A REAÇÃO PARADOXAL DAS COMUNIDADES “EX-ECCLESIA DEI” AO MOTU PROPRIO TRADITIONES CUSTODES

La réaction paradoxale des communautés « ex-Ecclesia Dei » au motu proprio  Traditionis Custodes • La Porte Latine

Se a nova missa é “fecunda” e “legítima”, por que recusar seu uso exclusivo? Especialmente se o papa tomou tal decisão motivado pelo desejo de união na Igreja…

Fonte: La Porte Latine – Tradução cedida pelo nosso amigo Bruno Rodrigues da Cunha

Amicus Plato, sed magis amica veritas.Sou amigo de Platão, mas mais amigo da verdade”. Se por um lado lastimamos sinceramente um motu proprio que revoga quase todo direito de cidadania à liturgia tradicional, por outro lado não podemos deixar de notar o caráter paradoxal das reações dos institutos “ex-Ecclesia Dei”.

A reação mais emblemática é, sem dúvida, a do padre Paul-Joseph, Superior do Distrito francês da Fraternidade São Pedro. Numa entrevista à Famille Chrétienne, ele disse que “a Fraternidade São Pedro nunca rejeitou o Concílio Vaticano II. Para nós, ele não contém dificuldades fundamentais, mas unicamente demanda esclarecimentos acerca de determinados pontos, que nós interpretamos à luz da tradição da Igreja tal como preconiza Bento XVI”. Disse também que “jamais colocamos em dúvida a validade e a fecundidade do missal de Paulo VI”.

Essas palavras nos lembram que, diferentemente do que alguns pensam, as posições da Fraternidade São Pedro sobre o Concílio e a missa nova são completamente diferentes das posições da Fraternidade São Pio X.

A Fraternidade São Pio X afirma que no Concílio e no ensinamento dos papas pós-conciliares há erros, que se colocam em descontinuidade em relação à doutrina católica de sempre. Por exemplo, a liberdade religiosa, o ecumenismo, a colegialidade, citando apenas os pontos mais importantes. A Fraternidade São Pedro reduz tudo isso a um problema de interpretação e de esclarecimentos a serem dados.

A Fraternidade São Pio X afirma que a missa nova, ainda que não seja inválida, é, contudo, sempre ilícita, porque ela exprime a fé de um modo fundamentalmente ambíguo – que pode ser aceita tanto por um católico como por um protestante, como os próprios teólogos protestantes afirmaram.

Alguém poderia objetar que os padres da Fraternidade São Pedro não têm a mesma posição que seu Superior de distrito. Isso talvez seja verdade. Mas desde quando um católico, acerca de matéria que se relaciona com a fé, tem o direito de ter uma posição pública (meramente por pertencer a um instituto que detém oficialmente essa posição) que está em contradição com sua posição privada? Se fosse assim, não haveria mártires.

É uma questão sobre a qual poderíamos ir longe. Aqui, queremos apenas relembrar que a reação do padre Paul-Joseph ao motu proprio Traditiones Custodes é incoerente até mesmo com sua própria posição doutrinal.

De fato, a moral nos ensina que, ao se escolher entre duas ações, na qual uma é em si mesma melhor e a outra é em si mesma pior (mas também boa); se o superior nos ordena fazer a pior, é ela que se torna, não mais em si, mas de fato, a melhor. E, portanto, não há razão alguma para se opor. Por exemplo, entre estudar e rezar, esta é em si mesma melhor. Contudo, se o superior ordena que se estude em vez de rezar, não tenho direito algum de lhe resistir, porque estudar é também uma boa ação, que pode ser objeto de uma ordem legítima.

Acontece o mesmo para a nova missa. A Fraternidade São Pedro pensa que ela é “fecunda” (Pe. Paul-Joseph), “absolutamente legítima” (carta de 71 padres da FSSP ao padre Bisig, 8 de setembro de 1999; recurso da FSSP perante à Comissão “Ecclesia Dei”, 29 de junho de 2000) e, portanto, ela é boa, ainda que seja menos boa do que a missa tradicional (mesmo se Francisco, na carta aos bispos que acompanha seu motu proprio, condena tal opinião).

Portanto, a partir do momento em que o papa ou o bispo ordenam seja a concelebração, seja celebrar apenas a missa nova, seja (é o caso de Traditiones Custodes) favorecê-la e conduzir a ela, pouco a pouco, os tradicionalistas, por que se opor? Se a missa nova é boa, ela pode ser objeto de uma ordem legítima. Especialmente se o papa tomou tal decisão motivado pelo desejo de união na Igreja…

Seria o contrário se pensamos, como pensa a Fraternidade São Pio X, que a missa nova é ilícita e, portanto, má. Nesse caso, ela não pode ser objeto de uma ordem legítima. E não somente podemos mas devemos nos opor a ela, porque não pode haver verdadeira obediência a uma ordem intrinsecamente injusta.

Portanto, das duas uma: se a missa nova é “fecunda” e “legítima”, portanto por que não aceitar, se o Papa quiser, até mesmo seu uso exclusivo? Se a missa nova é má, temos portanto o direito e o dever de permanecer na missa tradicional e de recusar a nova missa.

Pe. Daniele di Sorco, FSSPX

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