Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est
É inegável que os tempos atuais são, no mínimo, conturbados. A desordem está nas ruas e também na mente das pessoas. Somos civilmente convidados a viver em conformidade com uma ideia precisa de homem e de história sobre a qual devemos construir a sociedade de hoje e a de amanhã. Os critérios de beleza já não são mais aqueles que podiam ser admirados nas construções do passado. A verdade, hoje, já não deve mais continuar a pretender transcender as opiniões individuais e basear-se em regras de bom senso (senso comum). E a bondade não é mais um código moral cuja quintessência foi resumida nos Dez Mandamentos. Esses três critérios já não se aplicam mais à vida social e estão desaparecendo da vida privada. Nos nossos tempos, eles não devem mais orientar os cidadãos em sua busca por uma conduta que esteja de acordo com a natureza da qual Deus é o autor e, menos ainda, dispor de uma busca pela vida sobrenatural da qual Jesus Cristo é modelo e fonte.
“Diante dos nossos olhos, a vida das sociedades lutam contra Deus”
A vida social está organizada de modo que nem o belo, nem o verdadeiro e nem o bom existam mais. O wokismo, o comunitarismo, o feminismo e o anti-especismo desempenham um papel fundamental nisso, com uma grande publicidade por trás. O passado é apagado e a história reescrita. A nossa sociedade vive, deliberadamente, mudanças radicais e muito rápidas. Não há mais heróis para nos inspirar e nem modelos aos quais se referir. Voluntariamente, nossa vida cívica foi reduzida a um grande empreendimento econômico que beneficia os ricos e empobrece os pobres. Ela deixou de ter uma dimensão política verdadeira, orientada para o desejo virtuoso de um bem comum. Não está mais fundamentada na permanência de princípios duradouros. Consiste em um movimento. Os homens sucedem-se, sem apego, como atores de uma vasta fábrica de produtos virtuais.
Diante dos nossos olhos e apesar de nós mesmos, a vida cívica luta contra Deus, que é fonte e fim dos seres. Submeter a religião ao regime econômico que a governa é simplesmente promover um secularismo combativo e totalitário.
Infelizmente, o Concílio Vaticano II estabeleceu como preceito uma perscrutação dos sinais dos tempos e a Igreja Conciliar precipita-se rumo às mesmas loucuras. Romano Amerio, na sua famosa obra Iota Unum, fustigou com razão esse novo cristianismo: “A Igreja parece temer ser rejeitada, tal como ela já positivamente é por uma grande fração da humanidade. Procura, então, descolorir as suas próprias características meritórias e colorir, por outro lado, os traços que tem em comum com o mundo: todas as causas legais apoiadas pelo mundo têm o apoio da Igreja. Ela oferece seus serviços ao mundo e procura assumir a liderança do progresso humano. Dei a essa tendência o nome de cristianismo secundário.”
Diante desse perigo, a firmeza católica sempre foi a salvação e é, particularmente, importante para nós que assim continue. Mas é necessário que tenhamos um ardor invencível em nossos corações, que a fé na santa Igreja nos vivifique sempre, e que sejamos animados pela bela virtude teologal da esperança.
“A torpeza atual é uma provação purificadora”
Neste momento, devemos suportar muitas provações e dificuldades para atravessar esse mundo corrupto: “Nosso Senhor, o qual se deu a si mesmo por nossos pecados, para nos livrar do presente século mau” (Gal. 1, 4). Pois o mundo faz tudo o que está ao seu alcance para nos fazer fracassar: oferece-nos todo tipo de torpeza que nos conduz à queda. Esse mundo decadente nos choca ao mesmo tempo que atrai fortemente a nossa concupiscência. É necessário, portanto, atravessá-lo, porque, como cristãos, esperamos firmemente a ressurreição e a vida eterna. Que graça incrível, hoje, poder já alcançar esta felicidade futura no final de uma vida passageira!
É necessário esperar, mas, sobretudo, ter esperança, “Porque na esperança é que fomos salvos. Ora a esperança que se vê, não é esperança; porque, como esperar aquilo que se vê?” (Rom. 8, 24). Em todas as suas Epístolas, São Paulo exorta-nos a ter esperança na glória futura. Ele convida-nos a esperar pacientemente no decorrer do tempo pela redenção completa e definitiva. “A tribulação? ou a angústia? ou a fome? ou a nudez? ou o perigo? ou a perseguição? ou a espada?” (ibid., 35) não podem deter um cristão. E a força conferida pela esperança teologal consiste, precisamente, em não considerar a torpeza presente como um obstáculo, mas antes, como uma prova purificadora que atesta a nossa firmeza no caminho da felicidade eterna. É por isso que São Paulo chega a dizer: “nos gloriamos nas tribulações, sabendo que a tribulação produz a paciência, a paciência (produz) a prova, e a prova a esperança, e a esperança não traz engano” (Rom. 5, 3-4).
“Mas as coisas loucas segundo o mundo escolheu-as Deus para confundir os sábio” (1 Cor 1, 27). Sabemos, com efeito, que a nossa força está em Jesus Cristo e a nossa luta é uma participação na dEle. Neste mundo mau, a esperança não é apenas um consolo, mas também uma alegria, pois atesta que estamos tecemos, para nós mesmos, uma coroa de glória.
Pe. Benoît de Jorna, FSSPX