PONTO DE VISTA: QUAIS SÃO OS “VALORES DO OCIDENTE” A SE SUSTENTAR CONTRA A RÚSSIA?

O conflito entre Rússia e Ucrânia é apresentado pela grande mídia como uma cruzada pela defesa dos “valores ocidentais”, pela liberdade e pela democracia. Seria o caso então de se perguntar qual a natureza exata desses valores.

Fonte: DICI – Tradução: Dominus Est

É assim que antes de se unir — eventualmente — a todos os seus contemporâneos, numa vasta unanimidade consensual, Davide Lovat, um leitor do blog do vaticanista Aldo Maria Valli, prefere — de maneira sensata — refletir sobre quais são os valores do Ocidente hoje. Eis as partes principais da sua resposta, tais como elas foram relatadas pelo vaticanista italiano em 1 de março de 2022:

“Quais são os valores do Ocidente hoje? Houve um tempo em que eles consistiam em valores cristãos, mas hoje esses valores foram totalmente deixados de lado e são combatidos sem descanso. Então quais são eles? Tentarei listá-los aqui, adicionando um breve comentário, mas não necessariamente por ordem de importância.

“Então comecemos: há a celebração da memória da Shoah [nota do blog: o holocausto judeu da segunda guerra], o orgulho gay para afirmar socialmente a teoria de gênero, o cientificismo, o positivismo jurídico, o sincretismo religioso, o ecologismo, o imigracionismo para nutrir o multiculturalismo, a libertinagem (isto é, a pornografia, a prostituição, o aborto, a eutanásia, os “baseados” e as drogas), o estatismo elevado à dimensão continental e a cultura do cancelamento ligada ao progressismo ideológico.

“Eu, cristão, concordei em celebrar o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto enquanto acreditava que isso significava condenar a dinâmica da guetização que nos anos 1930 preparou o terreno para o racismo genocida subsequente dos anos 1940, mas após ter sentido na pele a dinâmica da guetização e discriminação ainda em curso sobre aqueles que não se submetem à chantagem sanitária dos poderes instaurados, ainda que sem querer fazer analogia direta, digo que se o dia da memória se reduz ao mea culpa generalizado por um só dos genocídios que a história enumera (o termo genocídio, porém, foi cunhado por causa do extermínio dos armênios, e talvez serviria como termo específico para o extermínio bimilenar dos cristãos no mundo que ainda está em curso), então neste caso não posso mais me reconhecer. Se devo reconhecer um fato que seja vergonha perpétua para a humanidade, eu já tenho o Tríduo Pascal com a paixão, crucifixão, morte e, pela Graça, a ressureição de Cristo que satisfaz tais exigências.  […]

“Devemos falar do sincretismo religioso? Eu era filho de uma Europa que civilizou o mundo reconhecendo Cristo Rei como o caminho, a verdade e a vida. Eu não sei o que pensar de um sistema político em que as religiões são todas as mesmas ou, como o Papa Francisco subscreveu em Abu Dhabi, diferentes expressões da vontade de Deus, e portanto são todas falsas na medida em que nenhuma é a plena expressão da verdade.

“Tampouco me reconheço no ecologismo ideológico em que o homem é uma doença para o meio ambiente; em que é preciso comer insetos no lugar da carne para não superaquecer o planeta; em que é preciso substituir o gás metano pela destruição da paisagem trazida pelas ultraimpactantes turbinas eólicas; e menos ainda me reconheço nesse sistema que revoga o papel de guardião da criação do ser humano.

“Tampouco me reconheço no imigracionismo selvagem que serve para empobrecer ainda mais os povos do Ocidente sem enriquecer os pobres da África e Ásia, criando tensões e deformações mútuas em prol de uma elite financeira apátrida que quer impor o multiculturalismo porque não aceita o dever de reconhecer o valor de uma cultura histórica específica.

“Reconheço-me ainda menos na libertinagem, que é mais filha do Marquês de Sade do que consequência do niilismo e seus derivados, e que produz doenças sociais como a pornografia e todos seus frutos perversos como a pedofilia ou a propagação de doenças; como a morte dos fracos hipocritamente chamada de eutanásia; como o aborto reduzido a uma prática contraceptiva; como a deformação do matrimônio, cujas características exclusivas foram estendidas a todas as formas de união sexual e afetiva; e numerosas outras práticas similares elevadas a ao nível de sistema de fé social e pseudo-civil.

“Nem mesmo menciono, senão de passagem, a cultura do cancelamento que serve para sufocar qualquer resistência residual à afirmação de todos esses «valores do Ocidente»; cultura essa que usa como meio a manipulação da linguagem e a destruição do patrimônio material e espiritual.

“Não é nem mesmo necessário se estender sobre a traição do ideal europeu pela União Europeia saída do tratado de Lisboa, que visa estabelecer os Estados Unidos da Europa no lugar da Europa dos povos. Um projeto tecnocrático e dirigista que nega as raízes técnicas, históricas e culturais da civilização europeia.

“Pois bem! Não estou pronto a defender esses valores, pois os combato todos os dias, abertamente, em público, a cada ocasião que me surge. É o “bom combate” do qual falava São Paulo quando saiu deste mundo, o combate a se conduzir até o término da caminhada e conservando a fé em Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo, pelos séculos dos séculos.

“Eu estou no mundo, mas como cristão não sou do mundo. E se o Ocidente tornou-se isso, renunciando ao cristianismo e sobretudo a Cristo, eu me mantenho fiel, custe o que custar, ao Verbo que se fez carne na Virgem Maria, porque somente em Cristo há palavras de verdade. E digo isso com todo «respeito» que merece a OTAN e seus comandantes e aqueles que servem ao Inimigo”.

Fim.

Nota do blog: Recomendamos, ademais, o texto Civilização latina ou judaico-cristã?” do historiador argentino Rubén Calderón Bouchet, pai do Padre Álvaro Calderón, FSSPX.