O SUICÍDIO DE LUTERO

Étienne Couvert

Em 20 de maio de 1505, Lutero iniciara seus estudos de Direito na Universidade de Erfurt. Pouco tempo depois, porém, uma desgraça ocorreu. Tendo encontrado seu amigo Jerônimo Buntz, desentenderam-se, travaram um duelo e Lutero acabou por matar seu companheiro. Em junho daquele mesmo ano, preocupado com as consequências da morte, Martinho buscou seu protetor e amigo, João Braun, vigário colegial em Eisenach, para lhe pedir conselho. Este o estimulou a tornar-se religioso, a fim de evitar as consequências judiciais do caso. Lutero acatou a sugestão e em 17 de julho de 1505 entrou para o convento dos Eremitas de Santo Agostinho, em Erfurt. Beneficiou-se assim do direito de asilo, então reconhecido pela justiça civil. Seu primeiro tratado, redigido por ele mesmo, intitula-se: “Sobre aqueles que se refugiam nas igrejas, muito útil para os juízes seculares e para os reitores de uma igreja e os prelados de mosteiros”. (“De his qui ad ecclesiam confugiunt tam judicibus secularibus quam Ecclesiae Rectoribus et Monasterioum Praelatis perutilis”). A obra foi publicada anonimamente em 1517, e depois em 1520 com o nome de Lutero. Nela, é lembrado que quem mata sem ter sido inimigo, por erro ou sem premeditação, não é culpado segundo a lei de Moisés.

Em seu mosteiro, porém, Lutero não encontrou paz de espírito. Sua vocação, bastante questionável, foi resultado mais de medo que de um chamado divino ou amor à oração e à solidão.

Devido a seu temperamento hereditário, em acréscimo à sua educação familiar, Martinho era dotado de um caráter violento e explosivo, de tipo primário, que no primeiro impulso age sem refletir, além de uma alma escrupulosa que depois de ter agido, rumina bastante sobre o erro ou a falta cometida desnecessariamente e que podia ter sido evitada com um pouco de reflexão. É um tipo de humanidade bastante comum neste mundo e que não deveria, de modo algum, provocar uma angústia suicida.

Uma morte cometida durante uma rixa, certamente mais acidental que premeditada, não deveria jamais provocar essa crise, que não fez senão acentuar-se ao longo de sua existência, até o suicídio final. A isso é preciso acrescentar outro fator. Continuar lendo

OS CATÓLICOS LIBERAIS E A FALÊNCIA DO ESTADO LAICO

Pe. João Batista de A. Prado Ferraz Costa

Diante do avanço da legislação anticristã no Brasil, as lideranças  dos diversos grupos religiosos estão em busca de um entendimento para empreender uma reação comum e impedir a aprovação de leis que agridem a consciência moral da imensa maioria da população brasileira. Em princípio, essa atitude poderia compreensível e louvável, contanto que observadas todas as regras da prudência para afastar qualquer perigo de um falso ecumenismo e irenismo.

Mas há uma coisa que merece reparo nessa frente ampla das “religiões” contra as forças maçônicas a serviço do Reino do Anticristo e da Sinagoga de Satanás. É que no embate com o inimigo, quando este defende sua plataforma política contra o Direito Divino e Natural e recusa uma interferência das religiões nos debates em curso no Congresso Nacional argumentando que o Estado brasileiro é laico, os representantes da frente ampla das religiões, principalmente os católicos liberais, saem em defesa do Estado laico dizendo que os verdadeiros inimigos deste são os políticos ateus ou agnósticos que se mostram intolerantes e incapazes de manter um diálogo democrático com seus adversários.

Dizem também os parlamentares da frente ampla das religiões que os seus adversários estão esquecidos de que o Brasil não é um Estado ateu, visto que no preâmbulo da Constituição Federal se diz que os representantes do povo brasileiro promulgam a carta magna sob a proteção de Deus. E argumentam que Estado laico significa que o Estado não sofre uma incidência direta das instituições religiosas em sua organização. Continuar lendo

A PROTESTANTIZAÇÃO DO CONCÍLIO VATICANO II – PARTE 3

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  1. A constituição dogmática sobre a Revelação Divina “Dei Verbum”

Esta constituição abandona a doutrina católica das duas fontes da Revelação, para aproximar-se do sola scriptura dos protestantes. Apresentam-nos de imediato no capítulo 1 a Revelação não mais como comunicação das verdades sobre Deus e suas intenções salvíficas, mas como auto-comunicação de Deus; nisto põem em evidência a passagem da perspectiva objetiva à perspectiva subjetiva.

No artigo 5, descrevem a fé como encontro pessoal com Deus, e dom do homem para com Ele; não se deveria mais considerar a tradição como complemento quantitativo e material da Escritura. Ela teria apenas uma dupla função de reconhecimento do teor do cânon e certidão da revelação. De modo ambíguo, não apresentam o magistério abaixo da palavra de Deus, senão que a seu serviço.

Reconhece-se fortemente no artigo 12 a exegese moderna com sua “Formengeschichte”, embebida no espírito protestante de Bultmann. Não mais se atribui à Santa Escritura a inerrância, mas só dizem que ela ensina a verdade.

artigo 19 fala que os Evangelhos oferecem o veraz e o sincero – no texto originam, acrecentaram: “alimentados pela força criativa da comunidade primitiva”, suprimido após o protesto de muitos dos Padres do Concílio. Na 2ª frase deste artigo, assume o Concílio sem meias palavras a exegese moderna: os apóstolos pregavam uma compreensão mais plena do Cristo, os redatores dos Evangelhos “redigiram” o material desta prédica, i. é., material que eles selecionaram, resumiram e atualizaram. Continuar lendo

A PROTESTANTIZAÇÃO DO CONCÍLIO VATICANO II – PARTE 2

protIII. A INFLUÊNCIA DOS PROTESTANTES SOBRE O CONCÍLIO

Com tamanha presença de protestantes no Concílio – presenças direta e indireta – como espantar-se da influência sobre o Concílio e seus documentos? Citemos-lhe alguns para fundamentar a afirmação:

  1. O decreto “Sacrosanctum Concilium” sobre liturgia

Já no artigo 5, encontramos a noção de mistério pascal, que põe a tônica da Redenção na Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo e arrefece a realidade do sacrifício expiatório da liturgia.

No artigo 6, mencionam o mistério pascal duas vezes.

No artigo 7, equiparam a presença do Cristo na Santa Missa e na substância transubstanciada com a presença no ministro da ação litúrgica, na virtude dos sacramentos, na palavra, ou com a presença que há onde duas ou três pessoas estiverem reunidas em seu nome. Uma tal ordem de coisas é um empréstimo manifesto dos protestantes.

No artigo 22, há clara descentralização da competência, em matéria litúrgica: a partir de agora é o bispo local, e sobretudo a conferência episcopal as estâncias decisórias.

Nos artigos 24 e 51, fala-se da grande importância da Santa Escritura na liturgia. Continuar lendo

A PROTESTANTIZAÇÃO DO CONCÍLIO VATICANO II – PARTE 1

cviiConferência do Sr. Padre Franz SCHMIDBERGER no Simpósio de Teologia em Paris, outubro de 2005.

RESUMO DA POSIÇÃO PROTESTANTE

1 – O ponto de partida do protestantismo, sua base filosófica e teológica, é sem dúvida a concepção de Lutero acerca do pecado e da justificação.

Para ele, corrompeu o pecado totalmente a natureza humana, não há sequer liberdade moral. Assim, nada encontra a graça de Deus que curar, transformar, divinizar, limitando-se tão-só a uma declaração exterior: Deus encobre o pecado com o manto dos méritos de seu Filho, não imputando-lhe de pecado, contudo o pecador conserva sua natureza corrompida.

2 – De tal parecer do estado da natureza decaída, decorrem os quatrosoli de Lutero:

a)Sola fide: salva-se o homem só pela fé; notem que, entre os reformadores, concebe-se a fé enquanto fé confiante nos méritos do Cristo Redentor, e não enquanto plena aceitação da Revelação de Deus sob impulso da graça. As boas obras – o jejum, a oração, a esmola, a penitência, a mortificação – não contribuem para a salvação, antes são sinais de fé. Exprime Lutero desta forma seu pensamento de modo categórico: “Peca fortemenTe e crê mais fortemente ainda, e tu serás salvo”. Continuar lendo

DE CAPITULAÇÃO EM CAPITULAÇÃO CHEGAMOS ÀS DIACONISAS

Na igreja conciliar é assim. Tudo começa com as “coroinhetes”. Após um período a candidata pode ser “elevada” à categoria de “Ministra” da Liturgia, depois da Comunhão, ser “gerente” da paróquia…. até chegar no que vemos hoje!!

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Foi anunciada pelo Vaticano há poucos dias a constituição de uma comissão de teólogos e teólogas encarregada de estudar o diaconato feminino na Igreja primitiva. A referida comissão é fruto de um pedido de  um grupo de religiosas ao papa Francisco I, que a instituiu após “muita oração e reflexão” – assim diz a nota da Santa Sé.

De acordo com os melhores estudiosos do assunto, não há nenhuma dúvida de que as diaconisas dos primeiros tempos da Igreja eram mulheres piedosas que se encarregavam de obras de caridade, recebiam uma bênção (com imposição das mãos do bispo) e tal bênção não era absolutamente um sacramento, mas apenas um sacramental.

À luz da tradição constante da Igreja e do magistério dos papas, não procede nenhuma discussão sobre a admissibilidade do sacerdócio feminino na Igreja Católica. Se por desgraça amanhã houver o abuso de uma ordenação de diaconisas, o sacramento da ordem a elas conferido, sobre ser um sacrilégio, será inválido, mas poderá originar uma enorme confusão na Igreja porque já não serão vistas essas reverendas diaconisas como leigas mas como membros do clero e pertencentes à hierarquia eclesiástica. E certamente não se contentarão em ser diaconisas permanentes mas vão pretender galgar os graus mais altos da hierarquia. Continuar lendo

A MESQUITA DE NOTRE-DAME

Como foi possível que este pesadelo se tornasse realidade no berço de nossa civilização? A falta de fé e ausência de luta deixaram as antigas terras da Cristandade indefesas contra a maciça e calculada imigração em um Ocidente tímido que cresceu muito egoísta para defender-se a si mesmo

Mosque-Of-Notre-DameElena Chudinova | The Remnant | Tradução Sensus fidei:

“Nunca houve um livro mais relevante ou mais oportuno.” … Taki Theodoracopulos, editor de “Takimag.com”

“A Mesquita de Notre-Dame (The Mosque of Notre Dame) é uma análise indispensável do Islã para quem quer entender a ameaça que o Ocidente está enfrentando.” … Thomas Fleming, editor de Chronicles: A Magazine of American Culture.

Leia a mensagem da autora.

Originalmente publicado em russo, em 2006, foi traduzido para o francês, sérvio, polonês, búlgaro, turco e norueguês. Está sendo agora publicado em sua primeira edição americana pela Remnant Press.

Como evitar o futuro sombrio que rapidamente se precipita sobre nós? É possível? No livro “A Mesquita de Notre-Dame”, cuja história se passa ano de 2048, os muçulmanos da Arábia e da Europa central assumiram os governos da Europa Ocidental e bloquearam os países sob a Lei de Shária, minaretes, burcas e tudo o mais.

O Arco do Triunfo, em Paris, tornou-se uma plataforma para o apedrejamento de fabricantes de vinho. O Louvre foi despojado de todas as suas obras de arte. E a grande catedral de Notre-Dame de Paris converteu-se em uma mesquita. A Basílica de São Pedro, em Roma, foi arrasada e se transformou em um depósito de lixo. Continuar lendo

DOMINUS FLEVIT SUPER GALLIAM

A data não podia ser mais significativa: o fatídico 14 de julho, data comemorada só pelos inimigos de Deus e da Igreja, ou pelos idiotas úteis que ainda não compreenderam a perversidade da Revolução Francesa, marco inicial do direito político moderno, da farsa da democracia, da rebelião da soberania popular contra a autoridade legítima que governa conforme a Lei de Deus e não conforme os caprichos dos demagogos revolucionários.

14 de julho de 1789 não foi apenas um presságio das calamidades que se precipitariam; foi também uma advertência, para que os franceses (e todos os povos que viam na França a filha primogênita da Igreja e a imitavam) voltassem a trilhar o bom caminho da tradição, os ensinamentos da Igreja e dos Santos e combatessem e condenassem com firmeza os erros e heresias dos filósofos modernos e dos ideólogos do Iluminismo.

Infelizmente, a advertência não foi ouvida. Os anos passaram-se, sucederam-se os séculos. A mão poderosa de Deus feriu a humanidade por causa dos seus pecados e crimes: sobreveio a Revolução Comunista de 1917. Os erros da Rússia espalharam-se pelo mundo afora. Milhões de mortos inocentes. Sobreveio o nazifascismo. Regiões imensas do mundo gemem sob um regime totalitário que, em nome dos princípios revolucionários modernos, em nome da Liberdade, da Igualdade, da Fraternidade, declara guerra ao homem criado por Deus e tenta construir um novo homem, um homem sem Deu, um homem inimigo de Deus, um homem que quer ser um deus.

Em fins do século XX, a humanidade, embrutecida pelo materialismo, dopada pelas drogas e pela pornografia, a humanidade corrompida pela revolução cultural da Escola de Frankfurt que se difunde a partir da grande potência norte-americana, comemora a queda do Muro de Berlim, achando que a partir de então viveria no paraíso de uma democracia universal, onde os homens viveriam como bem entendessem, cada um com seus próprios valores, sem nenhuma preocupação em saber se há uma verdade objetiva, uma lei moral de ordem superior. Continuar lendo

A IDÉIA PATRÍSTICA DE ANTICRISTO

Fim_dos_TemposFonte: Discussions and Arguments”, The Patristical Idea of Antichrist, part I – Cardeal John Henry Newman – Tradução: Dominus Est

Sermão 1. O tempo do Anticristo

Os cristãos tessalonicenses achavam que a vinda de Cristo estava próxima. São Paulo então os avisou por escrito para não alimentarem esse tipo de expectativa. Não que o Apóstolo desaprovasse o anseio deles pela vinda do Senhor, ao contrário; mas ele avisa que um determinado evento deverá ocorrer antes dessa vinda, e que enquanto não houver esse evento não haverá a vinda. “Ninguém de modo algum vos engane”, diz o Apóstolo, “porque isto não se dará sem que antes venha a apostasia (quase geral dos fiéis), e sem que tenha aparecido o homem do pecado, o filho da perdição” [2Ts 2:4].

Enquanto durar o mundo, essa passagem estará repleta de reverente interesse dos cristãos. É dever de todo cristão estar sempre atento para a vinda do Senhor; de buscar os sinais da vinda em tudo que acontece em sua volta; e, acima de tudo, ter em mente esse terrível sinal ao qual fala São Paulo aos tessalonicenses. Assim como a primeira vinda do Senhor teve seu predecessor, a segunda também terá o seu. O primeiro foi aquele que é “ainda mais do que profeta” [Mt 11:9], João Batista, enquanto que o segundo será mais que um inimigo de Cristo: será a própria imagem de Satanás, isto é, o assustador e odiável Anticristo. É dele, conforme nos é apresentado na profecia, que me proponho a falar. Ao fazer isso seguirei exclusivamente a orientação dos antigos Padres da Igreja.

Sigo os Padres da Igreja, mas não por pensar que em tal assunto eles possuem o valor que possuem nos campos das doutrinas e dos ritos. Quando eles falam de doutrinas, eles falam delas como algo que é universalmente mantido. Eles são testemunhas do fato de que receberam essas doutrinas não de um lugar ou de outro, mas de todos. Recebemos então essas doutrinas que eles nos ensinam, mas não apenas porque eles nos ensinaram, e sim porque os cristãos de todos os lugares a mantiveram dessa maneira. Tomamos os Padres da Igreja pela honestidade dos seus testemunhos, e não por suas autoridades, embora eles também sejam autoridades. Se eles afirmassem essa mesma doutrina, mas dissessem: “Essas são as nossas opiniões: nós a deduzimos da Sagrada Escritura, e elas são verdadeiras”, poderíamos então duvidar delas assim que a recebêssemos. Com justiça poderíamos dizer que temos tanto direito quanto eles de deduzir algo da Sagrada Escritura, pois essas deduções seriam meras opiniões, e que se nossas deduções coincidissem com as deles, essa seria uma feliz coincidência, e que se não coincidissem, paciência, pois cada um deveria seguir a própria luz. Não há dúvidas que homem nenhum jamais deve impor suas próprias deduções ao outro no que diz respeito à fé. Há, entretanto, uma óbvia obrigação do ignorante de se submeter àquele que é mais bem informado; também é conveniente que os jovens implicitamente submetam-se por um tempo aos ensinamentos dos mais velhos; mas, além disso, a opinião de um homem não é melhor do que a do outro. Todavia, esse não é o caso quando estamos falando dos primeiros Padres da Igreja. Eles não estão dando suas opiniões privadas; eles não dizem “Isso é verdade, porque vemos dessa forma na Sagrada Escritura” (e aí pode haver diferença entre os juízos), mas sim “Isso é verdade pois, com efeito, é algo que sempre foi mantido por todas as Igrejas até os nossos dias, sem interrupção, desde a época dos Apóstolos”, de modo que a coisa é apenas uma questão de testemunho, ou seja, se eles tinham os meios de saber como aquilo continuava a ser mantido — e ainda continuava sendo. Porquanto, essa era a crença mantida por igrejas que ao mesmo tempo estavam distantes e independentes uma das outras, mas que por terem sido todas elas fundadas pelos Apóstolos, não havia dúvida que esses testemunhos são verdadeiros e apostólicos. Continuar lendo

SANTO ATANÁSIO: O VERDADEIRO DEFENSOR DA TRADIÇÃO – PARTE II

SantoAtanasio21A queda do Papa Libério

Em 17 de maio de 352 Libério foi consagrado Papa. Ele imediatamente se viu envolvido na disputa ariana:

Ele apelou a Constâncio para que fosse justo com Atanásio. A resposta imperial veio na convocação dos bispos da Gália para um concílio em Arles em 353-354, onde, sob ameaça de exílio, os bispos concordaram em condenar Atanásio. Até mesmo o núncio apostólico de Libério rendeu-se. Quando o Papa pressionou para que o concílio fosse mais abrangente de representantes, Constâncio reuniu-os em Milão em 355. Houve, na ocasião, ameaças violentas de um grupo de pessoas e a intimidação pessoal do Imperador: “Minha vontade é a lei canônica”, exclamou. Com exceção de três bispos, o Imperador prevaleceu sobre todos os outros. Atanásio fora novamente condenado e os arianos admitidos à comunhão. Novamente os núncios do papa renderam-se e o próprio Libério recebeu ordens para assinar. Quando recusou a assinar, e até mesmo a aceitar as ofertas do Imperador, ele foi preso e carregado para longe da presença imperial; ao manter-se firme em prol reabilitação de Atanásio, o Papa foi exilado para a Trácia em 355, onde ficou por dois anos. Enquanto isso, um diácono Romano, Félix, foi introduzido na sé petrina. O povo recusou-se a reconhecer o antipapa imperial. O próprio Atanásio teve de se esconder e seu rebanho foi abandonado à perseguição pelo intruso de tendências arianas. Quando visitou Roma em 357, Constâncio foi assediado por pedidos clamorosos pela restauração de Libério. Por outro lado, bispos subservientes que rodeavam a corte em Sirmio subscreveram fórmulas doutrinais mais ou menos ambíguas ou heterodoxas. Em 358, uma fórmula composta por Basílio de Ancira, declarando que o Filho era de substância parecida com a do Pai, homoiousion, foi oficialmente imposta.[10]

A oposição ao antipapa Félix tornou urgente a necessidade de Constâncio restaurar Libério à sua sé. Contudo, era igualmente urgente que o Papa condenasse Atanásio. O Imperador usou uma combinação de ameaças e lisonjas para atingir seu objetivo. Seguiu-se então a trágica queda de Libério. Ela foi descrita implacavelmente em Lives of Saints de Alban Butler:

Nessa época, Libério começou desmoronar por conta das dificuldades do seu exílio, e sua resolução foi abalada pelas contínuas solicitações de Demófilo, o bispo ariano de Bereia, e de Fortunaciano, o contemporizador bispo da Aquiléia. Estava ele tão mais amolecido por lisonjas e alvitres (que deveriam na verdade fazê-lo tampar seus ouvido de horror) que ele rendeu-se, para grande escândalo da Igreja, à armadilha feita para ele. Ele subscreveu a condenação de Santo Atanásio e uma confissão ou credo concebido pelos arianos em Sirmio, embora a heresia ariana não estivesse lá expressa; e ele escreveu aos bispos arianos do Oriente dizendo que havia recebido a verdadeira fé católica que muitos bispos haviam aprovado em Sirmio. A queda de um prelado tão grande e tão ilustre confessor é um terrível exemplo da fraqueza humana que ninguém pode lembrar-se sem se estremecer todo. São Pedro caiu pela presunçosa confiança em sua própria força e resolução, de maneira que devemos aprender que todo mundo só se mantém pela humildade.[11] Continuar lendo

SANTO ATANÁSIO: O VERDADEIRO DEFENSOR DA TRADIÇÃO – PARTE I

S_Atanasio“O que aconteceu por volta de 1600 anos atrás repete-se nos dias de hoje, mas com duas ou três diferenças: Alexandria agora é toda a Igreja Católica — cuja estabilidade está abalada —, e o que foi empreendido naquela época por meio da força física e da crueldade é empreendido agora em níveis diferentes. O exílio foi substituído pelo ostracismo; o assassinato físico pelo assassinato de reputação.”

Mons. Rudolf Graber, Bispo de Regensburg, Athanasius and the Church of our Times, p. 23.

O objetivo deste apêndice não é explicar a natureza da heresia ariana, mas sim provar que um bispo fiel à Tradição pode ser repudiado, caluniado, perseguido e até mesmo excomungado por quase todo episcopado, inclusive pelo próprio Papa. Evidentemente trata-se de uma situação anormal, pois o fiel católico tem o direito de supor que a maioria dos bispos em união com o Papa ensinarão a sã doutrina; o católico seria imprudente se não conformasse sua crença e comportamento com o ensinamento desses bispos. Mas nem sempre o caso é esse, conforme demonstra a atual situação da Igreja. Não há praticamente uma única diocese no mundo anglófono cujo bispo esteja preocupado em assegurar que as crianças católicas recebam a sã doutrina; ou que a moral católica e os ensinamentos doutrinais não se contradigam com a impunidade do púlpito (trata-se da leniência com os abusos litúrgicos que chegam até ao nível do sacrilégio). Escrevendo sobre a época de Santo Atanásio, São Jerônimo fez sua célebre exclamação: “Ingemit totus orbis et arianum se esse miratus est” — “Com dor e assombro o mundo todo se viu ariano”. O mundo católico ocidental de hoje encontra-se num estado acelerado de desintegração; mas para a maioria não há dor, tampouco assombro. Com efeito, a maior parte dos bispos repete ad nauseam que as coisas jamais estiveram tão boas e que estamos vivendo no período de maior florescimento da história da Igreja. Um bispo como o falecido Mons. R. J. Dwyer (de Portland, Oregon, EUA), que teve a coragem de falar abertamente e descrever objetivamente o estado de coisas na Igreja, é taxado de excêntrico, fanático e desordeiro. A ICEL (International Commission for English in the Liturgy — Comissão Internacional para o Inglês na Liturgia) recebeu efusivos louvores dos bispos dos EUA por conta da tradução da missa que foi imposta aos fiéis católicos anglófonos. O arcebispo Dwyer falou sobre:

[…] a tradução inglesa — inepta, pueril e semi-analfabeta — que nos foi imposta pela ICEL, um grupo de homens dotados das piores características presentes nos burocratas autofágicos, prestou um imensurável desserviço a todo o mundo anglófono. O trabalho foi marcado pela ausência quase completa de sentido literário, pela insensibilidade crassa à linguagem poética e pior: o uso predominantemente inculto da liberdade de tradução dos textos, de modo que o texto chega ao ponto da deturpação de fato. [1] (grifos nossos) Continuar lendo

A FÉ CATÓLICA NÃO É OFENDIDA SÓ COM A HERESIA

Por Roberto de Mattei – Corrispondenza Romana, 13-01-2016 | Tradução: Hélio Dias Viana – FratresInUnum.com

Em uma longa entrevista aparecida em 30 de dezembro no semanário alemão Die Zeit, o cardeal Gerhard Ludwig Müller, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, levanta uma questão de crucial atualidade. Quando perguntado pela entrevistadora sobre o que pensa daqueles católicos que atacam o Papa, definindo-o de “herege”, ele responde: “Não só pelo meu ofício, mas pela convicção pessoal, devo dissentir. Herege na definição teológica é um católico que nega obstinadamente uma verdade revelada e proposta como tal pela Igreja para ser crida. Outra coisa é quando aqueles que são oficialmente encarregados de ensinar a fé se exprimem de forma talvez infeliz, enganosa ou vaga. O magistério do Papa e dos bispos não é superior à Palavra de Deus, mas a serve. (…) Pronunciamentos papais têm ademais um caráter vinculante diverso – desde uma decisão definitiva pronunciada ex cathedra até uma homilia que serve bastante para o aprofundamento espiritual.”

indifferentism-468x256Tende-se hoje a cair em uma dicotomia simplista entre heresia e ortodoxia. As palavras do cardeal Müller nos lembram que entre o branco (a plena ortodoxia) e o preto (a heresia aberta) há uma zona cinzenta que os teólogos têm explorado com precisão. Existem proposições doutrinárias que embora não sendo explicitamente heréticas, são reprovadas pela Igreja com qualificações teológicas proporcionais à gravidade e ao contraste com a doutrina católica. A oposição à verdade apresenta de fato diferentes graus, conforme seja direta ou indireta, imediata ou remota, aberta ou dissimulada, e assim por diante. As “censuras teológicas” (não confundir com as censuras ou penas eclesiásticas) expressam, como explica em seu clássico estudo o padre Sisto Cartechini, o julgamento negativo da Igreja sobre uma expressão, uma opinião ou toda uma doutrina teológica (Dall’ opinione al domma. Valore delle note teologiche, Edizioni “La Civiltà Cattolica”, Roma, 1953). Este julgamento pode ser privado, se for dado por um ou mais teólogos por conta própria, ou público e oficial, se promulgado pela autoridade eclesiástica. Continuar lendo

CITAÇÕES SOBRE O ANTICRISTO

antiPe. Emmanuel André: 

“Apresentar-se-á como cheio de respeito pela liberdade dos cultos, uma das máximas e uma das mentiras da besta revolucionária. Dirá aos budistas que é um Buda; aos muçulmanos, que Maomé é um grande profeta… Talvez até irá dizer, em sua hipocrisia, como Herodes seu precursor, que quer adorar Jesus Cristo. Mas isso não passará de uma zombaria amarga. Malditos os cristãos que suportam sem indignação que seu adorável Salvador seja posto lado a lado com Buda e Maomé em não sei que panteon de falsos deuses”  (O Drama do fim dos Tempos)

Santo Ambrósio

“O Senhor não virá como juiz antes que o reino romano seja dissolvido, e que o Anticristo apareça. Este matará os santos e restituirá aos Romanos sua liberdade mas sob seu próprio nome”.

Santo Anselmo

“O Anticristo procurará passar-se por religioso, a fim de poder seduzir sob este exterior de piedade; e há mais, ele dirá que e Deus e se fará adorar e prometerá o céu”.

“Porque, que incrédulo se converterá à fé, que cristão não ficará abalado e quebrado em sua fé, quando o perseguidor da religião se tornar autor de grandes prodígios?”

“Mas, o Espírito Santo é bastante poderoso para sustentar o coração dos seus, mesmo no meio desses grandes prodígios; esses prodígios extraordinários seduzirão somentes aqueles que merecem ser seduzidos”.

Santo Antônio

“O Anticristo será designado como chefe dos hipócritas, porque este homem tão perverso recorrerá sobretudo à hipocrisia para seduzir”.

Santo Agostinho

“Quando o Anticristo, filho do demônio, autor o mais perverso de toda malícia, vir perturbado o mundo inteiro e tiver atormentado o povo de Deus por diversos suplícios; depois que tiver morto Enoch e Elias e tiver martirizado todos os que perseveraram na Fé, a cólera de Deus tombará enfim sobre ele e Nosso Senhor o fará perecer pelo sopro de sua boca”.

São Boaventura

“Marcas do advento do Anticristo:

Quando os velhos não tiverem nem bom senso nem prudência;

Quando os cristãos estiverem sem fé;

Quando o povo estiver sem amor;

Quando os ricos forem sem misericórdia;

Quando os jovens não tiverem respeito;

Quando os pobres forem sem humildade;

Quando as mulheres tiverem perdido o pudor;

Quando, no casamento, não houver mais continência;

Quando os clérigos forem sem honra e sem santidade;

Quando os religiosos não tiverem verdade nem austeridade;

Quando os prelados não se inquietarem de sua administração e não tiverem piedade;

Quando os mestres da terra não tiverem misericórdia nem liberdade.”

São Gregório Magno

“O Anticristo se levantará tão alto, reinará com tanto poder, aparentará uma tão grande santidade por prodígios e sinais extraordinários, que ninguém poderá contradizer suas obras porque somará ao poder do terror os sinais mais aparentes de sua santidade exterior”.

“É coisa diferente de uma testemunha de Anticristo aquele que, não mais considerando como sagrada a Fé que deu a Deus, dá testemunho do erro?”

São Jerônimo

“O Anticristo deverá sair do povo judeu e tais serão sua simplicidade e sua humildade que se não lhe prestarem as honras devidas a um rei, ele se tornará mestre do poder por suas falsidades e seus artifícios e ele forçará os exércitos do povo romano a se renderem e os quebrará”.

“O Anticristo fingirá ser casto para pegar de surpresa um grande número de pessoas”.

São Berlarmino

“O Anticristo estará em entendimento secreto com o demônio que ele servirá secretamente. Em desígnio cheio de fingimento, ele mostrar-se-á como Cristo para enganar os cristãos e, ao mesmo tempo, aprovará a circuncisão e o sábado para seduzir os judeus”.

O Itinerário espiritual da Igreja Católica Júlio Fleichman

BULA “INEFFABILIS DEUS” – DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO

Murillo_immaculate_conceptionPosição e privilégios de Maria nos desígnios de Deus

Deus inefável, “cuja conduta toda é bondade e fidelidade”, cuja vontade é onipotente, e cuja sabedoria “se estende com poder de um extremo ao outro (do mundo), e tudo governa com bondade”, tendo previsto desde toda a eternidade a triste ruína de todo o gênero humano que derivaria do pecado de Adão, com desígnio oculto aos séculos, decretou realizar a obra primitiva da sua bondade com um mistério ainda mais profundo, mediante a Encarnação do Verbo. Porque, induzido ao pecado — contra o propósito da divina misericórdia — pela astúcia e pela malícia do demônio, o homem não devia mais perecer; antes, a queda da natureza do primeiro Adão devia ser reparada com melhor fortuna no segundo.

Assim Deus, desde o princípio e antes dos séculos, escolheu e pré-ordenou para seu Filho uma Mãe, na qual Ele se encarnaria, e da qual, depois, na feliz plenitude dos tempos, nasceria; e, de preferência a qualquer outra criatura, fê-la alvo de tanto amor, a ponto de se comprazer nela com singularíssima benevolência. Por isto cumulou-a admiravelmente, mais do que todos os Anjos e a todos os Santos, da abundância de todos os dons celestes, tirados do tesouro da sua Divindade. Assim, sempre absolutamente livre de toda mancha de pecado, toda bela e perfeita, ela possui uma tal plenitude de inocência e de santidade, que, depois da de Deus, não se pode conceber outra maior, e cuja profundeza, afora de Deus, nenhuma mente pode chegar a compreender.

E, certamente, era de todo conveniente que esta Mãe tão venerável brilhasse sempre adornada dos fulgores da santidade mais perfeita, e, imune inteiramente da mancha do pecado original, alcançasse o mais belo triunfo sobre a antiga serpente; porquanto a ela Deus Pai dispusera dar seu Filho Unigênito — gerado do seu seio, igual a si mesmo e amado como a si mesmo — de modo tal que Ele fosse, por natureza, Filho único e comum de Deus Pai e da Virgem; porquanto o próprio Filho estabelecera torná-la sua Mãe de modo substancial; porquanto o Espírito Santo quisera e fizera de modo que dela fosse concebido e nascesse Aquele de quem Ele mesmo procede. Continuar lendo

O SAQUE DE ROMA, UM CASTIGO MISERICORDIOSO

sacco-di-Roma-401x278Fonte: Corrispondenza Romana – Tradução: Dominus Est

A Igreja vive uma época de desvio doutrinário e moral. O cisma é deflagrado na Alemanha, mas o Papa não parece se dar conta do alcance do drama. Um grupo de cardeais e de bispos propunha a necessidade de um acordo com os hereges. Como sempre acontece nas horas mais graves da História, os eventos se sucedem com extrema rapidez.

A Igreja vive uma época de desvio doutrinário e moral. O cisma é deflagrado na Alemanha, mas o Papa não parece dar-se conta do alcance do drama. Um grupo de cardeais  e de bispos propugna a necessidade de um acordo com os hereges. Como sempre acontece nas horas mais graves da História, os  eventos se sucedem com extrema rapidez.

No domingo, 5 de maio de 1527, um exército descido da Lombardia entra no Gianicolo [uma das sete colinas de Roma]. O Imperador Carlos V, irado pela aliança política do Papa Clemente VII com o seu adversário, o rei francês Francisco I, tinha feito avançar um exército contra a capital da Cristandade. Naquela noite, o sol se pôs pela última vez sobre a beleza deslumbrante da Roma renascentista. Cerca de 20.000 homens, italianos, espanhóis e alemães, entre os quais os mercenários Lanzichenecchi, de fé luterana, se preparavam para atacar a Cidade Eterna. Seu comandante havia lhes dado licença para saquear. Durante toda a noite o sino do Capitólio tocou a repique para chamar os romanos às armas, mas já era tarde demais para improvisar uma defesa eficaz.  Continuar lendo

INDICAÇÃO DE LEITURA: O RENO SE LANÇA NO TIBRE

reno_1De nada adianta discutir sobre um evento do porte do Concílio Vaticano II se não se conhece sua história. O autor deste livro é um padre que teve como papel estabelecer um Centro de Imprensa no Vaticano, durante o Concílio.

Acompanhando seu desenrolar, entrevistando os bispos, analisando documentos, cartas, regimentos, deixou-nos por escrito o que se pode chamar dos Bastidores do Concílio. Dentro deste contexto, o que mais impressionou ao autor foi a força do grupo de bispos da Europa Central, que se denominaram Aliança Européia, diante de pequenos grupos mais conservadores que tentavam segurar a avalanche de reformas e novidades. Uma leitura viva, apaixonante e que não deixará nossos leitores indiferentes. Prefácio de Dom Lourenço Fleichman OSB.

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INDICAÇÃO DE LEITURA: CATECISMO DA CRISE NA IGREJA

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Na crise atual, este livro é um verdadeiro compêndio das Verdades atacadas pelos erros modernos. Coloca em plena luz, de um modo particularmente esclarecedor, a posição que deve ser sustentada para se permanecer fiel à Igreja.

A apresentação sob forma de perguntas e respostas tem o mérito de tornar o raciocínio do autor facilmente acessível e de assim permitir, a todos, uma boa compreensão sobre a crise e sobre os seus remédios.

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