NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – TERCEIRA CARTA – PARTE 1

Resultado de imagem para céu catolicoResposta a algumas objeções

I

É perigoso não responder às objeções. – As de que falamos, resultam da idéia falsa ou acanhada que se faz do Céu – O pensamento católico exprimido com felicidade por Dante. – Luzes que os bem-aventurados têm. – Eles não ignoram as nossas necessidades. – Desejo que têm de nos socorrer. – A sua lembrança de tudo.

SENHORA,

Nenhuma das verdades solidamente estabelecidas na Igreja deve ser abalada em nossas almas, por uma ou muitas objeções, cuja solução nos escapa.

“A verdade é do Senhor e permanecerá eternamente”, diz a Escritura (Ps. CXVI, 2); as objeções são do homem, o tempo muda-as, e o sopro da ciência as dissipa.

Todavia, acontece que uma verdade claramente demonstrada, não penetra profundamente em nossa alma, enquanto tivermos uma dificuldade a que não achemos resposta. Algumas vezes mesmo a objeção apodera-se de tal modo do nosso espírito, que chega a expelir dele a verdade.

É o que se deu em muitas pessoas a respeito do objeto de que nos ocupamos. Não sabendo como rasgar o véu de algumas dificuldades que lhes ocultava esta luz tão consoladora, têm dito que não nos reconheceremos no Céu. A sua imprudência poderia comparar-se à dum menino que, não podendo dissipar o espesso nevoeiro, negasse a existência do Sol.

As objeções que vos têm feito, e que me haveis transmitido, resultam de se não formar uma idéia assaz justa e grande do Céu. Continuar lendo

NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – SEGUNDA CARTA – PARTE 2

Resultado de imagem para céu catolicoI I

Provas da tradição: o fato simplesmente afirmado por Santo Atanásio, S. Paulino, Santo Agostinho, Honório e Berti – As consolações tiradas deste fato, por Santo Ambrósio para os irmãos; por Fócio para os parentes; por S. Jerônimo, Santo Agostinho e, mais ainda, S. João Crisóstomo, para as viúvas.

A luz despedida sobre este objeto pela tradição católica é tão viva e constante que passa através de todas as nuvens dos sofismas e da preocupação.

Os testemunhos podem dividir-se em duas classes: os que afirmam simplesmente o fato, e os que dele tiram uma consolação.

Entre as obras muitas vezes atribuídas a Santo Atanásio, esta glória tão pura do IV século, encontra-se uma que tem por título: Questões necessárias que nenhum cristão deve ignorar. Ora, na resposta à XXII questão lê-se: “Deus concede às almas justas, no Céu, um grande bem, o de se conhecerem mutuamente”.[1]

No fim do mesmo século, S. Paulino, que mais tarde foi Bispo de Nola, escrevia ao seu antigo preceptor, o poeta Ausónio:

“A alma sobrevive ao corpo, e é necessário que ela guarde os seus sentimentos e as suas afeições, tanto quanto a sua vida. Ela não pode esquecer que é imortal. Para qualquer lugar que Nosso Senhor me mande depois da minha morte, levar-vos-ei em meu coração, e o fatal golpe que me separar do meu corpo não porá termo ao amor que vos consagro”.[2]

No século V, o grande Bispo de Hipona dizia a seu auditório: “Conhecer-nos-emos todos no Céu. Pensais vós que me conhecereis, por me haverdes conhecido na terra, mas não conhecereis meu pai, porque nunca o vistes? Repito-vos, conhecereis todos os santos. Eles se conhecerão, não porque vejam a face uns dos outros, mas verão como os profetas costumam ver na terra; ou ainda dum modo bem mais excelente. Verão divinamente. Por isso que estarão cheias de Deus”[3].
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NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – SEGUNDA CARTA – PARTE 1

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No Céu todos se conhecem

I

Provas da Sagrada Escritura: a parábola do rico avarento, explicada por Santo Irineu, e sobretudo por S. Gregório Magno. – Fato que ele cita em apoio. O juízo final, base da argumentação de S. Teodoro Studita. 

SENHORA,

Todos os bem-aventurados admitidos no Céu conhecem-se perfeitamente, antes mesmo da ressurreição geral. Provam-no tanto a Sagrada Escritura como a Tradição.

Limitar-me-ei a citar-vos o Novo Testamento, tomando apenas dele a parábola do rico avarento e algumas palavras que se referem ao juízo final.

Está parábola é tão bela que não posso resistir ao desejo de apresentar a vossos olhos as suas passagens principais:

Havia um homem rico que trajava esplendidamente e se banqueteava com magnificência, todos os dias.

Havia também ao mesmo tempo um pobre, chamado Lázaro, deitado à sua porta, todo coberto de úlceras, que desejava ardentemente saciar a fome com as migalhas que caíam da mesa do rico, mas ninguém lhas dava, e os cães vinham lamber as suas feridas.

Ora, aconteceu morrer este pobre, e foi transportado pelos anjos ao seio de Abraão. O rico morreu também e teve por túmulo o Inferno. E quando estava em tormentos, levantou os olhos para o Céu e viu, ao longe, Abraão e Lázaro em seu seio; e, exclamando, diz estas palavras:
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NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – PRIMEIRA CARTA – PARTE 4

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Porque Deus só basta aos escolhidos, seguir-se-á que terão a Deus unicamente? – A sua liberalidade em todas as ordens conhecidas prova qual seja a mesma na ordem da glória. – É falso que nos esqueçamos no Céu ou que sejamos insensíveis à felicidade de nos tornarmos a ver. – Palavras de S. Francisco de Sales sobre este mútuo reconhecimento e sobre a alegria que dele resulta. 

Disseram-vos ainda:

“Só Deus é suficiente aos escolhidos!

Sem dúvida, deixando-se ver e possuir por nós, só Deus seria bastante para nos tornar a todos felizes. Mas que se pode concluir daqui?

Se bastava a si mesmo desde toda a eternidade, direis vós que nada criou no tempo e que nós não existimos? O menor sofrimento do Redentor bastava para nos salvar a todos: negareis Sua Paixão e Sua Morte?

A Sua Divindade é suficiente a si mesma: credes que ela não tenha cuidado algum da Sua humanidade?

Descei desta ordem toda divina até à ordem da graça e da mesma natureza, e contai todos os socorros que nos são oferecidos para santificar nossas almas, todas as iguarias que nos são dadas para nutrir nosso corpo, contai todas as flores que ornam a terra e todos os astros que brilham no firmamento, e dizei se o Senhor se contentou de criar para nós o suficiente, ou se passou muito além dele.

E querer-se-ia que na ordem da glória, quando houver de recompensar os Seus fiéis servos, os Seus apóstolos, os Seus mártires, os Seus pontífices, os Seus confessores e as Suas virgens, se limitasse a dar-lhes estritamente o necessário! Continuar lendo

NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – PRIMEIRA CARTA – PARTE 3

Resultado de imagem para céu catolicoSerá verdade que os santos só amam a Deus? – Eles amam-se entre si como concidadãos, como irmãos, como dois amigos que vêem todas as perfeições um do outro. – Deus só é cioso do nosso amor de adoração. – O amor recíproco dos santos glorifica-o como Criador, como Pai, como princípio de toda a amabilidade.

Disseram-vos que os santos amariam só a Deus.

Ouvi a resposta do abade Marcos no seu belo livro sobre a felicidade dos santos:

“A pátria celeste é-nos incessantemente apresentada no Evangelho sob o símbolo dum reino, duma sociedade, duma família. Mas uma sociedade, um Estado, uma família não é simplesmente uma aglomeração de individualidades estranhas umas às outras; mas sim uma reunião de seres inteligentes e racionais, obedecendo a leis comuns e obrigatórias para todos, que fazem um só e mesmo corpo da harmônica união destes diversos membros.

Ora, entre todas estas leis, há uma que é salvaguarda, e como que o laço de todas as outras; é a lei da solidariedade social ou fraternal, que ordena a todos se dediquem por cada um, e que cada um se dedique por todos, à proporção das forças e necessidades de cada membro. É, por outros termos, a lei da mútua caridade, a lei do amor.

No Céu nos amaremos como se amam os filhos dum mesmo pai, como irmãos queridos e ternas irmãs; amar-nos-emos, como se amam dois amigos que só se conhecem desde ontem, e cujos corações, apenas se encontraram, se compreenderam e encadearam um no outro, por uma simpatia que sentem ser indestrutível e eterna.

Desde o momento em que nossas almas tiverem penetrado no seio de Deus, encontrar-se-ão abrasadas duma fervente caridade de umas para com as outras. A sua vista e recíproca presença serão como que uma faísca que operará este abrasamento, assim como na natureza física se vê muitas vezes um corpo inflamar outro corpo, somente pelo efeito do choque ou simples contato. Continuar lendo

NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – PRIMEIRA CARTA – PARTE 2

Resultado de imagem para céu catolicoBem-aventurança essencial e bem-aventurança acidental. – Três erros sobre esta bem-aventurança acidental citados pelo filosofismo. – Confissão de J. J. Rousseau. – Refutam-se estes três erros.

Gozar plenamente do que temos amado pura e santamente na terra, eis para nós o Céu. Gozar de Deus constitui a bem-aventurança essencial.

Este gozo da criatura que nos tem sido mais querida, sem deixar de ser secundário, torna-se para a alma uma doce consolação, desde que a morte nos arrebata aqueles que mais amávamos; e Deus nos envia, para moderar nossos pesares, a esperança de torná-los a ver, de reconhecê-los, de amá-los ainda muito especialmente no Céu, e de receber deles também os testemunhos duma especial afeição.

Quantas vezes não tem servido esta esperança de remédio a vossas feridas e de alívio a vossas dores?

Mas, eis que muitas pessoas, aquelas mesmas cujos lábios devem guardar a ciência e cujo coração deve ser o depositário da lei (Malach. II, 7) ousaram primeiramente dizer-vos que não nos reconheceríamos no outro mundo, nem mesmo no Paraíso; depois repreenderam, como uma imperfeição, o vosso vivo desejo de possuir no Céu, além do Criador, certas pessoas ternamente queridas, vosso esposo e vossos filhos.

Finalmente, fazem crer ao mundo que a perfeição cristã, mais ainda a vida religiosa, esgota no coração humano a fonte da sensibilidade, para deixá-lo seco e gelado para com seus pais, irmãos ou irmãs e seus amigos.

No Céu tudo se esquece em Deus, dizem elas. Deus não vos será suficiente? Os santos nunca amaram senão a Deus, chamado pela Escritura um Deus cioso (Exod., XXXIV, 14). Continuar lendo

NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – PRIMEIRA CARTA – PARTE 1

Resultado de imagem para céu catolicoEstado da questão

É permitido afligir-nos pela morte dos nossos parentes, contanto que não cessemos de esperar. – Testemunho de Santo Agostinho. – Prática da Igreja – Palavras de S. Paulino. – Exemplo de Jesus Cristo.

SENHORA,

A morte descarregou o seu terrível golpe junto de vós, sobre as pessoas que vos eram mais caras. A vossa dor é extrema, e é legítima, ainda que não duvideis da eterna salvação daqueles cuja falta lamentais.

Por que motivos vos será proibido chorar por vossos parentes e amigos que adormecem no Senhor, contanto que, seguindo o conselho do Apóstolo, vos não entristeçais como os que não têm esperança? (I Thess. IV 12).

Santo Agostinho comentava assim estas palavras:

“É natural entristecermo-nos com a morte daqueles que nos são caros, pois que a natureza tem horror à morte, e a fé nos ensina que ela é um castigo do pecado.

A tristeza é uma necessidade: Hinc itaque necesse est ut tristes simus, quando aqueles que amamos deixam de existir. Porque, ainda que saibamos que nos não abandonam para sempre, como aconteceria se devêssemos ficar sempre na terra, mas que nos precedem pouco tempo, porque estamos destinados a segui-los talvez muito breve; todavia, como não contristaria o sentimento do nosso amor a inexorável morte que se apodera do nosso amigo?

Que seja permitido, pois, aos corações amantes entristecerem-se com a morte das pessoas amadas, contanto que haja um remédio para esta dor e uma consolação para estas lágrimas, na alegria que a fé nos faz gozar, assegurando-nos da sorte de nossos queridos defuntos, que se apartam somente por algum tempo de nós e passam a melhor vida.”[2] Continuar lendo

NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – INTRODUÇÃO – VANTAGENS DESTA PUBLICAÇÃO

Resultado de imagem para céu catolicoEsta esperança é-nos dada ainda por Monsenhor Wicart, Bispo de Laval:

“Li, diz ele, com muito prazer e fruto o seu livro – No Céu nos Reconheceremos.

Continuai, meu bom Padre, a escrever obras tão piedosas e atraentes ao mesmo tempo; muitas pessoas vos deverão a felicidade de se resolverem a marchar com passo firme no caminho que conduz à pátria celeste, onde se tornarão a encontrar para viverem eternamente em Deus”.

O sr. Hamon, pároco de S. Sulpício, escrevia-nos assim:

“O seu agradável opúsculo é muito próprio para consolar tantas pobres almas aflitas, que, tendo gozado na terra a felicidade de amarem certas pessoas queridas, têm dificuldade em conceber que se possa ser feliz longe delas.

Sem dúvida, Deus só, basta ao coração; mas a parte sensível da nossa alma tem repugnância de se elevar a esta verdade; e se o conhecimento que tivermos uns dos outros no Céu não aumentar a felicidade essencial no seio de Deus, a esperança deste conhecimento aumentará imensamente a nossa consolação nesta vida. É o fim que vos propusestes, e que haveis perfeitamente conseguido.

O seu livro é, pois, uma boa obra, um verdadeiro ato de caridade que lhe agradeço pela minha parte”.

O bem que produziu este opúsculo prova-se por cinqüenta mil exemplares em língua francesa, espalhados no espaço de quatro anos; pelas numerosas traduções feitas no estrangeiro; pelos novos opúsculos que suscita cada ano sobre o mesmo objeto, e por fatos que nos têm sido contados muitas vezes. Continuar lendo

NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – INTRODUÇÃO – JUÍZO QUE DELA FAZEM ALGUNS EMINENTES BISPOS E SACERDOTES

Resultado de imagem para céu catolicoMas conviria tratar um objeto tão mavioso em presença duma geração a quem o trovão da divina vingança e os estilhaços do raio dificilmente despertam do seu letargo?

Monsenhor Malou, Bispo de Burges, respondendo a um amigo, escrevia-lhe:

“Acabo de ler o opúsculo No Céu nos Reconheceremos. Pergunta-me o que penso a seu respeito. Todas as obras que tratam do Céu, da sua felicidade, da sua eternidade, etc., causam-me muito prazer, porque são estas que em nossos dias produzem nas almas o maior bem. Outrora recolhiam-se maiores frutos, ao que parece, falando da Morte, do Juízo e do Inferno. O temor tinha então mais poder do que o amor. Hoje o amor é mais poderoso para converter os corações.

É, pois, o amor que convém inspirar, não só para firmar os justos, mas também para converter os pecadores.

O objeto de que trata este livro é cheio de interesse. Responde a uma pergunta que as pessoas piedosas nos dirigem repetidas vezes: ‘Reconhecer-nos-emos no Céu?’ Sim, certamente, reconhecer-se-ão reciprocamente as almas e se amarão, e este amor fará parte da felicidade acidental do Céu. Segundo a minha opinião, o autor é exato e nada exagera. Se tem algum defeito, é, talvez, o de não ter esgotado o assunto de que se propôs tratar.”

O autor diz que o sábio prelado entra, depois disto, em considerações que lhe teriam sido dum grande auxílio se quisesse tratar este assunto debaixo doutro ponto de vista e com mais extensão; mas que, por uma parte, pessoas muito autorizadas o aconselharam a conservar neste opúsculo a sua primitiva filosofia; e que, por outra, a nobre senhora, a quem foram dirigidas estas cartas de consolação, tinha rendido naquela ocasião a sua bela alma a Deus, e que por isso lhe não era permitido acrescentar novas cartas às antigas, mas que unicamente lhe parecera conveniente completar estas, porque junto às orações que vão no fim deste opúsculo, lhe aumentarão muito interesse. Continuar lendo

INÍCIO DA PUBLICAÇÃO DO LIVRO: NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – INTRODUÇÃO: OCASIÃO E MOTIVOS DESTA OBRA

Resultado de imagem para céu catolicoNo princípio do ano de 1859, numa cidade do Oeste, onde ensinávamos teologia, soubemos que um pregador dissera, da cadeira da verdade, que os membros da mesma família não se reconheceriam no Céu.

Entre os seus ouvintes encontrava-se um ancião que ao ouvir isto se afligiu muito, porque tinha perdido a sua virtuosa esposa, que sempre esperara tornar a ver junto de Deus. Foi confiar sua aflição ao seu confessor, que era o Superior da mesma casa que habitávamos.

Este, sabendo que andávamos procurando nas obras dos Padres da Igreja os materiais necessários para a composição duma obra, que esperávamos publicar um dia, sobre o dogma da comunicação dos santos, convidou-nos especialmente a recolher todos os testemunhos que assegurassem que os parentes e os amigos se reconhecem na eterna bem-aventurança.

Disse-nos que estas autoridades nos serviriam para consolar as almas, e disse a verdade; tivemos a prova disto três anos depois, em seu próprio país.

Corria o ano de 1862, e pregávamos a Quaresma na catedral duma cidade do Leste. No fim duma instrução mostramos a família recomposta no Céu. Este quadro pareceu próprio a regozijar santamente uma viúva e uma mãe angustiada, bem conhecida em toda a cidade por sua virtude, mas a quem uma indisposição tinha impedido de ir ouvir-nos.

Uma de suas parentes que ela amava ternamente contou-lhe, em resumo, o que tínhamos desenvolvido, e veio da sua parte suplicar-nos que lho déssemos por escrito. Continuar lendo

QUAL SERÁ O GOZO DOS BEM-AVENTURADOS NO PARAÍSO.

NO CÉU NOS RECONHECEREMOS – SÉTIMA CARTA – PARTE 3 | DOMINUS EST

Videmus nunc per speculum in aenigmale; tunc autem facie ad faciem — “Vemos agora (a Deus) como por um espelho, em enigma; porém então face a face” (I Cor. 13, 12).

Sumário. O bem-aventurado, conhecendo no céu a amabilidade infinita de Deus, e vendo todas as disposições admiráveis para sua salvação, amá-Lo-á de todo o coração, regozijar-se-á pela felicidade de Deus mais do que pela sua própria, e não terá outro desejo senão o de amá-Lo e de ser amado por Ele. É nisto que consistirá a sua eterna beatitude. Portanto, se nós amarmos a Deus, sem termos tanto em vista o nosso interesse como a satisfação pela felicidade de Deus, desde a vida presente começaríamos a gozar da beatitude do reino celestial.

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Quando a alma entrar na pátria bem-aventurada e for corrido o reposteiro que lhe impedia a vista, verá a descoberto e sem véu a beleza infinita do seu Deus, e é nisto que consistirá o gozo do bem-aventurado. Todas as coisas que ele contemplará em Deus, enche-lo-ão de alegria. Verá a retidão dos juízos divinos, a harmonia nas suas disposições relativas a cada alma e todas ordenadas para a glória de Deus e o bem de si mesmo.

Com relação a si própria, a alma verá o amor imenso que Deus lhe mostrou em fazer-se homem e em sacrificar por amor dela a vida na Cruz. Conhecerá o excesso de amor encerrado no mistério da Cruz: ver um Deus feito servo e morto supliciado num infame patíbulo! Conhecerá o amor excessivo encerrado no mistério da Eucaristia: ver um Deus posto presente sob a espécie de pão e feito alimento de suas criaturas! Verá distintamente todas as graças que Deus lhe dispensou e que até então lhe estiveram ocultas. Verá toda a misericórdia de que Deus usou para com ela, esperando-a e perdoando-lhe todas as ingratidões. Verá os muitos convites, as luzes e os auxílios que tão abundantemente lhe foram prodigalizados. Verá que as tribulações, as doenças, a perda de bens ou de parentes, que chamara castigos, não foram castigos, senão manifestações da bondade divina para atrair a alma ao seu amor perfeito.

Numa palavra, tudo o que ela vir, lhe fará conhecer a bondade infinita de seu Deus, e o amor infinito que merece. Donde provém que logo que chegada for ao céu, não terá mais outro desejo senão o de vê-Lo feliz e contente. Compreendendo ao mesmo tempo, que a felicidade de Deus é suprema, infinita e eterna, sentirá uma satisfação, já não digo infinita, visto que a criatura não é susceptível de cousas infinitas, mas uma satisfação imensa e plena, que a encherá de gozo, e do mesmo gozo que é próprio a Deus. Assim se verificará nela a palavra de Jesus:  Intra in gaudium Domini tui (1) — “Entra no gozo de teu Senhor”. Continuar lendo

O CÉU – SEGUNDO SÃO JOÃO BOSCO

alg292891A noite de 22 de dezembro [de 1876] ficou memorável no Oratório. Foi um pouco antecipada a hora da oração. Reuniram-se no locutório os estudantes, os artesãos e todas as pessoas da casa. Dom Bosco tinha prometido falar no domingo anterior, mas não pudera fazê-lo. Imagine-se a expectativa geral! Subiu à cátedra, saudado por palmas entusiásticas, como acontecia sempre que dava daquele modo a “boa noite” à comunidade inteira. Fez sinal de que ia falar e imediatamente fez-se completo silêncio.

Na noite em que estive em Lanzo, chegada a hora de repousar, aconteceu-me que tive o seguinte sonho. É um sonho que não tem nenhuma relação com outros sonhos…

São coisas muito estranhas. Mas para meus filhos não tenho segredos; abro-lhes inteiramente o coração. Pensai o que quiserdes desse sonho. Como diz São Paulo, quod bonum est tenete [conservai o que é bom], se alguma coisa encontrais nele que seja de proveito para vossa alma, sabei aproveitar-vos dela. Quem não quiser crer, que não me creia, pouco importa; mas ninguém jamais zombe das coisas que vou dizer.

Peço-vos, ainda, que não o conteis nem o comuniqueis por escrito aos que não são da casa. Aos sonhos pode-se dar importância que sonhos merecem, e os que não conhecem nossa intimidade poderiam formar juízos errôneos, vendo as coisas de modo diferente do que são na realidade. Não sabem eles que sois meus filhos, e que sempre vos digo tudo o que sei, e às vezes até mesmo o que não sei (risos gerais). Mas o que um pai manifesta a seus filhos queridos para o bem deles, deve ficar entre o pai e os filhos, e não passar adiante. E ainda por outro motivo: é que em geral, quando se contam essas coisas fora, ou se desfiguram os fatos ou se conta apenas uma parte deles, e esta mesma mal entendida; de onde nasce dano, pois o mundo desprezaria o que não deve ser desprezado.

Deveis saber que ordinariamente os sonhos se têm dormindo. Ora, na noite de 6 de dezembro, enquanto eu estava no meu quarto, não recordo bem se lendo, ou se dando voltas pelo aposento, ou se me havia já deitado,comecei a sonhar. Continuar lendo