Conferência dada pelo Pe. Patrick de la Rocque, FSSPX, em novembro de 2007, na ocasião de um simpósio sobre a encíclica Pascendi Dominici Gregis.
Pe. de La Rocque, FSSPX (Atualmente Prior de Nice, participou de discussões teológicas com Roma entre 2009 e 2011).
Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est
Dizer que o modernismo denunciado pela Encíclica Pascendi Dominici Gregis jamais esteve tão presente quanto esteve no Papa João Paulo II pode parecer severo. Essa afirmação, todavia, não passa de um eufemismo para qualquer pessoa familiarizada com o pensamento e os ensinamentos do falecido papa. Com efeito, se aceitarmos aquela definição fundamental do modernismo dada pelo Papa São Pio X, ou seja, da imanência vital que o caracteriza, devemos reconhecer em João Paulo II um papa profundamente modernista. Imanência vital: nenhum outro papa a ensinou mais do que ele. Parece-me possível até afirmar – sem a pretensão de demonstrar pormenorizadamente aqui – que essa imanência vital foi a fonte da qual se alimentou todo o pontificado de João Paulo II. Seja como for, sob a luz de tal critério os vinte e sete anos de seu soberano pontificado adquirem uma coerência notável.
Por enquanto, esta apresentação cuidará de discutir somente três pontos. Eu gostaria primeiramente de mostrar que João Paulo II se fez pregador explícito da imanência vital: alguns exemplos bastarão. Em seguida, decifraremos a leitura que ele fez, à luz da imanência vital, do dogma da Encarnação e depois por fim da Redenção. A conclusão então será imposta por si mesma: ao passar pelo humilhante itinerário da imanência, os dogmas católicos perdem sua própria substância. Nesse sentido, a evolução da teologia católica sob o pontificado de João Paulo II foi uma triste ilustração da constatação de São Pio X: o modernismo é o esgoto coletor de todas as heresias.
1) A imanência vital em João Paulo II
Deus misteriosamente presente no coração de cada ser humano
Que João Paulo II tenha ensinado o princípio de imanência vital é evidente. Tomemos por exemplo o discurso que proferiu junto aos cardeais da Cúria no dia seguinte a Assis, a fim de justificar seu gesto: “Toda oração autêntica é suscitada pelo Espírito Santo que está misteriosamente presente no coração de cada homem”[1]. Ele não diz mais que o Espírito Santo age pontualmente sobre o coração de cada homem por meio das graças atuais – o que a Igreja ensina –, mas sim que está misteriosamente presente no coração de todos os homens: isso é a afirmação do princípio de imanência vital. Continuar lendo