Já há séculos que duas cidades entraram em conflito: a cidade de Deus e a cidade de Satanás; a cidade do Bem e a cidade do Mal; uma é a cidade da vida, a outra é a da morte. A luta é terrível, mas sabemos que a cidade de Deus triunfará no final. Nesse meio tempo, vitórias e derrotas se alternam em ambos os lados. E nossa época vive sob o jugo dos inimigos de Deus. Quando recua o reino de Deus, também recua o reino da caridade; ambos são idênticos. O reinado da força bruta está se impondo, e não é bom ser fraco. A cultura da morte que está se espalhando ataca os mais fracos. As crianças, os doentes e os idosos sempre foram objeto da proteção maternal da Igreja. Sem ela, eles estão abandonados aos carrascos. O aborto e a eutanásia são os dogmas do mundo sem Deus. Eles deixam pouca chance de sobrevivência.
Em um artigo de setembro, a Anistia Internacional (uma ONG que promove a defesa dos ditos direitos humanos e faz campanha especificamente para a abolição de todas as leis contra o aborto) publicou a seguinte manchete: “O Brasil pode ser o próximo país a dar um passo à frente na garantia do direito ao aborto”. Na cidade de Satanás, a morte é um progresso e o aborto é um direito; aqueles que se opõem a ele são “atores anti-direitos”. Para os discípulos do Príncipe das Trevas, os direitos humanos tomam o lugar dos direitos de Deus. Para nós, prevalece a lei de Deus: “Não matarás”. Esse preceito se aplica naturalmente aos inocentes. Deus nunca proibiu a autodefesa, seja ela pessoal ou pública (guerra e pena de morte). O essencial é exercê-la com justiça e prudência. O inocente pode até ser sacrificado indiretamente. Um piloto de guerra pode destruir uma ponte mesmo que haja pessoas inocentes nela. Uma mulher grávida pode salvar sua vida tomando um medicamento que terá o efeito colateral de matar seu filho. Esses casos específicos são autorizados somente se o efeito principal for bom, se o efeito ruim for secundário e indireto, e não for a intenção principal da pessoa que o causou. Por outro lado, matar diretamente uma pessoa inocente é sempre gravemente ilícito. Por exemplo, não se pode matar diretamente uma criança para salvar sua mãe. Se pode optar por salvar um ou outro. Nenhum dos dois pode ser morto diretamente.
Desde o momento da concepção até o nascimento, é inegável que a vida que reside no útero de uma mulher é vida humana. Essa vida humana é inocente. Não é apenas inocente, é indefesa. Essas características tornam possível afirmar, sem sombra de dúvida, que o aborto é um odioso assassinato.
O demônio odeia o homem em quem vê a imagem de Deus. Ele odeia o homem que pode ter acesso à felicidade do Céu que ele mesmo perdeu definitivamente. Ele odeia particularmente a criança, cuja inocência reflete mais perfeitamente a imagem de Deus.
A música satânica promove o vício e o suicídio. Geralmente, seus seguidores se afundam em uma vida sombria que termina em suicídio direto ou indireto (o resultado de sua vida dissoluta). Essa é a vitória de Lúcifer, o anjo destruidor.
O mesmo processo de autodestruição é realizado em nível coletivo e social por meio do aborto. Deixando a religião de lado, entendemos a importância de renovar uma população para que ela sobreviva. Os contraexemplos do Japão, da China e da Europa nos mostram como a queda da taxa de natalidade representa sérios perigos para a sociedade.
Algumas pessoas afirmam que somos demais no planeta. Então, por que elas não dão o exemplo? Isso é interessante: para elas, são sempre os outros que são demais!
A verdade é que a maioria dos abortos é resultado de um modo de vida pecaminoso e egoísta, principalmente nas camadas sociais mais abastadas. Entre os mais pobres, a miséria pode levar a uma decisão trágica. Mas a solução não é a morte. A solução é o reinado de Nosso Senhor Jesus Cristo nas almas, nas famílias e na sociedade como um todo. Sua doutrina e sua moral evitarão muitas situações indesejadas. E, no restante, permitirão que cada caso seja tratado com uma assistência generosa ditada pela justiça e pela caridade. Dessa forma, o pecado será uma oportunidade para a salvação e não para uma iniquidade maior.
Os milhões de abortos realizados em todo o mundo todos os anos são, portanto, os sacrifícios humanos de um culto verdadeiramente satânico. O aborto é um pilar da cidade de Satanás. É por isso que ele continua sendo um ponto essencial de combate entre as duas cidades.
O Brasil só autoriza o aborto em casos de estupro, feto com anencefalia ou perigo para a vida da mulher. O mesmo artigo de Anistia Internacional nos diz que a “Onda Verde” é “um movimento feminista e de direitos humanos que vem lutando há vários anos pela legalização do aborto em toda a América Latina”. No Brasil, esse tipo de movimento quer despenalizar o aborto até a 12ª semana de gravidez. As duas cidades entram em conflito. O recente filme Sound of Freedom nos lembra que o tráfico de crianças é a rede criminosa que mais cresce no mundo. Ele ultrapassou o tráfico de armas e, em breve, poderá ultrapassar o tráfico de drogas. Aterrorizante, mas não surpreendente. Se Deus não é respeitado, por que seus filhos deveriam ser?
Ao vir à Terra por meio do processo de nascimento, o Divino Salvador nos ensina o respeito pelas leis naturais desejadas por Deus e a importância da infância na estruturação de um ser e da sociedade em que ele nasce. Portanto, busquemos aumentar a nossa devoção ao Menino Jesus. Ela é um aspecto essencial da luta pela vida, tanto espiritual quanto natural.
Durante o Advento, ofereçamos nossos esforços em espírito de reparação para afastar os castigos causados pelo terrível pecado do aborto.
Os Padres do priorado desejam-lhes um santo e feliz Natal!
Pe. Jean-François Mouroux, Prior