CARTA DO SUPERIOR GERAL DA FSSPX AOS AMIGOS E BENFEITORES – N° 93

Mitte operarios in messem tuam.
Enviai operários à vossa messe.

Fonte: FSSPX

Caros fiéis, amigos e benfeitores,

Dentro de poucos dias terá início um novo Ano Jubilar para a Igreja. Em 20 de agosto do próximo ano, muitos de nós, espero, encontrar-nos-emos em Roma. Lá, evidentemente, daremos um testemunho de fé: uma fé recebida da Igreja por sua Tradição, uma fé viva que, por nossa vez, temos o dever de transmitir tal como a recebemos, isenta de qualquer compromisso com o espírito do mundo. 

Possa este jubileu ser igualmente um testemunho de esperança, especialmente em relação ao futuro da Igreja e sua indefectibilidade. Com efeito, se somos profundamente ligados à Roma de sempre, devemos nos preocupar intimamente com a Igreja de amanhã. Naturalmente, conhecemos a promessa de Cristo de estar com ela até o fim dos tempos, apesar das investidas do inferno. Contudo, devemos compreender que esta promessa implica, necessariamente, a nossa participação: Nosso Senhor conta com os nossos esforços, suscitados e fecundados por sua graça, para garantir à Igreja a sua indefectibilidade.

Concretamente, que esforços são estes que Nosso Senhor espera que façamos para assegurar o futuro da Igreja? Podemos resumi-los em nosso labor comum em fazer desabrochar numerosas e santas vocações, tanto religiosas quanto sacerdotais. Os santos e os papas não deixam de repeti-lo: um povo só é santo graças a um clero santo, e uma civilização só se torna cristã na medida em que ela é fecundada por santos religiosos. Logo, preocupar-se com a Igreja de amanhã é trabalhar com todo o nosso poder no surgimento, formação e perseverança destas vocações.

Testemunhas heroicas de Cristo

Que dirá suficientemente o que são chamados a ser os padres, religiosos e religiosas de amanhã? Dom Lefebvre foi muito sucinto quando se dirigiu aos seus seminaristas: 

“O tempo atual é o tempo dos heróis. Na hora em que tudo parece desaparecer na estrutura da sociedade, e mesmo na estrutura da Igreja, não é hora das almas tíbias, que se entregam às perturbações ou às dúvidas que circulam através do mundo, até sobre a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, e mesmo através da Igreja Católica. É hora daqueles que creem em Nosso Senhor Jesus Cristo, que creem que Nosso Senhor Jesus Cristo, por sua cruz, deu a solução a todos os problemas pessoais da nossa vida[1].”

Com efeito, o que a situação do nosso mundo implora é uma geração de padres, religiosos e religiosas, que testemunhe Nosso Senhor Jesus Cristo, frequentemente contra os ventos e as marés. Uma geração que, por nosso mundo deixado moribundo, testemunhe a onipotência redentora que se encontra em Cristo Jesus, e somente nele. Que o testemunhe, por palavras, sem medo nem rodeios, e mais ainda por uma vida vivida em sua escola e em seu amor. Uma geração aonde cada um ao seu modo será uma “imagem viva do Salvador”, segundo as palavras de Pio XII[2].

Uma luz para o mundo

Por vezes, há quem se assuste com as tempestades que abalam o mundo, e que o sacodem tanto mais quanto este mundo se afasta mais de Deus. Com Nosso Senhor, que acalma o coração de seus apóstolos antes mesmo de acalmar as ondas, gostaríamos de lhes dizer: Não temam[3]. O poder da tempestade não torna ainda mais manifesto o poder maior do farol, que não deixa de iluminar, de guiar-nos até o porto?

Eu sou a luz do mundo[4]. Depois de Cristo, tal é também a Igreja. Tais serão, outrossim, seus ministros e religiosos, se eles permanecerem alicerçados e enraizados na caridade, se Cristo habitar em seus corações pela fé[5]. Com São Paulo, poderão dizer: Estou convencido de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem as coisas presentes, nem as coisas futuras… nem nenhuma criatura poderá nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, Nosso Senhor[6].

Então, longe de se assustarem com as trevas, vencê-las-ão pela luz da qual eles serão os portadores. Desde a humilde sala de aula onde a religiosa ensina, até a cátedra onde o padre prega, a Igreja continuará, por eles, a fortificar as almas, a endireitar os corações, a iluminar o mundo. Do claustro silencioso à escuridão do confessionário, a Igreja derramará abundantemente a paz de Cristo sobre as almas, e, em breve, sobre as Cidades. Pois, não duvidemos: o nosso mundo, cada dia mais enredado em sua lógica autodestrutiva, tem sede desta luz, feita ao mesmo tempo de verdade e caridade.

Vá, e reconstrua minha Igreja em ruínas”: assim se dirigiu Cristo crucificado ao jovem Francisco de Assis. Para difundir esta divina luz sobre um mundo mergulhado em trevas, para comunicar a vida de Nosso Senhor às almas, será preciso, portanto, almas dispostas a dar testemunho da verdade[7], quer seja diante do Sumo Sacerdote ou diante de Pilatos. Certamente, a fumaça de Satanás penetrou na Igreja, onde o diabo divisor se traveste de anjo de luz[8]. Contudo, não nos enganemos: os graves desvios doutrinais e morais dos homens da Igreja, em plena derrocada, anunciam, cedo ou tarde, a morte da utopia modernista. 

Uma milícia abrasada

A vitória de Cristo e do Coração Imaculado de Maria passará, portanto, pela irradiação da vida consagrada, vivida plenamente e integralmente, e, portanto, por uma santa milícia de vocações sacerdotais e religiosas, que escolha renunciar a tudo para seguir Nosso Senhor.

A estas testemunhas heroicas e luminosas, será necessário, seguramente, uma grande força de espírito e grandes virtudes: animados por um espírito de fé tão firme quanto profundo, eles deverão ser, ao mesmo tempo, incapazes de comprometimento com o mal e o erro, e repletos de brandura e de caridade.

Estes conquistadores só alcançarão isto na medida em que forem inflamados pelo amor de Cristo, abrasados de zelo e completamente determinados para o bem da Igreja. Dom Lefebvre recordava isto aos seus seminaristas: “Tereis de ser heróis, santos e mártires. Mártires no sentido de testemunho da fé católica. Recriminar-vos-ão de todos os lados, porém, apoiados no exemplo daqueles que deram sua vida e seu sangue por sua fé, apoiados no exemplo da Santíssima Virgem Maria e por seu socorro, cumprireis esta obra para a vossa santificação e a santificação das almas[9].”

É esta nova geração de padres, religiosos e religiosas que é preciso despertar, e sem a qual a Providência carecerá de instrumentos para concretizar a sua obra de salvação. Como alcançar isto? 

Um dom de Deus a ser reivindicado

Sabemos, e a própria palavra indica isto, que a vocação é um dom de Deus. Somente Deus chama: Ninguém se arrogue esta dignidade, é preciso ser chamado por Deus[10]. Somente Deus, com efeito, insufla a graça nas almas, e uma vocação religiosa ou sacerdotal é uma graça muito particular, uma graça de escolha. 

Tal graça, não obstante, deve ser pedida. Tal dom depende da nossa oração. Nosso Senhor no-lo recorda: A messe é grande, mas os operários são poucos. Orai, portanto, ao mestre da messe, a fim que ele envie operários à messe[11]. Quanto mais um dom é insigne, mais a oração deve ser insistente. Assim é com a nossa, em relação às vocações? Receia-se que, por vezes, passamos mais tempo lamentando o mal que implorando a Deus os remédios… Se realmente estamos convencidos de que somente santas vocações restaurarão a Igreja, e, por isso, o mundo, se realmente queremos que a obra da Redenção de Nosso Senhor triunfe novamente em nossa época, então só podemos pedir, sempre com mais insistência e perseverança, santas vocações, multiplicando a nossa súplica.

Como os justos do Antigo Testamento que aspiravam, cheios de ardor, a vinda do Salvador, assim devemos orar ao Céu para que ele envie em nossa época “reflexos do amor de Deus”, “imagens vivas de Cristo”, em outras palavras, novos Franciscos de Assis ou Padres Pio, novas Teresas de Ávila ou Catarinas de Sena, e muitos santos padres para fornecer às almas “a pérola mais preciosa, a saber, as riquezas inesgotáveis do Sangue de Jesus Cristo[12].”

Com toda certeza, este é o pedido mais urgente para o nosso tempo. Sabemos que Deus não abandonará sua Igreja, e que Ele quer dar à nossa época os santos de que ela necessita: Ele só o fará, contudo, na medida em que pedirmos isto com o máximo de insistência e humildade. Eis exatamente a esperança e a oração que queremos levar a Roma por ocasião do Jubileu, e é por isso que escolhemos como tema da nossa peregrinação: “Mitte operarios in messem tuam. Enviai operários à vossa messe[13].”

Uma legião a conceber

Contudo, não queremos confinar tal causa a somente estas horas de oração jubilar. Pelo contrário, gostaríamos que esta preocupação com as vocações habite em nós todos durante os próximos anos: certamente, primeiramente em nossa oração, mas também no zelo que cada um de nós empregará para este fim. Pois todos temos de trabalhar por esta causa: os padres, seguramente, por seu exemplo e entusiasmo sobrenatural. Mas também os pais e as mães de família: pois é do zelo que eles dedicarão no desabrochar e na santificação de seu lar que depende as vocações de amanhã. Tanto é verdade que a família profundamente cristã é, segundo as palavras de Pio XI, “o primeiro jardim, e o mais adaptado, onde devem, como espontaneamente, germinar e desabrochar as vocações[14]”. Nas próximas cartas que vos dirigiremos voltaremos a estas reflexões com mais detalhes.

Não nos enganemos: lançamos aqui uma obra que se estenderá por anos. Outrossim, desejamos colocá-la particularmente sob a proteção de Nossa Senhora das Sete Dores. Desde então, pelo Fiat da Anunciação, seu seio virginal se tornaria a primeira catedral de Deus e instauraria o sacerdócio novo… Depois, ao pé da Cruz, Jesus confiou ao Coração doloroso e imaculado de Maria o sacerdócio de São João, estabelecendo-a como Mãe, através do Apóstolo bem-amado, de todos os padres. Assim, por sua compaixão, nas dores do Calvário, que ela unia intimamente aos sofrimentos de seu divino Filho, Nossa Senhora concebeu a Igreja de ontem, de hoje e de amanhã.

Logo, é a ela que nossas orações insistentes devem ser dirigidas. Imploremo-la com confiança para nos conceder estas vocações das quais tanto precisamos. E, particularmente, recorramos incansavelmente à arma do santo Rosário. Durante todo este ano jubilar, que se abrirá no dia 24 de dezembro e se concluirá no dia 6 de janeiro de 2026, elevemos ao Céu uma súplica contínua de terços fervorosos pelas vocações. Não consideraremos a quantidade, não queremos limitar seu número. Mas contamos com o compromisso de todos e de cada um para consagrar este ano santo à recitação fecunda do rosário. Em particular, contamos com a oração das crianças de nossas famílias e de nossas escolas, assim como com os seus sacrifícios. E pedimos vivamente aos seus professores para implementarem tudo para ajudar estas crianças a se mostrarem generosas.

Então, no dia 20 de agosto do próximo ano, depositaremos solenemente aos pés de Nossa Senhora esta multidão incalculável de terços e sacrifícios, como uma homenagem de reconhecimento e de humilde confiança no poder de sua intercessão materna.

Possamos, assim, sob sua conduta, trabalhar para o desabrochar das santas vocações que prepararão a santidade da Igreja de amanhã.

Desejo-vos a todos, assim como às vossas famílias, uma santa festa de Natal.

Que Deus vos abençoe.

Menzingen, 20 de dezembro de 2024

Don Davide Pagliarani
Superior Geral da FSSPX

[1]Homilia, Écône, 7 de janeiro de 1973.

[2] Enc. Menti Nostrae.

[3] Jo 6, 20.

[4] Jo 8, 12.

[5] Cf. Ep 3, 17.

[6] Rm 8, 38-39.

[7] Jo 18, 37

[8] 2 Co 11, 14.

[9] Homilia, Écône, 21 de maio de 1983.

[10] Heb 5, 4.

[11] Mt 9, 37-38.

[12] Pio XII, Enc. Menti Nostræ.

[13] Missale Romanum, Messe pour demander des vocations sacerdotales.

[14] Enc. Ad. Catholici sacerdotii.