o comunismo, Stalin, Lenin, etc. A resposta da maioria será positiva ou indiferente, mas dificilmente será negativa. De acordo com uma recente enquete do principal centro de pesquisa, 38% da população considera Stalin como “o maior homem da história”(!), 32% considera Lenin 26Outras pesquisas indicam que o número de pessoas que considera as repressões como “um crime político” diminuiu nos últimos cinco anos de 51% para 39% 27

Mas nós, como cristãos, sabemos que sem arrependimento não há absolvição! Enquanto a sociedade russa, o povo russo, não entender a natureza perversa da ideologia comunista como tal e não condenar explicitamente a ideologia comunista e o regime soviético, não haverá conversão. Não se pode ser cristão e ao mesmo tempo elogiar, ou pelo menos justificar, o regime comunista. É preciso rejeitar o regime comunista completamente com todos os seus crimes, etc. Agora, porém, a Federação Russa é a sucessora legal da URSS, tem o hino nacional da era soviética (embora com outras palavras), festas soviéticas, a era soviética é louvada por parlamentares, funcionários, publicitários e até padres; milhares de ruas das cidades russas, vilas e aldeias ainda glorificam “heróis” bolcheviques e nelas ainda se levantam monumentos para eles. E, no centro da capital russa, em seu mausoléu satânico, se encontra a múmia do principal bolchevique, Lenin… 

Sim, a maioria dos russos atualmente não é comunista, mas ainda é soviética. “Soviético” é uma categoria mais ampla do que “comunista”, relaciona-se não só com o partido, mas também com a mentalidade e com o estado. A mentalidade da maioria do povo russo agora, de funcionários do governo a trabalhadores comuns, na realidade ainda é “soviética”, e mesmo a geração mais jovem foi envenenada de sovietismo por seus avós ou pelos livros didáticos, que ainda estão cheios de paradigmas marxistas, porque nos anos 90 as pessoas foram preguiçosas para limpá-los desse veneno. O povo russo ainda gosta de coisas que gostava nos tempos soviéticos e odeia coisas, pessoas e países que odiava naquele período, por causa das diretivas do poder soviético (por isso se opõem ao casamento gay, porque não existia naqueles tempos, ao mesmo tempo que apoiam aborto e divórcio), as divergências em relação a isso são pouco comuns 28

Na esfera espiritual, também não podemos ver nenhuma tendência positiva real. Além do aborto, há o divórcio (Putin, Sobyanin e outros são homens divorciados), etc. Quem simplesmente for às ruas de Moscou, São Petersburgo e outras cidades, verá o mesmo comportamento imoral, a mesma moda imoral, o mesmo envenenamento pelo Marxismo Cultural que existe nos países ocidentais modernos. Não há diferença. Em pequenas cidades e vilarejos, destruídos pela coletivização comunista, a decadência é ainda mais visível. Mas a situação na Rússia é ainda pior, porque diferentemente dos países europeus e americanos, em que existem, mesmo que pequenas, saudáveis forças de oposição tradicionalistas, conservadoras, anti-comunistas ou anti-liberais, na Rússia só existem forças pseudo-conservadoras soviéticas (ou semi-soviéticas), que justificam o comunismo criminoso, ou os liberais pró-Ocidente contemporâneo. Para pessoas de mentalidade realmente tradicional, qualquer uma dessas alternativas é inaceitável. Essa é a devastação que a URSS deixou para trás. 

Entretanto, não há nada de errado em rejeitar os pecados do passado e condená-los! Muito pelo contrário, depois disso (mas somente depois disso), uma nova vida feliz começará! Ademais, neste caso, um grande futuro aguarda a Rússia e o mundo — tempo do triunfo do Imaculado Coração, da paz e do reinado de Maria… Mas é evidente que agora a Rússia não pode fazer isso sozinha, ela precisa da ajuda urgente do céu. 

A sociedade russa está doente, há décadas que ela sofre lavagem cerebral de propaganda comunista e, agora, neo-soviética. Está doente a tal ponto que, como às vezes penso, pode dar nascimento a uma construção ainda mais monstruosa do que foi a URSS, ou pode ser salva por um milagre. Esta não é uma opinião apenas minha, mas de muitos conhecidos meus, católicos tradicionais ou não. 

Acredito que todos os fatos (que podem ser facilmente provados) citados em minha palestra falam por si mesmos. E que a resposta para a pergunta de se a Rússia foi convertida ou está se convertendo é evidente. A Rússia não foi convertida nem está se convertendo, pelo contrário, vai agora na direção oposta. Significa que o “Tempo de Fátima” está longe de terminar, nós ainda o vivemos. O mundo moderno está envenenado pelos “erros da Rússia”: o Ocidente pelo Marxismo Cultural e a Rússia pelo sovietismo e pelo relativismo moral, e que justifica e se recusa a condenar tanto os crimes dos comunistas como essa ideologia maligna. O único meio de salvar o mundo foi definido pelo Céu em Fátima e Tuy. A Rússia precisa urgentemente da consagração! É nossa única esperança. 

Falei anteriormente sobre um milagre. Este milagre nos foi prometido por Nossa Senhora em Fátima. Quando isso vai acontecer, e depois de todo tipo de infortúnios, depende do papa, dos bispos e de nós também. 

P.S: Alguns eventos importantes aconteceram depois desta palestra, que são provas até maiores da tese principal nela apresentada — que a Rússia nem se converteu, nem está em vias de converter-se. Por causa de sua relevância, penso que é importante mencioná-los aqui na forma deste Post Scriptum

Em primeiro lugar, deve-se dizer que, no novo documentário, filmado em janeiro de 2018, o presidente russo Vladimir Putin disse que “o comunismo é muito semelhante ao cristianismo”, porque em sua opinião, ambos se baseiam em idéias de “liberdade, igualdade, fraternidade”29. Mas sabemos que na realidade a tríade “liberdade, igualdade e fraternidade” é o slogan maçônico, e não cristão! 

Além disso, Putin repetiu novamente sua infeliz comparação do “código do construtor do comunismo” com a Bíblia, e ainda mais blasfemamente comparou a múmia de Lenin, ainda deitada no mausoléu em Moscou, com relíquias sagradas de santos cristãos! 

Além disso, Guennadi Ziuganov, chefe do Partido Comunista Russo, disse que Putin prometeu-lhe que enquanto permanecer como presidente, o corpo de Lenin permanecerá no mausoléu na Praça Vermelha. De acordo com Ziuganov, Putin também rejeitou as alegações de que Lenin não foi enterrado de acordo com as tradições cristãs 30, ignorando assim um óbvio caráter oculto e o simbolismo do mausoléu. 

O segundo evento notável aconteceu quase simultaneamente. A nova comédia britânica “A Morte de Stalin”, de Armando Lanucci, foi proibida na Rússia. Não discutiremos aqui a qualidade ou precisão histórica desse filme, mas o que é importante para nós é o fato de que ele foi rotulado como “extremista” e “ofensivo à história russa (sic!)” por burocratas, políticos, ativistas culturais e até sacerdotes ortodoxos, porque zomba de líderes soviéticos! O autor pró-stalinista Nicolai Starikov chamou o filme de parte de uma “guerra de informação anti-russa (sic!)”. O ministro da Cultura da Federação Russa, Vladimir Medinsky disse que o filme será visto pelo público em geral, na sua opinião, como uma “zombaria de todo o passado soviético” e Pavel Pozhigailo, o então chefe do conselho público do Ministério da Cultura da Federação Russa, chamou isso de “ofensivo aos comunistas” (sic!) 31. Como se os comunistas e o passado soviético fossem algo sagrado para a atual Rússia (e de fato eles são, como podemos ver nos numerosos exemplos mencionados nesta palestra, para muitas pessoas, de oficiais de alto escalão a pessoas comuns nas ruas, para sua própria infelicidade e para a infelicidade da Rússia). 

Em todos esses exemplos, podemos ver que o espírito soviético está longe de morrer na Rússia, ao contrário, ele está ressuscitando agora em uma forma neo-soviética! Isto prova claramente que a conversão da Rússia não foi concluída nos anos 1980-90 e não está acontecendo agora, pelo contrário, muitos processos e eventos alarmantes, como os dois mencionados neste Post Scriptum, são o grito pela necessidade urgente de consagração da Rússia ao Imaculado Coração de Maria, exatamente como foi pedido em Fátima e em Tuy! Quanto antes melhor! Nossa Senhora de Fátima, rogai por nós!

*********************************

  1. Além disso, não há muita informação sobre o tema em inglês ou outras línguas, e este evento é considerado como caso estritamente ortodoxo, embora na realidade não seja, especialmente à luz de Fátima.
  2. Veja, por exemplo: Moss V. Sergianism as an Ecclesiological Heresy. http://www.euphrosynoscafe.com/www.saintbasilchurch.org/10.html
  3. Texto da Declaração com links para opiniões a favor e contra dos seus contemporâneos, pode ser visto aqui: http://www.krotov.info/acts/20/1927/19270729.html
  4. Talantov B. Sergianism, or Adaptation to Atheism (the Leaven of Herod). http://orthodoxinfo.com/ecumenism/cat_tal.aspx
  5. Eles não sabem também, que o nome atual da Igreja Ortodoxa Russa (Russkaya), do Patriarcado de Moscou também vem dos tempos de Stalin, porque antes o nome era outro — Igreja Ortodoxa Greco-Católica Russa (Rossiyskaya) (Cafólica (Kafolicheskaya)) aqui é a palavra grega, semelhante à católica (Katolicheskaya), mas usada pelos ortodoxos não no sentido de orientação a Roma ou a união com ela, é claro. Assim, a continuidade entre a ortodoxia russa pré-revolucionária e sua versão soviética é duplamente duvidosa.
  6. https://www.e-reading.club/chapter.php/64297/131/Chuev_-_Sto_sorok_besed…// Чуев Ф. Сто сорок бесед с Молотовым. М., 1991.
  7. Veja, por exemplo: Shlaes A. The Forgotten Man. A new history of the Great Depression. 2007.
  8. Em Moscou, não muito longe do Kremlin, é possível ver uma placa comemorativa na casa em que Gramsci morou em 1922-23 (Rua Mokhovaya, 16) próxima à casa do sangrento revolucionário húngaro Béla Kun, que também morava lá, e outros.
  9. Em inglês, por exemplo, aqui: http://theeasternfront.org/mein_sozialismus/downloads/articleI.pdf
  10. Veja: Wiltgen R. M. (S.V.D.). El Rin desemboca en el Tiber. Historia del Concilio Vaticano II. Madrid, 1999., p. 21.
  11. Veja note 68, p. 339 of: Socci A. El Quatro Secreto de Fatima. Madrid., 2012.
  12. [N. do E.] O Pe. Alonso, maior estudioso de Fátima, ensinava o seguinte acerca deste ponto: “É preciso afirmar que Lúcia sempre julgou que esta conversão não se resume ao retorno do povo russo à religião ortodoxa, com a rejeição do marxismo ateu dos soviéticos. Antes, refere-se pura, simples e totalmente à conversão total da Russia à única verdadeira Igreja de Cristo, que é a Igreja Católica”.
  13. Siscoe R. Is Russia Converting? The material preparation for the Consecration. // The Remnant, September 15, AD 2013, Volume 46, Number 15.
  14. A longa lista (com lugares e datas de construção) pode ser vista, por exemplo, aqui: Памятники Сталину. https://ru.wikipedia.org/wiki/Памятники_Сталину#Современные_памятники
  15. Пасху в Москве встретили около трехсот тысяч человек. Интерфакс/Interfax, 20 апреля 2014. http://www.interfax.ru/moscow/372712.
  16. As estatísticas policiais de diferentes regiões da Rússia podem ser vistas, por exemplo, aqui: Данные о посетивших пасхальные богослужения в 2014 г. http://www.sova-center.ru/religion/discussions/how-many/2014/04/d29380/
  17. Sobre o “ícone” de Strelna com uma imagem e um comentário bastante interessante do pároco, veja, por exemplo, aqui: http://www.fontanka.ru/2008/11/26/078/Sobre outro caso mais recente de “bênção” de um “ícone” similar na base aérea militar perto da cidade de Engels na região de Saratov (por ocasião, uma das áreas na qual antes dos tempos de Stalin viviam muitos católicos russos de origem alemã), veja, por exemplo, aqui: https://www.saratovnews.ru/news/2015/06/16/aleksandr-prohanov-bydet-rato… prichislenii-geroev-vov-k-liky-svyatyh/
  18. Veja aqui: http://www.ng.ru/faith/2016-05-26/2_patriarh.html
  19. Veja aqui: http://www.dw.com/ru/комментарий-день-памяти-жертв-репрессий-день-триумфа- кгб-трусости-и-унижения/a-41176479.
  20. Artigo em um dos principais jornais russos “Novaya Gazeta” sob o nome notável “Putin falou sobre suas simpatias às idéias do comunismo e do socialismo”, aqui: Путин рассказал о симпатии к идеям коммунизма и социализма. // Новая газета, 25.01.2016. // https://www.novayagazeta.ru/news/2016/01/25/117979-putin-rasskazal-o-sim…kommunizma-i-sotsializma.
  21. A reportagem do canal controlado pelo governo NTV pode ser vista e lida aqui: Путин с “намеком” подарил Зюганову на юбилей фигурку Чапаева. http://www.ntv.ru/novosti/1075237
  22. Por exemplo, obras de autores como: Mukhin, Starikov, Puchkov, Dugin, S. Kara-Murza, Kremliev, Martirosyan, Dukov, Wasserman, Kalashnikov, etc. – mencionando apenas alguns deles.
  23. Por exemplo, personalidades como Kurginyan, Prokhanov, etc.
  24. A iniciadora desta lei foi a parlamentar Irina Yarovaya, ex-membro do partido Liberal “Yabloko” e agora membro do partido pró-governo “Rússia Unida”. Yarovaya foi especialmente atuante na promoção pró-soviética e também no controle da Religião, Internet, etc. da parte do estado, que foram iniciativas nos últimos anos. Ela também é apoiadora do sistema judiciário juvenil.
  25. Essas teorias bobas se propagam em muitos livros que são vendidos até em respeitadas livrarias russas.
  26. https://www.levada.ru/2017/06/26/vydayushhiesya-lyudi/
  27. https://www.levada.ru/2017/05/23/zlonamerennoe-bezrazlichie/
  28. Não há muitos trabalhos em inglês sobre esse tema importante. Um dos poucos e, provavelmente o melhor e o mais detalhado, embora com algumas tendências liberais, é: Satter David. It Was a Long Time Ago, and It Never Happened Anyway. Russia and the Communist Past. 2012.
  29. Veja o relatório do canal RT oficial pró-Putin aqui (em inglês): https://www.rt.com/news/415883-putin-communist-ideology-christianity/ – ou aqui (em espanhol): https://actualidad.rt.com/actualidad/259997-putin-comunismo-cristianismo… – A única imprecisão, é que em “liberdade, igualdade, fraternidade” foi adicionado “justiça”, mas se olharmos para o documentário, veremos que foi adicionado pelo questionador do documentário, não por Putin diretamente.
  30. Ibid.
  31. Mais detalhes veja, por exemplo, aqui (em inglês): https://www.theguardian.com/world/2017/oct/14/in-russia-nobodys-laughing-at-armando-iannucci-death-of-stalin – ou aqui (em espanhol): http://www.el- nacional.com/noticias/entretenimiento/nuestro-amigo-comun-muerte-stalin-renacimiento-censura_221417 – ou aqui (em russo): https://meduza.io/feature/2018/01/23/eto-ne-yumor-ya-byl-znakom-s-gaydaem.