Esta é a busca de um coração inquieto que não descansa enquanto não encontrar a morada do Senhor para nela descansar.
Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est
João e André seguiam o Mestre em silêncio. Jesus, voltando-se para trás, e vendo que o seguiam, disse-lhes: “Que buscais vós?” Só se procura o que se ama, e só se segue alguém para estabelecer contato com ele… uma atração guiava seus passos. Disseram-lhe: “Mestre, onde habitais?”
O olhar do Senhor desencadeara uma impressão profunda na alma do discípulo bem-amado, e a Luz sobrenatural que trouxera essa graça levo-o a responder apenas um “onde habitais, Senhor?” Uma questão aparentemente desinteressada. Ele ouvira a pregação do Batista, e encontrara no deserto o anúncio daquilo que a sua alma ansiava, e que o excedia. Ao seguir Jesus, [João] oferece o seu ser a Cristo, para que Ele o preencha. Ele sabe, sem perceber. Certamente, ele lhe ofereceu muito mais do que podemos imaginar: a Luz fez brilhar a plenitude em sua alma jovem e pura… Mestre, gostaríamos de ver onde habitais. Tudo estava incluso nesta resposta.
Vinde ver. João se lembrará destas primeiras palavras por toda a sua vida. Ele é aquele que foi chamado para ver. Sua missão é ver e testificar que Jesus é o Filho de Deus. Mais tarde, ele ouvirá o Mestre dizer: É preciso que o mundo conheça que amo o Pai; então ele dará testemunho desse amor em seu Evangelho, escrito para nós. Ele será a testemunha de cada momento da vida pública de Cristo, testemunha dos ensinamentos divinos e das disputas com os fariseus, testemunha dos momentos de intimidade com o Mestre e das manifestações de sua glória, como no Monte Tabor, testemunha de seu coração na Última Ceia e aos pés da Cruz, testemunha de sua ressurreição e de sua presença na Igreja nascente… Os escritos de São João são uma visão. Por enquanto, o que viu foi a simplicidade do Mestre. A resposta do Mestre não demorou a chegar; foi acolhedora e doce. Vinde ver … Então eles foram, continua o evangelho, entraram em sua habitação e ficaram com Ele aquele dia. Então era quase a hora décima, cerca de quatro horas da tarde. Conversavam como amigos. A Caridade é amor de amizade, amor de presença.
Quando os dois discípulos deixaram o Senhor, sabiam, por experiência própria, tudo o que o Batista lhes havia ensinado, vê-se isso pela clareza e a resolução da mensagem que André imediatamente transmitiu ao seu irmão Simão: encontramos o Messias, ou seja, o Cristo, como o evangelista traduz para os gregos.
É surpreendente notar que João não dirá nada sobre esta tarde passada com Cristo. Não saberemos nada sobre o que disseram um ao outro. Por quê? Porque não é importante, porque a nossa curiosidade poderia nos levar a perder o essencial. A nós, que sempre pensamos que precisamos saber mais para desenvolver a nossa vida interior, João diz-nos que esta vida é, antes de tudo, uma presença, uma intimidade. Embora São João use a palavra permanecer quase 70 vezes em seus escritos, ele a utiliza com mais frequência em um sentido metafórico, em um sentido interior: Se permanecerdes fiéis à minha palavra, sois verdadeiramente meus discípulos – Permanecei em mim, como eu em vós – eu permanecerei em seu amor.
Quando São João pergunta ao Senhor onde habitais, ele está perguntando o que tantos santos depois dele perguntarão: onde habitais, Senhor, para que eu vos siga e permaneça em vós. Esta é a busca de um coração inquieto que não descansa até encontrar a morada do Senhor para nela descansar… porém, eras mais íntimo que o mais íntimo de mim mesmo, e mais elevado que os cumes de mim mesmo, escreveu Santo Agostinho. Neste movimento, nunca haverá confusão entre o Senhor e a alma que O busca.
A morada de Deus não é um lugar, nem é a experiência sensível do eu da fé modernista. Esta habitação é uma vida de fé inteiramente sobrenatural. Que Cristo habite em vossos corações por meio da Fé, dirá um dia São Paulo. Guillaume de Saint Thierry descreveu maravilhosamente essa habitação… Teu lugar és teu Pai; e o lugar do Pai és tu. Devido a este lugar, és localizado. Entretanto, essa localização, que te pertence, é mais distante, mais elevada e mais secreta que qualquer localização. Essa localização é a unidade do Pai e do Filho, a consubstancialidade da Trindade.
Pe. Vincent Bétin, FSSPX