PACIÊNCIA E IMPACIÊNCIA – PARTE 21 – TERCEIRO FRUTO DA PACIÊNCIA: A ALEGRIA

an angel statue next to a stone column

Fonte: Bulletin Hostia (SSPX Great Britain & Ireland) – Tradução: Dominus Est

Como se estivéssemos triste, mas sempre alegres.” (2 Cor 6, 10).

Essa é a descrição que São Paulo faz dos ministros de Cristo, que trabalham pela salvação das almas. O que é verdade para eles é verdade para todos os servos fiéis a Deus. Na superfície, aparente miséria, mas nas profundezas da alma, intensa alegria. Desta alegria diz São Paulo: “Estou cheio de consolação, estou inundado de alegria no meio de todas as nossas tribulações”. (2 Cor 7, 4). O que faz esse encanto funcionar? Paciência. Uma resistência paciente, uma humilde submissão à vontade de Deus, uma resignação à Sua providência.

Como é possível que da tristeza surja a alegria? A razão é que se vivermos para Deus e na dependência Dele, e buscarmos promover a Sua glória, então, embora na ordem natural possamos ser esmagados pela dor e pelo sofrimento, estaremos cheios de alegria por causa da alegria sobrenatural que Deus nos concede. “A vossa alegria”, diz nosso Senhor aos Seus apóstolos, “ninguém vo-la tirará”. (Jo 16, 22). Tenho alguma experiência dessa alegria? Se assim for, agradecerei a Deus por isso; caso contrário, devo esperar pacientemente e ver se não há algum impedimento de minha parte para tal.

De onde vem essa alegria? Do céu. É por isso que supera todas as alegrias terrenas e torna doces os sofrimentos terrenos. É o primeiro tênue reflexo da luz do Céu em meio às nuvens e à escuridão da Terra; a primeira amostra da alegria com a qual os justos serão acolhidos pelo seu Senhor na porta do Céu. Se uma gota dela na Terra adoça toda amargura e torna leves todos os sofrimentos, qual deve ser a intensidade da alegria que inebriará todos aqueles que aqui suportaram tribulações e sofrimentos por causa de Cristo?

E O CARDEAL INVENTOU UMA BÊNÇÃO PASTORAL, BREVE E ESPONTÂNEA…

Assim que o Cardeal Victor Manuel Fernández, novo Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, chegou ao seu escritório, ele se perguntou como conseguiria fazer acreditar que os casais não casados ​​e os pares do mesmo sexo poderiam, agora, ser abençoados, sem colocar em questão a doutrina e a moralidade católicas sobre o casamento.

Fonte: DICI – Tradução: Dominus Est

Tal era o seu dilema: como abençoar os pares homossexuais sem dar a impressão de estar abençoando a homossexualidade (em si)? Então ele inventou uma nova bênção que não é nem litúrgica nem ritual, mas pastoral e “espontânea”. E essa foi a Declaração Fiducia supplicans de 18 de dezembro de 2023, assinada por ele e referendada pelo Papa Francisco.

Em resumo, ele criou uma bênção informal para casais irregulares, algo sem precedentes, pretensamente justificado por uma doutrina distorcida e uma moralidade deformada.

Essa bênção pretende ser espontânea, portanto, não se expressa em uma fórmula ritual, considerada rígida demais. No entanto, o Cardeal Fernández teve o cuidado de apresentar um modelo ad hoc, em um esclarecimento datado de 29 de dezembro.

Nada como uma espontaneidade supervisionada! E ele chega ao ponto de indicar a duração desta bênção: não mais que 10 a 15 segundos, com o relógio na mão! Nada como a espontaneidade cronometrada! Continuar lendo

PROGRESSISMO E CONSERVADORISMO: HISTÓRIA DA DISSOLUÇÃO DO HOMEM NO MUNDO E NA IGREJA NOS ÚLTIMOS 100 ANOS

O politicamente correto, esse desconhecido

Fonte: Sì Sì No No, ano XXXV, n. 14 – Tradução: Dominus Est

Esquema introdutório

• Antonio Gramsci (1891-1937) trabalhou na expansão do pensamento revolucionário da década de 1920 até o final da década de 1930. Seu estudo tinha como objetivo fazer com que a filosofia do materialismo dialético marxista fosse aceita intelectualmente por meio de manipulação mental (“entrismo”) e não pela força. Gramsci queria uma “revolução cultural”, ou seja, adquirir a hegemonia, o consenso e a direção da sociedade civil-cultural europeia (penetrando na escola, na imprensa, nas publicações, no judiciário e na mídia de massa). Só então se poderia pensar em ocupar o poder, o governo e o domínio do Estado. Gramsci é o progenitor de todas as correntes revolucionárias (Escola de Frankfurt, Estruturalismo francês) que tentarão, depois dele, trabalhar a revolta dentro do homem individual e não apenas na sociedade.

• Um autor que buscará revolucionar a Europa também religiosamente (e não só culturalmente como Gramsci) é Ernst Bloch (1885-1977), filósofo alemão de origem judaica, que na década de 1960 trabalhou para converter os católicos à dialética social-comunista por meio do diálogo, opondo à religião tradicional ou dogmática (tese) uma religião progressista (antítese), a fim de alcançar um messianismo terreno e imanentista ou “socialismo-cristão” (síntese). Infelizmente, sua estratégia foi bem-sucedida com o Concílio Vaticano II, que se propôs a dialogar com o mundo sem mais querer convertê-lo.

• Dos anos 1920-1930 até os anos 1960, a “Escola de Frankfurt” (Adorno-Marcuse), por meio de drogas, psicanálise, pansexualismo, moda e música pop, tentou revolucionar e aniquilar (a partir da Alemanha e dos EUA) o próprio homem nos aspectos mais profundos de sua alma e personalidade[1] (inclinações, intelecto e vontade) e não mais apenas a sociedade cultural (Gramsci) ou religiosa (Bloch). Continuar lendo

A ACÉDIA

Mas, do que se trata? Por que falar sobre isso?

Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est

A acédia é uma forma de tristeza avassaladora que produz, no espírito humano, um profundo desânimo, uma verdadeira desolação da alma. É uma “depressão”, na qual qualquer forma de entusiasmo, de desejo genuíno, são transformadas e concentradas em um único desejo: o de não fazer mais nada, de cessar a luta.

Santo Tomás de Aquino define-a como “um torpor do espírito que não consegue empreender o bem”. Em última análise, é uma tendência que mergulha a alma em um grande cansaço, dando-lhe aversão aos exercícios espirituais e ao devido respeito pelas exigências da religião. Portanto, ela afeta, de modo particular, o exercício da nossa vida cristã.

Devemos estar atentos porque esse defeito, porque é efetivamente um defeito, é um mal que pode acarretar sérias consequências se não for combatido. É por isso que é necessário falar sobre isso.

São Gregório afirma: “Ninguém pode permanecer muito tempo sem prazer, em companhia da tristeza”. O mesmo acontece com a natureza humana e vemos que uma pessoa triste terá, obviamente, uma tendência a se afastar daquilo que lhe está causando dor e a se voltar para outras atividades nas quais espera encontrar prazer e alegria. Continuar lendo

AS RAÍZES PURITANAS DO ESPÍRITO AMERICANISTA

Bernard Gribble: Mayflower

Fonte: Sì Sì No No, ano XXXIV, n. 15 – Tradução: Dominus Est

Protestantismo moderado e protestantismo radical

havíamos dito que, para poder considerar a civilização americana e europeia como um unicum, os “neoconservadores” fazem silêncio sobre a profunda ruptura marcada na história da Europa pelo protestantismo, no qual o espírito americanista tem suas “raízes”.

No século XVI, a cristandade europeia passou por uma grave crise com o protestantismo, que rompeu sua unidade político-religiosa sob o papado romano e o Sacro Império Romano-Germânico. A Igreja Romana conhecia as heresias desde seu nascimento, mas havia triunfado sobre elas. A virada herética de Martinho Lutero (†1546), por outro lado, não pôde ser detida e se estabeleceu no norte da Europa (especialmente na Alemanha), onde os hereges se tornaram a maioria, organizados em igrejas autônomas oficialmente apoiadas pelos príncipes alemães. Todo o norte da Europa foi subtraído do papado. O protestantismo, com efeito, rejeita a Igreja de Roma (seu Credo, Sacramentos e Lei) e o papado, negando as origens apostólicas e petrinas da Esposa de Cristo.

Os Países Baixos[1] e os países escandinavos (Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia) seguiram e até ultrapassaram a Alemanha, acusando Lutero de excessiva moderação. Na Alemanha, entretanto, o extremismo já havia tido suas manifestações na forma do movimento dos camponeses (anabatismo, que considerava o batismo válido apenas para adultos). Essas correntes levariam o luteranismo ao extremo, chegando até à negação da Santíssima Trindade e da divindade de Jesus Cristo. Na Suíça, João Calvino (†1564) exasperou a doutrina predestinacionista luterana e apontou o sucesso terreno e mundano como sinal da eleição divina. Na Inglaterra, o calvinismo foi chamado de puritanismo, porque queria “limpar” a igreja nacional anglicana de qualquer resíduo de papismo; ele desempenhou um papel importante no nascimento da América e no espírito americanista, principalmente por meio de seus dois pilares principais: sucesso econômico mundano e antitrinitarismo. Continuar lendo

BOLETIM DO PRIORADO PADRE ANCHIETA (SÃO PAULO/SP) E MENSAGEM DO PRIOR – FEVEREIRO/24

Editora Permanência - Pré-Venda Missal Quotidiano Latim-Português.

Alguns anos atrás, um jovem estava caminhando pela rua que desce à capela São Pio X, em São Paulo. Era noite. Três homens o pararam, um deles armado. O jovem entregou todos os seus pertences: dinheiro, celular, mochila, etc, mas pediu para ficar com um objeto em particular. “O que é isso?”, perguntou o ladrão. “Meu missal!” “Para onde você está indo?” “Para a Missa do Galo”. Então, o ladrão lhe devolveu tudo e eles se cumprimentaram com um abraço, desejando um feliz Natal um ao outro.

Caros fiéis, seu missal pode salvá-lo de ladrões.

Mas essa não é sua principal utilidade.

A Sagrada Escritura, na primeira epístola de São Pedro (1 Pe 2,5 e 9-10) e no Apocalipse (Ap 5, 9-10), fala de um sacerdócio comum a todos os membros da Igreja. Os Padres da Igreja se expressam da mesma forma. Na encíclica Mediator Dei, Pio XII diz que, na liturgia, os fiéis oferecem o sacrifício da Missa com o celebrante.

Deve-se ressaltar que a Sagrada Escritura fala de um sacerdócio dos fiéis em um sentido metafórico. Além disso, a Mediator Dei nunca usa a expressão “sacerdócio” para significar essa atividade dos fiéis e evita se referir aos simplesmente batizados como “sacerdotes”. Pio XII disse mais tarde que, embora possamos falar de um certo “sacerdócio” dos fiéis, essa expressão é equivalente a um título meramente honorífico e que há uma diferença essencial entre a realidade desse sacerdócio íntimo e secreto (espiritual) e o sacerdócio verdadeiramente e propriamente dito. Continuar lendo

(NEO)CONSERVADORISMO – UMA IDEOLOGIA ATEU-REVOLUCIONÁRIA CAPAZ DE SEDUZIR OS CATÓLICOS

Leo Strauss [ crédito: http://leostrausscenter.uchicago.edu/ ] ORG XMIT: 354301_0.tif Retrato de Martinho Lutero (1483-1546) feito pelo artísta plástico Lucas Cranach. (Reprodução)

Fonte: Sì Sì No No, ano XXXIII, n. 19 – Tradução: Dominus Est

“Choque de civilizações” e neoconservadorismo

Na sequência dos acontecimentos internacionais deste início de milênio, uma corrente de pensamento chamou a atenção da opinião pública: o chamado “neoconservadorismo”, cujos principais intelectuais são os criadores diretos e indiretos das estratégias políticas e econômicas dos EUA.

No entanto, apesar do nome que foi dado a esse círculo intelectual, trata-se de uma escola de pensamento que carrega uma ideologia “ateu-messiânica” e um programa político “revolucionário-conservador” que hoje tenta e engana a muitos católicos.

O início do terrorismo islâmico-fundamentalista provocou um clamor no contexto católico tradicionalista – ou pelo menos conservador (os dois campos não coincidem perfeitamente) – em defesa de um “Ocidente” confundido com sua Cristandade perdida, ou com o que dele restaria e seria, portanto, digno de defesa a todo custo na perspectiva do iminente “choque de civilizações” de Samuel Huntington.

O que não foi compreendido por parte desses setores do catolicismo tradicionalista ou conservador é a falta de fundamento da tese huntingtoniana, segundo a qual, entre as diferentes civilizações que atualmente se confrontam no cenário mundial, a “euro-americana” constitui um “unicum” ou seja, a “civilização ocidental”. Na realidade, se devemos falar de um confronto, estamos, como veremos, diante de um confronto que é inteiramente interno ao chamado “mundo ocidental”. Trata-se do choque entre “a religião do Deus que se fez Homem e a religião do homem que pretende tornar-se Deus”. Com efeito, de um ponto de vista coerentemente católico, a passagem dos séculos, que desde a cristandade medieval nos levou através do interlúdio da Europa cristã dos séculos XVI-XVII até ao Ocidente global de hoje, não pode ser lida ignorando a grande ruptura protestante, que é a verdadeira raiz do Ocidente americanocêntrico. Continuar lendo

FIDUCIA SUPPLICANS – CONFERÊNCIA DO SUPERIOR DA FSSPX

Conferência de D. Davide Pagliarani, Superior Geral da Fraternidade São Pio. no XVII Congresso Teológico do Courrier de Rome, em Paris, 13 de janeiro de 2024.

FIDUCIA SUPPLICANS: A IGREJA SINODAL À ESCUTA DO MUNDO, PORÉM SURDA À PALAVRA DE DEUS

Fonte: FSSPX

Cabe a nós apresentar uma síntese, e expressar a posição da Fraternidade diante de todas as realidades que vêm sendo promovidas pela “Igreja sinodal”.

Tentemos, antes de mais, pôr em ordem esses diferentes elementos, em particular no que diz respeito ao recente documento, Fiducia Supplicans, que já fez correr rios de tinta. É preciso situarmos corretamente esse acontecimento. Por que se chegou a tal ponto, e que é que isso significa? O papel da Fraternidade não se pode limitar a uma reação imediata, instintiva: devemos aprofundar tanto quanto possível nossa compreensão do que está em jogo nesse texto. Se faltar profundidade à nossa análise, correremos o risco de incorrer nas falhas dos que querem reduzir a questão de Fiducia Supplicans a uma excentricidade pessoal do papa Francisco, cuja extravagância não se chega a entender.

Já outras reações a Fiducia supplicans reduzem a questão das bênçãos a uma mera questão de oportunidade: a iniciativa seria inoportuna em certos contextos culturais, sobretudo na África. A realidade, porém, é um pouco mais complexa… Todas essas reações são bem-vindas, são positivas na medida em que manifestam ainda certa capacidade de reação; porém a Fraternidade tem a obrigação de ir mais fundo. Tratemos, pois, de dar um passo atrás, saindo do círculo da agitação midiática.

I – Um pontificado que atende às expectativas do mundo moderno

Fiducia Supplicans não é, em sentido estrito, um ato sinodal, mas um ato produzido pelo Dicastério para a Doutrina da Fé e assinado pelo próprio papa. Trata-se, contudo, de um documento que corresponde àquilo que mais de uma vez vinha sendo ventilado, quando da preparação do sínodo. Pode-se, portanto, afirmar que constitui uma resposta a uma expectativa atual e sinodal.

Essa “Igreja sinodal”, que estamos tentando definir, é uma Igreja que escuta todos os homens: as periferias, a base, todo o mundo, no sentido mais amplo do termo… Uma Igreja que escuta “o mundo” enquanto tal. Ou seja, uma Igreja que dá mostras de uma nova sensibilidade e uma vontade nova de ir ao encontro do mundo.

Sem dúvida, o pontificado atual atende, cada vez mais perfeitamente, às expectativas e exigências do mundo contemporâneo, e, mais precisamente, do mundo “político”, no sentido profundo do termo. Com efeito, de um lado, esse pontificado corresponde a uma visão política hoje predominante em todo o globo, de outro, busca também adaptar-se aos métodos de uma política desejosa de criar uma nova organização social e que, força é reconhecê-lo, em grande medida já triunfou. Cabe aqui a pergunta: por que a presença de representantes da Igreja é tão importante nessa reorganização do mundo? Continuar lendo

JUVENTUDE E VIOLÊNCIA

O que é Black Bloc? | Jusbrasil

Fonte: Permanencia

“Os Jovens de agora são assim: pensam isto, querem aquilo” — é o que se ouve dizer em toda parte. Pois eu confesso que desconfio “a priori” desses mitos da juventude. Primeiro, por causa de sua excessiva simplificação: eles, na verdade, não se aplicam mais que a certa parcela da juventude, cuja importância é impossível avaliar. Segundo, porque são elaborados, a maior parte das vezes, por adultos ou velhos que lançam sobre os “caçulas” a luz de suas esperanças ou a sombra de seus rancores.

A Juventude com um J maiúsculo não me impressiona mais que o Progresso com P grande. Mas que espécie de progresso e que jovens? Pois, graças aos céus e malgrado a influência crescente dos “mass-media” que tendem a substituir pelo protótipo mecânico o arquétipo ideal, a natureza que “se compraz na diversidade” não moldou todos os jovens na mesma forma. Um “fã” de Johnny Halliday e o autor da carta a André Maurois divulgada recentemente nas “Nouvelles Littéraires” nasceram na mesma época mas parecem não pertencer à mesma espécie. E entre esses dois extremos todos os intermediários são possíveis.

A DOMINANTE DE NOSSA ÉPOCA: A REVOLTA

Existem, nas idéias e nos costumes, dominantes que são peculiares a cada época — como, por exemplo, a libertinagem durante a Regência, o culto da Razão no tempo do humanismo, a apologia da sensibilidade e do irracional no século do romantismo etc. Ora, uma das dominantes de nossa época é a revolta, em todos os domínios, contra os valores tradicionais; revolta que se traduz pela exaltação e prática da violência.

Esse fenômeno se observa em todas as ordens do humano e do social.
Continuar lendo

O MUNDO CAMINHA PARA A SUA RUÍNA. O QUE DEVEMOS FAZER?

Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est

É inegável que os tempos atuais são, no mínimo, conturbados. A desordem está nas ruas e também na mente das pessoas. Somos civilmente convidados a viver em conformidade com uma ideia precisa de homem e de história sobre a qual devemos construir a sociedade de hoje e a de amanhã. Os critérios de beleza já não são mais aqueles que podiam ser admirados nas construções do passado. A verdade, hoje, já não deve mais continuar a pretender transcender as opiniões individuais e basear-se em regras de bom senso (senso comum). E a bondade não é mais um código moral cuja quintessência foi resumida nos Dez Mandamentos. Esses três critérios já não se aplicam mais à vida social e estão desaparecendo da vida privada. Nos nossos tempos, eles não devem mais orientar os cidadãos em sua busca por uma conduta que esteja de acordo com a natureza da qual Deus é o autor e, menos ainda, dispor de uma busca pela vida sobrenatural da qual Jesus Cristo é modelo e fonte. 

“Diante dos nossos olhos, a vida das sociedades lutam contra Deus”

A vida social está organizada de modo que nem o belo, nem o verdadeiro e nem o bom existam mais. O wokismo, o comunitarismo, o feminismo e o anti-especismo desempenham um papel fundamental nisso, com uma grande publicidade por trás. O passado é apagado e a história reescrita. A nossa sociedade vive, deliberadamente, mudanças radicais e muito rápidas. Não há mais heróis para nos inspirar e nem modelos aos quais se referir. Voluntariamente, nossa vida cívica foi reduzida a um grande empreendimento econômico que beneficia os ricos e empobrece os pobres. Ela deixou de ter uma dimensão política verdadeira, orientada para o desejo virtuoso de um bem comum. Não está mais fundamentada na permanência de princípios duradouros. Consiste em um movimento. Os homens sucedem-se, sem apego, como atores de uma vasta fábrica de produtos virtuais. 

Diante dos nossos olhos e apesar de nós mesmos, a vida cívica luta contra Deus, que é fonte e fim dos seres. Submeter a religião ao regime econômico que a governa é simplesmente promover um secularismo combativo e totalitário. Continuar lendo

A JUSTA MEDIDA DE D. LEFEBVRE

Teria D. Lefebvre sido menos comedido que Jean Madiran, a quem o Pe. de Blignières prestou homenagem em um artigo no periódico L’Homme nouveau de 22 de dezembro de 2023, ao comparar a missa nova com a “missa de Lutero”?

Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est

A coluna “Tribune libre” do periódico L’Homme nouveau – felizmente dirigido por Philippe Maxence – publicou, em sua página na internet, no dia 22 de dezembro de 2023, uma homenagem a Jean Madiran. A homenagem se aproveitou da recente publicação de uma biografia dedicada ao falecido editor do periódico Présent, escrita por Yves Chiron, um historiador bem conhecido no meio tradicional católico. E a homenagem da coluna é assinada pelo Revmo. Pe. de Blignières, fundador da Fraternidade São Vicente Ferrer.

No espírito da Antiguidade grega, que ele tanto amava”, diz-nos o padre dominicano, Jean Madiran, “evitava aquele excesso tão difícil de se evitar em tempos de crise. Por exemplo, ele apontou claramente as deficiências da missa nova, mas nunca a descreveu como ‘a Missa de Lutero’”.

D. Lefebvre chegou ao ponto de fazer uma comparação entre a missa evangélica de Lutero e o Novus Ordo Missae de Paulo VI, sem todavia qualificar esta como sendo aquela. A referida comparação foi claramente estabelecida numa conferência histórica proferida em Florença, em 15 de fevereiro de 1975. O título dado ao texto dessa conferência, publicada juntamente com outra sobre a Missa e o sacerdócio católico, pelas Edições Saint-Gabriel em Martigny, na Suíça, poderia, no entanto, sugerir que o nome recusado por Madiran tenha sido adotado por D. Lefebvre. Mas o texto da conferência não faz qualquer menção a essa afirmação. Tampouco o título, que simplesmente designa o conteúdo principal da conferência, que é a missa evangélica de Lutero comparada ao Novus Ordo de Paulo VI. Continuar lendo

BELEZA FEMININA E MODÉSTIA – PARTE 2/2

Esta é a segunda parte de um sermão proferido pelo Pe. Louis Pieronne, FSSPX. O tema específico dessa parte é beleza e adoração. A Primeira Parte pode ser lida clicando aqui.

Fonte: SSPX USA  Tradução: Dominus Est

A riqueza perdida da civilização cristã

A perda dos princípios foi o que provocou a perda dos costumes que os incorporavam. Os costumes podem evoluir e ainda assim expressar as mesmas coisas. O Cristianismo expressou-se de forma diferente no Oriente e no Ocidente. O que preocupa não é a evolução dos costumes, mas a mudança nos princípios que os inspiram. Estamos perdendo os costumes cristãos, e um espírito ateu e materialista está entrando no vazio deixado por eles. Os costumes cristãos nascem do espírito de fé. É de fé vivida. O desaparecimento da moral e dos costumes cristãos equivale ao fato da fé não ser mais vivida. Significa que nossa fé é frágil e está em risco. Devemos apegar-nos firmemente a um estilo de vida cristão: não como uma moda, mas como um espírito que anima os detalhes do quotidiano. O costume dá vida a um princípio e o transmite. É um instrumento e pode ser mudado. Podemos mudar os costumes, mas não os princípios, nem um espírito, porque não mudamos a fé.

Viver o Plano de Deus

Acreditamos que a diversidade da criação é um reflexo das riquezas superabundantes de Deus. Quando Deus se dá na Trindade, Ele se dá perfeitamente e cada pessoa possui todas as qualidades divinas. As três Pessoas são absolutamente iguais. Quando Deus cria, Ele concede um ser limitado, uma medida de qualidades, compartilhadas para a harmonia do todo. As criaturas são desiguais para serem harmoniosas em sua imperfeição. Quanto mais há desigualdade e diversidade, mais qualidades são expressas, e assim o reflexo de Deus se torna ainda mais perfeito.

Deus coloca o reflexo de Suas qualidades mais nobres em Suas criaturas espirituais. Dizem que cada anjo tem uma natureza diferente. O homem também tem um lugar muito especial nesse reflexo de Deus. O Gênesis nos diz que Deus criou o homem à Sua imagem e semelhança. Deus faz da humanidade uma vasta multidão, para que cada indivíduo seja único e a sua vida possa enriquecer a harmonia da criação, expressando um aspecto único dessa mesma natureza humana à imagem de Deus. Continuar lendo

BELEZA FEMININA E MODÉSTIA – PARTE 1/2

Esta é a primeira parte de um sermão proferido pelo Pe. Louis Pieronne, FSSPX. O tema específico desta parte é beleza e modéstia. 

Fonte: SSPX USA – Tradução: Dominus Est

A miséria do homem

Ao falar de modéstia, nossas imperfeitas palavras podem, às vezes, levar a mal-entendidos. É fato que o pecado vem do coração do homem e não do corpo da mulher. É o coração ferido pelo pecado original e sujeito à concupiscência. O corpo feminino é uma obra de Deus, uma maravilha cuja grande dignidade é ser templo da vida. É o lugar onde todos fomos concebidos e carregados. É o lugar onde todos nós recebemos vida. Nunca poderemos ter respeito suficiente pelo corpo da mulher, onde ocorre um mistério tão grande. Não é este corpo que está contaminado, mas a reação da qual ele pode ser o objeto e a ocasião.

Por que, então, pedimos modéstia à mulher? Se este corpo é bom, por que ela o esconderia? Porquê dar-lhe a falsa impressão de ser uma fonte de corrupção, acusando-a de manchar os outros? Para compreender a situação da natureza decaída e as suas exigências, devemos considerar o plano de Deus.

O Plano de Deus

Deus semeia reflexos de Suas próprias perfeições ao longo de Sua obra, distribuindo entre Suas criaturas todas as qualidades que, de alguma forma, revelam Sua majestade. Há uma qualidade que o homem nunca disputou com a mulher – por mais inclinado que seja a ostentar a sua superioridade em todos os domínios – e essa qualidade é a beleza. Deus deu a beleza à mulher como sua prerrogativa e, como a beleza foi feita para ser contemplada, ela foi ao mesmo tempo um presente para o homem. Esta beleza foi o toque final de Deus na harmonia da criação, levando-a à perfeição. Continuar lendo

PACIÊNCIA E IMPACIÊNCIA – PARTE 20 – SEGUNDO FRUTO DA PACIÊNCIA: A ESPERANÇA

Apóstolo Saint Paul Tinta de Paris - Ilustração de Apóstolo royalty-free

Fonte: Bulletin Hostia (SSPX Great Britain & Ireland) – Tradução: Dominus Est

A paciência”, diz São Paulo, “(produz) a prova, e a prova a paciência”. (Rom 5, 4).

Se aceitarmos humildemente os sofrimentos que Deus nos envia, sem nos rebelarmos ou reclamarmos, então colheremos a recompensa no rápido crescimento da esperança dentro do nosso coração. Através da escuridão, avistamos uma luz brilhante ao longe e, embora nosso caminho seja sombrio e doloroso, essa perspectiva nos anima e nos faz prosseguir alegremente.

No início do período de provação, a esperança era fraca e tênue, mas quando nos provamos servos fiéis, a esperança começa a antecipar o futuro e a encher-nos de uma felicidade que torna os sofrimentos atuais comparativamente leves. Alcancei esse estado feliz? Unida a esta perspectiva de futuro está uma grande confiança em Deus no presente. A confiança faz parte da esperança. Quando aprendemos, com paciência, a confiar Nele em meio às tristezas, às tribulações e decepções, temos então uma base sólida para confiar Nele pelo resto de nossas vidas, não apenas com uma espécie de segurança cega de que tudo o que Ele faz é o melhor, mas com a consciência dos resultados felizes que virão de tudo o que a paciência nos faz suportar.

Resultados também, que começamos a experimentar mesmo aqui. Devo, então, almejar esta confiança e orar para que eu possa conquistá-la com paciência. São Paulo diz-nos que se esperamos aquilo que não vemos, temos que esperar por isso, pois a obra perfeita da paciência é esperar com satisfação o momento em que Deus nos dará as coisas boas que nos prometeu. Este era o estado de espírito do Apóstolo quando disse: “Combati o bom combate, guardei a fé, e, de resto, está-me reservada a coroa da justiça”. (2 Tim 4,7). Assim também, para mim, se perseverar até o fim, uma coroa semelhante estará guardada. A idéia dela me animará a ter mais paciência.

HÁ IMPERFEIÇÕES NA MÃE DE DEUS?

Maria Santíssima, modelo de oração - Arsenal Católico

Foi ninguém menos que um Doutor Católico, um Padre da Igreja, que identificou alguns fatos que atribuiu à Santíssima Virgem como imperfeições, durante o encontro do Menino Jesus no Templo e, também, nas Bodas de Caná. Trata-se de São João Crisóstomo.

Fonte: Permanencia

Em sentido contrário, deve-se dizer que a Santíssima Virgem nunca cometeu a menor imperfeição. As razões explicando isso são inúmeras.

Primeiro, porque a Mãe de Deus não tinha a “fonte do pecado” – também chamada de concupiscência – que é uma das causas principais das imperfeições. Essa ausência está ligada à sua imunidade ao pecado original.

Além disso, a virgem das virgens possuía a virtude perfeita em razão da graça que lhe havia sido dada. Ela também estava destinada a ser um modelo de santidade, porque Nossa Senhora é a primeira dos redimidos: é conveniente que seja ela, que tem o primado na ordem da santidade, deveria incorporá-la em sua perfeição consumada

Finalmente, sua perfeita prudência sempre determinou sua atividade na maneira que estava mais conformada à vontade de Deus. Continuar lendo

NÃO COLOQUE SUAS ORAÇÕES DE FÉRIAS

ferias

Com as férias, às vezes é difícil cumprir os horários, e a vida de oração pode ser prejudicada.

Fonte: Lou Pescadou n° 201  – Tradução: Dominus Est

Quando estávamos no primeiro ano do seminário, e as férias em família se aproximavam, nossos professores nos advertiam: as férias são um bom teste para mensurar o fervor. Longe da vida comunitária, sem parte dos serviços em comum, pode ser difícil manter uma vida de oração tão fervorosa como no seminário. Esta observação também pode ser feita a vocês, queridos fiéis. Com as férias, às vezes é difícil cumprir os horários, e a vida de oração pode ser prejudicada. Assim, para ajudá-lo a não colocar a oração de férias, gostaríamos de relembrar algumas verdades sobre essa “elevação de nossa alma a Deus”.

A primeira coisa a se convencer é que a oração é necessária. Em outras palavras: não pode não ser. É a respiração da alma. Respiramos para nos mantermos vivos. Rezamos para permanecermos unidos ao Autor da Vida. Entrentanto, uma objeção pode surgir na cabeça das pessoas: mas por que rezar, falar com Deus, fazer pedidos a Ele, já que Ele conhece tudo? O catecismo do Concílio de Trento responde. Ele diz que não somos animais sem razão, e que Deus não é uma abstração, um ser imaginário. É uma Pessoa, é nosso Pai. Portanto, é normal que seus filhos conversem com Ele. É claro que Deus poderia nos atender sem nenhum pedido, sem nenhuma oração. Mas se obtivéssemos tudo sem pedir, acabaríamos nos esquecendo do Deus para o qual fomos feitos. É por isso que Nosso Senhor Jesus Cristo diz: Devemos sempre orar (Lc 18, 1). E acrescenta um argumento decisivo, o da nossa fraqueza: Sem mim nada podeis fazer (Jo 15,5); vigiai e orai para não cairdes em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca (Mt 26,41).

O Papa Pio XII, em um discurso aos pregadores da Quaresma, disse em 1943: Ninguém pode, sem oração, guardar a lei divina por muito tempo e evitar uma falta grave. Porque a oração, diz o teólogo Garrigou-Lagrange, é o meio normal, universal e eficaz pelo qual Deus deseja que obtenhamos todas as graças atuais de que necessitamos. Lembremos que essas graças atuais são ajudas temporárias de Deus, para fazer o bem e evitar o mal. Continuar lendo

OS REIS MAGOS, MESTRES DA VIDA ESPIRITUAL

Assim como eles, sigamos a estrela da nossa fé. 

Se a perdermos de vista, mantenhamos sempre o mesmo caminho.

Fonte: La lettre de saint Florent n° 301 – Tradução: Dominus Est

A chegada dos Magos ao presépio (Mt 2,1-12) inspirou numerosos pregadores. Em um sermão sobre a Epifania, o jesuíta Louis Bourdaloue (1632-1704) evoca a verdadeira sabedoria “que consiste em procurar e encontrar Deus”. No início, no progresso e no aperfeiçoamento de sua fé, os Magos encorajam-nos a acolher a graça e a perseverar, deixando-nos guiar pela sabedoria divina.

Responder ao chamado da graça

O Evangelho observa: “Vimos a sua estrela e viemos”. Assim que discerniram o chamado de Deus, os Magos puseram-se a caminho. “Enquanto uma nova estrela brilhava externamente em seus olhos”, uma “luz secreta” entrava em seus corações. Movidos pela graça, estes sábios respondem ao seu Deus que espera “louvores de todas as nações”.

A disposição desses homens contrasta com a falta de entusiasmo que manifestamos quando o Espírito Santo nos sugere um bom projeto, cuja realização atrapalharia nossos planos. A prontidão dos Magos em seguir a estrela destaca os atrasos “imprudentes e insensatos que levamos todos os dias no cumprimento das ordens de Deus e em fazer o que a graça nos inspira Continuar lendo

TRADIÇÃO, UMA POSIÇÃO PARA O FUTURO

As convulsões atuais passarão como passaram todas as heresias. Será preciso voltar um dia à tradição; na autoridade será necessário que reapareçam os poderes significados pela tiara, que um tribunal protetor da fé e dos bons costumes se estabeleça de novo permanentemente, que os bispos reencontrem seus poderes e sua iniciativa pessoal.

Será preciso liberar o verdadeiro trabalho apostólico de todos os impedimentos que hoje o paralisam e que fazem desaparecer o essencial da mensagem; restituir aos seminários sua verdadeira função, recriar sociedades religiosas, restaurar as escolas católicas e as universidades desembaraçando-as dos programas leigos do Estado, sustentar organizações patronais e operárias decididas a colaborar fraternalmente no respeito dos deveres e dos direitos de todos, interditando-se o flagelo social da greve, que não passa de uma guerra civil fria, promover enfim uma legislação civil conforme às leis da Igreja e ajudar na designação de representantes católicos movidos pela vontade de orientar a sociedade para um reconhecimento oficial do reinado social de Nosso Senhor.

Enfim, pois, que dizemos todos os dias quando rezamos? “Venha a nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade assim na terra como no céu”. E no Glória da missa? “Vós sois o único Senhor, Jesus Cristo”. Nós cantaríamos isto, e, apenas saídos da Igreja, diríamos: ”Ah não, estas noções estão ultrapassadas”, é impossível encarar no mundo atual a possibilidade de falar no reino de Jesus Cristo? Vivemos nós no ilogismo? Somos cristãos ou não? Continuar lendo

FIDUCIA SUPPLICANS E A “BÊNÇÃO PASTORAL”

A Igreja deve evitar basear sua prática pastoral na rigidez de certos padrões doutrinários ou disciplinares”.

Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est

1. Essa passagem do número 25 da recentíssima Declaração Fiducia supplicans é apenas uma repetição do princípio fundamental já afirmado pelo Papa Francisco na Exortação pós-sinodal Amoris laetitia. Esse princípio encontra sua justificação no número 8 da referida Declaração, que por sua vez se refere ao número 12 do Novo Ritualpromulgado por João Paulo II em 1985. “As Bênçãos”,diz o documento, “podem ser consideradas como um dos sacramentais mais difundidos e em constante evolução. Eles nos ajudam a compreender a presença de Deus em todos os acontecimentos da vida e nos recordam que, mesmo no uso das coisas criadas, o ser humano é convidado a buscar a Deus, a amá-Lo e a servi-Lo fielmente”. As bênçãos estão “em constante evolução”. Por quê? Porque o seu objetivo é “nos fazer compreender e recordar”… Fazer compreender e recordar: as bênçãos são, portanto, apenas uma linguagem, puros sinais, operando simplesmente com o fim de aumentar a conscientização? Se for esse o caso, é lógico que as bênçãos se adaptam, como qualquer linguagem, à mentalidade daqueles a quem são dirigidas. Porque o essencial, em qualquer trabalho pastoral, é fazer-se compreender. Tudo o mais decorre disso.

2. Em primeiro lugar, para abençoar, segundo o documento, basta ouvir as diversas pessoas “que vêm espontaneamente pedir uma bênção” (n.º 21). Este pedido, por si só, expressa a necessidade “da presença salvífica de Deus em sua história”(nº. 20). Pedir uma bênção é reconhecer a Igreja “como sacramento de salvação” (ibidem), “admitir que a vida eclesial brota das entranhas da misericórdia de Deus e nos ajuda a avançar, a viver melhor, a responder à vontade do Senhor” (ibidem). Em suma, o pedido expressa convicções, mas o que mais? Expressa um desejo de cura, uma resolução eficaz? Ela expressa desejo de uma conversão? O número 21 simplesmente menciona, por parte daqueles que pedem a bênção, “uma abertura sincera à transcendência, a confiança de seu que não depende apenas das suas próprias forças, sua necessidade de Deus e do seu desejo de escapar à estreiteza desse mundo fechado sobre si mesmo.” E sair do pecado? Aparentemente, esse não é o caso aqui. O que não surpreende, já que a bênção é uma escuta, porque, como toda escuta, ela não precisa se preocupar com resoluções efetivas. Ela vem em um momento de esperança e expectativa.
Continuar lendo

TEMPO, UM PRESENTE DE DEUS

Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est

Enquanto Deus parece nos conceder mais tempo, peçamos ao Espírito Santo que nos ajude a usar sabiamente os dias desse novo ano, segundo o conselho de São Paulo: “Façamos o bem enquanto temos tempo” (Gal 6, 10). A vida na terra prepara para a eternidade. Longe de desperdiçar nosso tempo, é importante que façamos bom uso dele para crescer em Cristo.

Dois olhares no tempo

As Sagradas Escrituras dissertam com lucidez sobre a brevidade da vida. O homem apenas passa pela terra, onde as provas o aguardam. “O homem nascido de mulher vive pouco tempo e está cheio de misérias. Como uma flor nasce e é logo cortada e foge como uma sombra e jamais permanece num mesmo estado” (Jó 14, 1-2).

Na realidade, como explica Bossuet, o tempo pode ser considerado de duas maneiras [1] . Em si mesmo, o tempo “não é nada, porque não tem forma nem substância “. Ele “desvanece em um movimento sempre progressivo, que nunca regride“. Ele não faz nada além de “passar” e ” perecer “. Mas se o homem prende ao tempo “algo mais imutável do que ele mesmo “, então esse tempo se torna “uma passagem para a eternidade que permanece “.

Além disso, continua o Bispo de Meaux, um “homem que teria envelhecido nas vaidades da terra ” não viveu realmente, porque “todos os seus anos foram perdidos“. Mas uma vida cheia de boas obras, por mais curta que seja, é eternamente benéfica. A riqueza de uma vida é medida não por sua longevidade, mas pelo valor de suas ações. A Igreja que honra a virtude do velho Simeão celebra também o martírio dos santos inocentes.

O tempo é precioso, conclui Bourdaloue, porque “é o preço da eternidade”. A salvação depende do tempo. Além disso, “não é somente para nós, mas ainda mais para Ele mesmo e para Sua glória, que Deus nos deu o tempo. Ele quer que o usemos para servi-lo e glorificá-lo” [2] . Continuar lendo

BOLETIM DO PRIORADO PADRE ANCHIETA (SÃO PAULO/SP) E MENSAGEM DO PRIOR – JANEIRO/24

30 ANOS DEPOIS: O SERMÃO DAS SAGRAÇÕES EPISCOPAIS DO ARCEBISPO LEFEBVRE |  DOMINUS EST

Caros Fiéis,

Por que a Fraternidade São Pio X está demorando tanto para decidir consagrar bispos? Dom Fellay tem 65 anos, Dom Galarreta tem 66 anos e Dom Tissier de Mallerais tem 78 anos. Eles estão enfrentando um apostolado exaustivo que consiste em várias viagens ao redor do mundo. De fato, para deixar claro que não tinha nenhuma intenção cismática, o Arcebispo Dom Marcel Lefebvre, nas consagrações de 1988, não quis designar um território específico aos bispos destinados a continuar sua obra. De fato, a jurisdição territorial depende do Papa. Dom Lefebvre realizou uma “operação de sobrevivência”, para dar à Fraternidade os meios de oferecer o apostolado tradicional na Igreja. É por isso que nossos bispos nunca param de viajar, respondendo às necessidades dos fiéis que buscam espontaneamente o apostolado da Fraternidade, que continua crescendo sem parar. Não sabemos se devemos nos alegrar com isso, pois se trata da consequência do declínio geral da Igreja. Seja como for, alguns bispos a mais não parece ser excessivo. Então, por que não os consagrar, e rapidamente?

Assueta vilescunt; que podemos traduzir como: as coisas, quando se tornam rotineiras, aviltam-se.

As consagrações de 1988, sem mandato   papal, foram uma medida excepcional ditada pelas circunstâncias. A exceção não pode se tornar regra, caso contrário, ela perderia as razões que a justificam. As futuras consagrações receberão autorização romana? Ninguém sabe. Aconteça o que acontecer, uma cerimônia de consagração pela Fraternidade no contexto atual da Igreja é um evento suficientemente importante para não ser considerado de modo leviano. Continuar lendo

A DOUTRINA SOCIAL E A PRÁTICA CARITATIVA DA IGREJA CONTRA A USURA

Fonte: Sì Sì No No, ano XLI, n. 18 – Tradução: Dominus Est

Os Montepios (Monti di Pietà) nasceram como locais ou entes públicos com o objetivo de “emprestar dinheiro em troca de um penhor […] para combater a usura e ajudar as classes menos favorecidas. […] A fundação do Montepio foi uma inovação muito importante do ponto de vista social, que surgiu por volta do século XV […] e beneficiou aqueles que não tinham garantias sólidas para oferecer e teriam sido obrigados a recorrer a agiotas” (Enciclopedia Cattolica, Cidade do Vaticano, 1952, vol. VIII, col. 1378 e 1380, verbete Monti di Pietà) ou aos bancos, que emprestam com base em juros legalmente estabelecidos, mas moralmente injustos (cerca de 30-35%[1]) e, portanto, são na realidade agiotas legalizados[2].

Os franciscanos reformados do século XV (o Beato Bernardino de Feltre, S. Tiago das Marcas, S. Bernardino de Siena) conceberam e implementaram o primeiro Montepio para fins caritativos, concedendo assistência aos necessitados de forma quase gratuita. Eles também eram chamados de Montes Christi ou Deposita Apostolorum para distingui-los dos bancos com fins lucrativos[3].

O primeiro Montepio nasceu na Úmbria, em Perugia, pelo Padre Michele Càrcano em 1462, e posteriormente outros foram abertos em Orvieto em 1463, na Toscana, na Romagna, no norte da Itália e depois em toda a Itália. Continuar lendo

A VERDADEIRA ISRAEL SEGUNDO A FÉ

Israel perde a guerra pelos corações e mentes do mundo ocidental |  Metrópoles

Fonte: Sì Sì No No, Ano XXXIII, n. 18 – Tradução: Dominus Est

É formalmente e explicitamente revelado que existe uma Israel segundo o espírito e outra Israel segundo a descendência carnal.

Com efeito, São Paulo escreve: “Porque nem todos os que descendem de Israel, são verdadeiros israelitas (herdeiros das promessas); nem os que são da linhagem de Abraão (são) todos (seus) filhos” (Rom. IX, 6-7). Isso quer dizer que existe uma Israel carnal: aqueles que descendem de Israel e são “da linhagem de Abraão” por nascimento; e existe uma Israel espiritual: aqueles que têm a fé de Abraão e acreditaram na vinda do Messias, Jesus Cristo. Em suma, a verdadeira descendência de Abraão não é determinada pelo nascimento, mas pela fé em Jesus Cristo: “Se sois de Cristo, sois a descendência de Abraão, os herdeiros segundo a promessa — Si autem vos Christi, ergo semen Abrahae estis, secundum promissionem haeredes” (Gal. III, 29).

Por isso, é formalmente e implicitamente revelado (em “Israel segundo a carne” 1Cor. 10-18) que existe uma falsa Israel. Falsa porque não acolheu o Messias e impediu o seu conhecimento entre os gentios. E há uma verdadeira Israel que, respondendo à sua vocação, acolheu Cristo e pregou-O aos gentios.

Consequentemente, é pelo menos “virtualmente revelado”, ou seja, há ao menos uma “conclusão teológica” de que existe uma nova Israel: o cristianismo ou a Nova Aliança no sangue de Cristo; e uma velha Israel: o mosaísmo ou a Antiga Aliança, que era figura e preparação para Cristo (Rom. X, 4: “finis enim Legis Christus”; “o fim da Lei é Cristo”). Continuar lendo

PACIÊNCIA E IMPACIÊNCIA – PARTE 19 – PRIMEIRO FRUTO DA PACIÊNCIA: A PAZ

JÁ OUVIU FALAR EM "JOELHOFOBIA"?

Fonte: Bulletin Hostia (SSPX Great Britain & Ireland) – Tradução: Dominus Est

Todos nós ansiamos pela paz. Não pela inatividade, nem, de fato, para que não tenhamos nada contra o que lutar, mas pela ausência daquele conflito dentro de nós que é a fonte de toda a nossa miséria. É a luta em nossos corações entre duas forças opostas do dever e da inclinação que nos perturba e aflige. Para que esta luta cesse, uma destas duas forças deve ser esmagada. É o processo de esmagar as nossas inclinações corruptas que tememos. Não temos a coragem necessária, embora saibamos que o único caminho para a paz é mortificar os nossos membros que estão na terra. Essa é a história dos meus problemas: não venci minha natureza inferior e minha obstinação.

Como podemos obter a vitória e restaurar a paz em nossos corações? Sem sofrimento isso é impossível . Nada mais tem o poder de quebrar nossas vontades orgulhosas e fazer colocar nossos “teimosos pescoços” sob o jugo. Dizemos que aqueles que sofreram tem uma aparência castigada, e isso sempre nos atrai. Há, no sofrimento, uma espécie de magia que dever nos recomendar ou, pelo menos, nos reconciliar com ele. Se eu tiver que sofrer, pensarei nisso e me consolarei sabendo que Deus trará paz e felicidade a partir disso.

Mas não é todo o sofrimento que tem este efeito salutar, mas apenas o sofrimento suportado com paciência. Se formos impacientes, rebeldes, inconformados, o nosso sofrimento poderá ser ocasião de novos problemas e não de paz. Devo aceitá-lo das mãos de Deus, para que ele traga consigo aquela tranquilidade que ainda não alcancei enquanto estou lutando. Devo inclinar minha cabeça e me colocar nas mãos de Deus para sofrer como Ele quiser, o que Ele quiser, enquanto Ele quiser. Este é o único caminho para uma paz sólida.

COMUNICADO DO SUPERIOR GERAL DA FSSPX

“Quem me ama observa -e faz observar- meus mandamentos.”

A declaração Fiducia supplians do prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, acerca da questão das bênçãos para “casais irregulares e parceiros do mesmo sexo”, deixa-nos consternados. Ainda mais porque esse documento foi assinado pelo Papa.

Embora tente evitar qualquer confusão entre a bênção de tais uniões ilegítimas e a do matrimônio entre um homem e uma mulher, essa declaração não evita nem confusão, nem escândalo: não apenas ensina que um ministro da Igreja pode invocar a bênção de Deus sobre uniões pecaminosas; mas invocando-a confirma, de fato, essas situações de pecado.

A invocação expressa em tal “bênção” consistiria simplesmente em pedir para essas pessoas, em um ambiente não litúrgico, que “tudo o que é verdadeiro, bom e humanamente válido em suas vidas e relações seja investido, curado e elevado pela presença do Espírito Santo”.

Contudo, fazer com que pessoas que vivem em uma união fundamentalmente viciosa acreditem que ela possa ser, ao mesmo tempo, positiva e que tenha valores é o pior tipo de engano — e a mais grave falta de caridade para com estas almas desorientadas. É errado imaginar que haja algo de bom em uma situação de pecado público, é erro afirmar que Deus pode abençoar os pares que vivem nessa situação. Continuar lendo

O JUDAÍSMO RABÍNICO OU PÓS-CRISTÃO – PARTE 2/2

Judaísmo Rabínico. Historia de las Religiones . Biblioteca Virtual

Fonte: Fonte: Sì Sì No No, Ano XXXV n. 8 – Tradução: Dominus Est

1. Gênese do Talmud

Eugênio Zolli, ex-rabino-chefe de Roma e convertido ao catolicismo define o Talmud como “grande corpus da tradição rabínica”[1].

Riccardo Calimani, um israelita, escreve: “Uma crença rabínica, que ao longo do tempo se espalhou cada vez mais e se tornou oficial, chegou ao ponto de sustentar que Moisés tinha recebido a Torá [=Lei] total no Monte Sinai, tanto na forma escrita: Torá ou Pentateuco, e na forma oral, Mishná. Foi transmitida a Josué e dele aos mais velhos e depois, aos poucos […], foi confiada à memória dos homens que o escreveram fisicamente. Nesta nova luz, a Mishná […] adquire, como lei oral transcrita depois da Revelação no Sinai, enorme importância […]. Não é de surpreender, portanto, que tenham surgido inúmeros comentários […]. Os amoraim (literalmente: relatores) eram aqueles mestres que, aproximadamente entre os séculos III e V [d. C.], sucederam aos tannaim (repetidores, professores, do século I ao III) e deram vida a um grande comentário chamado Guemará que, somado à Mishná, tomou o nome de Talmud. A escola palestina produziu o Talmud de Jerusalém, e a da Babilônia o Talmud Babli, considerado o mais importante e concluído no século VI [d. C.]”[2].

São João Bosco, por sua vez, (Storia sacra, Turim, SEI, IX ed., 1950), explica: “O Talmud é o corpo da doutrina judaica que abrange a religião, as leis e os costumes dos judeus. Existem dois deles: o de Jerusalém, composto pelos rabinos dessa cidade por volta do ano 200 d.C., em favor dos judeus que viviam na Judéia; e o da Babilônia, composto nessa cidade cerca de 200 anos depois do primeiro, para uso dos judeus que viviam além do Eufrates. […]

A) Mishná: código de direito eclesiástico e civil dos judeus. Esta palavra significa “repetição da lei” ou “segunda lei”. Os judeus acreditam que, além da Lei escrita, Moisés recebeu outras leis no Monte Sinai que ele comunicou oralmente e que foram preservadas entre os doutores na Sinagoga até a época do famoso rabino Judas, o Santo, que escreveu a Mishná no ano 180 d.C. Nada mais é do que a coleção de ritos e leis orais dos judeus; Continuar lendo

O JUDAÍSMO RABÍNICO OU PÓS-CRISTÃO – PARTE 1/2

Judaísmo Rabínico. Historia de las Religiones . Biblioteca Virtual

Fonte: Sì Sì No No, Ano XXXV n. 7 – Tradução: Dominus Est

Um leitor nos pediu uma introdução ao judaísmo talmúdico ou “pós-bíblico”, ao qual aludimos muitas vezes, desde um ponto de vista puramente teológico, sem adentrarmos nas consequências sociais e econômicas disso. Faremos um breve resumo, esperando fazer algo útil aos católicos que hoje estão desorientados pelo pró-judaísmo dos modernistas, que (a partir da declaração Nostra aetate) camuflam a verdadeira natureza do judaísmo atual.

1. Judaísmo do Antigo Testamento e judaísmo pós-cristão

Eugenio Zolli (o antigo rabino-chefe de Roma que se converteu ao catolicismo) escreve: “O povo judeu, que tinha sido o veículo da Revelação quando esta se apresentou na sua plenitude com Cristo e os apóstolos, rejeitou-a, pelo menos na maior parte de seus membros, e colocou-se assim fora da Igreja […]. A orientação geral [do judaísmo] tornou-se anacrônica. Porquanto, enquanto a Igreja está inteiramente voltada para Aquele que já veio para redimir e salvar [Jesus Cristo], o judaísmo debruçou-se sobre uma expectativa puramente vã. O judaísmo pós-bíblico […] considera-se [ainda] um povo eleito e em relação de aliança com Deus”[1].

Monsenhor Francesco Spadafora explica as causas da rejeição de Cristo e de sua Igreja: depois da heroica insurreição liderada pelos Macabeus contra Antíoco Epifânio (175 a.C.), começaram os acontecimentos habituais de uma dinastia, a dos asmoneus, cujas disputas “levaram […] à intervenção de Roma (63 a.C.) e à chegada ao trono de Judá de um feroz idumeu, Herodes, sob a tutela de César. Nesses dois séculos (de 175 a.C. até à vinda de Jesus) formaram-se os grupos e instituições que encontramos no tempo de N. Senhor: fariseus, saduceus, essênios, Sinédrio, sinagogas, etc., e principalmente a concepção estreita de um messianismo nacionalista, com a exclusão dos gentios da salvação […]. O puritanismo dos fariseus e a intransigência altiva e cética do Sinédrio opor-se-ão ao divino Salvador, aos Apóstolos e à Igreja nascente. O trágico desvio do judaísmo terá o seu fim e o seu castigo na destruição de Jerusalém (70 d.C.)”[2]. Continuar lendo