Qualquer pessoa que, razoavelmente, pretenda fugir das injunções estatais e sanitárias, constantemente variáveis e contraditórias, encontra-se marginalizada como um pária.
Fonte: Fideliter n ° 260 – Tradução: Dominus Est
É surpreendente que a própria palavra contágio só tenha surgido no século XIV. Obviamente, bem antes, doenças graves já se transmitiam por aproximação e precisavam de medidas de proteção. O dicionário nos mostra que contágio é um “substantivo feminino que data de 1375, e que vem do latim tangere, tocar“. E se formos um pouco mais a fundo, descobrimos que a ideia de transmissão de uma doença por contato não teve origem na ciência da medicina. Não, não teve! Desde a antiguidade cristã, sempre houve um grande medo da propagação do mal.
Em primeiro lugar, o primeiro e pior dos males, aquele que é transmitido a todos de geração em geração e priva a natureza de sua ordenação, é o pecado original. Ele desordena todas as nossas faculdades entregues à própria vontade, em detrimento do governo da razão. É, até mesmo, a razão de nossa vida mortal e de todos os nossos males. O único remédio é a paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, cujo sacrifício se renova no altar, na Missa, que é um verdadeiro sacrifício propiciatório (que já não se manifesta na nova e atualizada Missa de Paulo VI). “Quem me livrará deste corpo (em que habita o pecado, que é causa de morte espiritual)?” pergunta o Apóstolo.
Outrora, o pecado original e a heresia eram estigmatizados
Mas, além dessa corrupção natural, qual é esse mal que todos os Padres da Igreja combateram, tão justamente, porque era tão contagioso? É a heresia. O caridoso Agostinho é cruel quando se trata de deter este flagelo, em particular, o dos donatistas . E por que, se não porque os hereges de todos os matizes rejeitam os cânones da fé e dissolvem a unidade política e social à imagem dos efeitos do pecado original? Por recusarem as regras de crença e ação que vinculam todos os membros de um corpo social organizado, eles devem ser excluídos.
São Paulo pede a tanto a Tito como a Timóteo, que os fiéis evitem os hereges. E os imperadores cristãos não brincavam com um assunto tão sério; eles exigiram que suas propriedades fossem confiscadas ou mesmo fossem exilados. Podemos compreender a inquisição instituída pelos papas Inocêncio XI e Gregório IX depois que os cátaros ou albigenses mostraram que eram perigosos. Todos aqueles que os defenderam foram declarados infames e suspensos de suas funções. O direito canônico impõe a excomunhão aos hereges públicos: eles estão excluídos da vida comum sacramental e não têm direito ao sepultamento eclesiástico.
Pertinentemente, o herege não deseja mais acreditar em Deus, seu Salvador, em razão de sua autoridade. Ele afirma, por seu próprio julgamento, alcançar o mistério divino. Ele é um flagelo para aqueles que o cercam e o ouvem, pois destrói resolutamente a sua bem-aventurança. É certo que deva ser excluído: o fim do homem está em perigo. Em um edital de 425, o imperador romano Teodósio II exigiu que os hereges fossem excluídos: “para que Roma não fosse manchada pelo contágio causado pela presença desses criminosos”.
A nova heresia consiste, hoje, em não receber a vacina
A fim de compreender a gravidade dessa doença e seu contágio, os Padres da Igreja a compararam à lepra, doença que provoca medo e rejeição. A feiura de seus rostos e a deformação de seus corpos fizeram com que os leprosos vivessem quase como mortos-vivos, párias (marginais). “A lepra (hanseníase) é, com efeito, um defeito na aparência, e não privação da saúde ou integridade dos nervos e dos membros. Portanto, é permitido ver nos leprosos o símbolo daqueles homens que, não tendo a ciência da verdadeira fé, professam abertamente os vários ensinamentos contraditórios do erro. Pois eles nem mesmo ocultam sua incapacidade, mas fazem o máximo para trazer o erro à tona e usar toda a pompa de seus discursos a seu serviço. Agora, a Igreja deve evitar tais homens”, explica Santo Agostinho.
E hoje? Qualquer pessoa que, razoavelmente, pretenda fugir das injunções estatais e sanitárias, constantemente variáveis e contraditórias, encontra-se marginalizada como um pária. Qualquer um que pretenda manter sua sanidade e não aderir ao código de vida republicano, duvidosamente fundado, rapidamente passa a ser considerado abjeto e marcado com uma impureza jurídica: ele se coloca em um estado de heresia secular e, portanto, deve ser excluído. Nada de novo sob o sol.
No tempo de Nosso Senhor, o legislador hebreu obrigava os leprosos a usar um véu sobre o queixo e a avisar os transeuntes da sua aproximação, gritando: “Tame, Tame, impuro, impuro”. Que profilaxia a República irá impor a esses novos hereges? Deverão eles, esses novos leprosos, vagando por aí, carregar um sino como outrora?
Pe. Benoît de Jorna, FSSPX